'Chamado aos comunistas: gênero, raça e as urgências do nosso tempo' (Victor)
Um trabalho que tenha inserção, que consiga se financiar e gerar ganhos imediatos junto às camadas mais marginalizadas, vai crescer independente de qual seja sua linha.
Por Victor para a Tribuna de Debates Preparatória do XVII Congresso Extraordinário.
Para mim, que já levo alguns anos em contato com o Marxismo-Leninismo, e vinha afastado da militância há um tempo, ver o processo de formação do RR, ainda que com todas as contradições - que um processo como esse não poderia deixar de ter, foi animador. Até por isso, resolvi aproveitar este ótimo espaço para tentar trazer contribuições.
Dado o contexto, ao acompanhar os movimentos posteriores ao racha, tenho percebido alguns vícios e posições que condizem mais com as mazelas da antiga organização, do que com o nível da responsabilidade e urgência histórica de organizar a classe, e de fazer de fato surgir uma organização revolucionária em nosso país. É, inclusive, desta urgência e responsabilidade que surge o compromisso com o leninismo, enquanto ferramenta para transformar a sociedade. Nunca como fim em si mesmo.
Adianto, ainda, que posso soar direto ou ríspido em algumas posições e colocações. Mas como será desenvolvido no texto, trato estritamente de posições e urgências políticas. Nada aqui exposto foi guiado por questões pessoais.
Para situar os debates que pretendo fazer, separo este texto em 4 partes, as quais considero todas urgentes, e me parecem atrasadas:
1- Sobre Formação: a apropriação da responsabilidade de fazer avançar as lutas de gênero sobre TODA a militância, não somente àquelas parcelas diretamente afetadas por tais opressões;
2- Sobre organização: facilitar a participação das camadas mais exploradas na vida e tomadas de decisões do partido: a organização deve ser de toda a militância.
3- Sobre prática política: A conexão da crítica teórica ao real impacto na atuação da militância, e a firmeza de linha para além de performance;
4- Ainda sobre prática política: Caminhos para superação do moralismo.
1- Sobre Formação: a apropriação da responsabilidade de fazer avançar as lutas de gênero sobre TODA a militância, não somente àquelas parcelas diretamente afetadas por tais opressões;
Me impressiona bastante como, tanto no círculo da militância partidária, como no movimento comunista como um todo, é visto com naturalidade que aqueles que não sejam mulheres ou pessoas trans não tenham qualquer domínio sobre lutas de gênero, discutir sobre direitos reprodutivos, liberdade sexual, família. Muitos mal entendem, por exemplo, o quão importante é garantir acesso gratuito à absorventes para as pessoas. No último ano, inclusive, foi aprovado pelo governo a distribuição destes itens no SUS, de maneira limitada e que precisa ser ampliada, como quase tudo na política burguesa, mas particularmente vi poucos debates a respeito. Enquanto isso, a pré-candidata à prefeitura de São Paulo, Tabata Amaral, mesmo com todas suas posições (ultra) liberais que conhecemos, participou da criação da medida e vem pautando este tema em sua campanha.
Tomado o exemplo, reforço que estes são temas absolutamente conectados à dominação capitalista, e que colocam membros da própria classe trabalhadora (a ler-se aqui principalmente homens cis-hetero) em posição de poder sobre outres membres da classe.
Ora, como temas tão cruciais e constitutivos de nossa própria existência, até previamente à atuação militante, podem ser ignorados por um estrato da militância? Ou então delegados somente àquelus que, além de sofrer com a própria opressão, ainda precisam carregar o fardo de formular e construir respostas sozinhes? Isto quando não estão sendo obrigades a passar por constrangimentos dentro da própria vida política no círculo partidário.
Inclusive, sobre estes constrangimentos, o completo atraso neste debate internamente faz surgir uma série de dinâmicas liberais e pouco efetivas na real superação do problema. Por exemplo, repetidas vezes a discussão sobre o enfrentamento à ocorrência de situações abusivas tem como foco primário as punições a aplicar, após tais ocorrências. Ora, o foco primordial há de ser a prevenção. Reconhece-se a possibilidade de ocorrências, às quais é necessário ter estruturações definidas, conforme muito bem iniciado por camaradas Daniel e Mariana na tribuna ‘Sobre Processos Disciplinares’(1).Mas precisamos nos mover com a devida urgência em direção da construção de um círculo partidário que signifique espaço seguro, onde não só não veremos violências nesse sentido, como também apoio e construção profunda destas lutas, independente de quem seja a pessoa envolvida. É preciso firmeza, não eternos processos de "desconstrução" e "autocríticas".
Sobre o tema da família monogâmica no capitalismo, diante da dificuldade de trazer alguns conceitos para sua prática de vida pessoal, é comum ver militantes diminuindo a pauta a comentários jocosos, ou reduzindo a discussão somente ao trabalho doméstico. Uma análise mais profunda, no entanto, mostra que as bases monogâmicas são elementos centrais na opressão feminina, e que a construção moral superestrutural de restrição à liberdade sexual feminina é ponto chave para entender a violência doméstica. Segundo fontes como o DataFolha, mais de 27 milhões de brasileiras já sofreram algum tipo de violência por parte de seus próprios parceiros (2). Como podemos ignorar esta realidade?
E me debruço aqui mais sobre o prisma cis-hetero, por ser o enfoque maior da crítica que pensei para este texto, mas reforço que é intrínseco à toda esta problemática também o caráter excludente que todo o conceito de família e suas moralidades carregam em relação à pessoas que se identificam como LGBTQIA.
Engels, há quase 150 anos, com todas as limitações que seu tempo e sua condição pessoal poderiam trazer, já era capaz de apontar:
"O primeiro antagonismo de classes que apareceu na história coincide com o desenvolvimento do antagonismo entre o homem e a mulher na monogamia: e a primeira opressão de classes, com a opressão do sexo feminino pelo masculino" (3)
Ou seja, é muito espantoso que uma discussão tão relevante, que foi teorizada em minúcia até mesmo por uma das principais e mais básicas referências comunistas, seja simplesmente rejeitada. Ainda que eu possa discordar da posição a nível pessoal, entendo ser compreensível. Porém, a completa abstenção de se falar sobre família e monogamia a nível político e social, a ponto de isto se tornar um tabu moral dentro da própria militância, é fugir de uma responsabilidade fundamental; é fechar os olhos para a liberdade de gênero, e para inúmeras violências subsequentes, que são silenciadas no capitalismo.
E não é como se faltassem fontes e referências, há diversos trabalhos que desenvolvem o tema com a devida historicidade como os de Saffioti, Zetkin, do próprio Engels, ou Walkowitz em suas análises sobre as condições de trabalhadoras sexuais diante da estrutura e superestrutura capitalistas, trabalhadoras estas também pouco visibilizadas para além dos coletivos feministas e algumes militantes que se engajam por interesse próprio, como no caso da camarada Nina (4). Muitos estudos e análises já foram teorizados por comunistas, anarquistas, etc. sobre a relação entre a estrutura e superestrutura capitalistas, família, moral e suas implicações de gênero. No entanto, a nível macro, no momento atual, pouco se absorve, contrasta e discute para que construamos posições e lutas com a devida robustez, com base nestes acúmulos.
Pois bem, como pode existir tantas opiniões políticas sobre a governança política do nosso e de outros países, sobre forma-partido, sobre minúcias teóricas e correntes, mas quando tratamos das relações de gênero, que estão completamente intrincadas na gênese e funcionamento do modo de produção capitalista, só uma parte da militância fica responsável por se preocupar e formular, enquanto outra parte se limita a rasas palavras de ordem e endosso sem profundidade?
Ampliando ainda sobre endossos deste tipo, por parte de homens cis, é algo que particularmente me incomoda, pois demonstra uma perspectiva de noção individual, de busca por isenção e por ser lido como um "apoiador" da "causa" entre seus pares; e é até mesmo uma caracterização de desimportância no tema, onde qualquer colocação genérica é aceita, por ser vista como de pouco impacto. Nisso, o debate fica sujeito até a passar com linhas rebaixadas, uma vez que vernizes morais e individuais passam à frente da luta coletiva. Posturas como estas passam à margem do verdadeiro papel de um comunista, que é o de ser agente ativo da luta por libertação.
Até mesmo as críticas a vertentes liberais, que nos coletivos e círculos de mulheres, pessoas trans e LGBTQIA+ são feitas com maior precisão, quando chegam aos demais círculos passam a cair num lugar comum de "considerarmos a questão de classe". Porque sim, consideramos a questão de classe e isso é central, mas como isso se conecta nas lutas e práticas cotidianas? Se, por exemplo, feministas liberais se colocam na defesa do direito ao aborto, os homens cis comunistas terão de fato compreensão da linha da organização sobre o tema? Saberão agregar em discussões de quando e onde é vantajosa ou não para a classe uma aliança tática com esses setores? Saberão levar a cabo posições mais avançadas de libertação se confrontados com posições reacionárias? Ou irão se isentar? Ou, no limite, se porem somente a criticar a visão incompleta contida nas vertentes liberais, sendo incapazes de enxergar sua própria posição de poder no processo?
Eu poderia incluir aqui, ainda, que estas dinâmicas se reproduzem, com mais ou menos similaridades, quando falamos sobre a questão de raça também. Problema que vimos com tanta frequência no antigo PCB, e que inclusive foi, acertadamente, um dos motivos do racha. Ou seja, é hora de fazer diferente.
É urgente que essas discussões sejam colocadas como pautas centrais de formação da nova militância. Quaisquer militantes que estejam ou passem pela organização precisam passar tendo visto com clareza a posição que ocupam neste aspecto intrínseco à luta de classes, entender os ideais de libertação de gênero, e estarem aptes para encampar e fazer avançar tanto as lutas que surjam sem a vanguarda do partido, como aquelas às quais o partido precise iniciar os debates e liderar as massas. Qualquer homem cis-het que faça parte da organização precisa estar disposto a renunciar sua posição de poder dentro da classe, e a lutar ombro a ombro com todas as várias mulheres e pessoas trans que estarão construindo o partido. Não há como falar em comunismo sem libertação de gênero. Não há como falar em militância comunista sem domínio deste debate.
2- Sobre organização: facilitar a participação das camadas mais exploradas na vida e tomadas de decisões do partido: a organização deve ser de toda a militância.
A participação na vida cotidiana do partido é algo que pode se tornar bastante complexo a depender do recorte social da pessoa militante. Longas horas de trabalho, deslocamento, responsabilidades domésticas, necessidade de tempo livre, e mesmo a forma com que tudo isso pode afetar a saúde mental, são pontos que afetam até militantes experientes, quanto mais quem se aproxima do partido e da militância pela primeira vez. E, como sabemos, são justamente os substratos mais precarizados pela exploração capitalista que irão encontrar com maior frequência estes desafios. E quem são estas pessoas? Justo aquelas das quais o partido precisa se aproximar e impactar prioritariamente. Apesar de acreditar que tudo isso é consenso entre comunistas, percebo que muito pouco é feito para de fato criar um ambiente que favoreça, bem como uma cultura que não rebaixe as pessoas que têm maior dificuldade para participar das atividades do partido.
Me parece que as pessoas que possuem histórico no movimento estudantil, e outros espaços de militância, estão acostumadas e entendem como normal a realização de reuniões demasiadamente longas, espaços de discussão restritivos, numa dinâmica que condiciona toda a vida da pessoa militante a estas atividades; e por tabela, aqueles que por alguma razão não comparecem perdem o espaço e o direito de discutir, avaliar, opinar. Porém, para militantes recentes e sobretudo precarizades, que é com quem o partido precisa se fortalecer, a construção desta forma pode se tornar inviável. E muitas vezes aqui se tratam de pessoas que estão dispostas a ajudar na construção, têm interesse e desejo revolucionário, mas que não têm seu potencial lapidado porque a organização não procura meios de facilitar e valorizar sua participação. Com isso, estas pessoas não encontram seu espaço, veem sua participação desprestigiada e desincentivada. Enquanto comunistas, precisamos trabalhar também com o desejo, com o acreditar das pessoas que se aproximam, de atuar na luta coletiva. As pessoas precisam acreditar que a presença delas ali é notada, é importante e que seu trabalho junto à organização terá impacto real na vida da classe trabalhadora; isso é mobilização, fundamental para o funcionamento da forma organizativa. Além disso, é preciso entender que as outras atividades nas vidas das pessoas, fora da militância, não são meramente acessórias. Como poderemos pautar o acesso das pessoas ao lazer, à saúde mental, à vida comunal, ao tempo livre e descanso (como bem indicado nas discussões por diminuição de escalas de trabalho), se dentro das nossas próprias instâncias consideramos estes anseios como distrações, ou falta de interesse por parte da pessoa militante?
A partir do momento em que perdemos esta dimensão do desejo participativo pelo lado militante, e da capacidade de se adaptar à realidade da militância por parte da organização, as tarefas militantes se tornam apenas mais um trabalho, diante de tantos outros que cada um de nós já acumula em inúmeras esferas da vida.
A quem é mais experiente, ou tem melhores condições disponíveis, isto pode não ser um problema. Mas definitivamente não podemos depender só destes. O movimento comunista, e em específico o RR, precisará ampliar visceralmente, a nível nacional, sua inserção na luta no campo, nos bairros, ocupações, sindicatos, coletivos, etc., tarefa que será impraticável se residir somente nas mãos dos poucos que "podem" seguir na militância sem quebrar.
3- Sobre prática política: A conexão da crítica teórica ao real impacto na atuação da militância, e a firmeza de linha para além de performance;
Retomando a discussão sobre debates teóricos e formação, aponto para a necessidade (e urgência!) de conexão entre as formulações, posicionamentos, formação de linhas e a atuação do partido. Diversas vezes, noto o surgimento de disputas, blocos, situações que entendo como normais da vida política, porém em torno de divergências supérfluas, que pouco ou nada tocam no desenvolvimento prático da organização, no sentido de responder nossas demandas de classe. E isso quando teóricas, pois, muitas vezes, mergulham em questões pessoais, que aquelus que estão imerses nessas disputas acabam nem percebendo o quão descolades se colocam da realidade.
É preciso que todes envolvides tenham a compreensão de que toda disputa, todo debate, ganhando ou perdendo, PRECISAM ter como norte fundamental a revolução brasileira, a subversão e transformação completa da realidade que o capitalismo impõe à classe trabalhadora. É a isto que serve o marxismo-leninismo.
Isto posto, é importante também que, tanto enquanto organização, quanto enquanto movimento, espectro político, é preciso que nos movamos na direção de ser uma opção real de construção, e não só nos limitarmos à crítica teórica. Levanto aqui, apenas como exemplo, o debate sobre o posicionamento e atuação do MST feito pelo camarada Raul(5), onde até guardo discordâncias da dimensão teórica do que aponta o camarada em sua exposição, e até da própria visão política do MST enquanto organização, embora se declare Marxista-Leninista. Porém, ao mesmo tempo, concordo no profundo respeito ao trabalho tocado pelo Movimento ao tocar a vida de inúmeras pessoas, desamparadas, que têm a oportunidade de experimentar um ambiente comunal, ter acesso a terra, comida, educação, enfim, acesso à vida. Isso NÃO é pouca coisa. Ao passo em que é justo e natural que tenhamos nossa linha e tenhamos divergências políticas com outros grupos, como no caso da crítica, que é comum entre marxistas-leninistas na análise per se, da proximidade que o MST guarda com o reformismo, é preciso que esta firmeza se traduza na construção de uma alternativa real. Nos colocarmos numa disputa direta, com uma organização que, mesmo que tenha limites, é fundamental na vida da classe trabalhadora brasileira, enquanto temos tão pouco a oferecer como alternativa, faz sentido? Estar "na linha correta", ainda que estejamos mesmo, é o suficiente? A real apreensão da importância dos alívios e avanços imediatos, ainda que limitados, na vida dos membros da classe, ajuda bastante a entender "O Que Fazer".
Concorrentemente, jamais podemos nutrir a ilusão tipicamente liberal de que a qualidade dos argumentos guia por si às vitórias políticas. Linha correta não garante capilaridade, assim como um ganho de capilaridade não é sinônimo de acerto de linha. Muitas vezes, defesas de rebaixamento de discurso e alianças com setores reacionários partem justamente dessa ilusão.
Crescimento e inserção estão muito mais ligados à capacidade organizativa, que a de tipo Leninista acaba por nos dar caminhos para superar os empecilhos que nossa posição de classe nos impõe nesse aspecto, mas paramos aí. Nesse aspecto, organizativo, à propósito, destaco bons debates trazidos pelos camaradas Tabaco, sobre o Jornal (6), e do camarada Kevin, sobre a profissionalização de finanças (7), com contribuições sobre onde deve estar nosso foco se queremos dar lastro à nossas linhas de maneira estruturada, a ponto de, por exemplo, disputar o espaço ocupado por igrejas na periferia, enquanto opção real, sem rebaixamento de linha.
Nossa linha não é o que vai garantir inserção, mas sim o que vai definir qual será o direcionamento que tomará a classe trabalhadora, à medida que nos inserirmos. Por um lado, um trabalho que tenha inserção, que consiga se financiar e gerar ganhos imediatos junto às camadas mais marginalizadas, vai crescer independente de qual seja sua linha. Por outro lado, no que este trabalho seguir uma linha reformista ou contrarrevolucionária, irá restringir a classe ou ao imobilismo, ou à eterna batalha pelo imediato, e estará sob o risco de, diante dos acirramentos provocados pelo capitalismo, até mesmo acentuar os conflitos internos à classe - à entender, de raça e gênero.
Assim, é preciso dar passos rumo à construção de uma alternativa mais avançada, que tenha o norte revolucionário claro e bem definido, sabendo como traduzir este norte em progressos reais a curto e médio prazo; ao passo que coletivamente tenhamos suficiente discernimento para entender quando disputar, quando cooperar e coexistir com organizações de linhas até determinado ponto divergentes, que também estejam contribuindo de alguma forma no alívio às demandas imediatas da classe trabalhadora, seja no campo ou nos territórios urbanos.
4- Ainda sobre prática política: Caminhos para superação do moralismo
Nestas tantas discussões políticas mencionadas aqui, umas maiores e mais relevantes, e outras menores, tenho percebido tanto a colocação de divergências políticas num campo moral, quanto a colocação de divergências pessoais no campo político. Com isso, o resultado é o surgimento de diversas disputas que ao mesmo tempo são ríspidas, e irrelevantes. Na maior parte das situações, salvo defesa de posições extremas, violentas ou absolutamente reacionárias, não faz muito sentido olhar para camaradas como inimigos, desejar cerceá-los ou ignorar seus trabalhos por estarem em defesa de uma linha que consideremos ruim.
Concordo que pode ser extremamente frustrante ter que lidar com certas posições; por exemplo, enquanto escrevia esta tribuna, houve uma pequena polêmica sobre abordagens envolvendo religião (no prisma evangélico-cristão, tão somente). Li textos e posições que particularmente considero péssimas, que apreendem pouco do real e no que apreendem, o fizeram sob um ângulo equivocado, ignorando as reais razões, diversos fatores envolvidos, e propondo soluções impraticáveis. Todavia, meu problema é com as posições e tão somente com sua defesa, não me cabem julgamentos para além disso.
Este maniqueísmo moral, que não consegue lidar com contradições, não consegue compreender que uma vítima de violência hoje pode ser um agente de violência amanhã, que quem defende uma linha que consideremos equivocada hoje, pode ser uma pessoa aliada na linha correta amanhã, invariavelmente leva a análises pobres, que, se aplicadas no real, podem ser destrutivas.
O real nos apresenta muitos matizes de cinza entre o preto e o branco, e aquelus que fazem uso do materialismo historico-dialético precisam ser capazes de formular sua posição, com a devida radicalidade, sem precisar criar caricaturas de outras posições para validar a sua própria.
O debate político deve sim ser feito com firmeza, mas, repito, sem perder de vista que o importante é o avanço da classe trabalhadora rumo à revolução, com todas as libertações que ela visa; e não somente "vencer debates".
Concluindo, fica claro que temos atrasos muito sérios a nível teórico que norteiam as ações no movimento comunista brasileiro atual, mesmo nos círculos que entendemos como mais avançados, que aparecem despidos quando alguns temas emergem, como discussões sobre gênero, encarceramento, drogas, religião. Ao mesmo tempo, nos encontramos severamente fragilizados com relação à construção material do movimento comunista enquanto alternativa política, onde não conseguimos - ou não estamos preparados para fazer o necessário para - dar respostas em larga escala, bem estruturadas, sobre financiamento e construção de programas que tragam ganhos imediatos e futuros para a classe trabalhadora.
Diante dessa realidade, faço um apelo a todes aqueles que não se conformam: que nos organizemos, entendamos a responsabilidade que carregamos como defensores da revolução brasileira, compreendamos a urgência da transformação imediata do quadro atual da classe trabalhadora e de seus estratos mais fragilizados, e façamos do marxismo-leninismo a arma para fazer surgir a sociedade de novo tipo no socialismo.
[3] ENGELS, F; MARX, K. A Origem da Família, da Propriedade Privada e do Estado. Rio de Janeiro: Editora Civilização Brasileira, 1984.
[5]https://emdefesadocomunismo.com.br/o-campo-e-a-reforma-agraria-popular/