O PPI do governo Lula: a privatização das florestas

O PPI também é uma das saídas que o empresariado encontra para solucionar a queda em suas taxas de lucro, impondo aos trabalhadores tarifas abusivas, contratos de concessão que são desrespeitados pelas empresas e serviços de má qualidade.

O PPI do governo Lula: a privatização das florestas
Reprodução: Divulgação/Ibama

Por Redação

Iniciado o segundo ano do mandato do novo governo Lula, a tônica até o momento do presidente é dar prioridade a medidas econômicas que favorecem os grandes grupos empresariais em detrimento das demandas da maioria das massas trabalhadoras. Embora o petista apresente maior sensibilidade frente aos anseios dos trabalhadores, movimentos sociais e sindicais, os quais apenas amargaram perdas nesse último ciclo de derrotas desde 2016, os interesses dos grupos financeiros e industriais têm predominado na agenda governista.

Recorda-se que um dos fatores que levaram ao golpe contra a presidenta Dilma Rousseff foi a tentativa deste governo de conciliar interesses tão divergentes entre as massas trabalhadoras e o grande empresariado exatamente num momento de ofensiva do patronato em um momento de grave crise global do sistema capitalista, na esteira da crise financeira de 2008.

Assim, escolhido para ser o novo Ministro da Fazenda ainda no início de 2015, o banqueiro advindo do Bradesco, Joaquim Levy, impôs um rigoroso ajuste fiscal nos gastos do governo federal, com o objetivo de condenar aos trabalhadores uma derrota: a elevação do desemprego, que provoca a redução do poder de barganha dos sindicatos.

Essas ações resultaram em uma forte retração da economia brasileira ainda no mandato de Dilma. A taxa de desemprego, segundo dados do IBGE, saiu de 6,6% em finais de 2014, logo após a eleição que elegeu a presidenta, para 9,1% no fechamento de 2015. O objetivo era solucionar a crise colocando os piores custos em cima daqueles que trabalham.

Mas isso não era suficiente, os empresários precisavam de mais, eram necessárias reformas mais profundas, ataques mais fortes, tudo que garantisse uma fatia maior da riqueza criada pelos próprios trabalhadores para o lucro do grande capital. Entretanto, tais ataques Dilma Rousseff não conseguia oferecer, pelo menos não na velocidade que queriam.

A própria ala governista não conseguia sequer convencer os trabalhadores, que sofriam com a recessão e o elevado desemprego causados pelo governo, a defender a presidenta Dilma. Qual operário irá se sentir na obrigação de ir às ruas para defender um mandato que promove corte de gastos e elevado desemprego? Sem apoio das massas trabalhadoras e um governo rendido a uma lógica política puramente palaciana, distante de suas próprias bases que a elegeram, as ruas ficaram desertas no momento do golpe.

Com os problemas que o pleno emprego causa na correlação de forças imediata pela luta econômica por melhores salários e condições de trabalho, dando maior poder aos sindicatos, os empresários estavam ansiosos por uma reformulação do papel do Estado, assim, aproveitando a oportunidade de ter na presidência um governo disposto a não realizar nenhuma concessão aos trabalhadores e impor um projeto de desestatização, sucateamento e desmonte de diversos aparelhos de Estado que atendiam aos interesses dos trabalhadores.

Nesse sentido, logo após o golpe contra a presidenta, a presidência de Michel Temer ficou marcada por um pacote de medidas econômicas que representava uma série de ataques aos direitos dos trabalhadores, assim sendo, a política econômica de Joaquim Levy era intensificada.

É o caso do teto de gastos, que simplesmente congelou o orçamento público da União por vinte anos (chamado à época pelas forças de esquerda como PEC da morte ou PEC do fim do mundo), da reforma trabalhista e do avanço da terceirização nas relações de trabalho, inclusive para atividades-fim. Nesse sentido, é possível caracterizar o período de 2016 a 2022 como um neoliberalismo reacionário, com uma forte ofensiva dos setores empresariais contra os trabalhadores, na intenção de recompor as suas taxas de lucro advindas da crise de 2008.

Essa foi a solução da crise política ao final do governo Dilma: instituir um severo arrocho nas contas públicas, retirar do Estado a prerrogativa dos investimentos públicos, flexibilizar as relações de trabalho. Derrotados, os trabalhadores amargaram um crescimento na taxa de desemprego, atingindo o patamar de 13,9% no início de 2017 e pagaram o custo da crise.

Entre as medidas adotadas, está o Programa de Parcerias de Investimentos (PPI), instituído logo após o impeachment (setembro de 2016), que promove uma reformulação no papel que o Estado deve cumprir na condução dos investimentos na economia, relegando apenas um papel secundário, com protagonismo da iniciativa privada.

O PPI apresenta mais um aspecto de mercantilização de cada aspecto do cotidiano dos trabalhadores, absolutamente tudo deve ser transformado em fonte de extração de riqueza, seja até a infraestrutura mais básica para manutenção da vida, como saneamento e saúde. Ou seja, o PPI também é uma das saídas que o empresariado encontra para solucionar a queda em suas taxas de lucro, impondo aos trabalhadores tarifas abusivas, contratos de concessão que são desrespeitados pelas empresas e serviços de má qualidade.

Boa parte das medidas estão sendo mantidas pelo governo Lula, como a reforma trabalhista e o novo teto de gastos (que mantém a lógica de restringir os gastos públicos, ainda que com maior margem de manobra). Embora sem os aspectos mais reacionários, a política neoliberal segue predominante, como a manutenção do programa do PPI.

Destacam-se as parcerias do meio ambiente, como concessões de florestas para manejo e parques e florestas para visitação. Dentre os 19 projetos de PPI do meio ambiente criados ainda durante o governo Bolsonaro, todos estão sendo mantidos pelo atual presidente, inclusive com 4 projetos novos. É evidente a clara continuidade da rendição ao projeto neoliberal que o governo Lula vem mantendo.

Ainda como aspecto agravante é o constante distanciamento do próprio governo com as massas trabalhadoras. Não houve sequer qualquer debate nacional ou tentativa de colocar na boca do povo a necessidade ou não dessas concessões de florestas, tudo é tocado pela via institucional palaciana, no estilo governista que causou a queda do governo Dilma.

Como um dos exemplos mais danosos, encontra-se a Floresta Nacional de Três Barras em Santa Catarina. Em compensação ao manejo florestal da região, a empresa privada que ganhar o edital terá a oportunidade de realizar a exploração de seus recursos madeireiros, ou seja, o importante papel que o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) será fragilizado. Como o projeto de concessão irá durar longos 35 anos, na prática essas medidas irão privatizar florestas por uma geração inteira.

Essas concessões do PPI das florestas promovem mais uma área para mercantilização e fonte de lucro do grande empresariado, inclusive há previsão até de garantia de um pagamento anual por parte do governo federal para as empresas, caso estas fiquem impossibilitadas, no decorrer da concessão, de explorar os recursos naturais.

Portanto, é necessário romper com a atual dicotomia apresentada, entre um neoliberalismo de projeto reacionário encabeçado por Bolsonaro ou um modelo mais progressista e com maior sensibilidade às mazelas mais intensas da classe trabalhadora.

É preciso dar uma alternativa política consequente a essas duas vias, um projeto político para a classe trabalhadora, que procure tornar parte do cotidiano de cada operário os debates que influenciarão nos rumos do Brasil nos próximos anos, que não esteja amarrado a uma condução puramente institucional do processo político, mas sim que tenha a mobilização de massas como elemento impulsionador do movimento operário.