São Carlos (SP): Nota política - Sobre a questão da moradia

A situação do déficit habitacional reflete as desigualdades que fazem parte do funcionamento do sistema capitalista, que prioriza o lucro em detrimento das necessidades básicas da população.

São Carlos (SP): Nota política - Sobre a questão da moradia
"É fundamental que o povo se organize para que a garantia do direito à moradia não seja algo a ser feito pela vontade deste ou daquele vereador ou prefeito. A construção do Poder Popular é a saída para que o povo decida o que será feito e como será feito!"

São Carlos, 21 de novembro de 2023

Nota política do PCB-RR São Carlos/SP

“Vai lá em Alphaville[1], vários ‘dono’ de prédio
e quantos ‘morador’ de rua sem direito a teto?
Se o aluguel ‘tá’ caro, imagina o resto
como vou no mercado se o meu saldo ‘tá’ zero?
E aí, político, ‘cês’ que ‘devia’ ‘tá’ com o salário mínimo
ensinando a dar valor para os ‘professor’
Porque se for seguir seus passos eu ia virar ladrão
Olha o exemplo Lava Jato e o Mensalão...”

(Ano de Copa - MC Hariel feat DJ Boy - part. MC Joãozinho VT e MC Kako)

Sobre a questão da moradia em São Carlos - SP

A questão de moradia em São Carlos, mais especificamente no que se refere ao déficit habitacional, é algo bastante conhecido pela classe trabalhadora e pouco enfrentado pelo poder público. Tal afirmação tem como base o alto número de moradores e moradoras sem teto e sem terra: sem dados oficiais, em 2023 contamos mais de dez ocupações espalhadas pela cidade que abrigam centenas de famílias trabalhadoras e não estimamos a quantidade de pessoas em situação de rua.

E por que não temos dados oficiais? E se o direito à moradia está estabelecido na Constituição Federal, por que ainda temos tantas pessoas sem teto? Vamos partir, então, dessas duas perguntas…

São Carlos não possui dados confiáveis disponíveis online a respeito do número de pessoas sem teto na cidade (entre outros). O que existe é uma lista de cerca de 17 mil pessoas que foram cadastradas para Habitação Popular neste ano, mas o que esse dado realmente significa? De acordo com matéria no site G1[2], “a iniciativa (do cadastramento) quer obter dados do déficit habitacional do município e, com isso, buscar novos programas habitacionais junto aos governos estadual e federal”. Porém, só poderiam se cadastrar para a campanha aquelas pessoas que se enquadram “na faixa 1 (recebem de 1 a 3 salários mínimos) e faixa 2 (recebem de 3 a 6 salários mínimos) e que não tenham imóveis próprios. Quem já tem o cadastro também deverá comparecer para atualizar as informações.”

Se só poderiam se cadastrar pessoas que possuem faixa específica de renda, as informações de quem não tem renda ou não tem como comprovar sua renda e necessitam de moradia não entram para a conta. Esse dado, portanto, se refere às pessoas que se encaixam na faixa salarial e não necessariamente àquelas que necessitam de habitação de interesse social.

Depois do cadastramento, tivemos 3 audiências públicas[3], em que só no momento do evento foi apresentado seu objetivo: “debater alterações no Plano Diretor da Cidade para que em determinadas áreas institucionais possam ser construídas habitações de interesse social”.

Na primeira audiência, foi explicado como o estudo e o levantamento serão feitos, apontando para várias áreas institucionais disponíveis no município que podem ser ocupadas e que já possuem determinada estrutura em seu entorno. Ao mesmo tempo, o presidente da Prohab, o vereador licenciado Rodson Magno, aponta para as possibilidades de construção das casas para ainda neste ano de 2023, e reforça que será só para aquelas famílias que participaram do cadastro. Diante das inúmeras perguntas que os/as trabalhadores fizeram, estes foram advertidos que o objetivo da audiência era o de levantar as áreas. Assim, ficam evidentes três principais coisas: 1) a confusão feita pela organização da audiência que não se preocupou em deixar explícito o que seria debatido, reforçando a intervenção feita por nossa militância: não há um esforço para que a população participe efetivamente das decisões; 2) a omissão das alterações[4] já feitas no funcionamento do COMDUSC (Conselho Municipal de Desenvolvimento Urbano), como a presidência e vice-presidência que deixam de ser eleitas pelo próprio pleno para serem indicações do governo municipal, para quê serve esse Conselho e qual a sua importância, o que foi amplamente denunciado em nossos panfletos e panfletagens, e 3) que estamos partindo de um número de cadastros que pode não corresponder ao número real de pessoas que necessitam de casas em São Carlos, reforçando que não se quer mesmo atacar o déficit habitacional, mas aproveitar do espaço para as próprias campanhas eleitorais.

Curioso que o presidente da PROHAB quer “dar dignidade” ao povo, mas não é tão “ousado” quanto diz para garantir moradia para as trabalhadoras e trabalhadores que não têm renda ou não têm renda comprovada; nem para se comprometer com o povo, principalmente as centenas de famílias Sem Teto e Sem Terra da cidade, muito menos com as pessoas que se encontram em situação de rua. Para estas apenas a negligência e violência do Estado. Já para as imobiliárias, tivemos até o Feirão da Habitação com uma super-estrutura para viabilizar o financiamento de casas em empreendimentos construídos e em construção. Mais uma vez questionamos: quem tem dinheiro para pagar?

A moradia é fundamental para a dignidade e bem-estar humano, não pode ser considerada apenas uma mercadoria, mas um direito inalienável de todas as pessoas. A situação do déficit habitacional reflete as desigualdades que fazem parte do funcionamento do sistema capitalista, que prioriza o lucro em detrimento das necessidades básicas da população. Mais do que meras intenções, é preciso enfrentar a especulação imobiliária, a construção desenfreada e desordenada dos empreendimentos, os grandes proprietários de terrenos e devedores de IPTU, os donos de terras sem função social e desapropriar! Além disso, é necessário e urgente a tributação progressiva, para que as pessoas paguem impostos de acordo com as suas condições, e não que os ricos se isentem de impostos enquanto os trabalhadores pobres continuam pagando altos impostos e altas taxas de juros.

Coloca-se a responsabilidade da garantia de moradia à própria sorte das pessoas, “serão contempladas se forem sorteadas”, “quem decide é a Caixa (Caixa Econômica Federal)”, “as 16 mil famílias não serão contempladas”, grita o presidente da PROHAB... Como é que as pessoas moradoras de ocupações e/ou pessoas em situação de rua vão continuar com o risco iminente de desbarrancamentos, sofrendo com as consequências das enchentes e sem endereço para o cadastro nos serviços da rede pública de atendimento? É inadmissível que não seja apresentado um plano emergencial para priorizar determinadas situações. Por quanto tempo mais vão continuar esperando?

Em nota[5], a PROHAB informa que apresentaram as áreas institucionais para o COMDUSC, responsável por aprovar as propostas, mas e a população que questiona essa localização desde maio, quando vai ter acesso a esses dados? Quando vai fazer parte dessas decisões?

Para responder às duas perguntas iniciais, fica evidente o motivo de não termos acesso aos dados: não se trata de uma preocupação verdadeira com o povo, são promessas que custam votos e que só nós, trabalhadores e trabalhadoras, sofremos com as consequências. Sem conhecer a realidade de nossa cidade, somos forçados a aceitar o que nos dão, acreditando que as autoridades, porque falam palavras difíceis, sabem mais do que nós. Não basta estar escrito na Constituição, é preciso que seja cobrado e que os abusos sejam denunciados, enfrentados e combatidos. Se o COMDUSC é o órgão que aprova as construções na cidade, não parece suspeito que uma alteração tão importante em seu regimento tenha sido votada às pressas e com a concordância de 14 vereadores que costumeiramente trocam votos por favores?

Neste momento, a prefeitura deve priorizar as famílias que se encontram em maiores riscos e as habitações devem ser projetadas considerando as necessidades reais com a participação da população. Para isso, a formulação e execução de políticas habitacionais devem ser construídas com a participação ativa dos movimentos sociais e populares, garantindo que as soluções sejam adequadas às realidades locais. Medidas devem ser tomadas para controlar e limitar a especulação imobiliária, garantindo que o solo urbano sirva primeiramente às necessidades da população e não aos interesses de lucro de poucos. Todas as políticas de habitação devem considerar os princípios do desenvolvimento sustentável, promovendo a integração entre moradia, meio ambiente e infraestrutura urbana.

Nós, do PCB-RR São Carlos, estaremos nas ruas junto da classe trabalhadora na luta por moradia digna a todas as pessoas e denunciando[6] todas as manobras executadas pelos políticos do município, com os objetivos de ampliar o debate com as famílias trabalhadoras a respeito de seus problemas e, juntos, construir o Poder Popular!

É fundamental que o povo se organize para que a garantia do direito à moradia não seja algo a ser feito pela vontade deste ou daquele vereador ou prefeito. A construção do Poder Popular é a saída para que o povo decida o que será feito e como será feito!


[1] Alphaville é um bairro luxuoso dos municípios de Barueri e Santana de Parnaíba, no estado de São Paulo.

[2] https://g1.globo.com/sp/sao-carlos-regiao/noticia/2023/03/20/prohab-cadastra-moradores-de-sao-carlos-que-nao-tem-casa-propria-saiba-como-se-inscrever.ghtml

[3] https://camarasaocarlos.sp.gov.br/video/?playlist=1111, vídeos da 13ª, 14ª e 17ª Audiências Públicas - Plano Diretor do Município - Confira as intervenções feitas por nossa militância.

[4] https://www.youtube.com/watch?v=1eqDJjyWsi4&ab_channel=C%C3%A2maraMunicipaldeS%C3%A3oCarlos - 2ª Sessão Ordinária - 2h56’40

[5] https://www.prohabsaocarlos.com.br/2023/10/17/prohab-apresenta-areas-institucionais-para-comdusc/#more-2067

[6] https://camarasaocarlos.sp.gov.br/video/?ent=70792&p=player&a=2023&id=4747 - Confira as intervenções feitas por nossa militância.