Inundações em Porto Alegre: bairros até então não alagados são atingidos por colapso do sistema de esgoto

Como novo capítulo da tragédia “planejada” que atingiu o Rio Grande do Sul, até mesmo regiões menos afetadas sofreram com as novas inundações devido à péssima gestão do sistema de esgoto e bombeamento da cidade de Porto Alegre.

Inundações em Porto Alegre: bairros até então não alagados são atingidos por colapso do sistema de esgoto
Foto: Fernanda Oliveira/ Metsul

Na última quinta-feira, 23 de maio, Porto Alegre enfrentou um novo episódio de inundações que afetou bairros até então não atingidos pelas enchentes. A chuva intensa e contínua sobrecarregou o já debilitado sistema de esgoto e bombeamento da cidade, resultando em alagamentos que surpreenderam moradores e expuseram a fragilidade das infraestruturas de drenagem da capital gaúcha.

Chuva Intensa e Colapso do Sistema de Drenagem

Ruas transformadas em rios e moradores usando barcos para resgatar crianças e idosos foram cenas comuns em bairros populosos como Cavalhada, Restinga e Ponta Grossa. Até então, essas áreas não haviam sido atingidas pelas enchentes, mas a forte chuva e o colapso do sistema de esgoto fizeram com que a água fizesse o caminho de volta, subindo pelos bueiros e inundando as ruas e residências.

Na Zona Sul da capital gaúcha, a situação foi particularmente grave, com moradores utilizando barcos para se deslocarem e resgatarem vizinhos. Em Ipanema, na orla do Guaíba, a água invadiu casas novamente, forçando os moradores a buscarem ajuda dos bombeiros. O Túnel da Conceição, uma área essencial para a cidade, voltou a ficar alagado, afetando o corredor humanitário que passa por ali.

Falhas no Sistema de Esgoto e Bombeamento

As inundações de quinta-feira foram agravadas por um sistema de esgoto e bombeamento em colapso devido ao projeto neoliberal de sucateamento que rege a política do prefeito Sebastião Melo (MDB). Dos 23 sistemas de bombeamento que ajudam a levar a água de volta ao rio Guaíba, 13 não estão funcionando. Além disso, a manutenção inadequada precarizada, além do acúmulo de entulho nas ruas e bueiros, impedem o fluxo adequado das águas pluviais. Em várias partes da cidade, moradores foram vistos desentupindo bueiros por conta própria, uma cena que ilustra o fato de que o poder público, sob esta agenda econômica, jamais será capaz de fornecer as condições necessárias para a mera manutenção da vida da classe trabalhadora.

Maurício Loss, diretor do Departamento de Águas e Esgotos (Dmae), reconheceu que a recuperação dos motores das estações de bombeamento levará vários dias. O diretor explicou que, com o nível dos rios e arroios elevados, a água das chuvas não consegue escoar corretamente, retornando pelos bueiros e causando alagamentos.

Em coletiva de imprensa, o prefeito Sebastião Melo negou que a prefeitura tenha demorado a tomar atitudes, colocando a responsabilidade das novas enchentes no volume de água inesperado. Entretanto, a previsão de tragédias climáticas devido ao aumento das chuvas é uma tecnologia já desenvolvida em território brasileiro e monitora sobretudo o estado do Rio Grande do Sul, como é o exemplo a iniciativa ligada ao governo federal intitulada Política por Inteiro, que faz acompanhamentos sobre as questões climáticas no país e confeccionou até mesmo um Monitor de Desastres atualizada a cada semana Os dados já alertavam antes mesmo das primeiras enchentes do ano um padrão crescente de chuvas no estado e assim permaneceram nas últimas semanas, fato que deveria denotar ainda mais atenção e investimento de recursos para prevenção de novas inundações no território gaúcho ou ao menos a mitigação dos severos danos já causados.

"Esta chuva se concentrou muito durante a manhã, especialmente no Belém Novo. A notícia que me traz o Inmet é que só na região sul [de Porto Alegre] choveu 100 milímetros. Então, o que era um problema das áreas alagadas estendeu-se praticamente para toda a cidade com essa chuvarada e aí, nós temos sérios problemas, além das áreas alagadas", afirmou Melo. O prefeito, porém, sequer tentou explicar qual a razão de nenhuma atitude em relação a este já esperado nível de chuva foi tomada para melhorar o funcionamento do sistema de esgoto da capital e o bombeamentos do fluxo fluvial.

Especialistas do Instituto de Pesquisas Hidráulicas (IPH) da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) argumentam que a precipitação não deveria representar um desafio substancial em condições normais. No entanto, o sistema de drenagem de Porto Alegre está debilitado por falhas anteriores, incluindo o desligamento de casas de bombas e o comprometimento da canalização das águas.

O desespero que resiste à solidariedade

Ainda que o Brasil tenha se mobilizado por campanhas de solidariedade pelo Rio Grande do Sul, a política neoliberal da prefeitura de Porto Alegre e do governo do estado não deixam de recolocar o desespero latente na vida dos cidadãos gaúchos. Antonio Martins, morador local, lamentou ao ver a casa da mãe novamente inundada. “Trabalhou a vida inteira para conseguir comprar as coisinhas dela e numa noite ela perde praticamente tudo”, desabafou.

Pedido de Impeachment

Em resposta à crise, um pedido de impeachment do prefeito Sebastião Melo foi protocolado na Câmara de Vereadores. Assinado por Brunno Mattos da Silva, secretário-geral da União das Associações de Moradores de Porto Alegre (Uampa), o documento acusa a prefeitura de negligência no cuidado das estações de bombeamento e do sistema de drenagem urbana, resultando no maior desastre ambiental e climático da história de Porto Alegre.

O pedido de impeachment cita um manifesto assinado por engenheiros, que alertavam sobre a necessidade de manutenção permanente do sistema de proteção contra inundações, e uma denúncia feita pelo deputado estadual Matheus Gomes (PSOL), que revelou que a prefeitura é alertada sobre as deficiências críticas nas estações de bombeamento desde 2018.

A situação do dique da Fiergs, no bairro Sarandi, é outro ponto levantado no documento. O rompimento do dique, inicialmente negado pelo prefeito, foi posteriormente confirmado, agravando ainda mais qualquer isenção de culpa por parte da administração municipal, que em realidade trabalhou ativamente para consolidar esta situação calamitosa na capital do estado.

As inundações que atingiram Porto Alegre na última quinta-feira (23/05) expuseram não a vulnerabilidade da cidade a eventos climáticos extremos, mas a fragilidade da infraestrutura de responsabilidade do poder público. Este, porém, diante uma política econômica de retirada galopante de investimentos em nome do sucateamento do serviço público, em nada atuou para prevenir ou mitigar a situação. A resposta insuficiente da prefeitura, combinada com a falta de manutenção adequada do sistema de esgoto e bombeamento, resultou em uma crise que afetou milhares de moradores.

Enquanto a população enfrenta os desafios de reconstruir suas vidas, inclusive ainda na busca de parentes e amigos desaparecidos, a administração municipal permanece com a postura de que as questões climáticas são frutos do mero acaso ou, em última instância, completamente imprevisíveis e incalculáveis. O pedido de impeachment de Sebastião Melo poderá ser, neste sentido, um passo consequente na luta contra este projeto capitalista neoliberal que defende o desinvestimento e a plena privatização dos serviços públicos de todo o país, pois será somente com outro modelo de sociedade que o Rio Grande do Sul e todos os estados brasileiros poderão desfrutar de condições dignas de vida para a classe trabalhadora deste país.