Carta das Juventudes da Grande Região Norte

Debatemos o que causa as mazelas e os conflitos no campo: a questão sistêmica do capitalismo, a cooptação da mídia, a marginalização e a criminalização das juventudes, o novo colonialismo gerido pelos grileiros ao atacar as comunidades e com isso ameaçar a preservação de suas ancestralidades.

Carta das Juventudes da Grande Região Norte
"Temos o desafio de nos fortalecer enquanto juventudes, para organizar e resistir em nossas comunidades e entendemos que as entidades que fazem parte da luta pela terra na Amazônia precisam estar ainda mais conscientes e participantes das lutas e das vivências das juventudes no e do campo."

O 1° Encontro de Juventudes da Grande Região Norte, organizado pela Comissão Pastoral da Terra (CPT) com as juventudes do campo dos estados do Pará, Tocantins, Amapá e Maranhão, surge a partir de urgências, cada uma descrita e vivida, em um chão do conflito compartilhado por aqueles e aquelas que nesse encontro constroem a resistência. O objetivo de reunir essa juventude se encaminha para além de compartilhar o espaço, mas de articular e de semear o viver e não o sobreviver.

A violência que afeta e destrói os povos do campo e a nossa biodiversidade também ameaça e mata as juventudes camponesas. Somente no primeiro semestre de 2023, de acordo com dados parciais da Comissão Pastoral da Terra (CPT), foram registrados 973 conflitos no campo, representando um aumento de 8% em relação ao mesmo período de 2022.

Os conflitos por terra encabeçam a lista de registros de violências, computando 791 ocorrências. No total, somente no primeiro semestre do ano, quase 527 mil pessoas estiveram envolvidas nesses episódios. O primeiro semestre de 2023 também registrou 107 casos de violência contra a mulher no contexto camponês, abarcando casos de estupro, ameaças, agressão e até criminalização.

No enfrentamento a este cenário de morte e violências, as juventudes camponesas resistem.

As juventudes demonstram a pluralidade de saberes, práticas e formulações de enfrentamento do sistema que adoece, expulsa e mata. Somos herdeiros de uma ancestralidade de luta que anseia por correntes desamarradas. A relação corpo e território compreende que cada espaço invadido é um corpo ferido. Assim, estamos de mãos dadas pela Amazônia e por nossa terra.

Compreendemos neste encontro a necessidade de semear a partir de hoje uma realidade de juventude que esteja alicerçada a preservação da tradição, da garantia de permanência em nossas terras e vivendo a juventude que nos faz.

A prática da comunicação será fundamental para a construção de um mundo novo, compreendendo as juventudes a partir das relações e dos saberes tradicionais.

Durante os debates várias questões foram postas, o que nos proporcionou enxergar quão diversa é a juventude do campo na Grande Região Norte e que, apesar dessa diversidade, se formam semelhanças.

Debatemos o que causa as mazelas e os conflitos no campo: a questão sistêmica do capitalismo, a cooptação da mídia, a marginalização e a criminalização das juventudes, o novo colonialismo gerido pelos grileiros ao atacar as comunidades e com isso ameaçar a preservação de suas ancestralidades. Esses são alguns dos desafios que nós, como juventudes campesinas e juventudes da CPT, temos a enfrentar como forma de resistência.

A realidade da juventude campesina é uma realidade de conflito, mas também é a realidade da coletividade, de tradição, de esporte, cultura e resistência. Uma juventude que, se organizada, pode vencer qualquer desafio posto pelos projetos de morte que atuam na lógica destrutiva da produção capitalista, que são nossos inimigos naturais.

Temos o desafio de nos fortalecer enquanto juventudes, para organizar e resistir em nossas comunidades e entendemos que as entidades que fazem parte da luta pela terra na Amazônia precisam estar ainda mais conscientes e participantes das lutas e das vivências das juventudes no e do campo.

O permanecer é ligado ao pertencimento. Por outro lado, o sentimento de distanciamento de seu território, gerado pela expulsão à força do seu local de origem, surge desde o período da escravização colonial até os dias de hoje. Assim, saímos deste encontro reflexivos do que nos incentiva a permanecer e pertencer, e para além, formulando com base em nossas realidades distintas e que nessa pluralidade nos une. Como juventudes, ansiamos esperançar, mas além disso, viver em um novo mundo, longe das cercas e amarras que nos prendem e nos privam de viver, cultivar e amar.

Pelo fim do latifúndio! Pelo fim da grilagem! Pelo fim do capitalismo!

Araguaína, 19 de novembro de 2023.