Sobre a atual gestão da crise das enchentes por parte da Prefeitura Municipal de Rio Grande - Nota política do PCBR no RS

Entendemos que a crise decorrente das enchentes na cidade de Rio Grande é mais um exemplo claro das limitações do governo estadual e principalmente municipal em atender as reais demandas do povo trabalhador.

Sobre a atual gestão da crise das enchentes por parte da Prefeitura Municipal de Rio Grande - Nota política do PCBR no RS

A célula do Rio Grande, do Partido Comunista Brasileiro Revolucionário (PCBR), vem por meio deste documento realizar a denúncia da vergonhosa gestão por parte do Poder Público da cidade do Rio Grande, atualmente representada pela gestão do prefeito Fábio Branco (MDB), no tocante ao manejo de toda a crise decorrente das enchentes que atingem o Estado do Rio Grande do Sul.

Nossa crítica está centrada em dois principais pontos: falhas na gestão dos abrigos e pontos de coleta de donativos e a precária comunicação relativa ao status  das enchentes, zonas de risco e atuação do próprio poder público. Destes pontos, serão desenvolvidos outros argumentos e questionamentos  que são do interesse da comunidade riograndina.

Primeiramente, gostaríamos de expor a postura burocrática e ineficiente da prefeitura e que buscou nas últimas semanas usufruir dos créditos dos trabalhos desenvolvidos pelo povo trabalhador que, no meio desta crise, se organizou de forma coletiva nos diversos abrigos e pontos de coleta de donativos.

Foi notado não só pela nossa militância, mas também por trabalhadores não-organizados presentes nestes espaços que o comportamento de representantes da prefeitura nas última semanas é condizente com um mandonismo ignorante, de pouco tato com a realidade e de profundo desrespeito com as pessoas que estavam construindo espaços antes mesmo que a prefeitura se posicionasse como coordenadora dos mesmos. A falta de organização, o completo descaso com a manutenção dos espaços e total ausência de comunicação entre voluntariado e “coordenação” - inclusive de representantes da prefeitura entre si - criou uma lacuna que está sendo preenchida pela organização popular voluntária. As tarefas de organização de espaço, desde a criação de planilhas de horário de trabalho - pois a prefeitura, com todo o seu plantel, foi incapaz de fornecer um mísero Excel - até mesmo o recebimento e transporte de doações estão sendo feitas majoritariamente por cidadãos comuns, que vêm desde o início deste período oferecendo sua força de trabalho de forma voluntária, em solidariedade aos que já foram atingidos e também aos que ainda serão. Estes fatores, oriundos de despreparo, despreocupação e descaso por parte da prefeitura estão impossibilitando que as preparações e o abastecimento dos abrigos sejam realizados com maior efetividade. Existe uma demanda considerável de mantimentos - roupas, alimentos, itens de higiene - por boa parte dos diversos abrigos espalhados pela cidade e, concomitante a isso, houve  um notável acúmulo de doações sendo retidas no ponto de coleta do Shopping Partage, onde a triagem de doações foi feita de diferentes maneiras, dependendo não só do dia, mas dos diferentes horários separados por “turno” e  também de quem estava selecionando os donativos.

As instruções nos locais de coleta e abrigos mudavam a todo momento e isto é reflexo da total incapacidade de coordenação por parte da prefeitura, que fica ainda mais exposta se considerarmos as informações repassadas pelos canais oficiais de comunicação acerca das necessidades de voluntários e tipos de donativos necessários em cada local, que diversas vezes não condiziam com a materialidade. Foram inúmeros casos de inconsistência nas informações passadas de forma oficial.  Esta postura burocrática e desnorteada expôs as falhas operativas da prefeitura, sendo elas muitas vezes corrigidas por voluntários que estavam e estão trabalhando nestes locais e que questionavam os funcionários da prefeitura, resultando que processos como a distribuição de donativos para os abrigos tenham sido melhorados nos últimos dias. Isto não é um mérito da prefeitura, mas sim de quem esteve e ainda está lá trabalhando de forma voluntária e solidária, pressionando para mudanças no processo de trabalho sejam feitas.

Foi notório por qualquer voluntário que trabalhou no espaço do Shopping Partage que existe uma grande quantidade de donativos que foram retidos no local, muitas vezes em más condições, expostos à umidade e sem nenhuma explicação por parte da prefeitura do porquê estarem ali, parados, sendo que existe demanda dos abrigos já operantes e dos abrigos a serem abertos que poderia ser suprida de forma rápida e efetiva, fosse da vontade e do interesse do poder executivo do município.

Em outro caso claro de despreparo total e completo por parte da prefeitura, há de ser citado o precário fornecimento de informações acerca de áreas de risco. Nas últimas semanas, a prefeitura, por meio de seu Instagram oficial, disponibilizou mapas contendo hachuras e sombreamentos em vermelho para indicar áreas do município que estariam correndo risco de inundação. Colocando assim, parece uma excelente postura por parte do poder público, que demonstra preocupação ao menos com o fornecimento de informações concretas à população. Entretanto, vamos aos fatos: os mapas são, por diversas vezes, desatualizados, confusos e difíceis de entender - os mapas e boletins produzidos pela FURG, por outro lado, são muito mais completos e precisos, não por serem feitos por acadêmicos, mas por apresentarem o rigor técnico para disposição de informações corretas de forma acessível -  e a maioria dos mesmos foi disponibilizada após as 22h, horário em que boa parte da população já está dormindo pois o comércio da cidade funcionava normalmente mesmo em meio ao risco de enchente severa - com a união da Lagoa Mirim e da Laguna dos Patos e um possível transbordamento do Saco da Mangueira - e trabalhadores precisaram manter as atividades em horário normal, se sujeitando, por obrigação, à redução da disponibilidade de horários da Transpessoal - empresa de transporte coletivo em Rio Grande - e tendo de enfrentar a água que vem não apenas dos corpos hídricos que cercam a cidade, mas também pelos bueiros e bocas de lobo.

A inconsistência dos horários do transporte coletivo também foi notada pelos trabalhadores, sendo comum ouvir e ler relatos no dia-a-dia de pessoas que dependem de ônibus falando sobre atrasos, chegada precoce dos carros nas paradas ou até mesmo carros que não chegam nem a passar nos pontos mesmo em um cenário em que a água da lagoa segue escoando e a normalidade volta a se reestabelecer, este cenário torna o processo de mobilidade urbana riograndina ainda mais frustrante e precarizado. Tais situações ainda perduram Em resumo, o trabalhador riograndino, além de enfrentar o risco de contração de doenças por ter que se locomover em meio à água suja, teve de repensar sua rota e seus horários, pois enfrenta a necessidade de cumprir com a pontualidade no serviço. O cidadão comum fica novamente jogado às traças no meio de uma crise, sendo mal atendido tanto pelos prestadores de serviços básicos - com o aval do poder público - quanto pelo poder público, como ocorreu no período de isolamento e quarentena na pandemia ocasionada pelo Coronavírus (Covid-19).

Por seguinte, outro tópico de extrema importância para a comunidade riograndina que deve ser apontado é a precária condução das necessidades de proteção animal por parte da prefeitura, situação que é considerada um problema crônico em nosso município, tendo em vista que a atual crise escancarou os problemas que o poder público local tem em aplicar medidas efetivas para com os animais dos trabalhadores empobrecidos e pessoas em situação de rua, sem moradia. A prefeitura, juntamente com o Sindicato Rural de Rio Grande, organizou de forma emergencial um abrigo para cães e gatos no próprio sindicato, utilizando baias de cavalos modificadas com cercas e pedaços de madeira para adaptação em canis. A organização foi feita pela Secretaria de Município da Causa Animal (SMCA) e por figuras políticas e da sociedade civil notórias da causa animal riograndina. Na verdade, talvez seja melhor descrever tal situação como uma grande desorganização, pois as condições neste local iniciaram-se de forma caótica e precária. Muitos animais abrigados estavam conseguindo fugir das frágeis baias improvisadas, voluntários não recebiam instruções adequadas dos coordenadores e em diversos momentos, animais com doenças infectocontagiosas estavam sendo misturados com animais sadios. Muitos animais não recebiam atendimentos veterinários minimamente adequados, pois além de inicialmente não haver, no local, medicamentos e insumos médicos - situação resolvida pois um camarada do partido juntamente com outros voluntários realizou uma mobilização para compra e doação de tais itens -, não há ao menos um médico veterinário a serviço da prefeitura ou contratado que pudesse trabalhar de forma fixa no local, sendo estes serviços veterinários realizados por médicos veterinários que eventualmente aparecem no local e prestam atendimentos e orientações. Há relatos que ocorreram óbitos de cães infectados com leptospirose neste abrigo, implicando em um grande perigo para a saúde pública e para os animais ali abrigados. Fora isto, os tutores destes animais estão tendo que lidar com a perda deles.

Fora estas questões, o próprio uso do sindicato como abrigo é extremamente problemático, pois está situado muito próximo à Lagoa dos Patos, sendo suscetível a alagamentos. Tanto que, quando os níveis da lagoa subiram recentemente, um dos galpões onde muitos cães estavam alojados foi inundado e voluntários tiveram que realocar os animais às pressas para outro galpão. Os cães foram alocados de forma aleatória, novamente havendo uma mistura entre cães sadios com doentes e até mesmo entre animais não familiarizados entre si, que, em situação de claríssimo estresse, acabou por ocasionar brigas que resultaram em animais feridos. É importante pontuar que estes animais, que em algum momento terão que retornar para casa de seus tutores, voltarão traumatizados e com cicatrizes físicas de uma situação de maus-tratos ocasionada mais uma vez pela má gestão da prefeitura.

A mobilização da causa animal por parte da prefeitura e sua secretaria “especializada” é totalmente incipiente. Em função deste fato, foram criados abrigos na cidade que são de total responsabilidade de voluntários e sem conexão com a prefeitura, sendo um localizado no bairro Senandes, dois abrigos para gatos nos bairros Cidade Nova e Cassino e também o CTG Mate Amargo, que tem abrigado alguns cães. Outros abrigos, como o da FURG, também começaram a aceitar animais. Como se não bastasse, muitos animais ainda estão sendo abandonados no abrigo do sindicato, gerando um problema gigantesco a longo prazo para a prefeitura, que não possui uma estrutura oficial de abrigo de animais e terá que futuramente recorrer à boa vontade de civis que possam acolher estes animais de forma temporária ou até mesmo permanente.

Outro grave problema da gestão da prefeitura ocorreu no tocante ao atendimento dos trabalhadores que saíram de suas casas ou abrigos em que estavam alojados em busca dos auxílios liberados pelo governo federal, como por exemplo o “Auxílio Reconstrução”, assim como os auxílios estaduais como a isenção da tarifa de saneamento e água. A prefeitura não se mobilizou de forma antecipada e enfrentou uma demanda gigantesca de pessoas em busca de seus direitos nos CRAS, tendo inicialmente poucos funcionários e fichas -100 por dia- para atender a população. O atendimento da população teve que ser deslocado temporariamente à E.E.E.M Bibiano de Almeida e ao Ginásio do Grêmio Ball devido ao prédio da Secretaria de Município de Cidadania e Assistência Social (SMCAS) ter sido afetado pelas enchentes. Após muitas reclamações em redes sociais, a prefeitura veio a agilizar o serviço, buscando parceria com o IFRS que disponibilizou estagiários para estes locais para poder atender a demanda da população, só assim conseguindo aumentar o número de cadastros nos auxílios

Por fim, percebe-se também uma postura oportunista  diante da crise na cidade, por parte de figuras políticas - tanto do poder Executivo quanto do poder Legislativo - já conhecidas, sempre caracterizada pela performance de protagonismo forçado, criando uma imagem artificial de gestores públicos “genuinamente preocupados” com as problemáticas enfrentadas pelo município de Rio Grande. Um bom exemplo de dita postura é a divulgação de material de propaganda nas redes sociais com demonstrações exageradamente egocêntricas de “prestar serviço/ser solidário ao povo”. Tal postura é característica de figuras públicas cuja maior preocupação orbita na criação e divulgação da própria imagem, com foco no ganho político mesmo em momento de fragilidade da comunidade riograndina, pois, crise ou não-crise, estamos em ano de eleições municipais e as figuras políticas locais sabem muito bem disso.

Nós do Partido Comunista Brasileiro Revolucionário, entendemos que a crise decorrente das enchentes na cidade de Rio Grande é mais um exemplo claro das limitações do governo estadual e principalmente municipal em atender as reais demandas do povo trabalhador. Entendemos também que a democracia burguesa cada vez mais escancara sua insuficiência e seu cinismo ao observarmos figuras políticas da direita se aproveitando da situação de calamidade para obter notoriedade política com vista nas eleições municipais, e também ao constatarmos o imobilismo da esquerda institucional que demonstrou ser uma oposição fraca ao governo municipal e pouco propôs no tocante a soluções para a classe trabalhadora que enfrentou e ainda enfrenta consequências desta crise. Observamos que os trabalhadores riograndinos em diversas situações foram extremamente mais efetivos e mobilizados que o poder público ao lidar com a crise, ao fazerem a triagem e entrega de donativos, organizando abrigos para as pessoas, construindo abrigos para animais, realizando resgates de pessoas e animais, entre outras ações. Concluímos que este potencial de transformação da realidade que a classe trabalhadora possui é mitigado dentro da democracia burguesa e que só a partir da organização das massas com um horizonte de construção do socialismo poderemos acabar com as mazelas que afligem a classe trabalhadora brasileira.

Partido Comunista Brasileiro Revolucionário
Célula do Rio Grande-RS
12/06/2024