'Para começar: participaremos dessas eleições?' (Bessa)
Clamo aos demais camaradas do PCB-RR que publiquem com urgência tribunas sobre as questões eleitorais, para que possamos avançar esse debate com a celeridade que ele precisa – além da seriedade que ele precisa.
Por Bessa para a Tribuna de Debates Preparatória do XVII Congresso Extraordinário.
Gostaria de saudar o CNP por chamar pelo debate eleitoral na circular 001/2023. Como sempre, estamos começando esse trabalho de forma atrasadíssima, mas antes tarde do que nunca. Comecei a escrever essa tribuna em dezembro, mas parei por puro perfeccionismo. O texto que vocês vão ler não teve muitas alterações do texto de dezembro, apenas esse parágrafo, um na discussão sobre o PSOL e a última parte que se refere à data de hoje (17/01/2023) foi adicionada posteriormente. Este parágrafo, inclusive, é um chamado para que camaradas novos que estão nervosos, com medo, ou sentindo que seus textos não estão bons o suficiente, enviem seus textos. Às vezes nos paralisamos pelo medo de errar e acabamos por atrasar o debate de questões centrais. Que sejamos a vanguarda do movimento.
Camaradas, em nove meses ocorrerão as eleições municipais em mais de 5 mil municípios Brasil adentro, e mais uma vez estamos atrasados no debate eleitoral. Não só atrasados, até o momento que estou escrevendo esta tribuna, não há nenhuma outra tribuna que debate nossa participação nas eleições burguesas [1]. Gostaria que, nessa altura do campeonato, estivéssemos avançados ao ponto de publicar uma tribuna: “Afinal: participaremos dessas eleições?” Como não é o caso, que possamos dar início ao debate público sobre se devemos participar das eleições ou como iremos participar. Se iremos participar, pois se não acreditamos que a via eleitoral é a que trará o socialismo que queremos construir, a não participação nos debates eleitorais só nos afastará do povo num momento em que muitos estão abertos ao debate, ainda mais no âmbito municipal. Como iremos participar, porque após a cisão que adicionou um tão sonhado hífen e dois Rs ao nome de nossa nova organização, ficamos sem legenda eleitoral. Se iremos tentar registrar nosso partido, algo que toma tempo militante absurdo são outros quinhentos, mas é algo que não temos condições de fazer nos três meses que temos antes do prazo de filiação para as eleições deste ano. Dessa forma, se quisermos participar das eleições com candidatos, precisamos discutir a única forma como podemos participar das eleições com candidatos próprios: precisamos discutir sobre filiação democrática.
Para discutirmos o conceito de filiação democrática de maneira séria, precisaríamos debater a origem e evolução do sistema eleitoral brasileiro, criação dos tribunais eleitorais, criação de regras para criação de partido, explicar o porquê essas regras vieram a ser e como se configuram, etc. Apesar de ter tentado fazer isso nos últimos meses, deixo isso para algum camarada que tenha interesse em fazer um artigo acadêmico, pois isso estava me tomando tempo demais e só atrasando este texto. Como é só uma tribuna, irei focar em discutir alguns direcionamentos políticos que acredito que são relevantes. O mais importante é: se quisermos ter candidatos, precisamos filiar os militantes que irão tocar essa tarefa até o dia 06 de abril de 2024, 6 meses antes das eleições.
De forma resumida, a filiação democrática ocorre quando membros de organizações que não estão sob o guarda-chuva de um partido registrado (que chamarei de organizações) fazem acordos com algum partido registrado (que chamarei de partidos) para poderem ter candidatos, mas manter certa autonomia no programa defendido. Na teoria, no caso de eleição, a organização sem registro ganha a possibilidade de ser eleita e o partido ganha um cargo do legislativo. Na prática, no campo da esquerda, as organizações ganham uma plataforma de debate e os partidos ganham votos para superar o quociente eleitoral. Há a possibilidade de eleição, mas no geral nossa força política é tão irrisória que o reflexo no âmbito eleitoral é uma quantidade de votos minúscula. Mesmo assim, é importante que debatamos possíveis partidos para fazer esse processo. É importante destacar também que não é só “escolhermos um partido” que a filiação democrática será feita. Serão precisas muitas bilaterais em âmbito local, estadual e nacional para que isso ocorra, e nosso prazo está apertado, por isso peço para toda a militância que nos atentemos a esse debate e peço para o órgão central agilizar tribunas sobre esse tema.
Primeiro, gostaria de dizer que sou (ou era) um dos que tinha a visão mais romântica em relação a todo o processo que se desencadeou em junho e julho de 2023, que efetivou a criação do PCB-RR. Eu acreditava realmente que se o Comitê Central do PCB tivesse o mínimo de razoabilidade, pararia os processos de expulsão, chamaria a conferência com urgência e debateria tudo internamente, reconciliando o partido e tomando as medidas necessárias para os que de fato estivessem caracterizando frações, inclusive aqueles que se mantém no PCB. Perdi as fichas que apostei, e isso leva a consequências políticas em relação às eleições. Irei abordar o exemplo de São Carlos, São Paulo, onde milito, para explicitar meu ponto.
Em São Carlos, após algumas plenárias municipais para debater o que estava acontecendo durante o período de cisão, e depois uma plenária para debater o manifesto da RR, decidimos em bloco aderir ao manifesto. Apenas uma militante do partido e um da juventude não aderiram, e hoje em dia compõem o “PCB São Carlos”, organização completamente inorgânica na vida política da cidade. Com todo respeito que tenho pelos que não assinaram, todas as figuras públicas conhecidas por serem do PCB aderiram à RR; os camaradas que poderiam ter alguma chance eleitoral para vereança estão no PCB-RR. Pelo atraso do debate, completamente justificado pelo racha, não vejo como teríamos viabilidade para lançar um candidato, mas seguindo análises que compartilhei internamente com o partido e outras que estava fazendo, existia a possibilidade real de se eleger alguém. Em diversas cidades do Brasil é essa a realidade, e faria sentido para o PCB filiar esses camaradas (por filiação democrática) para poder eleger vereadores e o partido teria a projeção e os benefícios que partidos que elegem representantes têm. Mas como as direções nacionais do PCB-21 mostram por diversas vezes que suas posições são mais guiadas por orgulho do que por pragmatismo, nem nessas cidades acredito que essa seja a prática adotada.
Se por algum milagre conseguirmos filiar democraticamente nossos militantes destacados para a tarefa eleitoral no partido do qual acabamos de ser expulsos, ótimo. Como isso é improvável, analisemos a possibilidade de nos candidatarmos pelos partidos que se classificam de “esquerda” no Brasil, que são: PCO, PT, PCdoB, PSTU, PSOL e UP.
De forma reducionista, mas até acertada, descarto o PCO de cara por ser uma organização ultraesquerdista, que só tem o mínimo de penetração nas massas como piada, quando usa sua plataforma para defender a riqueza do Neymar. Um partido que faz quase a teoria da ferradura fazer sentido, com posições de extrema direita e com influências duginistas invadindo essa seita familiar. PCO não deve ser uma opção para nos aproximarmos para tentar essa filiação.
PT e PCdoB estão numa federação partidária com o PV e, não por isso, são no máximo partidos de centro cuja maior luta que fazem é pela manutenção da democracia burguesa. O que chamam de “revolução real” é no máximo um anseio pela consolidação dum estado democrático de direito com algumas garantias sociais. Uma forma rebaixada de social democracia, consolidando esses partidos como partidos burgueses. Falo isso com todo respeito aos quadros sérios dentro desses partidos, inclusive socialistas e comunistas, que tentam fazer a disputa interna. Respeito também suas histórias e suas conquistas para a classe trabalhadora, mas essas definições não são morais e por isso repito: são partidos burgueses. Em nome do pragmatismo, esses partidos não só abandonaram a luta de classes em nome da conciliação, como abandonaram a conciliação para permitir a dominação da burguesia com algumas concessões, como é explicitado pelo efeito cascata que virá do novo teto de gastos, o que insistem em chamar de “regra fiscal sustentável”. Em relação a esses partidos não devemos ser só “independentes”, o que quer que isso signifique num partido sem representantes: devemos ser oposição.
Camaradas, aprovamos em plenária nacional do PCB-RR a nota “Construir a oposição de esquerda: tarefas imediatas das forças anticapitalistas“ [2], participamos e assinamos nacionalmente, e de forma acertada, a Declaração da plenária Nacional Sindical e Popular da Oposição de Esquerda [3]. É importante notar que o único partido registrado que assinou essa declaração foi o PSTU. Entendo toda a questão de ser um partido trotskista e alguns quadros nossos temerem a aproximação, mas camaradas, sejamos sinceros: o que temos a perder? Não temos nada, somos uma força com alguns trabalhos locais importantes, mas sem relevância no cenário político nacional. Ora, se juntarmos todas as forças que assinaram essa carta, é provável que não consigamos encher um Maracanã. Já estamos nos aproximando dessa organização aprovando uma “unidade nas lutas da classe trabalhadora”. Se temos unidade na luta, temos aproximação programática, temos objetivo parecido: qual o problema em tentarmos filiação democrática por esse partido? Faço essa pergunta da forma mais honesta possível e peço que respondam em alguma tribuna se puderem, mas não vejo problemas, só ganhos. Nós não somos o PSTU, e não proponho que façamos parte dele, proponho apenas que tentemos construir coletivamente campanhas locais onde for possível. É importante que comecemos agora o debate com os companheiros desse partido, para ver se é viável, mas é necessário que tenhamos diretrizes nacionais eleitorais para que saibamos o que fazer.
Quanto ao PSOL, é importante que analisemos o giro à direita que o partido tomou após esse último congresso. O partido que em 2004 surgiu pela expulsão de militantes do PT que foram expulsos por se manterem à esquerda, em 2023 aprovou um programa que na prática nos faz lembrar que o sol é uma estrela. Um partido que nasceu para levar uma alternativa ao programa democrático-popular do PT, agora se põe como ala desse projeto. Um retrato disso são as organizações que têm saído desse partido, como é o caso da CST, da Esquerda Marxista e Revolução Brasileira. Também é importante lembrarmos que estão em federação partidária com o Rede Sustentabilidade, partido de Centro (apesar de se definir como centro-esquerda) com diversas visões direitistas.
As resoluções eleitorais do último congresso do PSOL dizem para “construir, sempre que as condições locais exigirem – em particular para enfrentar representantes do bolsonarismo – frentes eleitorais com os partidos de esquerda e centro-esquerda” [4]. Assim, em cidades com maiores tendências bolsonaristas, é muito provável que ajam alianças com o PT e PCdoB nas eleições do executivo, o que tem consequências práticas no legislativo uma vez que a possível eleição tornaria o PSOL parte de um governo provavelmente hegemonizado pelo PT. Com tudo isso sendo levado em consideração, ainda é possível que haja construção conjunta de alguns mandatos ou mesmo filiação democrática em algumas localidades. Ainda há aproximações locais de trabalhos de base com algumas alas do MTST, historicamente ligados ao PSOL, e há trabalho conjunto em sindicatos com o MES e o Resistência, há também contato direto e parceria tática com parlamentares desses movimentos e de outros como o Primavera Socialista. Há de se fazer um balanço sério sobre essas aproximações, mas o fato é que elas existem. Além disso, o partido historicamente faz filiação democrática de movimentos sem partido, como é o caso do MRT [6].
Assim, é possível que haja a possibilidade de termos quadros concorrendo pelo PSOL, mas precisamos analisar se é politicamente consequente ou viável. Em São Carlos, por exemplo, temos uma aproximação com a ação parlamentar do PSOL, e recentemente atualizaram a nota que clamam por uma frente de esquerda na cidade [5] Essa análise não consigo fazer sozinho, e nem acho que a mera discussão por tribunas seja suficiente para deliberar uma decisão desse porte antes do congresso, que ocorrerá depois do prazo máximo para a filiação partidária para candidatura. O CNP precisa deliberar ou realizar uma plenária com urgência.
Quanto à Unidade Popular pelo Socialismo, primeiro gostaria de compartilhar uma experiência pessoal para trazer um ponto. Quando o partido surgiu, não estava organizado em nenhum partido, e de longe me parecia que havia surgido um partido que agremiaria diversas organizações socialistas que não tinham uma legenda eleitoral e logo me animei em procurar sobre o partido. Só depois descobri que era, na prática, a frente eleitoral do PCR, e que os movimentos sociais que faziam parte eram todos centralizados por militantes do PCR. Não tenho nenhum julgamento moral sobre isso, é uma tática que tem consequências políticas positivas e negativas e o balanço sobre isso não é o objetivo dessa minha tribuna. Inclusive, acredito que as leituras que muitos dos meus camaradas tem sobre a categoria de dmitrovismo e a caracterização imediata da UP nessa categoria são frutos de uma leitura falsa da realidade e uma pressa em ver uma frente de massas sem a foice e o martelo e acreditar necessariamente que isso não vai levar à revolução, sem uma análise adequada da categoria discutida por FMR [7], mas isso é assunto para outro momento. A questão é que faz falta no Brasil uma frente eleitoral que agremia diversas organizações socialistas e revolucionárias. Se houvesse uma, essa tribuna não existiria ou teria outro foco.
Camaradas, a UP e o PCR estão travando uma batalha nacional muito importante contra a privatização das águas, tendo inclusive militantes presos durante essa campanha. Claro que nós e companheiros de diversas organizações também, como mostramos no trabalho do plebiscito contra as privatizações em SP. É um partido que devemos analisar uma aproximação não só tática como estratégica, mas tenho minhas dúvidas se aceitariam filiações democráticas nesse momento. Além disso, em 2022 não quiseram fazer chapa conjunta para governo do estado de SP com o PCB, com proposta de campanha unificado para o senado com a candidata da UP, restando saber se há interesse de aproximação pós-racha. Não encontrei nenhuma resolução eleitoral deles que falem sobre isso, e nem tenho elementos suficientes para debater isso, assim peço que outros camaradas contribuam nesse ponto.
Dito isso, para realizarmos filiações democráticas, é preciso que os comitês locais, regionais e nacionais avaliem e deliberem o quanto antes, para permitir diálogos, sobre dois temas: Que camaradas deve realizar a tarefa de candidatura eleitoral, e em qual partido deve se filiar. Com todo o exposto neste texto, proponho que avaliemos preferencialmente acordos com o PSTU e com o PSOL, além de avaliar se a UP estaria aberta. Também precisamos avaliar se há possibilidade de conseguirmos ter candidatos pelo PCB-21.
Por fim, gostaria de me dirigir especialmente ao Camarada Jones Manoel. Em entrevista ao Azideia Podcast em 17/01/2024, você pontuou que se fosse vereador ou deputado estadual, enquadraria colegas de câmara/assembléia gravando-os com o celular na mão questionando-os sobre a questão do transporte, perguntando se estão do lado do trabalhador ou das empresas da máfia de transporte. É um desperdício não termos você como candidato a vereador esse ano na cidade de Recife. A sua campanha em 2022 conseguiu quase 34 mil votos para governador; com 1.217.120 eleitores e 39 vereadores, o quociente eleitoral de Recife é de 31.208 votos. Justamente por isso resta saber se algum partido aceitaria filiá-lo, pois você poderia tanto tirar a vaga de algum candidato, quanto trazer votos para eleger mais gente, mas sem dúvidas o camarada será eleito se concorrer às eleições. Termos um comunista consequente como vereador é um passo importantíssimo para mostrarmos a política séria que a Reconstrução Revolucionária do Partido Comunista Brasileiro está propondo para o Brasil. Entendo que está começando seu doutorado e que pode estar sem tempo, mas como seu compromisso é com a política popular e com a revolução brasileira, sua candidatura nestas eleições é imprescindível, sendo a figura pública de maior porte do nosso partido.
Assim, proponho ao CNP que delibere com urgência uma linha nacional eleitoral, e como consequência participação de Jones nas eleições de Recife. Trago como proposta de calendário que essa reunião seja realizada até o dia 18 de fevereiro, deixando 7 semanas para realizarem bilaterais com partidos para confirmar nossa tática de atuação. Caso aceitem o calendário proposto ou decidam outro calendário, que enviem em circular essas informações, mas que sejam feitas em tempo hábil antes do dia 06 de abril. E ainda, clamo aos demais camaradas do PCB-RR que publiquem com urgência tribunas sobre as questões eleitorais, para que possamos avançar esse debate com a celeridade que ele precisa – além da seriedade que ele precisa.
Referências:
[1] Na realidade, uma tribuna sobre o nome ‘Disputar as eleições burguesas?’, disponível em: https://emdefesadocomunismo.com.br/disputar-eleicoes-burguesas-contribuicao-anonima/ . Todavia, essa tribuna é uma transcrição literal do texto “O Partido Comunista e o Parlamentarismo”, de Leon Trotsky, que foi aprovado no II Congresso da Internacional Comunista sobre a relação entre os Partidos Comunistas e as eleições burguesas. Este texto não é uma tribuna escrita para o nosso congresso, e não o considerarei como tal.
[2] Disponível em: https://emdefesadocomunismo.com.br/construir-a-oposicao-de-esquerda-tarefas-imediatas-das-forcas-anticapitalistas/
[3] Disponível em: https://emdefesadocomunismo.com.br/construir-a-independencia-e-a-unidade-na-luta-da-classe-trabalhadora/
[4] Disponível em: https://psol50.org.br/file/2023/09/8-Resolucao-Eleicoes-2024-FINAL.pdf
[5] Disponível em: https://www.instagram.com/p/C2M6nubgiiV/?igsh=MWluZTNxMTJpM2loMA==
[6] Disponível em: https://www.marxists.org/portugues/rodrigues/1985/anti-dimitrov/index.htm
[7] Disponível em: https://www.esquerdadiario.com.br/O-que-e-filiacao-democratica-e-por-que-o-MRT-recorre-a-ela