Nota política - Massacre nos Complexos da Penha e do Alemão: O terrorismo de Estado, a disputa por territórios econômicos e os moradores de favelas em meio ao fogo cruzado

Chamamos toda a população, movimentos sociais e a militância organizada a tomar as ruas nos atos nacionais do dia 31, sexta-feira. Este massacre não pode e não vai passar em branco na história do nosso povo.

Nota política - Massacre nos Complexos da Penha e do Alemão: O terrorismo de Estado, a disputa por territórios econômicos e os moradores de favelas em meio ao fogo cruzado

Nota política do Partido Comunista Brasileiro Revolucionário (PCBR)

Os trabalhadores moradores dos Complexos da Penha e do Alemão acordaram, mais uma vez, sob os efeitos da “Guerra às Drogas” e da disputa por territórios econômicos no Rio de Janeiro. Ainda durante a madrugada do dia 28 de outubro de 2025, o Governo do Estado do Rio de Janeiro deu a ordem para o desencadeamento da megaoperação policial, envolvendo mais de 2500 agentes das polícias militar e civil, incluídos as suas tropas de elite (BOPE e CORE), que produziu a maior chacina da história brasileira.

No primeiro anúncio oficial de mortes produzidas pela chacina, que contabilizava  64 vítimas – sendo 60 civis e 4 policiais – a brutalidade da violência policial já era tratada como produtora da maior chacina da história do Rio de Janeiro. Contudo, se avolumavam as denúncias de moradores que afirmavam que muitas mortes e execuções haviam sido produzidas na área de mata que separa os dois complexos.

Uma parcela dos moradores tomou a iniciativa de adentrar a mata, em um processo que durou toda a madrugada e boa parte da manhã, para buscar os corpos de todos os vitimados pela chacina. O final do processo de busca, deslocamento e contagem dos corpos elevou para 132 mortos, como afirma a Defensoria Pública do Estado do Rio de Janeiro, os números da brutalidade que havia acontecido por ali no dia anterior.

Os efeitos da retaliação do Comando Vermelho contra a ação policial foram sentidos em diversos lugares nas zonas sudoeste e norte da capital, com ônibus sendo queimados e arrastões produzidos em meio ao caos instalado na cidade. Mais de uma centena de linhas de ônibus tiveram itinerários alterados, os trens e metrôs ficaram superlotados, escolas e universidades foram fechadas, unidades de saúde no entorno da região dos confrontos tiveram os serviços interrompidos e diversos eventos culturais foram cancelados pela cidade.

Se dezenas de milhares de trabalhadores foram liberados mais cedo e tiveram dificuldades para chegar em suas casas, uma parcela dos cariocas ainda foi mais atingida. Os cerca de 300 mil moradores dos Complexos da Penha e do Alemão viveram dois dias inteiros de terrorismo de Estado: no primeiro dia, muitos perderam seus dias de trabalho e ficaram aterrorizados dentro de suas casas no meio do fogo cruzado; já no segundo dia, o trabalho de recuperação dos corpos de familiares que estavam retalhados, a limpeza das ruas banhadas por sangue e a necessidade de deslocamento ao IML em meio a dor são os elementos que marcarão muitos pelo resto de suas vidas.

A justificativa de combate a supostos integrantes e lideranças do Comando Vermelho que está presente nas versões oficiais da polícia, entretanto, não se sustenta. O planejamento meticuloso da chacina até pode causar efeitos momentâneos sobre a facção, mas os maiores alvos do massacre são os seus sobreviventes: os familiares e trabalhadores que moram nessas favelas, mas também em todas as outras. Estes seguirão em meio a uma confrontação que remete às raízes profundas da história brasileira, marcada de forma profunda por desigualdades raciais e de classe, mas que segue sendo renovada em meio às disputas sanguinolentas pelo poder econômico e pelo poder político no capitalismo dependente brasileiro.

Algumas dessas disputas se expressam na:

1. Disputa de território por facções e milícias: a favela como fronteira imperialista

O Estado brasileiro não ocupa favelas para garantir direitos, mas para controlar territórios estratégicos. As UPPs fracassaram porque nunca tiveram como objetivo a paz, mas a pacificação para a especulação imobiliária e a expansão do latifúndio urbano. Hoje, o confronto entre o Estado e o Comando Vermelho não é uma guerra ao tráfico, mas uma disputa pelo controle do território. Milícias, aliadas diretas do bolsonarismo e do poder econômico, avançam sobre áreas historicamente dominadas por outras organizações, enquanto o Estado usa a violência policial para eliminar qualquer resistência popular. A favela é tratada como zona de exclusão social e campo de testes para tecnologias de repressão, financiadas e treinadas por potências imperialistas.

2. Disputa eleitoral do bolsonarismo com o petismo: fascismo em campanha

Este massacre ocorre a menos de um ano das eleições estaduais. Cláudio Castro, herdeiro político de Bolsonaro, utiliza a máquina do terror para se posicionar como “homem forte” diante da crise de hegemonia entre o bolsonarismo e o petismo. Ao declarar guerra às favelas, ele tenta galvanizar seu bloco conservador — composto por setores militares, lideranças neopentecostais e a burguesia — com a retórica do “bandido bom é bandido morto”. Enquanto Lula e seus aliados vacilam entre gestos de contenção e conivência com o Estado repressor, Castro radicaliza a intervenção, expandindo as periferias no palanque eleitoral. Cada corpo jogado nas encostas dos morros é um voto comprado com sangue.

3. Aceno à intervenção estrangeira: caos como justificativa

A escalada de violência, somada ao uso deliberado do termo “narcoterrorismo” pelo governador e sua articulação com outros governadores de extrema direita, não é fortuita. Trata-se de uma tentativa desesperada de criar um cenário de colapso institucional que justifique medidas específicas — inclusive a possibilidade de intervenção externa sob a disfarce de “cooperação internacional” ou “segurança regional”. Este projeto, articulado com interesses financeiros internacionais e setores do Pentágono, visa consolidar uma agenda de dominação imperialista no coração da América Latina. As mesmas forças que tentaram um golpe agora tentam provocar o caos para pedir ajuda militar estrangeira. É o cúmulo da submissão.

O PCBR denuncia este massacre como parte da guerra de classe travada pelo Estado burguês contra o povo trabalhador. Compreendemos que a forma de desarticulação do crime organizado passa, em primeiro lugar, por combater o financiamento dos grupos, que encontram no Estado e em setores do aparato financeiro nacional o seu principal aliado. Compreendemos que a ação de guerrilha tomada pelas forças de segurança busca e compreende centralmente reforçar uma narrativa de guerra contra a população pobre, acenando para um movimento eleitoral já em curso por parte de setores da extrema direita carioca. A face mais macabra do capital está à mostra nesse momento, nos desiludindo de qualquer possibilidade de resolução desse problema a partir dos ditames da segurança pública burguesa. 

Chamamos toda a população, movimentos sociais e a militância organizada a tomar as ruas nos atos nacionais do dia 31, sexta-feira. Este massacre não pode e não vai passar em branco na história do nosso povo. Os responsáveis por essa gestão da barbárie, sustentada pela democracia burguesa e seus aparatos repressivos, devem ser responsabilizados. É urgente construir uma nova concepção de segurança pública, forjada pelas mãos do povo, e não pelos generais, políticos e empresários que lucram com o sangue da favela.

Não há saída dentro dos muros do capitalismo, tampouco nas promessas vazias da gestão conciliadora do Estado burguês. Exigimos investigações independentes, o afastamento do Secretário de Segurança, Vitor Santos, a prisão e o impeachment imediato de Cláudio Castro. Além disso, urge a necessidade do desmantelamento completo do COE, CORE e BOPE. Que as favelas organizem sua autodefesa comunitária, que o povo una sua dor à revolta, e que de cada vida arrancada pelo Estado nasça a semente da luta por um novo mundo. Nossa solidariedade é incondicional às famílias das vítimas.