Louiblanquismo (Lenin, 1917)

Em todas as questões importantes da vida política atual, esses líderes, que ocupam aproximadamente a posição da tendência centrista internacional, representada por Kautsky, Longuet, Turati e muitos outros, abraçaram as visões pequeno-burguesas de Louis Blanqui.

Louiblanquismo (Lenin, 1917)
"Fora do socialismo, não há libertação da humanidade das guerras, da fome, da destruição de mais milhões e milhões de pessoas."

Por Vladimir Lênin, publicado no Pravda, nº 27, em 8 de abril de 1917.


Louis Blanqui, o socialista francês, conquistou uma fama nada invejável durante a revolução de 1848, quando mudou sua posição da luta de classes para a das ilusões pequeno-burguesas, ilusões adornadas com uma fraseologia supostamente “socialista”, mas, na realidade, tendendo a fortalecer a influência da burguesia sobre o proletariado. Louis Blanqui procurou a ajuda da burguesia, esperou e inspirou esperanças em outros de que a burguesia pudesse ajudar os operários na questão da “organização do trabalho” – este vago termo que pretende expressar tendências “socialistas”.

O blanquismo, agora, conquistou a vantagem dentro da ala direitista da “social-democracia”, do partido do Comitê Organizativo[1] na Rússia. Tchkheídze, Tseretéli[2], Steklov, e muitos outros, que agora são líderes do Soviet de Deputados Operários e Soldados de Petrogrado, e também foram líderes da recente Conferência dos Soviets de Toda a Rússia, assumiram a mesma posição de Louis Blanqui.

Em todas as questões importantes da vida política atual, esses líderes, que ocupam aproximadamente a posição da tendência centrista internacional, representada por Kautsky, Longuet, Turati e muitos outros, abraçaram as visões pequeno-burguesas de Louis Blanqui. Veja, por exemplo, a questão da guerra.

O ponto de vista proletário neste assunto consiste em uma definida caracterização de classe da guerra e de uma hostilidade irreconciliável à guerra imperialista – isto é, a uma guerra entre grupos de países capitalistas (não importa se monarquias ou repúblicas) por uma divisão dos espólios capitalistas.

O ponto de vista pequeno-burguês difere do burguês (defesa direta da guerra, da “defesa da pátria”, ou seja, defesa dos interesses dos próprios capitalistas, defesa de seu “direito” às anexações) no sentido de que o pequeno-burguês “renuncia” às anexações, “condena” o imperialismo, “exige” da burguesia que deixe de ser imperialista, ao mesmo tempo em que se mantém no quadro das relações imperialistas mundiais e do sistema econômico capitalista. Restringindo-se a essa declamação branda, inócua e insípida, o pequeno-burguês, na prática, caminha importente atrás da burguesia, “simpatizando” em algumas coisas com o proletariado, apenas em palavras, permanecendo dependente da burguesia em ações, incapaz ou sem vontade de compreender o caminho que conduz à derrubada do jugo capitalista, o único caminho que pode livrar o mundo do imperialismo.

“Exigir” dos governos burgueses que façam uma “declaração solene” no espírito da renúncia às anexações é o cúmulo da audácia da pequena burguesia e um exemplo da consistência anti-imperialista “zimmerwaldista”. Não é difícil ver que se trata de louiblanquismo do pior tipo. Por um lado, nenhum político burguês com alguma experiência terá dificuldade em pronunciar um certo número de frases lisonjeiras, “brilhantes” e pomposas contra anexações “em geral”, tão sem sentido quanto não comprometedoras. Mas quando se trata de feitos, sempre se pode fazer um truque de mágica à maneira do jornal Retch, que teve a deplorável coragem de declarar que a Curlândia[3] (agora anexada pelos predadores imperialistas da Alemanha burguesa) não é uma região anexada pela Rússia!

Esta é uma malandragem das mais nojentas, a mais desavergonhada fraude para com os operários por parte da burguesia, pois qualquer pessoa, por menos familiarizada com a política que seja, sabe que a Curlândia sempre esteve anexada à Rússia.

Desafiamos o Retch aberta e diretamente a: 1) apresentar ao povo uma definição política do conceito de “anexação” que se aplique igualmente a todas as anexações no mundo, na Alemanha, Grã-Bretanha e Rússia, no passado e presente, para todos, sem exceção; 2) declarar clara e definitivamente o que se entende, em sua opinião, por renúncia às anexações, não em palavras, mas em atos. Dar uma definição política ao conceito de “renúncia às anexações de fato”, que se aplicaria não apenas aos alemães, mas também aos ingleses a e todas as outras nações que já praticaram anexações.

Afirmamos que o Retch ou se recusará a aceitar nosso desafio ou será exposto por nós diante de toda a nação. E é precisamente por causa dessa questão da Curlândia, comentada pelo Retch, que nossa controvérsia não é teórica, mas prática e de maior urgência e interesse vital.

Em segundo lugar, vamos supor, mesmo que por um momento, que os ministros burgueses são o ideal da honestidade, que os Outchkovs, Lvovs, Miliukóvs e Cia. acreditem sinceramente na possibilidade de renunciar às anexações, preservando o capitalismo, e que eles realmente queiram renunciar a elas.

Vamos, por um momento, assumir até isso, vamos fazer essa suposição louiblanquista.

Alguém pode se perguntar: uma pessoa adulta pode se contentar com o que as pessoas pensam dela, sem comparar tal pensamento com o que realmente fazem? É possível, para um marxista, não distinguir a realidade objetiva dos bons votos e declarações?

Não, não é possível.

As anexações são mantidas unidas pelos laços do capital financeiro, bancário e imperialista. Aqui reside o fundamento moderno e econômico das anexações. Deste ponto de vista, as anexações são lucros politicamente garantidos sobre milhares de milhões de capital “investido” em múltiplas e inumeráveis empresas nos países anexados.

É impossível, mesmo com o desejo de fazê-lo, renunciar às anexações sem dar passos decisivos para se livrar do jugo do capitalismo.

Isso significa, como o Iedinstvo[4], a Rabótchaia Gazeta e os outros “Louis Blanquis” de nossa pequena burguesia estão prontos para concluir, e realmente concluem, que não devemos dar quaisquer passos decisivos rumo à derrubada do capitalismo, que devemos aceitar, pelo menos, um número mínimo de anexações?

Não. Passos decisivos devem ser dados para derrubar o capitalismo. Devem ser assumidos com habilidade e gradualmente, contando apenas com a consciência de classe e a atividade organizada da esmagadora maioria dos operários e camponeses pobres. Mas eles devem ser liderados. Os Soviets de Deputados Operários começaram a liderá-los em vários lugares na Rússia.

A ordem do dia, agora, está uma cisão decisiva e irrevogável com os Louis Blanquis, Tchkheídzes, Tseretélis, Steklovs, com o partido do Comitê Organizativo, com o Partido dos Socialistas-Revolucionários etc. As massas devem ter seus olhos abertos para ver que o louiblanquismo está desmoronando e arruinará totalmente o futuro sucesso da revolução, até mesmo o sucesso da liberdade, a menos que as massas percebam o quão nocivas são essas ilusões pequeno-burguesas e se juntem aos operários com consciência de classe em seus passos cautelosos, graduais e deliberados, mas firmes e diretos, em direção ao socialismo.

Fora do socialismo, não há libertação da humanidade das guerras, da fome, da destruição de mais milhões e milhões de pessoas.


[1] N.E. Nome do centro orientador menchevique, estabelecido em uma conferência dos liquidacionistas e de todos os grupos e tendências antipartido, realizada em agosto de 1912. Existiu até a eleição do Comitê Central do partido menchevique em agosto de 1917.

[2] N.E. Irakli Gueórguievitch Tseretéli (1882-1959): menchevique, membro do POSDR desde 1903. Tornou-se Ministro dos Correios e Telégrafo do governo provisório, em maio de 1917.

[3] N.E. O antigo nome de uma região a oeste e sudoeste do Golfo de Riga (Letônia).

[4] N.E. Fração dentro do Partido Operário Social-Democrata Russo entre 1914 e 1917 e, então, transformado em um pequeno partido independente em 1917 e 1918, liderado por Plekhánov.