Cotas Trans no Concurso Nacional e Nova Carteira de Identidade: O Retrocesso para a População T sob o Governo Lula - Alckmin
Em meio a polêmica que mobiliza a Câmara dos Deputados e os movimentos sociais em prol da inclusão das cotas para pessoas trans no CNU, o Ministério da Gestão e da Inovação anunciou mudanças na Carteira Nacional de Identidade que violam direitos mínimos da comunidade trans.
O governo Lula - Alckmin, apesar de subir a rampa do Palácio do Planalto homenageando a importância da diversidade e ter criado a coordenadoria-geral de Promoção dos Direitos LGBT, parece distante de cumprir suas promessas em relação aos direitos da população LGBT. O abandono dessas pautas centrais caminha lado a lado ao avanço das relações amistosas com os setores conservadores na Câmara de Deputados e entre o eleitorado.
Na última semana, duas notícias não apenas evidenciaram o recuo do governo da Frente Ampla nas demandas da população T, mas também o igualaram a medidas inauguradas pelo Governo Bolsonaro. O retrocesso na Nova Carteira de Identidade e a ausência de garantias de cotas para pessoas trans no Concurso Público Nacional Unificado (CNU) representam a perpetuação de preconceitos enraizados no sistema estatal e garantem que setores historicamente oprimidos sujeitem - se a trabalhos superexplorados e sem garantias trabalhistas.
O governo federal recuou em sua própria promessa e negligenciou a reserva das cotas para pessoas trans no edital inaugural do Concurso Público Nacional Unificado (CNU). Na quarta-feira (10), o edital foi publicado, abrindo as portas para mais de 6.640 novos funcionários. No entanto, desde a publicação do edital, entidades que representam a comunidade trans em nível nacional têm reivindicado a implementação de cotas que foram inicialmente asseguradas pelo próprio Ministro do Trabalho e Emprego, Luiz Marinho.
Na ocasião do lançamento do concurso para Auditor Fiscal do Trabalho em 2023, Luiz Marinho anunciou a inclusão de uma reserva de 2% de cotas para pessoas trans em todos os concursos públicos federais. Paralelamente, no mesmo ano, o Ministério Público da União implementou, em seus concursos para servidores e estagiários, um sistema de cotas destinado a pessoas trans, visando integrar a categoria com uma reserva mínima de 10% das vagas, já designadas para minorias étnico-raciais. No entanto, é preocupante observar que a atual proposta do Concurso Público Nacional Unificado sequer menciona essa modalidade de reserva.
O sistema de cotas para pessoas trans é uma forma de garantir possibilidades de melhores condições de vida e trabalho para uma população que está sujeita a alarmantes condições de baixa escolaridade, resultantes do abandono familiar e empregos extremamente precários. De acordo com uma pesquisa da Rede Nacional de Pessoas Trans do Brasil, 82% das pessoas trans e travestis abandonam o ensino médio entre os 14 e 18 anos. Quando o assunto é inserção no mercado de trabalho, a Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo, aponta que apenas 13,9% das mulheres trans e travestis estão formalmente empregadas, enquanto dados da ANTRA evidenciam que 90% trabalham na prostituição, enfrentando a informalidade e toda a exposição à violência urbana e transfobia.
Em nota, o Instituto Brasileiro de Transmasculinidades expressou sua preocupação por meio do Instagram: "E as cotas para pessoas trans? Onde foram parar? Elas precisam sair da esfera do discurso. A cidadania e a dignidade da população trans que mora no Brasil não pode viver apenas no discurso! Ela precisa ser real, assim como são reais as nossas vidas!", destacam.
A nova identidade
Em meio a polêmica que mobiliza a Câmara dos Deputados e os movimentos sociais em prol da inclusão das cotas para pessoas trans no CNU, o Ministério da Gestão e da Inovação anunciou mudanças na Carteira Nacional de Identidade que violam direitos mínimos da comunidade trans. No novo modelo, o campo ‘sexo’ será adicionado e os campos ‘nome social’ e ‘nome civil’ estarão em destaque, uma situação que pode ser motivo de constrangimento e violências para com as pessoas da comunidade T.
O governo Lula descumpriu não somente uma deliberação dos grupos de trabalho, que em maio de 2023 optaram pela retirada do campo 'sexo' e unificação de 'nome' e 'nome social’, como também recuou do acordo firmado com o Ministério dos Direitos Humanos e entidades LGBT.
O absurdo se torna ainda maior ao ser constatado que o novo decreto manteve as diretrizes propostas pela gestão ultra-conservadora do governo Jair Bolsonaro, barradas anteriormente pelas lutas dos movimentos sociais. Vale lembrar, que o atual modelo de CNI e outros documentos nacionais, não constam a identificação ‘sexo’, assim como o ‘nome civil’ não aparece em destaque.
A estigmatização nos documentos oficiais reforça a grave situação de violência sofrida nas ruas e locais de trabalho. É importante destacar que o Brasil é o país que lidera o número de assassinatos de pessoas trans e travestis, levando a expectativa de vida dessa população ser de 35 anos (Dossiê Assassinatos e Violências contra Travestis e Transexuais Brasileiras da Associação Nacional de Travestis e Transexuais - ANTRA). Em 2022, 131 pessoas foram assassinadas violentamente, enquanto outras vinte tiraram a própria vida devido a discriminação.
Ambas as pautas negadas à comunidade T são direitos mínimos e viáveis, mesmo na democracia burguesa. A representatividade vazia utilizada no marketing da campanha à presidência de Lula evidencia como as lutas da população LGBT, das mulheres e das pessoas negras e indígenas podem ser utilizadas de forma conveniente pelos setores liberais, sem imprimir qualquer mudança substancial nas condições básicas de sobrevivência. Por outro lado, auxilia na cooptação de parte dos movimentos para base do governo e dificulta a organização da classe trabalhadora LGBT para as lutas contra a superexploração da força de trabalho e contra o capitalismo.