A política por outros meios: violência e libertação nacional na Palestina

Compreender que existe uma estrutura de violência que é elemento central da colonização, que a violência é a linguagem da colonização e por isso é também a linguagem da reação à colonização, permite compreender porque essa forma de resistência se torna inescapável.

A política por outros meios: violência e libertação nacional na Palestina
"Representantes das alas armadas de seis organizações diferentes. Da esquerda para a direita: Brigadas Al-Ansar (Movimento de Liberdade Palestina), Brigadas Al-Quds (Movimento da Jihad Islâmica na Palestina), Brigadas Mártir Al-Aqsa (nominalmente braço armado do Fatah), Brigadas Al-Nasser Salah Al-Deen (Comitês de Resistência Palestina), Brigadas de Resistência Nacional Omar Al-Qasim (FDLP), Brigadas Mujahideen (Movimento Mujahideen na Palestina)"

Por Tavinho e Maju Viana

Neste dia 7 de outubro, as Brigadas Mártir Izz El-Din Al-Qassam, braço armado do Hamas, iniciaram a chamada Operação Tempestade Al-Aqsa, que visava romper as defesas de Israel por terra e pelo ar, em retaliação às violentas operações da polícia israelense na mesquita que dá nome à operação. Outras organizações que compõem a resistência são: Brigadas Mártir Al-Aqsa, braço armado do Fatah[1]; Saraya Al-Quds, braço armado do Movimento da Jihad Islâmica na Palestina; Brigadas Mártir Abu Ali Mustafa, ala armada da Frente Popular de Libertação da Palestina (FPLP)[2]; Brigadas Al-Nasser Salah Al-Deen, ala armada dos Comitês de Resistência Popular; Brigadas Mujahideen, ala armada do Movimento Mujahideen na Palestina; Brigadas de Resistência Nacional Omar Al-Qasim, ala armada da Frente Democrática de Libertação da Palestina (FDLP); etc.

Desde então, a retaliação por parte da ocupação israelense tem vitimado um número exorbitante de palestinos sob a anuência da comunidade internacional, que agora apoia o extermínio perpetrado por Israel como resposta, ou no máximo condena a morte de civis “de ambos os lados” — embora tenha passado os últimos quase oitenta anos da colonização da Palestina por Israel cerrando os olhos para tortura, encarceramento em massa, genocídio.

Observando os debates no que diz respeito à ofensiva palestina contra a ocupação e por sua libertação nacional, comentamos dois elementos fundamentais da nossa leitura enquanto comunistas: tática e estratégia da luta palestina e internacionalismo proletário. Em outras palavras interrogativas: porque a resistência palestina se depara com a necessidade de recorrer à violência? E qual o nosso papel, enquanto comunistas, nesse processo de libertação nacional da Palestina que começa a tomar novos contornos?

A violência como linguagem da colonização e a desumanização do colonizado

Para entendermos o porquê de recorrer à violência, precisamos entender porque outros caminhos não surtiram efeito. Aqui, é oportuno observar outros processos de libertação nacional. Samora Machel, militante da Frente de Libertação de Moçambique, diz: “os burgueses e os colonialistas dizem que os tribunais são imparciais e fazem justiça. Mas nunca ninguém ouviu dizer que os tribunais da burguesia e do colonialismo mandaram devolver a terra aos camponeses que foram espoliados”. Frantz Fanon, sobre a Argélia, aponta que mesmo que o governo colonial crie comissões de investigação, elas são inexistentes para o colonizado: “passados sete anos de crimes na Argélia, nem um só francês foi levado a tribunal pelo assassinato de um argelino”. Amílcar Cabral, que historicamente defendeu os meios pacíficos contra o colonialismo português até quando pode, em 1969 dizia que, contra o colonialismo e o imperialismo, não havia outra alternativa: “Porque o inimigo tem sempre armas na mão. Ou só ele é que tem armas e nós não temos, ou então não somos doidos e arranjamos armas para lhes dar tiros também”.

No caso palestino, as ocupações nunca foram impedidas pela comunidade internacional. São gerações exiladas, mortas, torturadas, sem qualquer impedimento dos que hoje se colocam contra a morte de civis (de ambos os lados, dizem). Israel mata jornalistas, mata funcionários da ONU, bombardeia ambulâncias da Federação Internacional das Sociedades da Cruz Vermelha e do Crescente Vermelho, e ainda assim continua triunfando na disputa de narrativas. A mídia hegemônica e a comunidade internacional, que passou décadas desprezando o fato de que Israel é uma máquina genocida que segue avançando sem impedimentos, agora são rápidas em pedir calma, soluções pacíficas, soluções “políticas”.

Esses pedidos ignoram os quase oitenta anos de ocupação que contam com índices elevados de mortes de palestinos, mesmo em manifestações pacíficas. Zonas residenciais são constantemente bombardeadas. No Dia da Terra de 1976, Israel reprimiu brutalmente uma manifestação pacífica contra a expropriação de terras. Entre 2018 e 2019, mais de 200 palestinos foram mortos e cerca de 8.000 feridos em protestos pacíficos na fronteira de Gaza. E um adendo, para não abrir margem para ingenuidade: o problema não nasce no governo de extrema-direita de Netanyahu. A violenta resposta militar à primeira intifada, por exemplo, que cunhou o termo “quebra ossos” em escala internacional, foi tomada sob o comando do trabalhista Yitzhak Rabin. A história da ocupação sionista é de genocídio, e a oposição progressista à extrema-direita também é genocida e é responsável pela Nakba e pelas primeiras ocupações militares. Nosso papel enquanto comunistas é denunciar a miséria do sistema, não só um aplicador dela.

Ao longo de todo o período da ocupação, o número de crianças vitimadas por Israel escancara o que a mídia hegemônica e a comunidade internacional fazem questão de ignorar quando propõem soluções abstratas de paz: a ocupação israelense não se iniciou ou se mantém porque a resistência palestina é violenta. A resistência palestina recorre à violência porque precisa, e é legítima em fazê-lo. Como bem coloca Fanon: “O trabalho do colono é tornar impossível todos os sonhos de liberdade do colonizado. O trabalho do colonizado é imaginar todas as combinações eventuais para aniquilar o colono. No plano do raciocínio, o maniqueísmo do colono produz o maniqueísmo do colonizado.”

Compreender que existe uma estrutura de violência que é elemento central da colonização, que a violência é a linguagem da colonização e por isso é também a linguagem da reação à colonização, permite compreender porque essa forma de resistência se torna inescapável. E sejamos claros: não fosse pela resistência dos palestinos, Israel ainda assim os estaria exterminando, mas sem qualquer obstáculo.

A violência é um recurso que se mostra necessário, e as especificidades desse tipo de violência são centrais para a discussão. Fanon argumenta, em O ano V da Revolução Argelina, que enquanto o povo era violentado pelo colonialismo, a lei internacional entendia que os colonizados deveriam triunfar, mas não poderiam recorrer à violência — mesmo que o colonizador se dedicasse ao terror sem impedimentos. O povo colonizado deve triunfar nesse cenário imaginário, mas precisa demonstrar suas capacidades combativas dentro dessa ordem moral, ou será condenado pelas nações ocidentais. O povo colonizado não pode vencer na mentalidade ocidental: ou se torna mártir, ou perde sua razão de resistir.

Quando os palestinos resistem, a imagem que o liberalismo pinta é de árabes bestializados violando mulheres, matando crianças, destruindo vidas inocentes. Quando o Ocidente mata, tortura, extermina, está traindo sua história e sua civilização (e isso fica evidente se observado que o holocausto é visto como raio em céu azul). Mas quando o colonizado reage violentamente, está apenas confirmando sua própria natureza violenta. É fácil ignorar o objetivo de libertação e recorrer a esse imaginário de violência pela violência, de barbárie, desumanizar essas pessoas, porque elas já são desumanizadas desde o princípio. Qualquer ação é convertida em evidência de seu atraso e bestialização.

Isso fica claro se quando observa-se que não faltam imagens e gravações de crianças palestinas brutalmente mortas em bombardeios, mas o mundo está em luto por 40 bebês fictícios decapitados, mesmo que as próprias Forças Armadas israelenses não tenham confirmado isso, mesmo que a Casa Branca tenha esclarecido que Biden não viu fotos dessas crianças, como ele alegou, mesmo que a jornalista que deu o pontapé inicial nesse relato já tenha mudado sua versão. Qualquer acusação infundada contra palestinos é facilmente suficiente para mover o mundo, porque é fácil emplacar a ideia de que árabes são animais violentos. Essa propaganda colonial já está posta no imaginário ocidental há séculos, e qualquer distorção absurda da realidade que se encaixe nesse imaginário dispensa evidências.

Aqui fica clara também a facilidade de disseminação de um medo do “terrorismo islâmico”. Sem fingir que essa é “uma questão complexa”, o adjetivo que acompanha o “terrorismo” nessas denúncias, inclusive por parte da esquerda, é prova da inaceitável inserção e normalização do discurso islamofóbico na esquerda. São quase oitenta anos de ocupação israelense em terras palestinas, que instaura diariamente uma realidade de absoluto terror permanente aos palestinos, e durante todo esse período não se ouviu falar, escrever, teorizar ou agitar em torno de um conceito de “terrorismo judeu”, algo que parece ser de um antissemitismo condenável. Essa prática em face de toda a população muçulmana, que não podemos mais tolerar, reduz a luta palestina ao imaginário colonial desumanizante do “terrorismo islâmico”, e tem nome muito bem definido: orientalismo, representações ocidentais do Oriente que perpetuam, pela lógica do “outro”, estereótipos, simplificações e distorções úteis aos interesses políticos, econômicos e culturais do Ocidente.

A esse respeito, há um esclarecimento importante a ser feito: caracterizar o Hamas como grupo terrorista é uma leitura rasa que ignora o real sentido desse conceito. O Hamas é um partido político que angariou amplo apoio entre os palestinos após duas décadas de falhas entre as tentativas de negociações entre Israel e a Organização para a Libertação da Palestina (OLP), e que recorre ao terror por razões táticas. O terrorismo enquanto tática é uma forma de guerra irregular destacada por visar não um ataque direto ao inimigo principal, mas um ataque-recado a um alvo indireto, que cause uma mensagem pública, cujo objetivo é causar o terror do alvo direto, Estado e (parte da) sociedade civil, e foi arma indispensável nos movimentos de libertação nacional, de forma que não podemos negligenciar a sua importância. O terror torna a vida insuportável para o inimigo, dissuade traidores, publiciza as lutas e convence parte do público da justeza de suas pautas. Pelo rigor do conceito, não podemos caracterizar os atos de guerra irregular da Operação Tempestade Al-Aqsa como terrorismo, pura e simplesmente, mas essa é outra discussão.

Há uma diferença substancial entre ser uma organização terrorista e recorrer a atos de terror por razões táticas em determinados contextos. O Brasil, inclusive, não reconhece o Hamas enquanto grupo terrorista por avaliar que essa definição é competência do Conselho de Segurança das Nações Unidas — embora o Presidente Lula tenha falado em “terrorismo”. Países que classificam o Hamas como grupo terrorista, como os Estados Unidos, o fazem a partir de uma perspectiva enviesada — lembremos das eleições de 2006 para o Conselho Legislativo Palestino que garantiram maioria ao Hamas e contrariaram as expectativas do governo estadunidense de que o Fatah fosse vitorioso. A então Senadora Hillary Clinton chegou a alegar que deveriam ter manipulado essas eleições para garantir um resultado favorável, e esse processo evidencia os interesses próprios do país em caracterizar o Hamas como grupo terrorista.

Para melhor compreensão do uso do terror como tática, a Argélia é um importante caso a ser lembrado, e evidencia a impossibilidade de alcançar a libertação nacional por vias pacíficas. Mesmo com o longo histórico de violência colonial, houve tentativas de negociação pela independência da Argélia com a França. Mas resultaram em um recrudescimento da violência colonial, porque abrir mão da Argélia não cabia nos planos da França. É justamente por esse acirramento do extermínio, que houve uma mudança da concepção de luta e novas formas de combate foram incorporadas, e foi preciso recorrer a uma nova forma de luta, até então rejeitada: o terror. Fanon inclusive comenta, no Ano V da Revolução Argelina, que ninguém toma a decisão de matar civis na rua ou colocar bombas em locais públicos sem longas considerações. Havia vacilações, preocupação em não acumular vítimas inocentes, em manter o apoio dos democratas de outros países. E isso diz muito sobre a situação atual: é fácil dizer que o Estado de Israel é genocida quando é possível enxergar os palestinos como vítimas “puras”, inocentes nos parâmetros ocidentais. A partir do momento que eles resistem, vemos a real face daqueles que Fanon chama de democratas.

Esse tipo de apoio condicional carrega consigo um repúdio apriorístico da violência sem que se analise e apreenda seu conteúdo histórico concreto, e, eventualmente, se torna um fardo para o campo revolucionário, afinal, como o proletariado alcançará a revolução sem qualquer uso da violência? Tomemos a realidade palestina como base. É possível exigir dos palestinos, em sua resistência que já perdura sete décadas, que prefiram como métodos de luta como manifestações pacíficas e a disputa eleitoral? É possível exigir métodos pacíficos em uma realidade violenta?

A solidariedade condicional adotada pelos liberais

A solidariedade internacional é um princípio que, de certa forma, toda a esquerda reivindica. Entretanto, há diferenças escandalosas na forma e no conteúdo que essa solidariedade se manifesta. A colonização cria um ethos ideal à imagem e semelhança do colonizador, incorporado ao imaginário como correto, “padrão”, enquanto qualquer tentativa do colonizado de contrapor esse padrão ou apresentar o seu próprio é violentamente suprimida. Ao colonizado está reservado o direito de não ser, e esse direito apenas. A desumanização total é arma ideológica do colonizador, que reverbera colônia afora, mundialmente, através dos aparelhos ideológicos da burguesia. Dessa forma, se tem algo que escolas, jornais, canais de televisão, filmes de Hollywood e intelectuais da academia concordam, é que a questão palestina é “complexa”, que é preciso ponderar os dois lados, que a luta pela descolonização é bárbara etc. Esse discurso, junto de um bloqueio internacional desumano e um aparato bélico desigual, sustenta o colonialismo enquanto projeto capitalista de expansão de mercados e capitais.

Frantz Fanon comentava que as posições da intelectualidade francesa comunista acerca da luta de libertação nacional na Argélia vinham sempre acompanhadas de condições, de exigências: “apoiamos a luta contra o colonialismo, mas...”. Esse apoio condicional é completamente insuficiente diante do caráter que tem uma luta de libertação nacional. Fanon complementa em seu Condenados da Terra que o mundo colonial é dividido em dois, tendo como sua linha divisória os quartéis e as delegacias de polícia, e a descolonização é o encontro necessariamente violento entre duas forças congenitamente antagônicas. O colonizador vê no colonizado uma espécie diferente, uma coisa desumanizada sob seu domínio absoluto.

Os argelinos lutaram, como lutam hoje os palestinos, uma desigual e diária batalha de vida ou morte contra o extermínio perpetrado pelo colonizador. A luta contra o colonialismo é uma luta terminal, que tem como objetivo estratégico a liquidação do regime colonial. Na prática, esse apoio que Fanon comenta se manifesta à luta palestina de forma oportunista: enquanto os palestinos apanham, há apoio; quando golpeiam de volta, aí surgem as “condições”.

Exemplo dessa retórica vazia e demagógica é a manifestação do presidente Lula no dia da operação, em que diz que repudia “o terrorismo em qualquer de suas formas”. A nota, determinada, se destaca das posições vacilantes de organizações, militantes, figuras públicas e intelectuais de esquerda que abandonaram no calor dos acontecimentos qualquer traço de “apoio” à causa palestina, para denunciar junto à mídia burguesa e à extrema-direita o “terrorismo islâmico” dos palestinos. Outro ponto que chama atenção são marxistas (e marxistas-leninistas!) repudiando, como Lula, “o terrorismo em qualquer de suas formas”.

Lembremos das palavras do velho Marx em sua Mensagem à Liga: “Surja a democracia, desde o princípio, decidida e terrorista contra a reação”. A concepção marxista de democracia assume um caráter irreconciliável com aquela da burguesia, a democracia socialista necessariamente aterroriza a reação. Assim como Lenin assinala em seu Guerra de Guerrilhas, “o marxismo distingue-se de todas as formas primitivas de socialismo pelo fato de não amarrar o movimento a qualquer forma determinada de luta”. Devemos criticar e entender os limites da prática política daquelas organizações que adotam essa ou aquela forma de luta como forma preferencial ou exclusiva de sua práxis, sem o exame criterioso de sua adequação à realidade, mas o marxismo admite em seu manejo prático que se absorvam as formas de luta “menos nobres” em campo tático. O próprio Lenin teve que se manifestar contra o uso das táticas terroristas pelos narodistas quando essas tinham saldo negativo à mobilização do movimento operário na Rússia, mas nunca se declarou “antiterror” ou um pacifista por princípio.

Para além disso, houve períodos da nossa história em que foram utilizadas táticas afins na luta proletária. Durante a ditadura militar brasileira, por exemplo, os métodos terroristas em espaço urbano, tendo como alvo embaixadas estadunidenses, foram parte do repertório da nossa luta armada. De mesma forma pode ser citado o exemplo de nossos vizinhos, e o uso dessa forma de luta pelos Montoneros contra a ditadura argentina e pelas FARC contra o Estado colombiano. Cabe à vanguarda proletária beber da prática do povo combativo em cada localidade e tempo histórico em que firmar seus pés, aprender com o povo suas formas de organização e luta, e incorporá-las na medida em que couber, nas táticas pela disputa pela hegemonia e conquista do poder político. Diante de realidades outras, não é o papel dos membros dessa vanguarda, internacionalistas que são, fazer juízo moral de como lutam os povos.

A realidade brasileira, embora qualitativamente diferente da palestina, em situação na qual é possível utilizar de formas de luta típicas de “tempos de maré baixa”, é também extremamente violenta. Produto histórico da continuidade de opressão, violência e exploração racista, o Brasil hoje tem números de guerra quando analisamos as baixas de jovens de 18-29 anos em operações policiais nas favelas. Nosso encarceramento em massa é uma das mais altas do mundo. Os porões de nossas delegacias de polícia nunca cessaram seus métodos de tortura continuados da ditadura militar. Ocupamos o primeiro lugar no ranking mundial de assassinatos de pessoas trans. Nosso latifúndio está fortemente armado e incorre contra os trabalhadores do campo, povos indígenas e quilombolas diariamente. Nossos quartéis compõem um partido político armado de facto. O fascismo não foi desmobilizado pela vitória eleitoral de Lula. Hoje, pouco podemos fazer e propor sobre essas questões em nosso atual momento de reconstrução revolucionária, mas para que um dia ocorra uma revolução no país, essa será a realidade a ser transformada, não sua representação distorcida e “civilizada” que nossa mídia apresenta diariamente.

Nossa resposta ao imperialismo: o internacionalismo proletário

Os comunistas sabem que esse tipo de apoio condicional e nada tem o mesmo valor, tanto que, para além do Hamas, somaram-se aos esforços da ofensiva palestina os marxistas-leninistas da FPLP e os maoístas da FDLP. O internacionalismo proletário não pode ser um pessimismo pequeno-burguês abstencionista em momentos de ofensiva ou diante de vitórias parciais. Fazemos coro ao nosso posicionamento enquanto PCB-RR:

Vivemos o momento de intensificação da unidade da resistência palestina, independente das diferenças políticas e estratégicas existentes entre eles. Trata-se de uma nova correlação de forças na luta contra a ofensiva imperialista de Israel, a partir do qual as ações de todos os tipos aumentarão e se intensificarão. Diante dela, dizemos o que precisa ser óbvio: em uma guerra de extermínio como a movida por Israel, os meios empregados em resposta pelo povo oprimido não podem ser medidos pelos padrões de conduta de uma guerra regular. O povo palestino, em todas as suas legítimas formas de resistência, receberá apoio irrestrito dos comunistas brasileiros [grifo nosso].

Nosso apoio ao povo palestino é dado sem ressalvas, sem condições, nessa luta contra o colonialismo israelense, mesmo com as discordâncias fundamentais que possamos ter com o Hamas, sua política e seus princípios. Há, evidentemente, divergências políticas e estratégicas entre esses grupos. O mesmo pode ser dito sobre a FLN, na Argélia, que tinha diversos projetos sendo disputados internamente, desde liberais até comunistas. Mas a FLN era quem tinha a possibilidade de libertar a Argélia da França, e hoje o mesmo acontece com a Palestina. Não perdemos de vista a necessidade de uma Palestina livre, soberana, popular, e da libertação de todos os povos colonizados e oprimidos a nível mundial.

Mas em busca da ‘revolução pura’, nenhum marxista jamais viu revolução alguma. Ou, nas palavras de Lenin, “Quem espera uma revolução social ‘pura’ nunca vai viver para vê-la. Tal pessoa fala tanto de revolução sem entender o que é uma revolução”. Antes de tudo, a Palestina precisa ser livre, e as formas encontradas de lutar por essa liberdade já são legítimas sem precisar passar pela régua ocidental. Não cabe avaliar a legitimidade da violência como forma de resistência. Se sequer tentamos elencar formas de resistência legítimas e formas ilegítimas, estamos partindo do pressuposto de que a legitimidade da resistência está em sua forma, não em sua necessidade. Não cabe questionar o porquê de não recorrerem a formas pacíficas de resistência só porque há um entendimento de que essas formas são moralmente superiores.

Pacifismos não libertarão a Palestina de uma das ocupações mais brutais já vistas, e clamar por elas é simplesmente um fetiche da derrota. Não queremos mártires palestinos, os queremos vivos e livres, e a Palestina livre e soberana. E como declarado pela FPLP, a vitória estratégica da resistência é o que abrirá as portas para o retorno e para a possibilidade de redefinir a história da Palestina e da região.

A FPLP faz um apelo de que sejam organizados protestos em larga escala contra a ocupação, demonstrando unidade com o povo palesitno, que protestos sejam organizados em frente às embaixadas de Israel e dos países em conluio com o ocupante, para condenar os crimes da ocupação e aqueles que se alinham a ela, que os crimes da ocupação sejam documentados e expostos ao mundo. Respondamos a esse apelo com nosso apoio irrestrito. Todo comunista deve entender que nossa luta aqui no Brasil está em conexão direta com a luta dos outros camaradas por todo o mundo. Em nosso papel internacionalista, devemos atuar como forças de pressão sobre embaixadas e governos, convocar manifestações de rua em solidariedade ao povo palestino e pautar ações que possam incidir diretamente sobre o esforço de guerra israelense em favor de nossos camaradas. Não cabe aos comunistas o vexame de ressalvas morais à sua violência, deixemos as condenações para o sionismo e a reação.

Toda a nossa solidariedade à luta palestina!

Palestina livre do rio ao mar!


[1] Apesar de nominalmente ser ala armada do Fatah, opera independentemente da liderança do Fatah na Cisjordânia, especialmente o ramo das Brigadas em Gaza.

[2] Veja o comunicado das Brigadas Mártir Abu Ali Mustafa (Kata'ib al-Shaheed Abu Ali Mustafa): https://emdefesadocomunismo.com.br/comunicado-do-batalhao-do-martir-abu-ali-mustafa-ala-militar-do-pflp/