'Veganismo e meio ambiente: uma contribuição para o debate da ecologia política' (Felipe Resende)
O veganismo desenvolvido dentro de uma perspectiva marxista é horizonte para as novas relações sociais de produção agroalimentares que visem a superação do latifúndio, do agronegócio e da monocultura.
Por Felipe Resende para a Tribuna de Debates Preparatória do XVII Congresso Extraordinário.
(Camaradas, esta tribuna está escrita há algum tempo e a ideia era enviar na sequência de outras tribunas que pautaram o veganismo um tempo atrás, mas acabei sentindo que perdi o “timing”, com diversos outros temas e polêmicas “mais importantes” e “urgentes” ocupando a atenção da militância. Havia até desistido de enviar, mas com a extensão do prazo das tribunas e alguns novos acontecimentos, resolvi adaptar alguns pontos e enviar. Espero que seja de alguma utilidade.)
Primeiramente, gostaria de saudar as contribuições valiosas de todes camarades que escreveram tribunas específicas sobre as perspectivas positivas de interação entre veganismo e comunismo, como 'Veganos comunistas do Brasil, uni-vos!!' (Marião), 'Veganismo e Comunismo são contraditórios?' (Camarada Rosa), 'Se a cooptação liberal das lutas anti-opressão não nos afasta delas, por que nos afasta do veganismo?' (Maria Fernanda Moneda), 'Antiveganismo na esquerda: Uma incoerência que precisa ser superada' (Cauê Huler) e 'Causa animal: Uma nova pauta para um novo partido' (Contribuição anônima). Até agora nenhuma tribuna foi escrita no sentido de tentar contestar os pontos levantados pelos camaradas veganos, mas é evidente que esse microcosmo de opiniões convergentes nas tribunas não se reflete no grosso do partido, para quem essa pauta continua a ser menosprezada. O único texto que pude encontrar, escrito como reação veementemente oposta à minha primeira tribuna “Pela construção de um veganismo marxista”, foi produzido e divulgado pelo PCO, um fato curioso que pode motivar os camaradas céticos em relação ao veganismo à alguma reflexão[1].
De qualquer forma, o objetivo desta tribuna é expandir sobre um eixo específico do veganismo, sua relação com a questão ambiental e da sustentabilidade. Como disse na minha tribuna anterior, o veganismo teria, de forma geral, quatro motivadores ou pilares que o justificariam, sendo eles o veganismo pelo meio ambiente, o veganismo pela saúde humana, o veganismo pela abolição do sofrimento animal (ou veganismo ético) e o que chamei genericamente de veganismo e sociedade (relações de poder e produção). Fiz a escolha de abordar o aspecto ambiental primeiro pois parece ser aquele em que há maior concordância entre os camaradas, ou seja, que um veganismo baseado nesse fator seria o mais facilmente justificável. Isso se reflete, por exemplo, nas menções ao veganismo em tribunas que tem abordado a luta ambiental e a necessidade de alteração de formas de produção dada a urgência climática, como em ‘A luta ambiental no PCB: uma emergência subestimada’ (Contribuição anônima), 'As tarefas dos comunistas quanto à questão ambiental' (Jaqueline Tavares) e 'Para uma Economia Planejada Socialista e Ecológica - Uma Resposta ao Camarada Ben' (G. Zaffari).
Gostaria de expandir esse tema pois, para muitos, o impacto ambiental da pecuária pode até ser reconhecido, mas de uma forma mais superficial, como se o grande problema fossem os peidos (ou arrotos) das vaquinhas que estariam agravando as mudanças climáticas, como aparece na mídia com alguma frequência. É claro que a emissão de gases de efeito estufa é uma das pegadas ambientais possíveis de serem usadas para mensurar os impactos da pecuária, mas existem muitas outras, e aquela que julgo mais ilustrativa da irracionalidade de um modelo produtivo a base de derivados animais é o fator uso da terra. A Embrapa estuda sistematicamente o uso e ocupação do solo no Brasil por meio do tratamento geocodificado dos dados do Cadastro Ambiental Rural, e a síntese da distribuição de área ocupada por uso pode ser vista no gráfico abaixo[2].
De imediato já é possível ver que de toda área ocupada pelo uso agropecuário (laranja) no Brasil, 70% são utilizadas como pastagens[3]. Esse já é um número impressionante e que tem relação com a pecuária extensiva praticada no Brasil, mas não conta toda a história pois grande parte das lavouras são também destinados para produção de alimentação animal e rações, fazendo com que o impacto da pecuária no uso do solo seja ainda maior. Podemos usar o milho e a soja para estimar um piso para essa contribuição: segundo o boletim da safra de grãos da Conab 2023/2024, no Brasil foram plantados 74 milhões de hectares no total, sendo 45 milhões de soja e 21 milhões de milho[4]. Como cerca de 77% da soja é destinada para alimentação animal[5], assim como cerca de 70% do milho[6], é possível estimar que aproximadamente 88% de toda a área de uso agropecuário no Brasil é destinada direta ou indiretamente para manter, criar ou sustentar animais não-humanos para consumo.
Dos 12% restantes poderíamos ainda retirar da conta a área de todas as outras lavouras sem destinação alimentar direta, como o algodão, o tabaco e a cana (álcool, biodiesel), e é nesse pequeno percentual de terra que sobra que se produz a comida que efetivamente sustenta a população brasileira, majoritariamente pela agricultura familiar que abastece feiras e mercados por todo o país. O desequilíbrio dessa relação é ainda mais acentuado quando comparamos que os produtos de origem animal contribuem apenas com 18% do total de calorias e com 37% do total de proteínas utilizadas nas cadeias de suprimento humano. Ou seja, produtos de origem animal demandam quase todo o espaço destinado à agropecuária, mas contribuem relativamente pouco para sustentar um indivíduo médio em uma dieta onívora[7]. As próprias palavras “agropecuária” e “agronegócio” parecem mascarar o real impacto da pecuária nessa relação, dando mais ênfase à parte do “agro”, sendo que é na verdade a pecuária a maior engrenagem dessa máquina, de longe. Escuto com alguma frequência de camaradas que, dada a política de desindustrialização e aumento progressivo do setor primário no PIB, o Brasil seria um grande “fazendão”. Se me permitem a sugestão, acho que o mais adequado seria falar que o Brasil é um grande “curralzão”, um grande pasto, um grande abatedouro, um grande frigorífico - para que seja dada a real dimensão do peso da pecuária dentro deste sistema.
Dei ênfase ao fator “uso da terra” até agora pois considero a contradição mais absurda, dada a relação íntima e secular entre concentração de terra, exploração e poder no Brasil, mas todos os outros indicadores de impacto ambiental também vão na mesma direção. Um estudo que analisou esses indicadores concluiu que, para cada grama de proteína bovina consumida em uma dieta humana, a produção da carne que a originou necessitou de 42 vezes mais espaço físico, 2 vezes mais água e 4 vezes mais nitrogênio e emitiu 3 vezes mais gases de efeito estufa do uma quantidade equivalente originada de plantas. Outro estudo descobriu que produzir um quilo de carne bovina necessita de 163 vezes mais terra, 18 vezes mais água, 19 vezes mais nitrogênio e emite 11 vezes mais gases de efeito estufa do que produzir um quilo de arroz ou batata[8]. O fato desses valores variarem tanto não é motivo para descrença naquilo que eles anunciam, mas sim pelo motivo de que eles são médias e esses fatores variam muito entre regiões, culturas, climas e métodos de produção diferentes (como produção extensiva e intensiva), entre outras variáveis. Embora essa margem de valores possíveis seja grande, a conclusão é uma só, qual seja, mesmo produtos de origem animal obtidos através das metodologias mais eficientes e produtivas continuam a ter um impacto ambiental muito pior do que produtos equivalentes à base de plantas, mesmo que produzidos de formas pouco eficientes.
Mas por que isso ocorre? Por que um sistema produtivo à base de exploração animal parece ser tão menos eficiente no uso de recursos naturais do que um à base de plantas? É importante discorrer sobre isso para evitar fantasias de que poderia-se aprimorar o atual sistema a partir da tecnologia, reformado-o talvez, para que fosse melhor, mais sustentável. Talvez isso até possa ocorrer individualmente, mas como estamos a comparar dois sistemas possíveis, um nunca poderá superar ou se igualar ao outro, por questões de impossibilidade científica. Basta retomarmos alguns conceitos científicos para entender o fundamento por trás dessa afirmação: o fluxo energético dentro das cadeias alimentares é assunto bem estudado na biologia e na ecologia, podendo ser representado didaticamente por meio de pirâmides tróficas. Na base dessa pirâmide estão os organismos autótrofos, que produzem o próprio alimento, como as plantas que fazem fotossíntese. É desse nível trófico que toda a energia do sistema se origina, e é dela que os posteriores níveis de consumidores irão se utilizar. A quantidade de energia que flui em uma cadeia alimentar diminui à medida que passa de um nível trófico para outro. Isso acontece porque os organismos de cada nível trófico utilizam parte da energia assimilada em suas atividades metabólicas, com consequente liberação de energia na forma de calor. Deste modo, a energia disponível para os consumidores primários é sempre maior do que a disponível para os consumidores secundários e assim por diante. O fluxo de energia é unidirecional, pois a energia disponível para um determinado nível trófico não retorna ao nível trófico anterior.
Nestes termos já é possível responder à questão proposta: uma dieta a base de plantas posiciona os humanos como consumidores primários, enquanto uma dieta que faz uso de produtos de origem animal posiciona os humanos como consumidores secundários, o que a torna menos eficiente e sustentável. Isso se dá pela imensa quantidade de energia que é “perdida” nos processos metabólicos dos organismos (o termo está entre aspas pois, como dita a primeira lei da termodinâmica, a energia total se conserva, mas o calor dissipado passa a ser uma energia não aproveitável pelo consumidor subsequente). É o que acontece a cada degrau trófico que se acrescenta, obedecendo à lei mais geral de crescimento da entropia, a segunda lei da termodinâmica: a energia tende a se redistribuir em formas "menos organizadas". Coletar calorias e proteínas, enfim, matéria e energia em um nível trófico mais baixo é, por si só, mais eficiente[9], e a consequência prática disso são justamente os imensos impactos ambientais causados pela pecuária, uma indústria da escassez em sua essência, que produz pouco com o muito e vende caro, um mercado perfeito. É claro que o modelo de cadeia alimentar usado aqui é em si uma simplificação, pois o que existe na realidade é uma complexa teia alimentar e que outros fatores, como a utilização de subprodutos e novas tecnologias, poderiam até alterar quantitativamente essa relação, mas qualitativamente a barreira da impossibilidade científica impede que, em sendo as duas fontes de energia possíveis para a reprodução saudável da vida humana, uma sempre será menos eficiente que a outra.
Um exemplo de cenário onde isso é bastante evidente é na elaboração de perspectivas para futuras missões de exploração e colonização espacial. Obviamente é algo que ainda está muito distante no horizonte de eventos da humanidade, mas é interessante pensar nos princípios que têm sido estudados para desenvolvimento de sistemas de reprodução da vida humana em tais ambientes, em particular o sistema alimentar, pois podem ter muito a nos ensinar aqui e agora na questão ecológica, dado ser um ambiente extremo que impõe restrições gigantes na utilização de todos os recursos. A agência espacial estadunidense possui programas específicos para projetar sistemas alimentares espaciais, onde foram estabelecidos oito critérios básicos que qualquer sistema deve preencher para ser considerado factível e um deles é justamente a otimização extrema de recursos[10], o que direciona objetivamente os estudos para um sistema alimentar à base de plantas: as 100 receitas iniciais elaboradas para que astronautas preparem em Marte são totalmente a base de plantas[11]. E isso se dá unicamente por questões técnicas de eficiência no uso dos recursos disponíveis e não por nenhuma questão ética ou filosófica, tanto que nem se fala em veganismo em momento algum nessas pesquisas. “Sou um grande entusiasta da liberdade de escolha para qualquer futura colônia marciana. Dito isso, é provavel que os colonos de Marte teriam uma dieta predominantemente a base de vegetais, por causa da energia e do espaço necessários para criar animais de consumo”, teria dito a porra do Elon Musk ao ser qestionado pela organização liberal PETA sobre veganismo no espaço[12], e isso em 2011. Tendo extrapolado essa ideia para um caso extremo, voltemos para o aqui e agora - não é que a criação de animais para consumo humano seja dispendiosa no espaço; ela é assim em qualquer lugar, pois apenas adiciona um intermediário desnecessário na relação energética (além da questão dos resíduos, das zoonoses etc), o que me leva à seguinte provocação: teríamos nós, como onívoros neste contexto de crise climática, urgência ambiental e extrapolação dos limites planetários causados pelo capitalismo, o luxo de poder escolher levianamente qual destes sistemas vamos escolher enquanto projeto alternativo de sociedade?
Reitero que tais informações sobre os impactos ambientais do consumo de produtos de origem animal já são até um senso comum entre pessoas que estudam minimamente a questão ecológica[13], motivo pelo qual eu estranho quando, por exemplo, em uma tribuna que se propõe a debater essas ideias, como 'Greve pelo clima e contra o capital! Revolução para evitar a extinção!' (Mh e Zenem Sanchez), o veganismo como alternativa viável, não seja mencionado nenhuma vez sequer, mas sim algumas frases vagas como “... se não estendermos a concepção de coletividade à totalidade da vida, aspirando à equidade valorativa de cada entidade biótica, continuaremos fracassando”, “A luta pela mãe natureza é a mãe de todas as lutas” e “Precisamos discutir a construção de uma nova relação entre seres humanos e natureza para libertarmos os demais seres vivos do sofrimento a que estão submetidos”. O veganismo não faz parte dessa “nova relação”, camaradas? Não seria uma vaca uma “entidade biótica” ou parte da ”mãe natureza”? Se não, as belas palavras usadas no texto são largamente esvaziadas de conteúdo prático. Se sim, porque não fazer uma defesa explícita, sequer uma menção ao veganismo? Sinto que esse é um fato recorrente nos debates marxistas sobre meio ambiente, como na tribuna “Por um assunto [que continua] esquecido em nossas fileiras: a crise climática e o [descaso] do partido comunista' (F.L.)”, onde ao comentar sobre o contexto histórico da criação do conceito marxista de metabolismo (sobre os seres humanos e a natureza se influenciarem dialeticamente, e como, portanto, essa visão antropocêntrica de que os seres humanos seriam o centro do universo natural, nada mais era do que “uma exaltação idealista dos homens”), o camarada pergunta retoricamente se “Por acaso já se acabou a visão especista de que a espécie humana é a mais importante do mundo e toda e qualquer espécie não-humana pode ser subjugada e considerada inferior?”. De fato não acabou e por isso a obra de Marx ainda é atual no tema ambiental, mas pergunto ao camarada: o veganismo não é também um caminho prático para superar essa visão antropocêntrica e especista criticada, ou o camarada possui alguma outra sugestão? O texto “Nós e a Ecologia Política” do camarada Gui Voigt, publicado no talvez falecido Caderno de Contribuições Dinarco Reis, volume 4/2023, sofre da mesma contradição. Em dado momento do texto ele afirma que “o socialismo precisa ser um socialismo também para a natureza. Deixem-me dizer, com o risco de parecer ridículo, que o socialismo precisa ser um socialismo para a Amazônia, para o Cerrado, para os rios, para as araras, para as joaninhas, para as abelhas e para as serpentes. Ou o socialismo no Brasil será ambiental e ecológico, ou não será socialismo”. Não acho ridícula a formulação do camarada, acho insuficiente, carente de apelo prático, imersa em especismo (ora, por que socialismo para as araras mas não para as galinhas?). Novamente, a ausência de qualquer menção ao veganismo num texto de 41 páginas que se propõe a discorrer sobre ecologia política e exploração do meio ambiente e dos animais sob o capitalismo me causa um estranhamento muito grande. Uso os três textos citados aqui para perguntar finalmente: porque tanto receio para falar de veganismo?
Camaradas, encerro esta tribuna reiterando que seu propósito é discorrer especificamente sobre a relação entre veganismo e meio ambiente, pois tenho a percepção de que seria o caminho mais viável para abrir espaço para discussões sobre veganismo dentro do partido dado o peso que a questão ambiental tem ocupado nas análises de conjuntura global. No entanto, devo confessar que essa linha argumentativa não me é particularmente satisfatória, pois em última instância é como se eu dissesse que um sistema que mata animais desnecessariamente é ruim porque é ruim para o meio ambiente, para a eficiência e para a produtividade, e não porque é errado e cruel. Ou seja, sem a consideração de um veganismo ético a ser o pilar central de argumentação, os outros perdem, para mim, a essência de ser. No entanto, sinto que a defesa de um veganismo ético neste momento seria ainda mais intragável para a maioria dos camaradas por uma série de motivos, como a dificuldade em se formular sobre a tal “moral comunista” sem cair em moralismos. Exemplos disso não faltam, como a visão moralista da UP/PCR em relação às drogas ou a do KKE em relação à comunidade LGBT+, para ficar apenas em casos abordados aqui nas tribunas. Ou seja, acho compreensível a aversão dos camaradas a discursos que tentam delimitar o que seria um “certo” ou “errado” em algo que influi sobre sua vida particular, mas espero que com a construção coletiva de um veganismo marxista que seja coerente com a atuação política do partido isso possa ser superado, e eu mesmo não me sinto qualificado para fazer um debate filosófico sobre bioética. De qualquer forma, é importante deixar claro que a intenção dessa discussão não é “veganizar” ninguém à força, mas sim o desenvolvimento de um consenso de que é necessário fomentar a criação de condições materiais para que o veganismo possa ser acessível, cotidiano, ordinário, popular, ou seja, “normal”, começando no próprio partido. Considero que um bom exemplo disso foi a experiência da etapa estadual do Congresso em São Paulo. As marmitas oferecidas durante os dias do evento foram fornecidas por um restaurante vegano de um camarada, e elas parecem ter sido muito elogiadas mesmo por camaradas que não eram veganos[14]. Desconheço quais foram os motivadores dessa escolha, se de caráter mais político ou mais prático, mas saúdo a iniciativa pois ela coloca a questão no campo do coletivo e não do indivíduo, linha que considero correta. É por esse motivo que defendo que o horizonte positivo de integração entre veganismo e comunismo conste do programa do partido, mas infelizmente parece que isso está enfrentando alguma resistência que não está clara para mim e vou aproveitar esse momento para questionar isso publicamente.
Na minha etapa de célula do Congresso, fomos instados a avaliar o documento contendo as pré-teses. Na parte sobre as “Resoluções de Estratégia e Táticas” existe o subtítulo inchado “Sobre a questão agrária, a luta pela terra, a crise climática e a questão ambiental”, o “balaio verde” como bem disse camarada F.L. Enxergando este como o tópico mais factível para abordar o tema do veganismo, fiz a sugestão da inclusão de uma pré-tese com a seguinte redação:
O veganismo desenvolvido dentro de uma perspectiva marxista é horizonte para as novas relações sociais de produção agroalimentares que visem a superação do latifúndio, do agronegócio e da monocultura, uma vez que a pecuária é a força motriz esmagadora do sistema atual que produz e reproduz escassez, chegando a ocupar, direta ou indiretamente, cerca de 90% de toda terra de uso agropecuário no Brasil entre pastagens e produção de rações, terra que poderia ser destinada para produção de alimentos consumidos diretamente pelo povo para garantir sua soberania alimentar
Essa sugestão dialoga com as teses §96 e §97 em seu conteúdo, apenas incluindo a questão do veganismo e uma breve contextualização. Certamente podem existir redações melhores e a possibilidade de aglutinação com outras teses, mas essa foi a sugestão que consegui elaborar na etapa de célula e que foi aprovada por unanimidade pelos integrantes da célula presentes na reunião. Essa sugestão foi sistematizada e consta do caderno distrital das pré-teses como proposta da célula e que foi posteriormente discutido na nossa etapa distrital. Na etapa distrital, por sua vez, os outros temas do caderno tomaram todo o tempo congressual e nenhum GD chegou nem perto de discutir esse tópico e na plenária final também foi dada prioridade para a questão organizativa e da eleição dos membros da CR e da delegação para a etapa nacional. Em contato com a sistematização regional, me informaram que os itens que não foram diretamente discutidos na etapa distrital por falta de tempo hábil subiriam para posterior sistematização nacional. No entanto, quando desceu o arquivo com a sistematização nacional das pré-teses, embora houvesse várias outras propostas de adição vindas de outros Estados nesse aspecto da luta ecológica, nenhum item sequer mencionava a questão do veganismo. O arquivo contendo a explicação da sistematização nacional e os anexos tampouco esclarecem os motivos dessa proposta de tese ter sido apagada. Em questionamento para integrantes da sistematização distrital, ninguém soube informar o porquê disso ter ocorrido. Considerando que hoje é o último dia para envio das tribunas e que ainda não obtive um retorno concreto sobre o sumiço da proposta de tese, vou considerar o silêncio como resposta, o que reitera o sentimento de que essa é de fato uma pauta menosprezada hoje no partido, coisa que lamento, assim como a falta de transparência na condução do processo. De qualquer forma, espero que no Congresso em si esse tema possa ser pautado e que a construção de um veganismo marxista possa fazer parte das resoluções do partido.
[1] https://causaoperaria.org.br/2023/e-possivel-um-veganismo-marxista/
[2] https://www.embrapa.br/car/sintese
[3] Há posteriormente no relatório um argumento pela incorporação das pastagens nativas como áreas de conservação, numa tentativa de inflar as estatísticas ambientais positivas do Brasil (greenwashing?) - O relatório foi feito no Governo Bolsonaro. Segundo ele, “não se trata nem de áreas protegidas, nem de áreas preservadas. Mas sim, de áreas conservadas sob pastejo animal extensivo, em equilíbrio secular com os sistemas de exploração pecuária”. Pastagens nativas em equilíbrio secular? Existiam bovinos no Brasil antes da invasão europeia? Fica aqui a reflexão.
[4] https://www.conab.gov.br/info-agro/safras/graos/boletim-da-safra-de-graos
[5] https://ourworldindata.org/soy
[6] https://www.embrapa.br/agencia-de-informacao-tecnologica/cultivos/milho/pre-producao/socioeconomia/importancia-socioeconomica
[7] https://ourworldindata.org/agricultural-land-by-global-diets
[8] Chai, Bingli Clark, et al. "Which diet has the least environmental impact on our planet? A systematic review of vegan, vegetarian and omnivorous diets." Sustainability 11.15 (2019): 4110.
[9] https://oquevocefariasesoubesse.blogspot.com/2015/10/a-outra-bomba-de-carbono-nossa-dieta_20.html
[10] Douglas, Grace L., Sara R. Zwart, and Scott M. Smith. "Space food for thought: challenges and considerations for food and nutrition on exploration missions." The Journal of Nutrition 150.9 (2020): 2242-2244.
[11] https://www.lubbockonline.com/story/news/state/2012/07/18/nasa-builds-menu-planned-mars-mission-2030s/15143518007/
[12] https://www.livekindly.com/elon-musk-predicts-vegan-colonies-will-be-on-mars-in-7-10-years/
[13] Poore, Joseph, and Thomas Nemecek. "Reducing food’s environmental impacts through producers and consumers." Science 360.6392 (2018): 987-992.
[14] https://twitter.com/Nad_Persu/status/1775516626193932538