'Um chamamento à militância da Bahia para o XVII congresso e notas sobre um balanço político na Bahia' (Gideão Gabriel)
Observar de forma camarada as exposições contrárias à nossa leitura de terminados aspectos, entendendo em que momento estamos como militância, para evitar um espírito belicoso que se herdou de toda movimentação anormal nas redes sociais durante o auge da cisão.
Por Gideão Gabriel para a Tribuna de Debates Preparatória do XVII Congresso Extraordinário.
Esta pequena tribuna é escrita por alguém que, como boa parte de seus camaradas, esteve muito longe do olho do furacão, como um distante que ouviu rumores e fragmentos e foi interpelado a tomar uma decisão no frigir dos ovos.
O objetivo desta é fazer um chamamento à militância da Bahia para expor suas formulações, que em partes foram expostas no congresso, e para fazer um balanço dos caminhos escolhidos e as formas para tal e seus resultados, isso no momento em que acredito ser de maior importância fixar as bases e coesão do partido para dar de forma direcionada e com uso de todas as forças em direção à estratégia e com as táticas estabelecidas no congresso.
Há em torno de oito meses de cisão oficiais na Bahia. É necessário um balanço agora de todos as bases que romperam com o Partido naquele momento. Isso constituído dos documentos de denúncia em sua forma e conteúdo, dos processos de oficializar e legitimar os novos organismos de direção com suas durações e nível de profundidade dos debates e sínteses e, principalmente, do nível do estágio atual do trabalho e da organicidade.
Este texto é construído a partir das inquietações surgidas da falta de unidade expostas nas tribunas (em partes nas redes socais e mídias digitais) pós-cisão, da contradição entre os motivos expostos para referendar a cisão e o que na prática, na ação diária, observa-se. Por outra parte, a sensação da falta de conexão entre a defesa da cisão com o seu argumento principal: o abandono do marxismo-leninismo pela maioria do núcleo dirigente do PCB. Concomitantemente, a sobreposição disso pela noção de conexão central cisão - problemas sensíveis organizativos, aqui na Bahia, nas bases.
Primeiramente, à época, na minha célula e nos espaços de pleno, defendi que o debate de cindir e posteriormente construir um congresso era muito importante e suas consequências radicais, ou seja, uma vez deliberado isso não haveria volta atrás. Assim, qualquer escolha, inclusive aguardar, deveria ser tomada após análise sóbria dos discursos que construíam aquele momento e do contexto histórico da esquerda radical (nacionalmente, marcado por cisões e cisões das cisões, internacionalmente, em especial na Europa, da mesma forma, ainda que por motivos diferentes). O que de fato não ocorreu.
Quatro de junho de 2023 desce a CI sobre a denúncia no dia três de junho da participação do PCB na PMAI e suas implicações. Expulsões oficiais e no parecer e relatório da Comissão Disciplinar foram comunicadas dia 31 de julho de 2023. De acordo com documentos enviados, em torno de uma semana do manifesto do congresso extraordinário, parte das direções da UJC se movimentaram em favor da construção e daí em diante, em um curto período de tempo, regiões se manifestaram a favor. Não foi assim na Bahia. (Para alguns militantes da UJC, por outro lado, claramente alguns militantes tanto pró-PCB quanto pró-PCBRR já participavam de movimentações com seus parceiros de “conversas de corredor”).
A Bahia no dia dois de julho, ato da independência da Bahia, tem sua militância e militantes, que se agrediram mutualmente pós-cisão, construindo um bloco massivo com militantes de várias células e núcleos. Então, quando oficialmente isso atinge os órgãos na Bahia? No Ativo Estadual do Complexo Partidário, no dia 12/08. Nesse espaço foi realizado denúncias e solicitado a expulsão de alguns camaradas pró-PCB CC.
As direções da UJC já haviam tido embates alguns dias anteriores ao ativo. Mas parte das bases, que não comungavam de conversas de corredores, não sabiam da articulação prévia que organizou as denúncias e preparou os documentos veiculados no espaço do ativo. Essas denúncias serviram para balizar a posição da UJC-BA em favor da adesão ao congresso extraordinário. Com os argumentos principais: O fracionismo do Comitê Regional iniciou há muitos anos através da perseguição dos camaradas e coordenar intervenções nos coletivos, vistos muitas vezes enquanto problemas internos, ou seja, um método de perseguição orquestrado.
A partir das denúncias e do documento de balanço se produziu a síntese das discussões dos núcleos da UJC-BA, todos tenderam a construção do congresso extraordinário, porém a maioria pontuou que era pra sanar os problemas, a insatisfação pelo trucamento dos trabalhos e da falta de diálogo partido-juventude. A questão central saiu do abandono do marxismo-leninismo (e liquidacionismo do PCB) para problemas em relação ao trabalho prático e as perseguições postas nas denúncias (sem o devido processo de apuração dado as circunstâncias).
O ativo teve uma particularidade. Perto do final da primeira parte, houve uma intervenção com as denúncias, apresentação de documentos e afins e a solicitação de expulsão imediata, o que é algo que geralmente não ocorre, há ritus para isso. O fato é que da discussão sobre as denúncias se passou rapidamente à implosão do espaço, hoje julgo isso como uma imaturidade política por parte dos militantes que não participaram da articulação das denúncias e do preparo da intervenção. Seria mais proveitoso para o avançar fosse do processo de cisão, fosse do processo de terceira via (a exemplo de parte do Rio de Janeiro à época) ou fosse da não adesão ao congresso, o andamento do ativo ou a proposição de uma segunda parte para apreciação profunda das denúncias e suas respectivas defesas.
Passado o tempo, ficou claro que a intenção no ativo não apenas a denúncia para a militância da Bahia, era também o máximo tencionamento para o racha. Assim foram os passos seguintes, não houve, no meu núcleo, a chance de defasa ou explicação para as denúncias ou a reformulação do balanço partidário, considerado superficial. Ou seja, não houve um espaço para a tentativa sequer de uma análise fria do que acontecia e ouvindo os dois lados da cisão. Confiou-se justamente nas direções e em seus trabalhos desenvolvidos nos últimos anos. Tomou-se decisões sem o tempo necessário de apreensão de evento que, como exposto pela fração que cindiu e pelo CC, já se gestava há anos dentro do PCB.
As trocas de agressões no nível pessoal saem do ativo e partem para as redes, com dirigentes de juventude e militantes de base se atacando no que até hoje assombra o PCB e PCB-RR: os ataques no Twitter/X. Deixa-se o foco na criação de sínteses ou compreensão do evento para ataques pessoais de rixas antigas ou um espírito de torcida organizada na sua pior face.
Logo se apresenta a primeira plenária do PCB-RR, com integrantes da direção da UJC-BA. Quem de fato dá folego e andamento político ao trabalho do PCB-RR é a UJC (a maioria). Ainda que a não foi oficialmente fundida a estrutura da UJC com o partido, ao ver a formação das células e do respectivo CR é prevalente a juventude.
Isso tudo, reconhecidamente, sem o tempo de análise de fato, assim, a juventude vai confiando na atuação de seus dirigentes. Chegamos no momento de construção do congresso. A partir desse momento, imaginava que como a maioria se propôs a cindir, de forma lógica, o próximo passo seria a disposição para superar o que se apontou como os problemas fundamentais. Mas o que aconteceu em parte, foram militantes que agitaram ativamente pelo racha e disputaram ideologicamente, por motivos diferentes, não se colocaram para esta segunda fase ou fase mais difícil: formular e superar as resoluções do congresso passado do PCB.
É necessário parabenizar o esforço e o objetivo alcançado na construção do congresso na Bahia. A comissão de organização realizou um trabalho difícil e garantiu um ambiente harmonioso e propício para o debate das teses de forma qualitativa. A garantia do deslocamento da militância e toda a parte logística é digna de reconhecimento, pois isso também é trabalho militante e sem o compromisso com essa tarefa todo o congresso estaria comprometido. Com aditivo da sobrecarga e do ambiente caótico pós-cisão.
Porém, no momento de formular politicamente, dentro das condições que se tem, uma militância jovem politicamente falando, houve o esvaziamento tanto no congresso estadual em si, quanto nas discussões dos temas que causam divergências sensíveis. É curioso que uma parte significativa de militantes que agitaram, defenderam e convenceram camaradas sobre a importância de aderir ao racha, abstiveram-se e seguem assim de formular ou expor suas formulações nas tribunas e no congresso. Se temos o congresso como o momento máximo da democracia interna, o momento de apresentar, defender, convencer, ou seja, reconstruir de fato aquilo que dá as direções ao partido, e tão cobrado outra, por que se abster de participar?
Não é compreensível que se siga tocando tarefas como se não estivéssemos em um momento crucial, em que parte significativa de nossas forças e energia intelectual deve estar direcionada, dentro dos nossos limites de formação teórica, a pensar que partido queremos construir. Isso inclui acompanhar as tribunas abertas, estudar e formular sobre nossa realidade local e expor essas formulações internamente aos nossos camaradas de célula e nas tribunas, ainda que somente públicas. Observar de forma camarada as exposições contrárias à nossa leitura de terminados aspectos, entendendo em que momento estamos como militância, para evitar um espírito belicoso que se herdou de toda movimentação anormal nas redes sociais durante o auge da cisão.
Por outra parte, participar desse processo é importante inclusive por conta das ventilações de um racha dentro do racha (não no nosso congresso, mas em algumas tribunas) por se entender que estas divergências são basilares para a construção do novo partido, como já apontado em outras tribunas, é explícito que parte da militância acompanha o racha por motivos organizativos e não por divergência da linha política dos pontos a seguir: abordagem ortodoxa do Marxismo-leninismo, MCI (caracterização atual República Popular da China), setores estratégicos e as formulações anti-opressões.
A formação e tempo para se depurar sobre assuntos sensíveis como a caracterização do perfil do proletariado, das áreas estratégicas e do movimento comunista internacional (o mote para cisão) não permitiram uma discussão qualificada ou profunda. Algumas poucas formulações e mais nada. Tivemos poucos militantes abordando esses temas e quando se instituía a discussão a resposta principal era “não tenho acumulo sobre o tema”, algo natural para uma juventude que ainda está no processo de formação política. Por outro lado, a pouca contribuição da militância de base e direção intermediária da Bahia nas tribunas, salvo a exceção de duas tribunas, é também outra face da expressão dessa baixa formulação sobre esses temas.
Finalmente, é importante tanto a fomentação da reflexão sobre as escolhas políticas, o balanço do último período, quanto da formulação e contribuição no debate público pelas direções políticas, a fim de demonstra explicitamente o caráter da cisão e a disposição em superar os desafios apontados. Dado que a esquerda radical brasileira desde a consolidação do PT como centro gravitacional da esquerda moderada, sua conquista do governo e o processo de despolitização das massas, vem enfrentando um processo de fragmentação e cisões. É a falta de poder criar sínteses e superar contradições, mas causas de cisões podem ser variadas e conectadas. O balanço na Bahia é necessário pra se buscar estabelecer qual a caracterização de fato dessa cisão: democracia interna, disputas de figuras públicas, conchavos, revisionismos, abandono do marxismo-leninismo etc.
Como essa cisão se encaixa no cenário global das cisões contemporâneas nos PC’s e no MCI, ao mesmo tempo, nas cisões provocadas pela agudização que vem desde junho de 2013 e perpassa pelo golpe de 2017 até o apogeu do bolsonarismo. Fazer essa reflexão é importante, cisões geram outros conflitos que não são resolvidos no ato de rachar. Como por exemplo os acordos no último congresso de um grupo com outro com fim de manter a unidade partidária e o aroma do desejo de um grupo de barrar a ação de certas lideranças para manter uma hegemonia artificial sobre o partido. Essa sombra está aqui principalmente em SP, dado algumas tribunas e debates sobre a forma de condução de certos processos. Ou seja, há muitos pontos em aberto para serem fechados. Não considerar a tendência nos partidos e organizações da esquerda radical, de centralismo democrático ou de tendência, de racharem nos últimos 20 anos, por motivos diametralmente diferentes dos século passado, é reduzir os motivos do racha atual do PCB e de construir uma alternativa coerente.
Atualmente, temos contradições que já se mostram firmes nas tribunas e nos congressos, principalmente em relação a caraterização do Estado Chinês, ao ecletismo teórico e aos setores estratégicos. Disso tiramos que ou conseguiremos no caminhar fazer sínteses ou acharemos normal parte da militância que agitou para congresso por avaliar questões mais à nível organizativo e desvios do centralismo democrático, porém tem visões próximas ao ecletismo teórico e caracterização do Estado Chinês ou negam o interimperialismo deixem o partido, como apontado em algumas tribunas, ou seja, não se tem o esforço de produzir sínteses e se fragmenta mais e mais em organizações menores.
Não havendo outro canal de difusão interno com a capacidade das tribunas, fica a intimação ou convite aos camaradas da Bahia que promovam esse ambiente de estudo e formulação política sobre a nossa realidade política e realidade concreta, a fim de contribuir para a construção do congresso e da firmeza político-ideológica. As tarefas imediatas devem ser tocadas, mas o momento em que estamos é de formulação sobre a base, o documento sintético, que dará sustento ou não ao futuro do PCB-RR (ou como propomos alguns PCBR).
Deixo duas citações do Mao Tsetung, a primeira em suas teses para IX Congresso da Organização do Partido no IV Corpo do Exército Vermelho no tópico contra o subjectivismo: “1) ensinar os membros do Partido a fazerem análises da situação política e a apreciarem as forças das classes segundo o método marxista-leninista, em vez de procederem a análises e a apreciações subjectivistas; 2) atrair a atenção dos membros do Partido para as investigações e estudos económicos e sociais, com vistas à determinação da táctica da luta e dos métodos de trabalho; fazer compreender aos camaradas que, sem uma investigação sobre a situação real, eles embrenham-se no abismo das imaginações vãs e da aventura; 3) na crítica dentro do Partido há que saber guardar-se do subjectivismo, da arbitrariedade e da banalização da crítica; todas as afirmações devem basear-se em factos e a crítica deve ter um sentido político.”¹.
A segunda citação está no texto a Oposição ao Culto de Livros: “Esta é a única maneira para chegar perto da verdade, a única maneira de tirar conclusões. É fácil cometer erros se tu não realizares reuniões de apuração dos fatos para a investigação através de discussões, mas simplesmente confiar em um indivíduo que relate sua própria experiência. Tu não podes tirar conclusões mais ou menos corretas em tais reuniões se colocar questões casualmente em vez de levantar questões-chave para discussão.”². São pequenos fragmentos que não dispensam a leitura geral e contextualizada junto da pergunta em que esse texto pode ser útil à nossa realidade?, dito isto, o balanço sobre os últimos meses e o processo e, ao mesmo tempo, o estudo da realidade local e a formulação a partir dele são indispensáveis para os próximos passos, sejam quais forem.
Referências
[1] <https://www.marxists.org/portugues/mao/1929/12/elimina.htm#i5>
[2]<https://www.marxists.org/portugues/mao/1930/mes/livros.htm>