UERJ: Ocupação de 57 dias foi encerrada com violência policial, prisões arbitrárias e intransigência da reitoria
O estopim foi a implementação do Ato Executivo de Decisão Administrativa 038 (AEDA), chamado pelos estudantes de "AEDA da Fome", que cortou em 46% as bolsas de assistência estudantil, essencial para a permanência dos alunos mais vulneráveis.
Por Redação
A Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) foi ocupada por 57 dias, com uma mobilização massiva dos estudantes iniciada em 26 de julho. O estopim foi a implementação do Ato Executivo de Decisão Administrativa 038 (AEDA), chamado pelos estudantes de "AEDA da Fome", que cortou em 46% as bolsas de assistência estudantil, essencial para a permanência dos alunos mais vulneráveis.
O impacto devastador do AEDA 038 nas bolsas e a traição da reitoria
O "AEDA da Fome", decretado pela reitoria durante as férias, atingiu diretamente estudantes de baixa renda e aqueles dos campi externos ao Maracanã, que não possuem bandejão. Para esses estudantes, as bolsas representam a única forma de garantir a continuidade dos estudos. Sem qualquer diálogo com a comunidade universitária, a reitoria de Gulnar Azevedo e Bruno Deusdará, impôs essa medida absurda que ameaça expulsar uma grande parcela de alunos da UERJ. A gestão, ligada a setores do PSOL e PT, foi eleita com a promessa de não cortar auxílios e de promover maior transparência nas contas da universidade — uma promessa agora visivelmente quebrada.
A campanha de Gulnar criticava a gestão anterior, de Ricardo Lodi, também ligado ao PT, pela falta de transparência em sua gestão e pelos indícios de corrupção. Lodi havia implementado alguns auxílios a técnicos e estudantes e Gulnar defendia a manutenção desses benefícios, mas não se posicionava contra o financiamento privado da universidade pública, deixando em aberto qual caminho seria seguido para garantir o orçamento necessário à universidade e expondo uma enorme fragilidade em seu projeto, suscetível aos interesses privados e do governo estadual.
A crise orçamentária e a postura covarde da reitoria
A UERJ, sob o regime de recuperação fiscal imposto ao estado do Rio de Janeiro, viu seu orçamento ser estrangulado, obrigando a administração da universidade a realizar adiantamentos de pagamentos, com a evidente consequência de um colapso financeiro iminente. Gulnar e Deusdará, incapazes de enfrentar o governo estadual, preferiram manter uma postura “republicana e democrática”, o que, na prática, significou omissão diante dos ataques contra a educação pública. Se por um lado, o governo Castro demonstrava sua intenção de seguir o sucateamento da universidade pública, como com a nomeação do deputado Anderson Moraes (responsável por tentar fechar a UERJ em 2021) como novo secretário de Ciência e Tecnologia, a reitoria se omitiu de posicionamentos e críticas a respeito, demonstrando incapacidade de proteger a instituição e os estudantes.
O início da ocupação: resistência contra a fome e a repressão
A ocupação da reitoria foi uma resposta organizada pelos estudantes para barrar a destruição das condições de permanência estudantil. Com o anúncio do AEDA 038, os alunos se viram sem alternativa. Sem as bolsas, muitos seriam forçados a abandonar a universidade. A ocupação, iniciada em 26 de julho, escancarou a realidade: a reitoria está mais preocupada em manter uma aparência de boa relação com o governo do que em garantir a permanência dos estudantes.
Desde o início, a postura da reitoria foi de repressão e criminalização do movimento. Ao invés de dialogar, Gulnar Azevedo tentou sufocar a ocupação, utilizando da segurança privada para agredir estudantes, bloquear o acesso de alimentos e barrar a entrada de apoiadores. Mesmo assim, os estudantes resistiram e ocuparam o campus Maracanã. Sua luta, legítima e necessária, expôs a fraqueza de uma reitoria que se diz progressista, mas que na prática age com autoritarismo e desprezo pelas demandas dos estudantes mais pobres.
Vitórias parciais e a traição dos aliados da reitoria
A mobilização forçou o governo estadual a realizar um repasse de R$150 milhões para a UERJ. No entanto, a reitoria, mais uma vez, mostrou sua face traiçoeira ao não destinar o valor integralmente para as bolsas estudantis, mantendo assim o risco da evasão em massa de alunos. Além disso, no Conselho Universitário, onde se debateria a revogação do AEDA 038, a reitoria encerrou a sessão às pressas, sem dar a oportunidade para os estudantes apresentarem suas demandas.
Para agravar a situação, setores da gestão “A UERJ vale a luta” do Diretório Central dos Estudantes (DCE) e alguns Centros Acadêmicos ligados ao PT (Coletivo Cria e Rio vale a luta), PCdoB e Levante articularam com a reitoria uma proposta de "transição" que ignorava completamente as demandas da ocupação, passando por cima das deliberações legítimas do movimento e dos estudantes mais afetados pelos cortes. Essa atitude lembra a postura do PROIFES, que, durante a greve das universidades federais, passou por cima da mobilização da categoria e dos sindicatos com maior representatividade e aceitou a proposta do governo, traindo o movimento docente.
A escalada da repressão: segurança privada e tropa de choque contra os estudantes
Com o acordo ilegítimo construído entre a reitoria e seus aliados no movimento estudantil, a ocupação continuou, buscando que a pauta da revogação do AEDA 038 fosse atendida. Em vez de buscar soluções para a crise, a reitoria optou pela repressão violenta. No dia 17 de setembro, Gulnar e Deusdará entraram com um pedido de reintegração de posse na justiça, exigindo uma multa absurda de R$10.000 por dia para estudantes ocupantes, além de solicitar o uso da força policial. No dia 19 de setembro, a reitoria enviou seguranças particulares para tentar desarticular a ocupação, mas sem sucesso. Mesmo assim, houveram novas cenas de violência, com estudantes sendo agredidos por esses seguranças. No dia seguinte, 20 de setembro, a Tropa de Choque da Polícia Militar do Rio de Janeiro foi chamada. A brutalidade policial foi imensa, e a universidade, que não havia presenciado tamanha repressão nem mesmo durante a ditadura militar, viu três estudantes e o deputado Glauber Braga (PSOL/RJ) serem presos de maneira arbitrária. Todos foram liberados ao final do dia, mas a violência utilizada manchou para sempre a história da UERJ.
A luta continua: derrubar o AEDA 038 e reverter os cortes
O uso da violência policial foi efetivo para encerrar a ocupação, após 57 dias de resistência. No entanto, os estudantes continuam mobilizados e vigilantes. A intransigência da reitoria, que se recusa a negociar com aqueles que lutam pelo direito de concluir seus cursos, só fortalece a disposição do movimento estudantil. A máscara de "democráticos" e "progressistas" da gestão de Gulnar e Deusdará caiu por completo, revelando seu autoritarismo e conivência com os ataques à educação pública.
A União da Juventude Comunista e as demais organizações do movimento estudantil verdadeiramente comprometidas com a luta pela permanência estudantil seguirão em luta até que o AEDA 038 seja revogado e os recursos sejam destinados à manutenção das bolsas de permanência. A resistência estudantil desmascarou os setores que fingem defender os estudantes, como as organizações ligadas ao DCE, e expôs a falência de uma reitoria que, longe de defender a educação pública e seus alunos, segue a mesma visão de que Cláudio Castro, que já disse que “Não dá para a UERJ ficar pagando para estudarem lá”.
A luta da ocupação da UERJ é uma luta pela garantia de que a classe trabalhadora poderá cursar uma universidade pública e gratuita, com direito a políticas de permanência estudantil. Foi através da mobilização ao longo de décadas que a assistência estudantil foi conquistada e será através da mesma mobilização que a assistência estudantil será mantida e ampliada.