'Devemos abandonar a Foice e Martelo? A estética brasileira' (Silas Adriano)
A estética é forma de representar a cultura e os anseios de um povo em seu contexto histórico, por conta disso devemos questionar o motivo de reproduzirmos excessivamente o alfabeto cirílico soviético, os pôsteres da década 30 e 40 ou até mesmo a logo de nosso partido.
Por Silas Adriano para a Tribuna de Debates Preparatória do XVII Congresso Extraordinário.
Gostaria de abrir esse texto relatando uma experiência pessoal que me ocorreu. Recentemente havia postado uma imagem no Twitter como resposta ao texto “Rever e discutir o Artigo 2”, a imagem era a logo do martelo, facão e a flecha, popularizado pelo Don L, misturado com a bandeira do M 26 de julho de Cuba. A minha caixa de notificações ficou lotada por comentários revoltosos. A maioria de anarquistas criticando os comunistas por se apropriarem da bandeira preta e outros por membros do velho PCB que não perdem a oportunidade para atacar militantes de forma covarde. Pois bem, isso me fez pensar na discussão sobre estética comunista e como ainda a um eterno luto pela União Soviética e, ao mesmo tempo, um abandono ao que poderia ser a estética revolucionaria brasileira.
Não é polemica nenhuma afirmar que os comunistas brasileiros se tornaram eternos colonizados pela historicidade europeia no sentido que todo comunista pode citar na ponta da língua sobre comuna de Paris, sobre Stalingrado, sobre guerra civil russa e entre outros, porém são poucos o que podem falar sobre Burkina Faso, sobre resistência coreana contra EUA, sobre processo revolucionário do Vietnã, sobre cabanagem, a revolta dos males, revolução haitiana ou sobre debate da reivindicação de Zumbi dos Palmares como revolucionário de seu tempo. Esse eurocentrismo também é reproduzido nas escolas, quando vamos aprender sobre socialismo vemos a União Soviética e suas lideranças, mas nada é dito sobre comunistas brasileiros, latinos ou africanos. Existe uma não reivindicação a historicidade revolucionaria do povo brasileiro. Não podemos virar às costas para expressões culturais cotidianas e não enxergar uma roupagem revolucionaria.
No Brasil tivemos a perseguição as religiões de matriz africanas que até hoje seguem resistindo a todo ataque racista, o samba que foi perseguido por ser considerado “vadiagem” (crime esse criado após o fim da escravidão) e que algum tempo depois foi apropriado pela ditadura do estado novo de Getúlio Vargas. O Rap e o hip-hop nacional que nunca perdeu a veia política de resistência, o cinema de Glauber Rocha e Zózimo Bulbul. Nos comunistas vamos virar às costas para nossa história de luta e rebeldia? É mais do que certeza de que tem muitos artistas (a maioria jovens) que está sedento de vontade de construir um movimento rebelde, afrontoso ao senso comum burguês e que reivindique a cultura brasileira. Reivindicar a nossa história e dizer que a escravidão acabou pelas lutas do povo escravizado, apontar o dedo a hipocrisia de que Brasil é um país pacifico e que nunca entrou em guerra, o Brasil está em guerra contra seu próprio povo dês da invasão colonial portuguesa.
Isso vem mudado nos últimos cinco anos, mas ainda estamos caminhando lentamente para um progresso. Os intelectuais brasileiros (tanto comunistas quanto liberais) sempre reagiram ao que estava sendo debatido no cenário internacional ocidental, ao mesmo tempo que características culturais e históricas do Brasil eram esquecidas pelos ditos pensadores nacionais. Isso resultou que luta pelas principais pautas do povo brasileiro estava sendo pensada e expressada pelos artistas do rap, do movimento mangue beat ou por escritores fora da universidade.
Esse esquecimento acadêmico está hoje presente no PCB-CC. Não acho que seja coincidência que esse debate tenha aflorado nas instâncias do PCB-RR, o qual a maioria é não acadêmica.
A estética nacional comunista faz parte do processo revolucionário de qualquer país. As revoluções africanas tiveram sua estética, as revoluções na Ásia e na América Latina tiveram sua estética. A estética é forma de representar a cultura e os anseios de um povo em seu contexto histórico, por conta disso devemos questionar o motivo de reproduzirmos excessivamente o alfabeto cirílico soviético, os pôsteres da década 30 e 40 ou até mesmo a logo de nosso partido. Devemos questionar.
A foice e o martelo foi um símbolo histórico dos revolucionários em todo globo. Hoje o socialismo está se reconstruindo depois da queda da União Soviética e da agressão do “fim da história”. O socialismo está voltando a ser uma alternativa e agora demos pensar em como comunicarmos essa alternativa ao povo brasileiro.
Queremos que todos os povos aqui no Brasil possam olhar para revolução como a única saída para um futuro melhor. Para isso devemos nos comunicarmos não só em nosso discurso, mas também em como nos apresentamos artisticamente.
Eu defendo repensar a foice e o martelo. Não para negar sua importância histórica, mas para construir uma alternativa histórica brasileira.
Na minha opinião, o facão (representa os camponeses que lutam pela reforma agraria), o martelo (os trabalhadores urbanos explorados não só pelos seus patrões, mas também pela forma como cidade é pensada) e a flecha (a luta histórica dos povos indígenas) seria uma imagem nacional brasileira a ser considerada. Queremos construir um partido que leve no nome a luta: o partido da revolução brasileira (PRB) ou partido dos trabalhadores revolucionários (PTR).
Deixo também um adendo. Muitas vezes os partidos comunistas deixaram de lado símbolo histórico comunista alegando que era algo do passado ou que não representava a nação em si. Usavam o argumento do anacronismo na política atual para o abandono de certas imagem e expressões. Esse argumento era usado para esconder o abandono da revolução e do Marxismo-Leninismo. Não devemos abandonar a revolução brasileira e o Marxismo-Leninismo, mas pensar o Brasil e revolução brasileira.
É engraçado que PCB-CC esteja gradualmente abandonado as suas bandeiras ao mesmo tempo que mantêm a foice e o martelo.
Para derrotar a burguesia e fazer a revolução proletária, precisamos conhecer o Brasil e radicalizar o nosso povo com sua própria história e expressões.
Por uma estética comunista nacional brasileira e Marxista-Leninista.