Tarcísio e Feder querem fechar 96 turmas no estado de São Paulo
O governador do estado de São Paulo, Tarcísio (Republicanos), planeja fechar 96 turmas de Ensino Médio e Educação de Jovens e Adultos (EJA) do período noturno no próximo ano. O projeto rememora a proposta de Alckmin em 2015 e a "Primavera Secundarista" que barrou a proposta.
Por Redação
O governador do estado de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), planeja fechar 96 turmas de Ensino Médio e Educação de Jovens e Adultos (EJA) do período noturno no próximo ano. O sindicato dos professores da rede estadual, APEOESP, já identificou que ao menos 38 escolas de 25 cidades foram notificadas do fechamento das salas.
O Secretário de Educação, Renato Feder, não apresentou os dados que justificam o fechamento das turmas, mas disse que foi constatada uma queda de demanda pelo ensino noturno, como resultado da expansão da escola de tempo integral. Membros da comunidade escolar afirmam que a demanda não diminuiu, mas houve uma mudança na regra para quem pleiteia uma vaga nestas turmas.
Em agosto, o próprio Feder publicou uma resolução que diz que “a comprovação do exercício das atividades/condições que constam neste artigo, a fim de garantir vaga no período noturno, deverá ser atualizada semestralmente”, em referência a comprovação de que o aluno está trabalhando durante o dia.
Na verdade, a resolução tem como intuito excluir uma parcela da população de acessar o ensino médio e o EJA, dado que a grande maioria destes alunos são trabalhadores informais e não conseguem o documento de comprovação exigido na resolução. Isso quando não acabam rotacionando entre trabalhos de maneira muito rápida, por contas dos bicos, e pela maneira como o mercado de trabalho impõe a utilização do exército industrial de reserva.
Algumas escolas foram informadas ao longo dos últimos meses, houve alguma mobilização e a Secretaria de Educação recuou no fechamento de algumas turmas, porém, o projeto ainda se mantém e irá avançar ainda mais no ano que vem. A secretaria ainda justificou que os alunos ainda poderão ser transferidos para outras escolas, com transporte garantido se residirem a uma distância maior que 2 km da unidade escolar.
Os paralelos entre Tarcísio e Alckmin
Há 9 anos atrás, o atual vice-presidente do Brasil, Geraldo Alckmin, quando foi governador do estado de São Paulo, ocupando a mesma posição que Tarcísio ocupa hoje, propôs uma “reorganização escolar” que implicaria no fechamento de quase uma centena de escolas estaduais. O que vemos hoje na proposta de Tarcísio é uma repaginação da mesma política, a de desmonte do ensino público, como justificativa para entrada do setor privado na área da educação.
Da mesma forma que na proposta de Feder e Tarcísio, o então governador Alckmin e o seu secretário, Herman Voorwald, defendiam a ideia de que isso melhoraria o ensino público, separando as unidades de ensino por ciclos. Eles também justificaram que alunos que passassem a ficar mais longe das suas unidades, teriam a possibilidade de ter a garantia do transporte. Porém, em um cenário real, o transporte público hoje (e naquela época também) não consegue ter trajetos e linhas que permitam um bom deslocamento dos alunos até as escolas, os ônibus são de péssima qualidade e as taxas cobradas pelas empresas são abusivas. Além disso, desconsiderava a realidade de pais que tinham filhos em ciclos diferentes e teriam que percorrer trajetos mais longos para deixar seus filhos nas escolas.
Como no projeto apresentado hoje por Tarcísio, Alckmin e Voorwald não abriram diálogo com a comunidade escolar e impuseram seu projeto sem nenhum debate ou consulta pública. O projeto de Alckmin foi tão antagônico à classe trabalhadora que desconsiderava, por exemplo, o impacto que teria nos trabalhadores terceirizados da merenda e da limpeza, que provavelmente seriam demitidos. O projeto também abriria brecha para a implementação de parcerias público-privadas.
O legado da “Primavera Secundarista”
À época, o movimento secundarista se mobilizou e ocupou mais de 200 escolas da rede pública paulista, no episódio que ficou conhecido como “Primavera Secundarista”. O ano de 2015 foi marcado também por uma greve de três meses dos professores do estado de São Paulo e do Paraná. E apenas três meses depois do fim desta greve, a Secretaria de Educação de SP anunciou seu plano de fechamento de escolas.
Entre setembro e outubro, houveram diversos atos e manifestações contrários, com diversas críticas contundentes ao projeto e a maneira de implementá-lo. No dia 29 de outubro de 2015 foi divulgada a lista de escolas atingidas pelo plano governamental e que seriam fechadas. Apenas algumas semanas foram suficientes para provocar nos secundaristas um movimento de ocupação de escolas pelo estado. A primeira escola ocupada foi a E.E. Diadema e no dia seguinte a E.E. Fernão Dias Paes, na zona oeste de São Paulo.
Em movimento articulado junto às entidades estudantis, partidos e movimentos sociais, a cada dia mais escolas eram ocupadas. Houveram inclusive ocupações em escolas de outros estados, em apoio à luta dos secundaristas paulistas. As ocupações eram totalmente organizadas pelos secundaristas, que cuidavam da limpeza da escola, faziam almoços comunitários e contavam com o auxílio de apoiadores para as tarefas de segurança externa, por exemplo, e diálogo com a força repressora.
As ocupações também tinham calendário de atividades de formação política, debate e assembleias sobre os rumos das ocupações, atividades de recreação, entre outras. As lideranças das ocupações também constituíram uma rede de fortalecimento entre cada escola ocupada, conseguindo trazer uma tática de unidade entre todas as escolas.
E hoje, dia 4 de dezembro, marca 9 anos do dia da vitória do movimento secundarista contra a “reorganização escolar”, 42 dias após a apresentação do projeto. Neste dia, o governador Alckmin anunciou a suspensão do projeto e o secretário Voorwald entregava seu cargo. Os secundaristas ainda mantiveram a ocupação por mais algumas semanas a fim de obter garantias reais quanto à suspensão do projeto.
Os paralelos entre os projetos são nítidos, salvaguarda a mudança de conjunturas, até mesmo pela forma como foi proposta e os objetivos nefastos que ficam nas entrelinhas e não são falados publicamente. De fato, ambas propostas buscam responder unicamente aos interesses do setor privado.
Mas também o legado do movimento secundarista de 2015 nos deixa perspectivas de luta contra este projeto e outros que afetam diretamente a educação, como os projetos de privatização, leilão e militarização de escolas. Também é importante notar que, como em 2015, os estados que têm sido os “laboratórios” desses projetos políticos têm sido São Paulo e Paraná.
A “Primavera Secundarista” nos deixou lições e táticas de luta importantes para o enfrentamento, combate e reorganização da luta dos trabalhadores brasileiros contra o avanço do projeto neoliberal.