'Somos oposição?' (P.A.)

Tivemos 5 meses para colocar todos os nossos esforços em denunciar a política fiscal de Lula, para deixar claro que ela era a continuação objetiva do que havia de mais central e fundamental na política de Temer e Bolsonaro

'Somos oposição?' (P.A.)
"Lula não está em disputa, nosso papel não é disputar os rumos do governo e, muito menos, nosso papel não é poupar o governo"

Por P. A. (UJC-SP) para Tribuna de Debates Preparatória do XVII Congresso Extraordinário.


[Terminei de escrever essa tribuna no dia 1/7/23, alguns dias depois de meu núcleo ter recebido o 2º volume do Caderno de Debates da UJC, pensando que este seria publicado no 3º volume, que até hoje não desceu. Desta maneira, algumas coisas aqui podem parecer redundantes visto que muitas coisas foram finalmente expostas à militância. O único motivo de enviar esse texto para as tribunas do XVII Congresso é pelo detalhamento da leitura das notas do partido que tinham até então sido lançadas e pelos dados sobre os atos que tínhamos composto até então, de forma que essa tribuna, apesar de não introduzir nenhum tema ou denúncia nova, pode ser importante para detalhar algumas coisas. Perceberão que não falo explicitamente dos oportunistas ou da ala direita do partido etc, pois na época em que escrevi, o debate ainda não estava se dando nesses termos. Isso tudo posto, segue a tribuna tal qual a escrevi dia 1/7.]

Camaradas, gostaria de iniciar saudando a iniciativa da CEN ao publicar a circular CN/UJC Nº 027/2023 “Carta ao Comitê Central do Partido Comunista Brasileiro e à militância da União da Juventude Comunista” e a circular da CR/UJC-SP “Carta da CR/UJC-SP ao comitê central do PCB” que acredito eu deveria circular nacionalmente, caso ainda não esteja. Por fim, gostaria de parabenizar a excelente tribuna que o camarada Danilo B enviou no volume anterior (2º) e reitero todas as demandas que o camarada faz. Agora, à tribuna!

Camaradas, é gritante para toda a militância a morosidade do CR/PCB-SP e do comitê central (CC) em se pronunciarem e mobilizarem o complexo partidário para realizar uma oposição consequente ao governo Lula-Alckmin. Foram poucas e atrasadas as notas, com poucas ou nenhuma diretivas. Sem que qualquer decisão tenha sido explicitamente tomada nesse sentido, o complexo partidário, por inercia, está adotando na prática uma posição rebaixada e de não oposição ao governo Lula-Alckmin e a todos os ataques que este vem operando de maneira virulenta contra a classe trabalhadora brasileira.

Vamos aos fatos. Estruturei o texto da seguinte maneira, primeiro colocarei algumas citações centrais das notas do CC neste semestre e, em seguida, passarei à crítica (negritos são todos meus).

Notas

- Comitê Central do PCB, 8 de fevereiro de 2023, “os rumos da luta de classes sob o governo Lula-Alckmin”.

“O cenário atual exigirá dos comunistas um esforço redobrado na luta ideológica, a fim de preservar e fortalecer a independência de classe do proletariado em sua luta cotidiana. É preciso abordar de modo particularmente minucioso, perseverante e paciente os limites do projeto de conciliação de classes e a atualidade da estratégia socialista revolucionáriainclusive no que diz respeito a um combate classista e consequente ao golpismo.”

“[...] Por isso mesmo, acreditamos que é hora de reforçar a mobilização e a organização da classe trabalhadora e do povo oprimido, e não apenas deixar nas mãos do governo um cheque em branco.“

“[...] O cenário atual permite um espaço mais amplo para nossa agitação e propaganda contra o capitalismo e os limites da democracia burguesa, colocando no primeiro plano a necessidade de superar as ilusões e as armadilhas da conciliação de classes – evidenciadas, entre outros aspectos, no embate entre os anseios e necessidades históricas da classe trabalhadora e os interesses do “mercado”.”

“[...] É preciso diferenciar a perspectiva proletária do combate ao golpismo das perspectivas burguesas – que, na verdade, buscarão no reforço da repressão estatal e da criminalização da luta social a solução para a crescente instabilidade política nacional.”

“[...] O PCB, portanto, mantém-se firme em sua luta revolucionária contra o neoliberalismo e o modo de produção capitalista, entendendo que o combate à extrema-direita e seus intentos golpistas deve estar combinada necessariamente à luta em defesa de pautas sociais que possam superar esse cenário de miséria, desemprego, opressão e violência contra do povo trabalhador e avançar na superação desse modelo de sociedade, rumo à reorganização socialista da sociedade.””

- “Brasil: a luta de classes em campo aberto” de 25 de fevereiro de 2023, assinada pelo camarada Edimilson Costa, enquanto Secretário Geral:

“[...] Essas políticas deverão gerar um grande alívio na parcela mais pobre do povo e conseguirá no primeiro momento apoio da maioria dos brasileiros, afinal ninguém pode ser contra combater a miséria e a fome. Assim, cria-se uma cortina de fumaça para não desmontar a política neoliberal, para não revogar as contrareformas, nem a política de austeridade fiscal e muito menos retomar para o setor público as empresas estatais privatizadas na bacia das almas. O que precisa ser dito é que as políticas de compensação social são apenas uma vitrine para que o governo possa manter os interesses básicos das classes dominantes na economia. [...]”

“[...]Em todos os momentos da história as massas se levantaram quando a situação chegou a um limite insuportável e esse limite está na ordem do dia no Brasil. Para tanto, é fundamental termos confiança nas bases objetivas para um processo de transformação social no Brasil.[...]”

“[...]É hora de arregaçar as mangas, fazer o trabalho de base nos bairros, nos locais de trabalho, moradia e estudo e transformar as bases objetivas das transformações sociais em movimento consciente na construção do poder popular e do socialismo. Esta não é uma tarefa que será realizada da noite para o dia, nem os comunistas têm uma varinha mágica para atingir seus objetivos. No processo de construção a militância tem que colocar o pé no barro para chegar ao coração das massas. Um bom exemplo de que o trabalho de base gera bons frutos pode ser observado nos dois principais movimentos sociais do país atualmente, o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) e o Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST). Precisamos ter humildade e recolher os ensinamentos da prática dessas organizações junto ao povo pobre e combiná-los com nossa centenária experiência de trabalho junto ao proletariado tradicional e buscar alternativas criativas de organização do novo proletariado, tanto aquele ligado às fronteiras tecnológicas quanto o precarizado nas plataformas digitais. [...]”

- Comissão Política Nacional (CPN) do PCB, 6 de abril de 2023, Pacote fiscal de Haddad é rendição à agenda neoliberal da burguesia.

“É hora de a classe trabalhadora, unida às forças populares e aos movimentos sociais, se mobilizar em torno das lutas concretas contra as medidas burguesas de contrarreformas e retiradas de direitos e, ao mesmo tempo, construir um programa de mais largo prazo para romper com o sistema capitalista, a única forma de enfrentar a subordinação do país ao capital internacional e aos interesses da burguesia brasileira, realizando as medidas necessárias para a construção de uma economia planejada pelos e para os trabalhadores, rumo ao poder popular e ao socialismo.

Só a luta nas ruas e locais de trabalho combate o capital!

- Secretaria Sindical do PCB, 21 de maio de 2023, “Organizar a luta contra o novo teto de gastos!”

“Neste sentido, convocamos as trabalhadoras e os trabalhadores que já perceberam que estamos sendo convidados a assistir a um filme cujo roteiro já vimos, e cujo final é desastroso, para que possamos construir um novo rumo para a nossa história. É fundamental que os Fóruns e Frentes de Luta, compostos por sindicatos, movimentos populares e pela juventude, retomem sua organização e combatividade, pois já ficou mais do que nítido que o modo “deixa o homem governar” foi ativado.”

“[...]Para barrar e denunciar o “novo teto de gastos” ou até mesmo para reduzir os seus danos, será necessário ampliar e fortalecer as mobilizações por todo o país, com materiais nas ruas, nas redes, nos locais de trabalho, moradia e estudo e convocar os Fóruns e Frentes de Luta que realmente queiram pressionar o governo de plantão.”

“Além destas lutas emergenciais, reafirmamos nossa disposição para construirmos e debatermos estas e outras bandeiras em um grande Encontro Nacional da Classe Trabalhadora, com a participação de todos os sindicatos de trabalhadores do Brasil, dos partidos políticos ligados aos interesses da classe trabalhadora, dos movimentos populares e dos estudantes, com a maior brevidade possível e como fórum indispensável para o processo de reorganização da classe trabalhadora.”

Nota concluída com uma série de “lutar para isso e para aquilo”.

- Comitê Central do PCB, 5 de junho de 2023, “A saída para combater a crise e a ofensiva da burguesia é a luta popular”.

“Além dessas tarefas mais urgentes, é importante que o movimento sindical classista desenvolva esforços para realizar um Encontro Nacional das Classes Trabalhadoras (Enclat)[...]”

Crítica

Primeiro camaradas, no meio do ano passado, a militância do complexo partidário do PCB foi surpreendida pela assinatura pelo partido da “Carta às brasileiras e aos brasileiros em defesa do Estado Democrático de Direito”, um documento que homenageia como “mestre de todos nós” e bastião democrata um integralista de carreira, que aplaude a “secular democracia norte-americana” e condena como intoleráveis “as ameaças aos demais poderes e setores da sociedade civil e a incitação à violência e à ruptura da ordem constitucional”. Uma carta que colocava como objetivo maior e causa de unidade em última instância de todos os seus signatários a defesa do Estado democrático direito, devido a nossa grande “consciência cívica”.

A assinatura dessa carta pelo PCB foi tão inesperada e contraditória com tudo que defendemos em termos de crítica do Estado burguês, da democracia burguesa e de Poder Popular, que o núcleo do qual eu faço parte estava redigindo uma carta pública de crítica a esta carta quando foi pego de surpresa com essa notícia, veiculada até nós em tom de troça por uma militante do Juntos! Era já preocupante, e se confirma com os desdobramentos a serem aqui analisados, a assinatura de um documento absolutamente rebaixado, republicano, que defende uma ordem democrática que historicamente devasta a classe trabalhadora desse país.

Com a eleição de Lula e Alckmin, os ataques contra a classe trabalhadora não demoraram a começar, quando das notas de fevereiro aqui citadas o governo Lula-Alckmin já estava com todas as suas garrinhas de fora, Haddad não escondia a que vinha, Rui Costa defendia a modernização e o aumento dos investimentos nas forças armadas e atacava o ministro Carlos Lupi quando este mencionou alguma melhora na previdência; entre outras questões, tínhamos mais do que o suficiente (e conforme o tempo passou, cada vez mais tivemos) para pautar panfletagens, assembleias, rodas de conversa e manifestações etc, contra o governo, concretizando de fato uma denúncia das limitações do PT e do fato de que este é um governo burguês que apoiamos no segundo turno porque não havia alternativa melhor numa eleição atípica.

Estas notas de fevereiro, como todas as outras, nada têm de propositivo, além de algumas frases genéricas sobre “mobilizar, criticar, construir etc” (algumas das quais negritei nos trechos acima reproduzidos). Somente nas notas de 6 de abril e de 21 de maio, dois dias antes da aprovação na câmara do novo arcabouço fiscal, que o CC vem a público comentar sobre o tema e, nelas, novamente, faz uma análise de conjuntura, coloca algumas críticas ao governo e às esquerdas e, novamente, não põe nada de concreto, e o padrão se repete na nota seguinte. O que há de mais “concreto” em algumas notas é o apelo a um Encontro Nacional da Classe Trabalhadora (ENCLAT), evento esse que, tendo em vista a conjuntura de derrota e desmobilização do movimento sindical há anos, tem a mesmo concretude de apelos ao povo para que se arme. Inclusive, é absurdamente contraditório da parte da CE-UC/SP e do CR-PCB/SP que, tendo em vista essa já antiga (e congressual) pauta do PCB (a ENCLAT), escolham sair na chapa do PT para a APEOESP, da Bebel, notória burocrata da categoria que nada constrói em termos de mobilização.

Desta maneira, camaradas, se a militância se encontra carente de boas análises de conjuntura, opções não faltam por aí (eu, particularmente aprecio as entrevistas do professor Vladimir Safatle). O papel de um comitê central não pode ser limitado a produzir análises de conjuntura, não deve ser mais um intelectual (ou corpo de intelectuais) que publica suas opiniões sobre a conjuntura, entre tantas outras que circulam por aí. O CC deve partir das análises de conjuntura que realiza para tirar encaminhamentos, diretivas concretas para que o partido possa agir. Deve dirigir o conjunto do complexo partidário com encaminhamentos claros e objetivos para a construção de uma oposição consequente e bem demarcada com o governo Lula à nível nacional, além de garantir a execução prática desses encaminhamentos.

Tivemos 5 meses para colocar todos os nossos esforços em denunciar a política fiscal de Lula, para deixar claro que ela era a continuação objetiva do que havia de mais central e fundamental na política de Temer e Bolsonaro, para denunciar concretamente – por meio de grandes campanhas de panfletagem, assembleias, rodas de conversa e por toda uma infinidade de táticas (que não chegaram nem perto de serem organizados pelo CC e pelo CR-SP/PCB) – que o governo Lula, em tudo que é fundamental, é uma continuação de tudo que veio desde o golpe de 2016.

Na cidade de São Paulo, se não me esqueço de nada, tivemos 6 atos gerais, um mais atrofiado do que o outro. O primeiro “Ato pela redução da taxa de juros e Fora Campos Neto (21/3/23)” contava com algo em torno de 100/150 pessoas, ficou estacionado em frente a sede do Banco Central na Paulista e foi composto majoritariamente por centrais sindicais, uma com uma linha mais oportunista e rebaixada que a outra. Toda a representação do complexo partidário do PCB nesse ato foram eu e uma camarada do meu núcleo, ambos sem qualquer experiência sindical, sem qualquer orientação decente. Nenhum militante do PCB ou da UC estava presente e o ato ficou tomado por uma linha no sentido de “Campos Neto, deixa o Lula governar”. Inclusive, a sondagem foi feita na noite anterior ao ato, o que dificulta ainda mais qualquer mobilização da militância, para não falar das bases. É mais que preocupante que, num ato sobre a questão mais fundamental do governo e da luta de classes no país até então, somente DOIS militantes estivessem presentes, ambos da juventude.

O segundo foi um ato dia 1/4 em memória às vítimas da Ditadura Militar e do COVID, em frente ao Memorial da Resistência, junto da Frente Povo sem Medo e da Articulação Povo na Rua, sobre o qual não consegui averiguar detalhes.

O terceiro ato, ocorrido dia 30/05, foi o trancasso de rodovia em resposta ao marco temporal, nele, novamente, havia quase ninguém do complexo partidário: dois militantes da UJC e um do partido, sem grandes orientações e sem qualquer peso político efetivo.

O quarto ato foi contra o Marco Temporal no Teatro Municipal (12h, 7/6). Foi num local e data ruim, no meio da semana e contou praticamente só com militantes de várias forças. Novamente, o complexo partidário foi representado somente por militantes da juventude (ou que tem sua atuação focada nela, apesar de comporem o partido), os quais, ainda assim, foram só 9.

O quinto ato, contra o arcabouço fiscal e o marco temporal (13/6 no MASP), foi chamado no dia 10/6, num sábado, com pouquíssima antecedência e num fim de semana. Apesar disso, fomos o maior bloco (em torno de 100 pessoas de todo o complexo partidário), mas em um ato pequeno, somente com gente organizada, sem independentes e completamente hegemonizado pelo PSTU.

O sexto ato ocorreu dia 22 de junho, sondado com a costumaz falta de antecedência. Foi um ato pela inelegibilidade de Bolsonaro e por sua prisão, um ato com duração prevista de uma hora em frente ao TRE, com uma pauta que hoje está longe de ser central na luta de classes brasileira e, novamente, foi um ato nada impactante. Essa pauta, tomando Bolsonaro como bode expiatório, simula uma posição combativa contra o fascismo e a burguesia por uma via absolutamente legalista e acaba por ignorar o combate real ao fascismo, o qual deve ser centrado na mobilização da classe trabalhadora contra a carestia e os ataques que sofre, rumo a construção do Poder Popular, combate do qual nos ausentamos completamente no primeiro semestre de 2023. Inclusive, é comum ver esse hiperfoco na prisão de Bolsonaro e dos golpistas nas posições das juventudes do PSOL nos espaços de movimento estudantil, seguidas de uma série de posições vacilantes sobre os ataques do governo Lula-Alckmin e de uma retumbante ausência de construção de um trabalho consequente. Não podemos nos limitar a esse pânico legalista focado na prisão de algumas figuras fascistas, pânico esse pequeno-burguês, ansioso para que o “incivilizado” seja expurgado da vida pública. Deixo, inclusive, uma passagem das resoluções do XVI Congresso do PCB:

Programa de Lutas para implementação da estratégia socialista no Brasil;

81) [...] Descolada dessa luta [contra os ataques da burguesia às condições de vida do proletariado], a defesa das liberdades democráticas se converte em uma pauta abstrata, afastada dos problemas cotidianos das massas e incapaz de mobilizá-las em um sentido revolucionário.”

Ou seja, até realizamos alguns atos, todos pequenos, tanto em número de militantes nossos quanto em número de base independente, o que sugere que eram atos meramente simbólicos, que não refletiam qualquer trabalho político verdadeiro dos partidos com a classe trabalhadora sobre essas pautas.

Poderíamos, neste importante semestre, ter sido a única força política na esquerda brasileira a de fato criticar na prática o governo Lula, apontando com coerência suas contradições. A insatisfação com as medidas do governo e com o PT de modo mais geral está espalhada por toda a classe trabalhadora, conseguimos um mar de recrutamentos após o primeiro turno das eleições ano passado por causa disso e, nesse semestre, poderíamos ter conquistado ainda tantos outros com um trabalho consequente e qualificado de crítica e mobilização contra o governo Lula-Alckmin, poderíamos ter ganho muita legitimidade e terreno político e avançado no trabalho de superação do PT e na construção de uma alternativa revolucionária ao PT, mas não o fizemos.

Nossa prática se mostra absolutamente descentralizada e contrária, inclusive, a nota do CC quando do resultado do primeiro turno, da qual deixo uma citação: “Temos absoluta convicção de que a profundidade da crise que estamos vivendo não pode ser resolvida buscando-se conciliar os interesses da burguesia com os dos trabalhadores, como propõe a candidatura petista. Sabemos que, mesmo derrotado eleitoralmente, o bolsonarismo não sumirá de cena, continuará sendo uma ameaça política à classe trabalhadora nos anos que virão, enquanto não seja desarmado e esmagado. Os métodos de conciliação não preparam a classe trabalhadora para enfrentar verdadeiramente a ameaça do golpismo burguês-militar, nem são capazes de pôr fim às crises econômicas e políticas que atravessamos, ao fortalecimento do chauvinismo e do militarismo no Brasil e no mundo. A resposta para essa crise é a construção do Poder Popular e a implementação de um programa anticapitalista e anti-imperialista, tarefa à qual o PCB e a nossa militância organizada e combativa se dedicará em todos os momentos no próximo período, aconteça o que acontecer. [...] Atuaremos para que a classe trabalhadora siga se organizando e pressionando o futuro governo em defesa dos seus interesses e para que as suas reivindicações sejam alcançadas, sem qualquer vacilação.

Deixo ainda três resoluções do já referido Programa de Lutas para implementação da estratégia socialista no Brasil do XVI Congresso do PCB (negritos e grifos meus):

44) [...] No atual quadro conjuntural algumas lutas ganham envergadura de se tornarem lutas unificadoras, tais como a luta contra as privatizações, pela reversão das contrarreformas trabalhista e previdenciária e pela revogação da emenda constitucional que instituiu o congelamento de gastos por vinte anos. Assim, devemos construir uma pauta de lutas unificadoras que envolvam amplos setores da sociedade e apontem para o ganho político, organizativo e concreto para a classe trabalhadora. [...];

81) No entanto, dada a complexidade da sociedade brasileira e do processo de construção revolucionária do socialismo, não podemos prescindir da participação nas lutas institucionais, com vistas a obter avanços possíveis no campo das liberdades democráticas, difundir as ideias socialistas e comunistas e também visando apoiar as lutas da classe trabalhadora contra a perda de direitos civis e sociais e para novas conquistas. Diante dos ataques da classe capitalista, urge às forças proletárias a luta em defesa das condições de vida e interesses materiais das massas exploradas, contra o aumento do custo de vida, o desemprego e todas as mazelas que assolam o proletariado. Descolada dessa luta, a defesa das liberdades democráticas se converte em uma pauta abstrata, afastada dos problemas cotidianos das massas e incapaz de mobilizá-las em um sentido revolucionário.;

84) Parte central das lutas no campo das liberdades democráticas é a construção do Poder Popular, como definido nas Resoluções do XV Congresso. A projeção das lutas no campo das liberdades democráticas e do poder popular deve apontar e lastrear a configuração da estrutura democrática da nova institucionalidade socialista que queremos construir revolucionariamente. Lutamos pela construção do Poder Popular, na forma de organizações independentes, a exemplo de como foram os sovietes, os tribunais de fábrica, os cordões industriais, para criar as estruturas de dualidade de poderes fundamentais para a criação da institucionalidade socialista.

Falamos a verdade para a classe trabalhadora quando – durante a campanha da camarada Sofia Manzano e durante nossa campanha de apoio crítico a Lula no 2º turno – apontamos que a política petista não podia resolver os problemas da classe trabalhadora, que a vitória de Lula garantiria somente melhores condições para construir a luta? Se falamos a verdade naquele período, estamos sendo oportunistas agora, na prática. Se mentimos antes, fomos rasteiramente oportunistas para ganho eleitoral. Se o próprio CC orientou na nota sobre o segundo turno que a resposta para a crise é a construção do Poder Popular, pautado no anticapitalismo e no anti-imperialismo, o qual deve ser construído com dedicação constante “em todos os momentos do próximo período, aconteça o que acontecer”, organizando a classe trabalhadora e pressionando o governo em defesa da classe trabalhadora “SEM QUALQUER VACILAÇÃO”, eu lhes pergunto camaradas, por que o CC e o CR/PCB-SP não estão efetivamente organizando a luta? Percebem, camaradas, que com nossa atuação vacilante, com essa tática concreta de praticamente nada fazer, estamos inclusive sob o perigo de acabar abandonando efetivamente a estratégia do Poder Popular? Como construiremos o Poder Popular se não construímos as lutas da classe trabalhadora, lutas tão centrais quanto as que se formam nesse novo governo? Percebem que, portanto, hoje somos um partido que concretamente não é oposição a Lula-Alckmin e a todos os ataques virulentos que cometeu e comete contra a classe trabalhadora? É essa nossa linha política? É esse a linha revolucionária? É esse o Partido Comunista que queremos, que construirá capilaridade e a revolução brasileira?

Uma curta crítica do texto do camarada Edmilson

Camaradas, relendo o texto “Brasil: a luta de classes em campo aberto” do camarada Edmilson Costa, percebi a existência de algumas questões que gostaria de tratar dentro dessa tribuna. Também iniciarei reproduzindo alguns trechos, e depois procederei à crítica. Os trechos são tirados dos subtópicos “a luta de classes em campo aberto” e “as armadilhas da conjuntura”, nas quais o camarada concentra sua análise da conjuntura, enquanto os tópicos anteriores são reservados a uma recapitulação do início do governo. Vamos aos trechos! (grifos e negritos meus)

“[...]  Se o governo ceder à chantagem [da burguesia, para manter a política econômica que tão bem a serve] e não mudar a política econômica na perspectiva dos interesses populares, deverá ter o mesmo destino do período anterior, quando a burguesia não só ganhou rios de dinheiro como acumulou forças até o momento em que se sentiu forte o suficiente para derrubar o PT e aprofundar o modelo neoliberal.”

[...]

“[...] Se o governo insistir nessa ilusão [da conciliação de classes] terá como resultado não só o fortalecimento das forças conservadoras, inclusive da extrema-direita, como poderá colher o mesmo resultado do ciclo anterior, com a captura da política governamental pela burguesia ou mesmo a queda do governo, além da frustração que ocorrerá no movimento social e popular. Já vimos esse filme em passado recente.”

[...]

“As contradições oriundas da própria frente que possibilitou a eleição de Lula nos levam a acreditar que existe uma margem estreita de manobra por parte do governo para realizar qualquer tipo de mudança mais avançada sem a luta social. A burguesia vai continuar lutando para manter o velho modelo das últimas três décadas e chantagear o governo com o objetivo de garantir os privilégios que obteve ao longo do ciclo neoliberal, enquanto o movimento social e popular, passado o período de lua de mel com o governo e diante da expectativa das mudanças que dificilmente virão, poderá intensificar a luta social, afinal ainda estão bem vivos na memória popular os erros cometidos pela administração do PT e a frustração com relação ao estelionato eleitoral do segundo governo Dilma, que levaram ao golpe de 2016, às contrareformas, à regressão no mundo do trabalho, à emergência da extrema-direita e ao governo Bolsonaro.

Mesmo com todos os ensinamentos do período anterior, o que se pode esperar é que o social-liberalismo não deve ter aprendido as lições do passado e tudo indica que tenderá ao masoquismo na luta política. [...]”

O camarada conclui esses subtópicos, por fim, dizendo que o movimento social e popular não pode dar um cheque em branco para o governo, aponta que os objetivos dos comunistas nessa conjuntura são lutar contra a extrema-direita e o fascismo junto com outras forças que inclusive são contra o socialismo, evidentemente mantendo nossa independência política e conservando nossos objetivos estratégicos. Por fim diz que, nesse combate, quando nossos interesses convergirem estaremos juntos, mas marcharemos separados na luta pelas transformações sociais do Brasil.

Passando agora à crítica do texto do camarada Edmilson, fica claro que o camarada está defendendo uma postura de que o governo está em disputa, sendo disputado pela burguesia e pelo movimento social e popular. O camarada insinua: “se” o governo insistir na política de conciliação de classe e “se” o governo ceder a chantagem burguesa e não mudar a política econômica para algo mais favorável ao povo. Ora, camaradas, “se” implica que há possibilidades, que para o governo Lula é uma possibilidade, uma alternativa política real, escolher peitar a burguesia e implementar uma política econômica popular e que, caso não o faça, a política econômica será capturada pela burguesia, afirma também que a burguesia vai chantagear o governo. Não só isso, o camarada afirma que existe uma pequena margem de manobra do governo para realizar mudanças mais avançadas sem luta social.

A escolha política da chapa petista que chega à presidência foi muito clara, para não dizer gritante, resgataram das catacumbas da política Alckmin, um símbolo marcante da direita antipetista pré-Bolsonaro, se aliaram (isso tudo antes de serem eleitos) com todo tipo de figura da direita, do mal chamado centrão e, como já disse anteriormente, desde o primeiro dia de governo avançam em sua política neoliberal, burguesa e agressiva contra a classe trabalhadora. A burguesia não precisa chantagear o governo Lula – tanto quanto não precisaria chantagear ou “capturar” um governo Simone Tebet -, o governo não é chantageado pelo congresso nem nada do tipo, Haddad almoçou com Campos Neto para discutir o novo Teto de Gastos (que, como sugeriu a camarada Juh Guerra, deveríamos chamar de Traição Fiscal), o governo Lula e sua política econômica já estão nas mãos da burguesia, Lula é um político burguês de todo o coração. É preocupante qualquer tipo de ilusão com um governo Lula com algum nível de autonomia perante a burguesia, com algum nível de antagonismo ao ponto de acreditar que a classe dominante precisa “chantagear” ou “sequestrar” qualquer coisa.

Por isso, reitero, Lula não está em disputa, nosso papel não é disputar os rumos do governo e, muito menos, nosso papel não é poupar o governo para focar em derrotar a extrema-direita e o bolsonarismo nos aliando com toda corja de liberais anti-comunistas que estavam muito confortáveis durante os últimos quatro anos e agora aí estão compondo a política burguesa do governo Lula que vem se mostrando bastante eficiente em atacar o que Temer e Bolsonaro não conseguiram. A luta central é, e sempre foi, a luta do proletariado contra a burguesia, não a luta contra a extrema direita e o fascismo, não são mais Bolsonaro e Paulo Guedes que aprovam o arcabouço fiscal, que atacam os mínimos constitucionais para o investimento em áreas centrais da vida do povo brasileiro, que já mencionam a possibilidade de privatizar a água etc.

Lula é um inimigo da classe trabalhadora, camaradas, temos de fazer oposição a ele como fizemos a Bolsonaro, como a Tarcísio ou como a qualquer figura de direita que, diferente de Lula, não faça um showzinho popular ao tomar a faixa de presidente.

Por fim, gostaria de saudar os insistentes esforços do camarada Jones em levantar e criticar esse imobilismo dos comunistas frente a pautas essenciais (não mencionei, por exemplo, a questão do piso salarial da enfermagem) por meio de seu canal no YouTube, seus esforços foram essenciais para avançar esse debate na militância, como em tantos outros casos.

Que avancemos na luta, camaradas, o futuro será nosso

Abraços.