Sobre o comportamento dos monopólios chineses no México

Os monopólios chineses tentam dominar as principais matérias-primas, além de tirar vantagem em setores econômicos estratégicos, como as novas energias limpas, colocando em pauta as possibilidades de conflitos intermonopolistas no caso do lítio em Sonora.

Sobre o comportamento dos monopólios chineses no México

Por Revista El Comunista

Investimentos chineses no México

Se é certo dizer que a aposta do governo Obrador foi manter os compromissos assumidos pelo governo Peña Nieto com os governos do Canadá e dos EUA através da ratificação da assinatura do Tratado de Livre Comércio da América do Norte, o antigo TLCAN, hoje denominado T-MEC, cerrando fileiras como bloco comercial, do qual o próprio Obrador tem sido porta-voz, também podemos afirmar que capitais de outras regiões, inclusive de origem chinesa, continuaram a chegar ao México, aumentando sua participação no país.

Desde que foram aprovadas as reformas energética e de telecomunicações, no início do mandato de Enrique Peña Nieto, chegaram os capitais chineses mais significativos. Eles foram canalizados através da formação de um Fundo de Investimentos China-México, com uma contribuição superior a um bilhão de dólares por parte de investidores chineses, e seriam administrados por instituições do Banco Mundial através de uma instituição financeira internacional.

Os capitais chineses no México se orientam mais para as obras de infraestrutura no transporte terrestre de passageiros, mas também no transporte ferroviário, onde a empresa chinesa CRRC Zhuzhou Locomotive desde 2021 importou trens para o serviço de transporte coletivo de Nuevo León; enquanto a empresa China Communications Construction Company participa na construção do primeiro trecho do Trem Maia, em sociedade com a Mota-Engil. Ambas as empresas também construirão projetos ferroviários em Jalisco e Monterrey, enquanto a CRRC Zhuzhou Locomotive, em particular, recebeu em 2020 um contrato de 32 bilhões de pesos para dar manutenção por 19 anos à Linha 1 do Metrô da Cidade do México (CDMX).

Outras empresas instaladas com capital chinês são a Mexico Curtain Wall System Engineering, SWI de Mexico e BOE Vision Electronic Technology Mexico. Outras como Huawei, Xiaomi, Hisense e Lenovo aumentaram seus investimentos. A empresa chinesa State Power Investment Corporation comprou a empresa mexicana de energias renováveis Zuma Energía. Merecem menção o Grupo Hengli, Lizhong, Citic Dicastal, Alibaba, CF Moto, BOE Vision Electronic Technology, Eson Multiwin, TCL Moka Manufacturing, Trend Smart CE, Curtain Wall System Engineering e SWI. Também devem ser considerados monopólios como ChemChina, que adquiriu a Syngenta e, através dela, comprou a Semillas Ceres no México. Merecem destaque os investimentos chineses em mineração, principalmente em lítio, onde a Bacanora Lithium e seu sócio chinês Ganfeng Lithium têm um projeto de 420 milhões de dólares no estado de Sonora.

Os dados oficiais do governo do México para 2022 estabelecem o investimento estrangeiro direto (IED) chinês em 282 milhões de dólares. As entidades federativas que receberam maior IED da China foram Chihuahua, com 53 milhões de dólares; Cidade do México, 39,4 milhões de dólares; e Nuevo León, 23,8 milhões de dólares. Vale ressaltar que nas estatísticas oficiais, tanto no que diz respeito aos montantes de investimento quanto aos destinos dos mesmos, a informação é contraditória, pois a Secretaria de Economia classificou como confidenciais muitos dos projetos e contratos que envolvem capitais chineses; enquanto outra parte dos investimentos chineses entra no país através de suas subsidiárias sediadas nos EUA, o que faz com que a Secretaria de Economia considere esses investimentos como capital norte-americano; ou como no caso do transporte de passageiros, onde os investimentos chineses são feitos capitalizando empresários mexicanos, em alguns casos o próprio governo federal favorece mecanismos que denomina eufemisticamente como “cooperação” ou “alianças”, como acontece com a construção dos Perímetros de Bem-Estar (cinturões industriais) no Corredor Interoceânico do Istmo de Tehuantepec (CIIT), por isso esses investimentos são considerados capital nacional. Por outro lado bancos chineses como o Banco Industrial e Comercial da China (ICBC) e o Banco da China têm um investimento de 600 milhões de dólares na refinaria de Dos Bocas, em Tabasco.

Deve-se ressaltar que, atualmente, um dos credores prioritários da Altán Redes, a empresa mexicana financiada com capital privado, é justamente a Fundação México China; que junto com a Axtel, Morgan Stanley, Isla Guadalupe Investments, Megacable e Hansam pretendem cobrar uma dívida superior a um bilhão de pesos. Entre os mais de 100 credores secundários está o China Development Bank. Trata-se de uma dívida que o governo mexicano pretende pagar com o resgate da empresa, financiada com recursos públicos dos contribuintes, ou seja, com o dinheiro dos trabalhadores.

As “vantagens” para os capitais chineses investirem no México

Mesmo dentro dos marcos do T-MEC, as empresas chinesas buscam manobras jurídicas que lhes permitam obter vantagens com seus investimentos. Nesse sentido, empresas chinesas estão se instalando no México, procurando fornecedores nacionais para poder etiquetar seus produtos com o selo “Made in Mexico” e, assim, introduzi-los, livres de impostos, no mercado norte-americano. É o caso das empresas produtoras de componentes automotivos que fornecem para fabricantes de automóveis norte-americanos, já que o T-MEC prevê que os carros comercializados pelas empresas contenham uma porcentagem de peças fabricadas em qualquer um dos três países membros. Isso motiva empresas imobiliárias chinesas a comprarem grandes extensões de terrenos para a construção de parques industriais, o que, juntamente com o aluguel de galpões industriais, é um investimento altamente rentável.

Existem outras “vantagens” para os capitais chineses que estão investindo no país. Hoje, o México está se tornando o campeão do nearshoring, ou seja, da transferência de empresas manufatureiras que buscam tirar vantagem da localização geográfica – devido à proximidade com o mercado norte-americano – da mão de obra e do T-MEC. Isso é particularmente evidente nas indústrias automotiva, metalúrgica, mecânica, eletrônica e têxtil, entre outras. No ano passado, os capitalistas chineses adquiriram em vários estados do país mais de quatro milhões de pés quadrados de terrenos para a construção de parques e galpões industriais; como exemplo, no estado de Guanajuato, os capitais chineses investidos através do nearshoring foram de cerca de 13,6 milhões de pesos.

E o governo mexicano, como nos melhores tempos do neoliberalismo, “extinto” pelo governo da 4T, oferece todas as facilidades para a instalação de plantas industriais, desde isenção de impostos até “estímulos fiscais”, mudanças no uso do solo, construção de infraestrutura e oferta de serviços; como indicado no Plano Nacional de Desenvolvimento 2019-2024, onde estão contempladas ‘zonas livres’ para aumentar a atração de investimento estrangeiro direto, reduções do Imposto sobre Valor Agregado (IVA) e do Imposto sobre a Renda (ISR), além da venda de combustíveis a preços mais baixos, entre outras facilidades.

Mas o que mais se destaca são as relações trabalhistas. As empresas chinesas estão acostumadas a submeter seus trabalhadores à pior exploração, e esse critério também é um “atrativo” determinante para o investimento chinês no México; não apenas para os monopólios, mas também para empresas cujos investimentos “modestos” são de cerca de 300 milhões de dólares, como no caso da Man Wah Furniture Manufacturing, que antes de trazer seu capital para o estado de Nuevo León, considerou a taxa de desemprego, que permite considerar os trabalhadores como facilmente substituíveis. Mas nem todas as empresas que chegam ou vão chegar ao México são de capitais chineses. O governo mexicano, através da Secretaria de Relações Exteriores, está convencendo as empresas de capital norte-americano instaladas na China a aproveitarem os Polos de Desenvolvimento para o Bem-Estar, ou seja, os corredores industriais ao longo de toda a rota do Corredor Interoceânico.

Assim como fez Jaime Rodríguez “El Bronco” quando era governador de Nuevo León, atualmente Samuel García promove os investimentos chineses em seu estado. Outros governadores também tentam fazer o mesmo. É o caso de Tabasco, onde, segundo o site oficial do governo daquele estado, o governador Carlos Merino recebeu no ano passado uma delegação chinesa de “alto nível”, liderada pelo então embaixador Zhu Qingqiao, e convidou o governo da República Popular da China e a iniciativa privada daquele país a investir no estado de Tabasco, aproveitando as oportunidades oferecidas pelo Corredor Interoceânico e o apoio incondicional do presidente López Obrador.

Outras “atividades empresariais” chinesas no México

Um ponto a ser considerado são as “atividades empresariais” realizadas por grupos do crime organizado internacional, numa época em que as atividades ilícitas incluem o tráfico de matérias-primas. Como aponta um estudo da Political Room, “Vivemos tempos em que se ignora a relação entre o desenvolvimento econômico e o crime organizado transnacional (COT), relações que se sobrepõem e se consolidam da mesma maneira, até o ponto em que a cultura ou a política se moldam a interesses econômicos lícitos e ilícitos.”

Nesse sentido, é um fato que os cartéis do crime organizado agem em função dos interesses dos diferentes blocos econômicos. Isso pode ser observado no caso da mineração, onde é evidente e documentada a correlação entre os projetos minerários canadenses e norte-americanos com o aumento do crime organizado. Esse fenômeno traz consigo a militarização, de modo que o assentamento de projetos monopolistas acentua uma espiral de violência que começa com o despojo dos territórios, continua com a chegada do crime organizado e se reforça com a presença das forças armadas, que geralmente chegam para controlar o descontentamento social e exercer a repressão.

Existe hoje uma atividade comercial proibida pela proibição permanente aos pescadores do Alto Golfo da Califórnia, que é a pesca de totoaba; no entanto, os cartéis mexicanos, principalmente o de Sinaloa, continuam pressionando os pescadores que, diante da necessidade, são forçados a pescar para vender seu produto aos grupos criminosos, que por sua vez o comercializam com grupos criminosos chineses. Isso permite que a totoaba acabe vendida nos mercados tradicionais chineses, onde seu preço oscila entre 60 mil e 100 mil dólares.

Outro caso similar, também documentado, é o do ferro. A extração desse mineral foi uma atividade legal até que a crise afetou negativamente os preços do ferro. Então o cartel de Cavaleros Templarios passou a controlar a atividade de extração e exportação ilegal para a China através do Porto Lázaro Cárdenas, em Michoacán. Para se ter uma ideia das dimensões dessa atividade, que não poderia passar despercebida pelas autoridades chinesas, os ganhos obtidos pelos grupos criminosos em 2013 foram da ordem de 100 milhões de dólares. Outro porto onde também se desenvolvia essa atividade ilegal era o de Manzanillo, Colima, estado onde as autoridades tiveram que fechar 36 minas de ferro por considerarem que todas estavam controladas pelo crime organizado que “exportava” ilegalmente o produto para a China.

Existem mais cinco portos onde operam grupos criminosos de origem chinesa e que controlam parcialmente atividades portuárias chave: Veracruz, no Golfo do México; e Puerto Vallarta, Jalisco, Ensenada, Baja California, Lázaro Cárdenas, Michoacán, e Manzanillo, Colima, no Oceano Pacífico.

Outros cartéis que têm relações com grupos criminosos chineses são os Zetas e o Cartel Jalisco Nueva Generación, com quem construíram uma infraestrutura empresarial que lhes permite lavar e legitimar seus milionários rendimentos.

Naturalmente, o governo chinês não só não reconhece essa situação, como também não está disposto a cooperar para combatê-la, desliga-se dessas atividades argumentando “fraquezas internas” dos portos. Esse problema não ocorre apenas no caso do México, é uma constante onde quer que empresas chinesas operem atividades portuárias, como no chamado cinturão africano; além disso, nessas atividades empresariais de caráter ilegal estão envolvidas companhias militarizadas de segurança privada, “alinhadas com os investimentos da China para manter o equilíbrio de estabilidade que traz a sobreposição dessas novas vias com as rotas de comércio ilícito já estabelecidas.” Essa situação envolve funcionários chineses, o que parece ser um jogo “debaixo da mesa” do governo daquele país.

Conclusões

Embora seja verdade que os capitais chineses não são os únicos que chegam ao país, pois os EUA continuam ocupando o primeiro lugar em investimento estrangeiro direto (IED), e independentemente de como esses capitais entrem no país, ainda não são significativos em termos percentuais, mas mantêm um aumento constante. Isso está alinhado com as projeções vigentes sobre a disputa por ocupar o topo da pirâmide imperialista mundial. É evidente que o Partido “Comunista” da China atua como promotor do capitalismo através do governo da República Popular da China. O atual embaixador chinês no México, Zhang Run, em poucos meses no cargo, tem promovido as visitas sucessivas do Representante de Negociações de Comércio Internacional e Vice-Ministro do Comércio, Wang Shouwen, e do Presidente da Agência de Cooperação para o Desenvolvimento Internacional da China (CIDCA), Luo Zhaohui.

É inegável que os monopólios chineses não são apenas exportadores de mercadorias, mas também, e principalmente, de capitais; sobretudo seguindo os planos de expansão capitalista da China pelo mundo, como “A Nova Rota da Seda”, o “Belt and Road” e o “Cinturão Africano”. Este último significa o controle dos principais portos ao redor de todo o continente africano e cujas características de funcionamento no tráfico ilegal de matérias-primas são as mesmas usadas nos portos de Lázaro Cárdenas e Manzanillo.

Da mesma forma, os monopólios chineses tentam monopolizar as principais concentrações de matérias-primas, tanto na mineração quanto na energia, além de tirar vantagem em setores econômicos-chave, como as novas energias limpas ou verdes, colocando em pauta as possibilidades de conflitos intermonopolistas no caso do lítio em Sonora – já manifestos na nova Lei de Mineração e, como consequência particular, na decisão do governo social-democrata de revogar as nove concessões da Ganfeng Lithium. Além disso, no caso do Corredor Interoceânico do Istmo de Tehuantepec ou no caso do milho transgênico e do glifosato, como indicado na Tese Política do PCM aprovada no VII Congresso, em dezembro do ano passado, em nosso país, o conflito da China com os EUA é milimétrico.

As mesmas razões econômicas que permitiram à China sua crescente acumulação e desenvolvimento, ou seja, as relações sociais capitalistas com a superexploração da força de trabalho, ampliada a setores vulneráveis como a mão de obra infantil, são as que os capitalistas chineses consideram ao trazer seus investimentos ao país. Aproveitando não só a proximidade geográfica com a América do Norte, mas principalmente as altas taxas de desemprego e a existência de mão de obra qualificada, sob controle do sindicalismo colaboracionista e do sindicalismo social-democrata, ou desorganizada sindicalmente.

Outro fator a considerar é a violência e a expansão dos cartéis e grupos do crime organizado internacional. Onde esses capitais chegam, aumentam os índices de violência e a disputa desses grupos; como podemos ver no Istmo de Tehuantepec, onde mais de 12 cartéis estão disputando diferentes territórios. As ações desses cartéis acabam favorecendo os interesses dos monopólios mineradores, das empresas eólicas, das imobiliárias e, em geral, dos capitais que chegam a essa região, destacando-se entre outros os de origem chinesa.

Um ponto que deve ser enfatizado é que todos esses capitais chineses no país necessitam de representantes nas instâncias governamentais, ou seja, agentes e guardiões de seus interesses econômicos nas dependências dos três níveis de governo e, obviamente, no Congresso da União. E com certeza os têm, por isso vemos diferenças e enfrentamentos entre os diversos atores políticos; surgem, com mais ou menos força, diferentes candidaturas entre os partidos da burguesia; até mesmo dentro de um único partido existem dois ou mais pré-candidatos, pois cada um deles é apoiado por esses ou aqueles monopólios e blocos comerciais em disputa.

Portanto, como indica a resolução sobre a questão chinesa contida na Tese Política em questão, assumimos que: “partindo do fato de que a China é um país onde predominam as relações capitalistas, e que à frente de um grupo de países capitalistas, chamados eufemisticamente de ‘economias emergentes’, disputa contra os EUA o lugar principal no sistema imperialista, confirma que nas rivalidades imperialistas que levam à guerra ambos os grupos, o dos EUA e o da China, são inimigos da classe trabalhadora internacional e que devemos nos manter independentes deles; que no plano do México, os capitais chineses, assim como os dos EUA, da UE ou nacionais, são inimigos da classe trabalhadora e que no conflito capital/trabalho, estamos em campos antagônicos. Essa mesma linha antioperária se expressa no Peru, onde os capitais chineses na mineração buscam controlar o sindicalismo e impedir as greves, ou na Grécia, onde com a Cosco atacam os direitos e condições de vida dos trabalhadores que não se curvam e lutam organizadamente contra o ataque capitalista chinês. Confirmamos que a linha do socialismo de mercado é alheia ao programa comunista, assim como são alheias as chamadas especificidades nacionais. A posição do Partido “Comunista” da China é mais um fator que agrava a crise do movimento comunista internacional. É nosso dever intensificar a luta ideológica contra a corrente oportunista liderada pelo Partido “Comunista” da China.”

Quanto à nossa classe, devemos esclarecer aos trabalhadores o verdadeiro papel da China no mundo e no México; a natureza imperialista dos monopólios chineses, que em nada se diferenciam dos norte-americanos ou europeus. Nestes tempos convulsionados pela guerra interimperialista na Ucrânia, muita confusão é gerada pelas forças oportunistas sobre o papel da China; por isso é necessário mostrar aos trabalhadores com informações detalhadas a realidade do comportamento dos monopólios chineses. Em nosso país, por exemplo, ocorrem os conflitos entre trabalhadores e patrões na Refinaria de Dos Bocas, onde à ponta de baioneta os militares mantêm o controle dos trabalhadores, reprimindo os protestos e a insatisfação laboral, para também proteger os capitais chineses ali investidos. É por isso que a classe trabalhadora no México não deve cair na falsa alternativa de que para se livrar dos capitais americanos deve apoiar os capitais de origem chinesa, acreditando que a China é um país socialista. Nossa posição deve ser contra os monopólios, sejam de que capital forem, e lutar contra a dominação do capital e pela revolução socialista.