Sobre o chamado “Partido Comunista Americano” (ACP)
A bandeira da multipolaridade não pertence aos comunistas. O slogan para o “mundo multipolar” é uma continuação do imperialismo através de uma nova divisão de mercados, forças de trabalho e matérias-primas.
Por Plataforma Comunista dos Trabalhadores dos EUA (CWPUSA)
Em 21 de julho de 2024, várias personalidades “comunistas” da internet se reuniram em Chicago para formar o “Partido Comunista Americano” (ACP). Entre os membros fundadores estão Eddie “Liger” Smith, Carlos Garrido, Noah Khrachvik e Kyle Pettis (ex-membro do Coletivo Maoísta – Guardas Vermelhos e do Partido Trabalhista Americano) do Midwestern Marx; Adam “Haz Al-Din” Tahir, Henry Ahmad e Grayson Preutz do Coletivo Infrared; Jackson Hinkle (proeminente comunista MAGA) do podcast The Dive With Jackson Hinkle; Christopher Helali do Partido dos Comunistas dos EUA (PCUSA); e Rev Laskaris do RTSG. Juntos, esses dez indivíduos constituem o Comitê Plenário do ACP.
A declaração de fundação também inclui assinaturas de vinte e nove clubes do Partido Comunista dos EUA (CPUSA), bem como três clubes do Partido dos Comunistas dos EUA (PCUSA). No entanto, muitos negaram a afiliação ao ACP nas redes sociais. O ACP justificou a inclusão dessas assinaturas com base em uma petição que assinaram contra a Resolução nº 5 da 32ª Convenção Nacional do CPUSA, que formalizou a longa aliança do CPUSA com o Partido Democrata.
Em poucos dias, os líderes do ACP apareceram na RT e no The Jimmy Dore Show para promover sua nova formação, rapidamente acumulando dezenas de milhares de seguidores no X (anteriormente Twitter). Sua rápida ascensão à popularidade é o culminar da iniciativa “CPUSA 2036”, lançada por “Haz” em 2021, onde os apoiadores do Infrared foram incentivados a se infiltrar no CPUSA, desvinculá-lo do Partido Democrata e “restaurar sua antiga glória”. Com certeza, a declaração do ACP destaca questões significativas dentro do CPUSA – como a falha em abordar as lutas da classe trabalhadora nos Estados Unidos, a falta de centralismo democrático, a dissolução de seu braço editorial e jornal ideológico, a doação dos arquivos do partido para a Universidade de Nova Iorque, e sua aliança com o Partido Democrata. No entanto, a validade dessas observações não nega o fato de que o ACP constitui mais um desvio completo do marxismo-leninismo.
Esse novo “partido” é uma agremiação totalmente pequeno-burguesa, liderada por streamers do pequeno empresariado, oportunistas políticos e ex-funcionários do Estado, incorporando algumas das tendências mais perturbadoras e prejudiciais que obstruem a reconstituição do partido comunista nos EUA — carreirismo, individualismo, dependência excessiva de formas online de recrutamento e organização, condescendência com as tendências mais retrógradas da sociedade, promoção e aceitação de posições reacionárias e alienantes (por exemplo, “socialismo patriótico” e “comunismo MAGA [‘Make America Great Again’]”) e apoio a líderes anticomunistas como Nicolás Maduro e Vladimir Putin. Essas tendências não devem surpreender, pois os líderes do ACP no “Comitê Plenário” têm todos um histórico pequeno-burguês como “influenciadores” e “criadores de conteúdo” das redes sociais. Além disso, Hinkle e o Coletivo Infrared são especificamente conhecidos por sua aceitação de ideólogos fascistas e de “Terceira/Quarta Teoria Política” como Aleksandr Dugin, James Porrazzo (American Front, Nova Resistência) e Raphael Machado (Nova Resistência Brasil).
O ACP junta-se à profundamente anticomunista e oportunista Plataforma Mundial Anti-Imperialista (PMAI) como outro grupo fundamentalmente reformista que defende a teoria da multipolaridade. Em vez de lutar pela revolução, seu verdadeiro objetivo é subjugar os trabalhadores e o povo deste país a setores da burguesia nos EUA que supostamente estão interessados na retomada da produção nacional e à burguesia de outros países. Para esse fim, esses charlatões cooptam a retórica de Donald Trump, de “trazer empregos de volta para a América”, e o disfarce ideológico do bloco imperialista eurasiático para a “defesa dos valores tradicionais”. Sua máscara de “socialismo patriótico” é projetada para atrair a base do Partido Republicano nos EUA como um suposto baluarte da classe trabalhadora, remontando aos dias de Browder e da Frente Popular, e recorrendo a símbolos e tradições modernas e históricas dos EUA com slogans como “O Comunismo é o Americanismo do Século 20 (21)”. O Midwestern Marx Institute, agora convergindo com as vozes do “comunismo MAGA”, desempenhou um papel significativo no desenvolvimento desse quadro político-ideológico, utilizando da obra de Georgi Dimitrov [1, 2, 3], tentando dar “conteúdo socialista a uma forma nacional”, um “socialismo com características americanas”. Essa abordagem repete erros do passado enquanto obscurece sistematicamente os motivos da burguesia e distorce a realidade, apresentando o conservadorismo e a virada reacionária do capital como progresso. No entanto, também se mostrou eficaz em influenciar os jovens, que muitas vezes carecem de conhecimento histórico e experiência de classe.
A referência ao socialismo com características chinesas não é coincidência. Em uma entrevista recente com Jimmy Dore discutindo a fundação do ACP, Hinkle confirmou que “a forma como um país comunista opera, pelo menos no que diz respeito ao aspecto econômico, é muito semelhante à forma como estamos vendo a China operar hoje”. Tal caracterização contradiz a compreensão marxista do caráter fundamental do capitalismo (apropriação privada da produção social) versus o do socialismo (produção social para as necessidades da sociedade). Hinkle ainda afirma que “a Rússia, está basicamente reconstruindo esse mundo multipolar, embora Putin não se declare comunista, ele basicamente está assumindo o manto e agitando a bandeira [bandeira comunista] neste momento”. Ambas as declarações demonstram a rejeição do ACP ao comunismo científico, da luta incessante pela emancipação da classe trabalhadora da burguesia de todos os países, em favor de alinhar o povo com a aliança imperialista dos BRICS.
Na mesma entrevista, Hinkle nunca menciona a necessidade da revolução socialista, apenas regurgitando o velho e cansado plano de usar o Estado para nacionalizar indústrias. Assim, o “socialismo” deve ser construído dentro da estrutura da sociedade capitalista, conforme consagrado em uma constituição burguesa que garante a propriedade privada e uma declaração de direitos cujas liberdades se estendem apenas até onde vai o capital de alguém.
A bandeira da multipolaridade não pertence aos comunistas. O slogan para o “mundo multipolar” é uma continuação do imperialismo através de uma nova divisão de mercados, forças de trabalho e matérias-primas. Trocar um centro imperialista por outro não é troca alguma. A multipolaridade é o slogan da social-democracia, do “progressismo” e, em última análise, da reação disfarçada de revolução. É a bandeira de qual aliança imperialista liderará o sistema capitalista global e, por extensão, a guerra interimperialista.
Alinhar-se com as forças estatais da Rússia e da China é uma traição ao internacionalismo proletário. Significa escolher o lado de um ou outro polo imperialista na competição cada vez mais intensa pela dominação dentro do sistema imperialista. Hoje, essa competição toma a forma da aliança EUA-OTAN-UE contra a aliança China-Rússia. Nesse sentido, o ACP não é diferente dos partidos social-democratas da Segunda Internacional que optaram por apoiar a “sua” burguesia. As consequências desse alinhamento serão as mesmas: a desorientação da classe trabalhadora e a obstrução do caminho para a revolução socialista, deixando o povo despreparado para a ameaça iminente de uma nova guerra mundial.
Devemos estar ainda mais atentos a qualquer organização que se autodenomine o Partido Comunista, especialmente uma liderada por personalidades online e sem conexão com as massas trabalhadoras. Tal reivindicação grandiosa, nascida de uma megalomania descarada e de um apoio superestimado, só pode levar a mais confusão dentro de um movimento revolucionário já fraturado. O título de Partido Comunista não é algo que se possa atribuir a si mesmo. Para os marxistas-leninistas, o partido comunista é a organização de combate da classe trabalhadora, liderada por um programa revolucionário baseado no princípio do centralismo democrático. O ACP não oferece tal programa, e a aparente falta de uma eleição para o seu “Comitê Plenário” questiona sua alegação de defender o centralismo democrático.
Desde a contrarrevolução na URSS, uma crise político-ideológica tem devastado o movimento comunista internacional. Sem um centro liderando a unidade das forças revolucionárias do mundo, o oportunismo e revisionismo passaram a dominar o movimento, particularmente nos EUA. Tudo isso levou ao surgimento de muitas organizações que se autodenominam os verdadeiros campeões da classe trabalhadora na luta pelo socialismo-comunismo, entre elas o CPUSA e o PCUSA. Nenhuma organização pode evitar sua responsabilidade conjunta pelo desenvolvimento do ACP, pois ambas se tornaram bastiões das mesmas tendências ecléticas e oportunistas que apresentam a China e a Rússia como “anti-imperialistas”.
O CPUSA, é claro, nega a sua responsabilidade pela criação do ACP, alegando que foi “nascido fora de suas fileiras”. Eles não mencionam os anos passados cultivando as teorias da multipolaridade, do socialismo de mercado e outras tendências oportunistas dentro de suas fileiras ou sua renúncia à teoria leninista do partido em favor dos padrões organizacionais de um partido de massa social-democrata. Mas a verdade é que o CPUSA tem sido um veículo falido do oportunismo e apêndice do sistema político burguês por décadas, tendo se amarrado ao Partido Democrata em nome de “derrotar o fascismo”. É natural que esse ecletismo e oportunismo dariam origem à abominação que é o “Partido Comunista Americano”.
Assim, entre o CPUSA, o PCUSA e o ACP — sem mencionar as inúmeras outras formações espalhadas pelo país — nenhuma oferece uma opção revolucionária para os trabalhadores e forças populares nos EUA. No entanto, ainda resta uma alternativa ao estado burguês: a Plataforma Comunista dos Trabalhadores, uma organização dedicada a lutar nas ruas, nos nossos bairros, nas escolas e, crucialmente, nos locais de trabalho para a reconstituição do Partido Comunista nos EUA. Nós não simplesmente sonhamos com um mundo melhor. Trabalhamos para construí-lo, para fortalecer e organizar as forças da classe trabalhadora em preparação para sua missão histórica, a derrubada do sistema capitalista.