'Sobre nossa atuação nas Universidades Privadas' (Lulis)

As instituições de ensino superior estabelecidas durante o regime militar tinham como foco principal a elite da sociedade, demonstrando baixo interesse em abordar questões sociais, enquanto dedicavam uma atenção considerável, por exemplo, nas demandas econômicas.

'Sobre nossa atuação nas Universidades Privadas' (Lulis)
"Se a Reforma de 1968 introduziu inovações, por outro lado, criou condições propícias para o surgimento do ensino privado que reproduziu o que Florestan Fernandes chamou de antigo padrão brasileiro de ensino superior."

Por Lulis para a Tribuna de Debates Preparatória do XVII Congresso Extraordinário.

“Ora, a discordância nunca é um fato repentino, mas o amadurecimento de um processo contraditório, facilitado sempre que se abre o debate [...] Entretanto, revelar as contradições é uma forma e até mesmo um método para superá-las, desde quando as idéias entram em confronto uma com as outras e a prática é tomada como critério para testar a verdade.” (Carlos Mariguella, 1966).

Estarei nesta tribuna abordando mais especificamente a nossa atuação enquanto UJC no local das Universidades Privadas, para isso apresentarei alguns aspectos da minha atuação para que essa argumentação faça sentido, não pretendo encerrar esse debate nesse texto e sim iniciá-lo, visto que até o momento em que escrevo isso, ainda não saiu nenhuma tribuna sobre esse assunto, espero então, que a partir dessa humilde contribuição surjam mais tribunas sobre essa temática.

1. Origem das Universidades Privadas como conhecemos

Partindo da Lei da Reforma Universitária que completou 55 ano esse ano que foi encarregada de “regular” o ensino superior no Brasil, como muitas políticas advindas dessa época da ditadura empresarial-militar, tem um legado de autoritarismo.

Para além de sua natureza repressiva e violenta, a ditadura também demonstrou um caráter altamente elitista sob a perspectiva social. As instituições de ensino superior estabelecidas durante o regime militar tinham como foco principal a elite da sociedade, demonstrando baixo interesse em abordar questões sociais, enquanto dedicavam uma atenção considerável, por exemplo, nas demandas econômicas.

Ao término do período ditatorial, observamos que as universidades públicas tiveram a expansão do sistema de pós-graduação, consolidação de institutos, desenvolvimento de campi universitários. No entanto, é crucial destacar que essas oportunidades foram predominantemente ocupadas por estudantes da elite, constituindo uma distorção séria. Para mitigar essa disparidade, houve uma tentativa de compensação por meio da expansão do setor privado, visando atrair estudantes mais pobres.

Se a Reforma de 1968 introduziu inovações, por outro lado, criou condições propícias para o surgimento do ensino privado que reproduziu o que Florestan Fernandes chamou de antigo padrão brasileiro de ensino superior. Esse padrão refere-se a instituições organizadas como entidades isoladas, focalizadas principalmente na transmissão de conhecimentos profissionalizantes e afastadas da atividade de pesquisa. Tais instituições contribuem pouco para a formação de uma perspectiva intelectual crítica na análise da sociedade brasileira e das mudanças em nossa época.

O ensino superior privado que emergiu após a Reforma de 1968 apresenta qualidades distintas, tanto em termos de sua natureza quanto de seus objetivos, se comparado ao período anterior. Ele representa um sistema diferente, estruturado como empresas educacionais focadas na obtenção de lucro econômico e na resposta rápida às demandas do mercado educacional. Esse novo padrão, como tendência, alterou a concepção tradicional de ensino superior, que buscava a integração entre ensino e pesquisa, a preservação da autonomia acadêmica do professor e o compromisso com o interesse público, transformando sua clientela em consumidores educacionais.

2. Tipos de Universidade Privada no Brasil

Antes de prosseguir precisamos diferenciar dois tipos de UPs para entender onde e como deveriamos estar atuando em cada uma delas:

a) Universidades confessionais/filantrópicas (elitizadas): O objetivo desses locais é formar quadros para a burguesia, com um direcionamento mercadológico e empresarial, são instituições centrais para o capitalismo internacional, estão incluídas nesse tipo a Mackenzie, PUC e FGV. É importante destacar que esse tipo de UP tende a se assemelha em questão de caráter e objetivos com relação às Universidades Públicas brasileiras.

b) Universidades privadas de massa: Funcionam basicamente como empresas, seja para obter lucro diretamente, ou para fornecer um tipo de qualificação que auxilie na reprodução do capital, muitas vezes abrangendo pessoas com objetivo de conseguir trabalhos melhores na estrutura de empregos formais. Essas instituições não só muitas vezes não contam com organizações e mobilizações estudantis como às vezes as proíbe, estão incluídas nesse tipo: Cruzeiro do Sul, Estácio, Anhanguera, Uninter e etc.

3. Por que mudar nosso formato de atuação nesses espaços?

Gostaria de destacar que a aplicação de táticas do movimento estudantil público no movimento estudantil privado tem nos gerado resultados esvaziados, quando gera. Fazer com que nossos núcleos tenham como horizonte se eleger para CAs e DCEs em seus locais de inserção, em vez de antes conhecer nossas bases e suas demandas, faz com que toquemos esses trabalhos com enorme artesanalismo e quebremos militantes com grandíssima facilidade.

No núcleo em que estou, estamos presentes quase que a cada dois militantes, em uma universidade, e a Universidade que temos mais militantes, é uma universidade confessional/filantrópica (elitizada), e não uma universidade privada de massa. Essa Universidade elitizada, não deveria ter sido em nenhum momento nossa prioridade de inserção, visto que a maioria dos estudantes é advinda da pequena-burguesia, tirando os prounistas, ou seja, o que podemos enquanto UJC fazer nesse espaço?

A resposta que meu núcleo tendia a dar é mobilizar todes es outres militantes do núcleo para atuar nessa universidade em eleições de CA que só geravam mais conflitos com outras pessoas e mais desgaste por ter que tocar tarefas sem sentido nesse local.

Pessoalmente falando militei durante 2 anos nesse NB de universidades privadas e tenho dificuldade em entender até hoje o que essa atuação gerou de ganhos políticos, contudo é fácil para mim pensar no desgaste que tive tocando tarefas sem sentido na universidade que estudava que fazem muito mais sentido para quem está no movimento estudantil nas universidades públicas.

Usando das Resoluções do IX CONUJC:

"Com a piora nas condições de vida da classe trabalhadora, o avanço do desemprego, a uberização e uma juventude cada vez mais precarizada, a maioria dos filhos da classe trabalhadora se encontram não na universidade pública, mas nas IES privadas empresariais ou “de massa” e endividados." (IX CONUJC, 2022, p.9)

Sobre as Universidades Privadas de Massa, diferenciamos entre as modalidades à distância e presencial. Acho que antes de deliberarmos por: "lá está a classe trabalhadora, portanto precisamos nos inserir". Precisamos entender o que faremos a partir dessa inserção, o modelo de atuação no movimento estudantil principalmente nas universidades privadas precisa ser repensado urgentemente, pois sabemos que simplesmente falar: "vamos nos inserir porque é estratégico" não tem funcionado.

"As prioridades de inserção no movimento de massas para a UJC no próximo período serão: o movimento secundarista em geral e, vinculado a ele o movimento de estudantes do Ensino Profissional Técnico (EPT); a inserção no movimento de jovens trabalhadores e a inserção nas universidades privadas de massas." (IX CONUJC, 2022, p.41)
"Quanto ao Movimento Estudantil Universitário nas IES Privadas de tipo empresarial e cursos técnicos privados, a UJC deverá ter como eixo central os esforços de integração da luta dos estudantes com o movimento de Jovens Trabalhadores, contribuindo em realidades diversas às instâncias tradicionais de representação estudantil, com o Giro Operário-Popular, fortalecendo o movimento sindical e organização estudantil nesses espaços." (IX CONUJC, 2022, p.56)

Com isso, proponho que unamos os trabalhos dos estudantes das universidades privadas de massa com os jovens trabalhadores, nossa rotina está entrelaçada, e pensar em recrutar os estudantes dessas universidades enquanto jovens trabalhadores estudantes e não como militantes do movimento estudantil faz muito mais sentido e com certeza conseguiríamos pensar e atuar de uma maneira que traga mais efeito e impacte à nós e à nossa classe.

Portanto, não defendo que não seja debatida a questão da universidade privada, mas que seja debatida contextualizando a situação des estudantes trabalhadores, assim poderíamos amplificar nossa atuação nesses locais de maneira que faça sentido para esses militantes. Precisamos estar presentes nos locais onde nossa classe está e fortalecer nossa atuação, somente assim seremos a vanguarda da nossa classe.