'Sobre avanço da extrema direita na Argentina' (Andressa Bacin)

A velha fórmula peronista, social-democrata e cada vez mais liberal, já não funciona, o marasmo da esquerda reformista contribui para o fortalecimento de vários setores da direita, desde liberais até fascistas declarados.

'Sobre avanço da extrema direita na Argentina' (Andressa Bacin)
"Os planos sociais do governo, muitas vezes, a única fonte de renda da população, não dão conta de cobrir a inflação e os preços das necessidades básicas como alimentação e moradia."

Por Andressa Bacin para a Tribuna de Debates Preparatória do XVII Congresso Extraordinário.

Olá, camaradas! Nessa modesta contribuição, pretendo fazer uma breve análise das próximas eleições argentinas, das quais o primeiro turno acontece no próximo dia 22 de outubro.

Como temos acompanhado nos meios de comunicação, Javier Milei, candidato pelo "La libertad avanza" e que se declara como "anarcocapitalista", é o preferido para as próximas eleições do país Hermano. Ele, que é grande admirador de Bolsonaro e Donald Trump, vem ganhando cada vez mais relevância nas “paso”.

As "paso" ou prévias, servem como uma pesquisa para eleger os candidatos mais conceituados na opinião pública e também para eliminar da disputa candidatos menores.

A velha fórmula peronista, social-democrata e cada vez mais liberal, já não funciona, o marasmo da esquerda reformista contribui para o fortalecimento de vários setores da direita, desde liberais até fascistas declarados.

O aumento constante da inflação, que hoje supera os 117%, coloca a população em uma situação de miséria. Por morar na Argentina há alguns anos e acompanhar na vida cotidiana a realidade dos bairros, diria que está quase impossível para a classe trabalhadora se alimentar na Argentina.

É comum vermos nos merendeiros comunitários crianças chegando desmaiando de fome. No sistema de saúde pública, a realidade não é diferente, muitos casos de desnutrição, crianças e adultos doentes por imunidades deficitárias devido à má alimentação.

Esse avanço, representa uma grande ameaça aos direitos dos trabalhadores, principalmente, das mulheres e seus direitos sexuais e reprodutivos como a legalização e descriminalização do aborto, luta histórica das mulheres argentinas. Assim como é uma ameaça à vida de pessoas LGBTQIAP+.

Os planos sociais do governo, muitas vezes, a única fonte de renda da população, não dão conta de cobrir a inflação e os preços das necessidades básicas como alimentação e moradia.

Aposentados têm que escolher entre comer ou morar.

O câmbio de real para peso hoje está em torno de 150, oscilando todos os dias, geralmente para uma desvalorização vertiginosa do peso.

A ineficácia da esquerda reformista abre espaço para a extrema direita, que esbraveja discursos punitivistas e cativa com promessas de que as privatizações melhorarão as condições de vida e acesso ao básico da população.

Algumas das propostas de Milei são: dolarizar a economia, facilitar a venda de armas, privatizações generalizadas, acabar com todos os ministérios e, acredite, legalizar a venda de órgãos humanos. Ele também defende que as mudanças climáticas são mentira.

Qualquer semelhança com Bolsonaro não é mera coincidência, ele é apoiado pelo próprio e pelos seus eleitores, que comemoram a volta da extrema direita à América Latina.

Inclusive, no último 29 de setembro, o futuro ministro da educação de Milei, Martín Krause  elogiou a "eficiência" da Gestapo, afirmando que, se a máquina de matar nazista fosse argentina, haveria matado muito menos judeus. Como se isso fosse uma demonstração de ineficácia argentina.

Por outro lado, a direitista Patrícia Bullrich do "Juntos por el cambio", ex ministra de segurança do governo Macri, trás propostas como, uma economia bimonetaria, a redução do Estado, redução dos impostos sobre as exportações agrícolas, principal economia argentina, e  a criminalização dos protestos em via pública.

Entre Milei e Patrícia Bulrrich, é escolher entre a direita e a extrema direita.

Sergio Massa, o candidato peronista do "Unión por la patria" e atual ministro da economia da Argentina, defende como propostas principais, saldar a dívida Argentina com o FMI, manter universidades públicas e aprofundar a aproximação com com Estados Unidos e China em sua política internacional. Pincelando velhas promessas Kirchneristas que nunca foram cumpridas.

Lembrando, que a Argentina saiu recentemente do governo liberal de Mauricio Macri, que aprofundou brutalmente a pobreza e a crise econômica no país.

O governo de Alberto Fernandez não deu conta de reverter a situação, apostou em uma guinada para o neoliberalismo defasado.

A imprensa Argentina se mostra, ou finge estar indignada com o avanço de Milei e tenta emplacar Patrícia como sua candidata de estimação.

Hoje, Milei aparece nas intenções de voto com 32,3%, Patrícia Bullrich e Segio Massa, oscilam entre o segundo e terceiro lugar com cerca de 29,%. Esse é o pior desempenho da história do peronismo nas prévias do país.

Em províncias mais conservadoras como Jujuy, Salta e Tucumán, Milei lidera,inclusive com uma certa folga quanto ao candidato peronista.

Javier Milei acaba surgindo quase como um popstar, conquistando grande parte da juventude.

Os candidatos da "Frente de izquierda" Myrian Bregman e Nicolás del Caño", da lista "Unir y fortalecer la izquierda", têm uma pontuação baixíssima, ficando muito longe de qualquer possibilidade de vitória.

A Argentina se coloca na difícil posição de escolher o presidente menos pior.

Milei é o candidato que expressa o descontentamento, a angústia e a desesperança da população com anos de políticas fracassadas do peronismo.

Nos resta esperar o resultado e ver como este afetará nossa relação, estreita desde a reeleição de Lula, com o país vizinho.