'Sobre a crise que o PCB-RR passa no estado de SP e a responsabilização das direções' (L. Queen)

O que realmente tem afetado a construção de uma unidade de ação verdadeira não é exatamente os pontos políticos e teóricos divergentes, mas a dificuldade de estabelecer uma prática verdadeiramente revolucionária na organização do processo de disputa política.

'Sobre a crise que o PCB-RR passa no estado de SP e a responsabilização das direções' (L. Queen)
"Falta bastante autocrítica por parte das direções para reconhecer onde e como erraram. De nada adianta clamar pela manutenção da unidade, dizer que não vai ser destacando todo mundo do CR que vai se resolver as coisas, se a autocrítica necessária não vem, se a prática não muda. Aí impera o espírito de círculo!"

Por L. Queen para a Tribuna de Debates Preparatória do XVII Congresso Extraordinário.

Camaradas, desde a publicação da carta da camarada Raquel Luxemburgo venho pensando seriamente sobre o problema do espírito de círculo, a desconfiança das bases com as direções – em especial no estado de SP – e os caminhos que estamos tomando enquanto partido. Pretendo aqui discorrer sobre o rompimento da confiança das bases para com as direções e sobre aquilo que acredito ter sido o verdadeiro motivo para o racha do Partido: a insatisfação das bases com os métodos de direção.

É seguro dizer que uma série de pactos de confiança foram rompidos e isso tem dificultado o estabelecimento da unidade de ação no estado de São Paulo. Essa questão parece ter chegado a um estágio crítico, em que inúmeros quadros têm quebrado e se desligado do Partido. Com uma crescente insatisfação da base, alguns camaradas da direção têm apelado à manutenção da unidade-de-ação, a meu ver, sem refletir muito bem sobre o significado que querem imprimir à unidade de ação. 

O primeiro passo para sanar esta questão já foi dado, a aceitação de que a desconfiança entre base e direção existe. Contudo, os motivos que levaram à desconfiança são frequentemente omitidos ou ignorados pelas direções. Tratam como se houvesse, entre as bases, uma certa implicância desproposital com as direções, um esquerdismo infantil, um grupismo, enquanto a verdade é que há motivos, e de sobra, para a desconfiança. O próximo passo, portanto, é a identificação das ocasiões que colaboraram para o acirramento dessas tensões e a reposta (ou não resposta, em alguns casos) que foi dada pelo CR em cada uma delas.

Comecemos pelo recente caso da unificação dos CRs e a eleição da delegação nata. Neste recente caso, o motivo da desconfiança se desdobra em dois momentos. O primeiro quando a proposta chega e é votada na plenária, sem muito tempo para discussão a respeito do tema nas células e núcleos. Por si só isso talvez nem tivesse sido tão problemático, não fosse, contudo, um segundo momento, quando o CR delibera pela eleição de todos os membros do CR como delegados natos do congresso.

É a partir da decisão sobre os delegados natos que de fato a polêmica explode no estado, com a divulgação da carta do núcleo da UJC/Unicamp – e os motivos para isso são bem claros. Ao aprovar a unificação dos CRs em SP na plenária, os camaradas delegados não tinham consciência de que estariam elegendo toda a CR UJC-SP como delegada nata no Congresso. Isso pareceu uma manobra para a manutenção das estruturas de poder da CR UJC-SP.

Esse é o motivo da polêmica recente, contudo há outro problema pouco declarado a respeito da desconfiança das bases com as direções regionais: esse tensionamento entre as bases já existia antes do racha na CR UJC-SP e se agravou desde então. Muitos militantes que criticavam as atitudes do CR da UJC-SP como mandonistas, burocratistas e dirigistas antes do racha, agora viam estes mesmos alvos de suas críticas agitarem contra as mesmas práticas que praticavam na UJC-CC, mas efetivamente mantendo-se em suas posições sem uma autocrítica sobre as ações passadas. 

A desconfiança das bases da UJC com a antiga CR da UJC-SP tem fundamentos que vão desde pelo menos antes do IX Congresso da UJC, mas dou um exemplo do referido congresso. Dentre as disputas políticas que ocorreram no estado de SP houve a fatídica e agressiva fala dos camaradas do secretariado da CR contra a indicação da camarada Sandriely para a CR, a acusando de estar agindo de maneira fracionista, criando tendência em conversa com seus camaradas. Esses mesmos camaradas que a criticaram, meses depois, foram fundamentais para a articulação do racha em SP, lutando pela liberdade de polêmica pública – certamente teriam sido chamados de fracionistas no IX Congresso da UJC por eles mesmos. 

Contudo, após o racha não houve nenhuma menção a isso, nenhuma autocrítica ao que foi feito na plenária do IX Congresso da UJC em SP com a camarada Sandriely, nenhuma exposição científica do equívoco que foi chamar a camarada de fracionista por estar conversando com os camaradas de seus núcleos sobre os desenvolvimentos do Congresso. Não me surpreendeu saber que a camarada Sandriely e todo o núcleo Universidades Privadas da UJC ficou com o CC.

Este caso é apenas um exemplo que creio que será compreendido mais facilmente pela totalidade da militância do estado de SP, mas há uma série de outros tensionamentos mal resolvidos entre os núcleos da UJC e a antiga CR. Estas contradições se expressam de maneira mais acentuada na relação entre capital e interior do estado (os militantes do interior frequentemente reclamavam da dificuldade de obter assistências, quando ainda era feita pelo CR). 

Para falar de meu antigo núcleo (fui transferido recentemente para outra célula), o núcleo Unicamp, desde antes do racha tem colecionado problemas com a CR da UJC-SP. Há alguns momentos críticos que foram responsáveis por aumentar a desconfiança do núcleo com a CR, vou citar dois.

O primeiro foi com relação à decisão de participar da disputa para DCE, que a longo prazo causou uma série de problemas e quebras ao núcleo. Sobre isso, desde o começo dos debates sobre se participaríamos ou não da disputa para DCE, havia uma sensação geral contrária à participação. Ninguém parecia muito otimista com isso. À época eu era Sec. Form. do núcleo e expressei minhas dúvidas numa reunião do secretariado se o núcleo seria capaz, não só de participar do processo eleitoral, mas de efetivamente dirigir o DCE se fosse eleito. Outras dúvidas surgiam também sobre a questão das alianças que estabeleceríamos. 

Apesar disso, a postura da CR era de que deveríamos disputar o DCE e que a preferência era que formássemos aliança com Correnteza e Juntos. Houve momento, inclusive, em que nosso assistente chegou a dizer que o núcleo poderia decidir por não participar das eleições, ou escolher não se aliar com tal força, e a CR poderia simplesmente decidir o contrário e impor sua decisão. Aconteceu uma série de coerções, nunca explicitamente declaradas, para que o núcleo participasse da disputa eleitoral. No dia da reunião de núcleo que decidiria sobre o assunto, um militante da CR que nunca antes havia aparecido no núcleo foi lá para argumentar a favor da disputa (se não me engano, o camarada Benetti). Hoje o núcleo Unicamp se encontra completamente fragmentado e inorgânico, vários militantes que atuaram no DCE quebraram, se afastaram ou desligaram. A maioria destes militantes possuía cerca de um ano de organização. Durante o período que assumimos a direção do DCE o CR foi incapaz de assistir nosso núcleo, deixando o núcleo com uma direção completamente jovem para lidar com uma greve extremamente tensionada. Chegou-se ao absurdo da camarada T.M., ex-sec pol do núcleo e já desligada da organização no período em questão, ter que assistir, na prática, o secretariado (mesmo sem qualquer ligação com o CR, nem mesmo com a UJC ou PCB-RR).

Este tipo de imposição silenciosa, seguido do abandono nos momentos de necessidade, é um dos motivos para as quebras de confiança e isso precisa ser devidamente apreciado pelo CR. É o tipo de recurso coercitivo que impõe aos militantes uma linha política não pelo convencimento político, mas pela autoridade das direções.

Ao contrário de haver uma autocrítica, porém, as vezes que isso foi pontuado perto de militantes da CR UJC-SP a resposta sempre era “mas a decisão de disputar o DCE foi votada, o pleno acatou”. Sim, acatou. E sobre que condições? Veremos que esta mesma atitude formalista se repete na questão da unificação dos CRs. É exatamente esse o mesmo argumento utilizado pelo camarada Machado em sua tribuna “Resposta ao núcleo UJC/Unicamp”, sobre a questão dos delegados natos e da unificação dos CRs. Esta argumentação ignora completamente as diversas formas de coerção e de manobra do debate político. Sobre isso, a tribuna “Um pequeno, pequeno detalhe – Ainda sobre a unificação das CRs e es delegadas nates” do camarada Arthur Gabriel me parece responder de maneira satisfatória ao camarada Machado:

De maneira muito simples, a resposta do camarada se baseia na pequena omissão sobre o que ele chama de “problema na apresentação do debate”, que é, na realidade, o ponto principal da manobra que foi realizada naquela Plenária.

As falhas na apresentação de debate sobre a organização dos trabalhos, cuja consequência lógica é a eleição imediata de mais de 60 pessoas como delegades nates para a Etapa Estadual do Congresso Nacional não é um “problema”, tanto que foi rechaçado não só individualmente por militantes, mas por núcleos inteiros.

Reitero individualmente o que colocamos coletivamente na tribuna do núcleo UNICAMP: na sua resposta, camarada, tem uma tentativa de dar “ares democráticos” para essa decisão só pelo fato de ela ter sido tomada em plenário, quando o fundamental para a garantia da direção coletiva faltou.

A inversão que você realiza nesse texto tem 3 partes:

1) reduzir o papel da “apresentação da discussão” a um mero “problema”, como se ela não condicionasse as possibilidades de formulações que poderiam ser feitas naquele espaço;

2) tratar es delegades eleites da Plenária como “a maioria da militância”, sendo que “a maioria da militância” foi operacionalmente impedida de participar do debate e realizar o convencimento e a polêmica em seus núcleos;

3) vestir a armadura do paladino da democracia interna contra militantes que não legitimam essa decisão porque, de fato, ela não cumpriu o básico da forma comunista de formar uma direção coletiva, anterior a qualquer decisão de qualquer pleno, que é a discussão e a organização da polêmica nas base.

Aqui podemos ver o cerne da insatisfação das bases para com as direções no Estado de SP: a falta de diálogo e a tentativa de manobrar a militância através de recursos burocráticos. Se os delegados votaram em uma proposta na plenária, então a militância aprovou a decisão – essa é a lógica do camarada Machado e de muitos membros do CR de SP. Contudo, continuam ignorando que existem formas de manobrar o debate político, seja por meio da restrição ao debate em si, seja por meio de um argumento de autoridade (“a CR pode decidir sobre a aliança ou a participação na eleição de DCE”; a presença de um militante desconhecido da CR para fazer fala a favor da participação na disputa). Espero que os camaradas que discordarem dessa posição assumam as consequências dessa postura e passem a acreditar também no caráter democrático do Estado Democrático de Direito (afinal, se os representantes políticos foram eleitos pelo povo eles são legítimos, não?).

Após essa resposta do camarada Arthur, não houve sequer um textículo do camarada Machado para realizar uma autocrítica (ou mesmo discordar da crítica feita). A questão pairou no ar. Essa falta de realização de uma autocrítíca consequente é um dos motivos que tem levado aos desgastes recentes. 

Antes de prosseguir falando a respeito das tribunas e do debate político realizado (ou melhor, não realizado) pelas direções quero entrar no segundo exemplo sobre a quebra de confiança do núcleo Unicamp, que também não foi devidamente respondida pela CR da UJC-SP.

Isso diz respeito à uma tribuna minha, enviada internamente para a plenária da UJC-SP que decidiu pela unificação dos CRs, que parece ter passado batido. À época eu decidi por publicar internamente a tribuna ao invés de expor no EdC por consideração às implicações que isso poderia ter em uma de nossas figuras públicas e como isso poderia ser prejudicial para a nossa organização – talvez por ainda acreditar que o camarada poderia realizar uma autocrítica. Hoje, francamente, acho mais prejudicial a manutenção de certas figuras públicas do que a exposição de suas incoerências.

Esta tribuna diz respeito do caso de racismo que o secretariado do núcleo Unicamp (a qual eu estava incluído e por isso devia uma autocrítica coerente) e o assistente, à época o camarada Gabriel Tavares, realizamos contra o já citado camarada Arthur Gabriel. Eu, como alguém que tomou parte da articulação descrita abaixo, decidi que preciso insistir nessa crítica (que é também uma autocrítica) e torná-la realmente pública, para que compreendamos os erros que as nossas direções tem cometido e como isso tem impactado os nossos militantes (principalmente as militantes mulheres, negres, indígenas, LGBTs e PCDs). 

Me permitam repetir trechos da tribuna aqui, já que ela não está pública:

Vou começar o relato a partir da etapa estadual do IX CNUJC, quando realizei um destaque na nominata para a CR/UJC-SP e sugeri o nome do camarada Arthur Gabriel (A.G.), do meu núcleo, para a CR. Após a disputa dos nomes, o camarada foi eleito como membro da CR. Quando sugeri o nome do camarada para a CR, tinha em mente seu conhecimento sobre engenharia popular e a construção do Coletivo Dínamo, área de atuação que achava (e ainda acho) que é bastante negligenciada pela UJC tanto à nível estadual como nacional. Minha ideia era: o camarada coordenava um coletivo com um trabalho de base bastante avançado e eu achava que esses acúmulos deveriam ser aproveitados. Hoje percebo como essa lógica é uma expressão do federalismo, já que a dificuldade de socialização dos acúmulos da base impõe a prática de aquisição de cargos como forma de influenciar a linha política do Partido e da UJC.

Preciso ainda falar um pouco mais sobre o camarada A.G. no núcleo. O camarada, desde que entrei para o núcleo (estando lá há mais tempo que eu), sempre foi um militante orgânico, participando ativamente da vida do núcleo e contribuindo para os trabalhos. O camarada também sempre foi muito crítico nas reuniões de núcleo e colocava suas inquietações e discordâncias de maneira franca. (...)

Contudo, a partir do segundo semestre de 2022 (após sua eleição para CR) o camarada começou a realizar críticas mais contundentes ao secretariado, algumas das quais concordava, outras discordava e passei a concordar após a crise, e algumas poucas ainda discordo. O ponto aqui, contudo, não é o que eu discordava ou não. O ponto é que o camarada realizava suas críticas ao secretariado e ele tinha todo o direto de fazê-lo. Mas isso começou a causar um mal-estar nos secretários e no assistente [o camarada Gabriel Tavares (G.T.)]. Acredito que o ápice desta crise interna do núcleo tenha se dado na votação da nominata para secretário de Finanças, em que o secretariado indicou o nome do camarada (G.C.) e o camarada A.G. (e outros da base) destacaram o nome do camarada e indicaram o do camarada (G.F.). Esta votação terminou em empate na primeira reunião e acabamos por postergar para outro dia a votação, em que o camarada G.C. foi eleito. Creio que foi mais ou menos nesta época o camarada A.G. se desligou da CR UJC-SP após um período de inatividade e inorganicidade (conforme relatava o assistente G.T.). O desligamento da CR somado às críticas realizadas causou uma desconfiança do camarada G.T. [e do secretariado] para com o camarada A.G. 

Esta desconfiança levou, no começo deste ano [2023], a uma reunião um tanto quanto estranha entre o secretariado e a assistência. Estávamos discutindo a troca da secretaria de Agitprop e o nome a ser indicado. Tínhamos alguns nomes possíveis para a nominata: o camarada I.T., o camarada G.L. e o camarada A.G. eram os nomes fortes. Contudo, em um dado momento, quando começamos a aventar o nome do camarada A.G., a assistência pediu uma fala. Não consegui achar a ata desta reunião para relatar aqui e tenho a impressão de que esta fala foi retirada de ata (o que é um erro que jamais podemos voltar a cometer). Portanto, o meu relato aqui pode conter falhas, mas o conteúdo geral é o seguinte: o assistente G.T. apontou que A.G. tinha se desligado da CR, que ele queria escolher as próprias tarefas, que ele tensionava o núcleo para causar desconfiança com o secretariado, que ele era carreirista e que se fosse eleito para secretaria de Agitprop ele iria quebrar todos no secretariado até chegar à secretaria política.

Essa fala impactou a todos presentes, tenho certeza, pela firmeza e agressividade com que o camarada a fez. No momento ninguém discordou do camarada. A autoridade do camarada G.T. era muito grande para discordamos. Sua fala tinha sido muito incisiva e os incômodos pessoais que vínhamos sentindo com o camarada A.G. por suas críticas ressoou na fala do camarada G.T. A partir daí começamos a planejar como faríamos para o camarada A.G. não ser sequer indicado. Tentaríamos de tudo para que I.T. aceitasse a tarefa, porque o camarada tinha um respaldo muito grande da base. Sabíamos que o camarada A.G. era um dos camaradas mais respeitados no quesito Agitprop no núcleo e sabíamos que se o nome dele fosse sugerido ele teria chances de ser eleito, o nome de I.T. era o único capaz de fazer frente à esta indicação. 

Por fim, se I.T. recusasse e precisássemos indicar o camarada G.L. e alguém questionasse a nominata, indicando A.G., o assistente G.T. faria uma fala para denunciar as atitudes do camarada frente à CR.

Camaradas, vejamos: tudo isso que eu descrevi é um completo absurdo. Independente das críticas do camarada A.G. terem sido equivocadas ou não, isso tudo é um completo absurdo. 

Foram atitudes racistas de todos nós (visto que o camarada A.G. é um homem negro), repetimos o estereótipo racista do negro ardiloso. E vejamos bem, camaradas: não havia nenhum motivo para acreditar que o camarada era carreirista, o camarada havia se desligado da CR por críticas à instância; as críticas do camarada ao secretariado eram em boa parte válidas e ele tinha todo o direito de fazê-las (e elas eram sempre feitas em reuniões de núcleo ou email, ou seja, os espaços internos de crítica). Nada disso que foi descrito acima é justificável. A omissão de falas de ata, a articulação fracionista que fizemos para impedir o camarada de ser sequer indicado, a omissão e incapacidade do secretariado em criticar a fala da assistência, a fala da assistência em si. Temos um quadro gravíssimo de uma cultura política racista, mandonista, cunhalista e oportunista.

Não houve jamais uma autocrítica sobre isso por parte da CR UJC-SP, agora CRP PCB-RR/SP, nem do camarada Gabriel Tavares. 

Esse é só mais um exemplo de como as direções da CR UJC-SP agiam de modo similar às direções do antigo PCB, a despeito de toda crítica empreendida no período do racha. Desde as manobras formalistas, as acusações de fracionismo e criação de tendência, até as falas retiradas de ata para manipular a direção política do núcleo e a visita de militantes com autoridade para influenciar reuniões. É o mesmo modus operandi que identificamos durante o período de racha sendo reproduzido especialmente pela CR UJC/SP, sem qualquer autocrítica, que agora se repete no CR do PCB-RR/SP. 

Dito isso tudo, acham mesmo que não há motivos para as desconfianças da base com as direções? Na primeira plenária do PCB-RR em SP a camarada Bia Cassin falou que a CR UJC-SP cometeu várias atitudes mandonistas e dirigistas no passado e que seus militantes estariam realizando uma autocrítica, mas a camarada não se dedicou a explicar quais foram estas atitudes, nem quando cometeram, nem contra quem ou qual organismo. Não há até hoje um único documento sobre isso. Quais foram essas práticas? Como elas ocorreram e como não irão ocorrer de novo? Não há nada disso, mas há sempre omissão, tergiversação e respostas formalistas para as denúncias de manobras políticas.

E essas práticas continuam ocorrendo.

O camarada P. Acácio disse em sua tribuna, “‘Oportunismo, métodos de disputa e o afogamento do debate político?: uma resposta ao camarada Di Lorenzo’”:

Desta maneira eu pergunto, analisando as atas das etapas de base e das reuniões das instâncias das quais as não-nomeadas direções participam, é possível afirmar que os camaradas escondem suas posições nos debates em pauta? Os camaradas organizam, nas temidas mesas de bar, o boicote do que é deliberado nas devidas instâncias? Se não, não vejo qualquer problema nem qualquer violação do centralismo-democrático.

E aqui novamente vemos o argumento formalista ressurgir, com outros ares. Se não violou o centralismo democrático não há problema. Mas o que significa o centralismo democrático? Ampla crítica e unidade de ação, certo? E quando não há a possibilidade de realizar a crítica? E quando a unidade de ação é imposta por vias burocráticas? Será que o camarada considera isso uma violação do centralismo democrático? Eu certamente considero. 

E aqui precisamos tirar a crítica personalista de lugar. É possível que os camaradas do CR acreditem estarem agindo de boa-fé (acredito inclusive que a maioria crê nisso mesmo, a julgar pelo martírio autoimposto pelo camarada Raul em sua carta de desligamento), que estão fazendo a melhor das escolhas que poderiam para o caminhar da revolução brasileira. Não se trata do que estes militantes acham. Não se trata, infelizmente, nem sequer do conteúdo político em si da decisão de unificar os CRs. Eu, por exemplo, fui e ainda sou completamente favorável não só à unificação dos CRs em SP, mas à unificação da própria UJC ao Partido a nível nacional (embora seja contrário aos delegados natos). Nem por isso deixei de achar ruim a maneira como o CR conduziu o processo, com o agravante da decisão sobre a delegação nata do CR, que realmente me pareceu como um golpe das direções para se manterem onde estão.

Será que os camaradas não percebem como que essas coisas aparecem à militância? Parece realmente injustificável para os camaradas do CR que a militância do estado de SP tenha suas desconfianças?

Uma última exemplificação das atitudes deste CR que minam a confiança das bases – desta vez uma ação recente, coisa de alguns dias atrás. Recentemente, com o envio da sistematização das etapas de base do congresso no estado de SP, nos deparamos com o curioso sumiço das alterações aprovadas pelo núcleo Unicamp e PUCCAMP na sistematização. Eu, mesmo não tendo participado da etapa de núcleo por estar afastado, sugeri aos camaradas algumas alterações, que foram todas aprovadas. Nenhuma delas consta na sistematização nem em sua forma original, nem em outra forma sistematizada. Por exemplo, uma inclusão de um ponto nas resoluções a respeito do MUP (tendo sido acatado pelo núcleo Unicamp), que eu explicitava nas resoluções organizativas que deixaríamos de construir o MUP (podem procurar pela palavra MUP na sistematização e não vão encontrar uma única menção). Outros camaradas relataram que sentiram falta também de outras alterações que foram feitas (agora, já com acesso às atas das etapas de base e com a sistematização eu posso confirmar que, de fato, nada que foi aprovado pelo núcleo Unicamp se encontra na sistematização). 

Vão nos dizer que não há motivos para desconfiança? A resposta por email que o CR deu ao CL de Campinas foi que os militantes destes núcleos poderiam incluir estas alterações nos grupos de discussão durante a etapa estadual.

O camarada P. Acácio diz em sua tribuna que o camarada Gustavo “pretere em absoluto o conteúdo político dos debates em favor da forma pela qual algumas pessoas fazem ou deixam de fazer o debate”. Embora eu concorde que tribuna de debate não é a única forma de fazer polêmica pública e nem sequer acho que o cerne da questão é exatamente a conversa de bar, eu quero chamar a atenção do camarada de que a forma como a disputa política é feita importa tanto quanto seu conteúdo. Ou virou prática comum e aceitável do debate político a exclusão inteira dos destaques realizados por um núcleo na sistematização estadual? Achar que isso é um problema também seria uma preocupação com a forma e não com o conteúdo? Afinal, é só os militantes destes núcleo adicionarem nos grupos de discussão os destaques aprovados! É meramente uma questão formal!

O camarada separa a forma do conteúdo sem entender o significado que a forma dá ao conteúdo e como estas duas coisas se relacionam. É inclusive uma postura completamente anti-dialética a separação do conteúdo e da forma como o camarada fez, espero que ele reconheça isso.

Não adianta o conteúdo político de uma decisão estar correta, se a forma como essa decisão foi tomada põe em xeque a confiança e autonomia das bases, levando à sensação de que as bases só importam às direções quando é necessário legitimar suas ações frente a uma disputa não resolvida internamente (como já pontuei em tribunas anteriores). Como podemos confiar numa direção que não parece confiar na capacidade da sua base decidir as questões por si? Como confiar numa direção que quer ser ouvida, mas parece se negar a ouvir as bases? Estamos realmente construindo a tão sonhada democracia/ditadura operária dessa forma? O militante de base se sente incapaz de decidir sobre os rumos do próprio partido e parece estar tudo bem para as direções.

O camarada P. Acácio tergiversa a respeito do que é o jornal leninista para não tocar no ponto central, que é o fato de que as bases do PCB-RR no estado de SP se sentem constantemente lesadas pelas suas direções – desde antes do racha até o momento atual, como procurei demonstrar. O episódio da unificação dos CRs e a subsequente decisão sobre os delegados natos foi somente o momento que estas questões emergiram para a superfície. Inclusive acho que a questão nem teria sido tão polêmica não fosse o momento que o Partido vivia, de negação e crítica às práticas mandonistas e dirigistas do antigo PCB – uma certa subestimação do CR daqueles que foram os reais motivos para o racha.

Certamente os exemplos que dei sobre o núcleo Unicamp podem ser reencontrados em outros núcleos ao redor de SP sob outras formas, cada qual com sua particularidade, mas estas experiências nunca foram devidamente discutidas, compartilhadas, criticadas ou sequer documentadas. É por isso que a questão da unificação do CR se tornou tão grande, mesmo que aparente ser menor em seu suposto conteúdo. Não é somente por conta da unificação, mas é sobre os métodos de direção que vem sendo utilizados.

As práticas coercitivas e indutivas para fazer aprovar pontos políticos de interesse das direções continuam ocorrendo, independentemente do que os camaradas do CR acham a respeito de suas próprias ações. A ocasião da unificação dos CRs e a aprovação dos delegados natos foi mais uma situação em que as bases sentiram que estavam sendo passadas para trás, que as promessas de mudanças que foram colocadas com o Manifesto do PCB-RR serviram apenas de fundamento para rachar o partido, mas não de fundamento para a prática positiva deste novo partido em construção. Não foi o ato de rachar com a antiga estrutura organizativa partidária que significou o fim do espírito de círculo, mas foi ali que houve a deflagração de um processo de acirramento das contradições entre o espírito de círculo que ainda impera em nosso Partido e as tarefas históricas a qual estamos nos colocamos. Estas coisas não são possíveis juntas.

E independentemente das boas intenções, das boas motivações, a unificação dos CRs de maneira apressada, seguida pela aprovação da delegação nata, tem tudo o que configura para a militância como um golpe burocrático das direções – uma reprodução do espírito de círculo. Falta ainda reconhecer isso e parar de tergiversar, de fugir e de negar as críticas. Não se trata de “grupos que vêm colecionando derrotas” (como disse o camarada Raul). Se trata de uma direção encastelada que parece se negar a entender o porquê de as bases estarem tão insatisfeitas, o porquê de tantos desligamentos e afastamentos de militantes. Se internamente vocês não se comportam como círculos (o que eu também sinceramente duvido muito), em relação às bases o espírito de círculo fica bastante evidente. O CRP – em especial pela herança da CR da UJC/SP – atua hoje como um círculo. E certamente entre às bases há círculos também, não se enganem, mas se esta prática é perpetuada pelas direções, sua superação nas bases é mais difícil ainda. Meu ponto, no fim das contas, é para que haja um esforço conjunto de superação do espírito de círculo, para que as direções passem a construir o Partido “das massas, para as massas” – mesmo que sejam novas direções eleitas em congresso, como eu acredito que deve ser.

Por fim, eu queria ainda comentar sobre outra questão que surgiu tanto na tribuna do camarada P. Acácio, como na carta de desligamento do camarada Raul, e que já foi motivo para muito debate nas tribunas: a questão da participação das direções partidárias nas tribunas de debate congressual. Se por um lado os atores do racha criticavam corretamente a atitude de membros do antigo Comitê Central (e filiais estaduais) em não se fazerem presentes nos debates, não exporem sua opinião a não ser em espaços privilegiados (livros, palestras, etc), as bases têm o sentimento de que o mesmo ocorre hoje após o racha.

Esse abandono do debate público por parte das direções, está muito bem expresso na carta de desligamento do camarada Raul:

faltou um trabalho da nossa parte, enquanto direções, para que a Tribuna caminhasse, de fato, para se tornar literatura partidária comum. Deixamos que a Tribuna se tornasse muito mais um “Twitter autorizado”, em que textos extremamente panfletários, rasos e às vezes até agressivos são publicados e atropelados por dezenas de outros textos de assuntos completamente distintos. Poucas vezes militantes se responderam nas tribunas, e menos vezes ainda a direção interveio enquanto direção no debate (só me lembro de isso ser trazido à tona em duas ocasiões: na última ata do CNP em relação ao debate sobre o KKE e no caso do rapaz que convocou as pessoas a violarem a unidade de ação partidária). Isso não é literatura partidária comum e muito menos nos leva para a unidade.

Não se trata, portanto, apenas dos dirigentes escreverem tribunas individualmente, se trata das direções darem a tônica do debate a partir do próprio órgão central, realizando a síntese das posições políticas desenvolvidas nas tribunas. Recentemente o camarada Gabriel Lazzari publicou sua tese de doutorado no EdC, uma ótima tribuna chamada “Quais são as principais questões que devemos resolver no XVII Congresso”. Em que pese toda a qualidade da tribuna do camarada, ela tem dois problemas: é muito longa e foi publicada muito tarde, muito em cima das etapas estaduais do congresso.

Sinto que muito do que foi colocado ali sobre os principais pontos de debate do congresso, poderia ter sido feito antes por meio do nosso OC. Por exemplo, algumas explicações que o camarada dá sobre as pré-teses, como a questão do programa e seus pontos de A à E, poderiam ter sido feitas antes pelo próprio OC e muitas dificuldades de compreensão da militância para com o programa poderiam ter sido sanados anteriormente. 

Por outro lado, o camarada Lazzari sozinho é o único que teria a capacidade de realizar o empreendimento de síntese dos debates congressuais? Creio que não. Não seria possível realizar uma divisão do trabalho dentro do OC para que fossem publicadas sínteses mensais, com comentários políticos, sobre os debates congressuais? Portanto, não se trata somente de uma crítica aos indivíduos, mas à postura geral das direções de se omitirem de dirigir o partido neste processo congressual, que é tão crítico.

Esse tipo de prática, por parte do OC, seria extremamente positiva para a unidade ideológica e, inclusive, ajudaria e muito na resolução de diversos empasses entre base e direção. Porém, o sumiço das direções do debate público resulta numa estranha sensação de que estamos sendo passados para trás (novamente). Inúmeras reclamações e cobranças às direções surgem nas tribunas de debates, inúmeras propostas ou ideias são levantadas para resolvermos certos problemas (quantas vezes já li camaradas escreverem em suas tribunas sobre a necessidade de criar no EdC uma divisão por temas, que facilite a pesquisa nas tribunas de debate?), mas não há diálogo com nada disso por parte das direções. Se não há diálogo, se as tribunas servem apenas para as bases desabafarem e as direções resolverem seus impasses quando convém, sem construir coletivamente com a militância, não pode haver unidade de ação.

Recentemente tenho tido cada vez mais receio pela unidade do partido (mais até do que no momento inicial do racha), coisa que muitos camaradas vêm colocando também – um dos motivos que me levou à decisão de não publicar uma tribuna que havia escrito no dia de publicação da tribuna da camarada Raquel, sugerindo o destacamento de todos os camaradas do CR na etapa estadual do congresso.

Por outro lado, me parece muito ruim a postura tomada pelo camarada Raul em sua carta de desligamento, que coloca a responsabilidade sobre a quebra da unidade de ação em cima dos militantes de base, culpando supostos “grupos que vêm colecionando derrotas”. Reparem que é exatamente esta a mesma postura tomada pelo camarada Machado em sua fala registrada em ata sobre a reclamação daqueles que se sentiram lesados com a maneira como os CRs foram unificados. Ouvir as críticas e entender os erros que foram cometidos? Não, nada disso! É certamente um grupo que está perdendo politicamente – a despeito de algum destes concordarem com a unificação dos CRs! 

Me parece, na verdade, que o que realmente tem afetado a construção de uma unidade de ação verdadeira não é exatamente os pontos políticos e teóricos divergentes, mas a dificuldade de estabelecer uma prática verdadeiramente revolucionária na organização do processo de disputa política. Falta bastante autocrítica por parte das direções para reconhecer onde e como erraram. De nada adianta clamar pela manutenção da unidade, dizer que não vai ser destacando todo mundo do CR que vai se resolver as coisas, se a autocrítica necessária não vem, se a prática não muda. Aí impera o espírito de círculo! O CRP se encastela, se defende das críticas por meio de acusações de que há grupos perdedores e insistem em não olhar para o fundamento da crítica, isto é, a forma com que a unificação foi realizada – que é só mais um reflexo de inúmeras outras práticas perpetuadas desde antes do racha. A questão é minimizada pelas direções, como se fosse mero detalhe. Talvez para os antigos CRs, que estavam acostumados a tomar decisões importantes à revelia do restante do complexo partidário, essa seja uma questão menor, (meramente de “forma” e não de “conteúdo”, se abandonarmos o materialismo histórico-dialético, como o camarada P. Acácio fez). Para quem tenta há anos ser ouvido, seja pela evidente percepção de que a disputa e direção de um DCE iria causar uma enorme quebra do núcleo, seja pelos casos de racismo e opressão que são minimizados pelas direções, seja pelas sistematizações que omitem as contribuições de um núcleo para o congresso, seja pela forma como ocorreu a unificação dos CRs e eleição dos delegados natos, isso é, na verdade, uma questão fundamental. 

O que me leva ainda a outro ponto, que acho mais crítico ainda e que pouco se fala quando analisamos os motivos que levaram ao racha. Longe de terem sidos motivos políticos sobre o internacionalismo, sobre o reformismo, sobre o rebaixamento de linha, o racha foi motivado pelo descontentamento completo dos militantes de base para com suas direções. A eterna sensação de estarmos sendo passados para trás, a constante inação das direções com os problemas locais, a dificuldade de verdadeiramente assistir e dirigir o Partido – tudo aquilo que o Comitê Central de maneira bem caricata reproduziu. Todas estas questões, a meu ver, foram muito mais importantes para a concretização do racha do que aqueles pontos apresentados no Manifesto do PCB-RR. No fim, estas sensações podem ser resumidas na sensação de que os militantes de base não tem poder sobre o Partido.

Há uma parcela de culpa do CC nisso, certamente. Teria a UJC no estado de SP rachado de maneira quase que unificada com PCB-CC se o CR de SP não tivesse expulsado sumariamente toda a militância? Creio que não. Acredito que teríamos tido um racha mais desigual se isso não tivesse acontecido. Por exemplo, no núcleo Unicamp antes da expulsão sumária muitos camaradas estavam em dúvida se a adesão ao PCB-RR era a via mais acertada. A mensagem de Telegram que nos expulsou acabou com todas as dúvidas para os militantes indecisos.

E eu concordo plenamente com o camarada Raul quando ele aponta a dificuldade que temos de sair pela positiva do racha, contudo, para isso, precisamos antes de mais nada rever os fundamentos REAIS que levaram ao racha. Certamente que a participação do PCB na PMAI é uma péssima linha política, e eu estou de acordo com o Manifesto do PCB-RR neste sentido, mas será que o que realmente levou o partido ao racha em última instância foi esse fundamento político da disputa internacional? Ou foi a visualização clara e inequívoca de que as nossas direções nacionais eram politicamente viciadas, boicotavam as resoluções, utilizavam o Partido para preencher seus respectivos Lattes, atrasavam o desenvolvimento da agitação e propaganda do Partido e mantinham o Partido num eterno espírito de círculo em prol de seus interesses pessoais (tudo aquilo que a gente já sentia no dia-a-dia)? Tenho certeza que é esta última a real motivação para o racha.

Por exemplo, a enorme polêmica em torno do caráter capitalista da China nos aponta que o real fundamento para o racha não foi o ponto de vista leninista sobre a participação do PCB na PMAI, mas sim foi a relação das bases com as direções. Porque se há camaradas no PCB-RR que concordam que a China é socialista hoje, que é uma ditadura do proletariado e bastião de defesa dos interesses do proletário, então o apoio à Rússia é necessariamente uma aliança tática do proletariado com uma suposta burguesia antiimperialista, que deve ser seguida e apoiada neste momento pelos comunistas. Assim não haveria motivo para estes camaradas terem rachado com o PCB-CC. Mas muitos aqui estão.

Por outro lado, o ponto de tensionamento político comum a todas as instâncias partidárias que racharam era justamente a manutenção de uma estrutura de poder claramente viciada. Em Campinas isso se refletiu na relação da UJC e Coletivos Partidários com o CM, que agia de maneira extremamente amadora e tratava os coletivos partidários como segunda classe, mão de obra do Partido. Na CR da UJC houve a disputa com o CR do Partido, disputa de longa data que envolveu, por exemplo, as interferências do CR no Congresso e nas decisões tomadas pela UJC, ou ainda a resistência ao jornal O Futuro de SP por parte do CR. No Comitê Central a disputa se deu também em relação aos membro da ala esquerda e a Comissão Política Nacional, que detinha um controle sobre o pleno do CC e não o contrário (como deveria ser). Até mesmo internamente ao CR do PCB/SP houve uma disputa (mesmo que minoritária) entre militantes do pleno do CR e membros da Comissão Política Regional (na caricata figura do Mazzeo). 

É triste perceber isso, porque nos demonstra claramente que estamos bem longe de resolver os pontos programáticos de maneira unitária e que a disputa política para a construção do Partido Comunista na verdade só está começando. Mas isso precisa ser reconhecido, para que consigamos obter um mínimo de unidade possível para a construção do congresso e para a superação destas práticas nocivas à militância. Este mesmo tipo de prática coercitiva e indutiva (chamo indutiva porque ela induz os militantes a acharem que apoiam uma proposta, quando na verdade só não tiveram muito tempo para entendê-la) é o que leva a classe trabalhadora a se afastar do sindicato, do movimento estudantil, da associação de bairro e do partido.

Enquanto isso não for reconhecido e as práticas efetivamente mudarem, jamais conseguiremos prosseguir com a construção de um partido verdadeiramente revolucionário. Ao invés de ficarem acusando os militantes da base de “perdedores”, as direções devem olhar para o curso passado de suas ações e ver se não há motivos para a desconfiança. Como reestabelecer este pacto de confiança? Eu creio que uma parte da solução é trocar as direções, e acredito que meus camaradas irão se empenhar nisso na etapa estadual. Mas outra parte importante é compreendermos efetivamente as práticas que causaram esta desconfiança e rever nossos métodos de direção (sejam as direções atuais ou as futuramente eleitas). E para isso seria necessária uma profunda autocrítica partidária, uma espécie de retificação coletiva dos métodos de direção e disputa dentro do Partido.

E quando falo em autocrítica não quero dizer um parágrafo de texto ou uma fala breve numa plenária. Falo de 1) documentar todos estes erros, expondo os motivos que levaram a tal decisão e as consequências das práticas adotadas pelas direções (desde antes do racha); 2) mudar as estruturas concretas do Partido (ou seja, tirar pessoas dos cargos de direção e colocar outras, mas também mudar a forma organizativa, abandonando a ideia de Comitês Regionais, que se pautam numa divisão espacial burguesa e que reproduzem as contradições entre campo e cidade, capital e interior); e 3) também mudar as práticas individuais, mas isso só será possível a partir de um método de responsabilização coletiva da militância consigo mesma – não podemos, de maneira alguma, esperar soluções espontaneístas de ninguém (como isso pode ser feito é outra questão, que não tenho resposta). 

As direções precisam assumir responsabilidade sobre o seu papel e assumir os erros que cometeram. As bases elegem suas direções pois confiam que estes camaradas farão um bom trabalho e conseguirão dirigir os trabalhos de acordo com os princípios do Partido (mesmo que sejam, na verdade, induzidos a acreditar nisso). Se há uma crise de legitimidade das direções é porque a base sente que as direções não agiram de acordo com a responsabilidade que lhes foi conferida e que faltaram com algum princípio estabelecido. Nesse caso, cabe às bases decidir se aquelas direções ainda são capazes de cumprir o papel a que foram designadas. O processo congressual tá ai pra isso.