Senado votará hoje PEC da Morte que estabelece Marco Temporal
A PEC será discutida hoje na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) do Senado Federal. Se aprovada, essa PEC colocará em risco os Territórios Indígenas já demarcados e praticamente inviabilizará futuras demarcações, exacerbando conflitos e violências contra os povos indígenas.
Por Redação
A ofensiva contra os direitos indígenas avança novamente com a PEC 48/2023, que será discutida hoje, 10 de julho, na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) do Senado Federal. Se aprovada, essa PEC colocará em risco os Territórios Indígenas já demarcados e praticamente inviabilizará futuras demarcações, exacerbando conflitos e violências contra os povos indígenas.
A aprovação dessa PEC intensificaria os conflitos agrários, as invasões de terras e a violência contra os povos indígenas. Isso não apenas traria consequências desastrosas para a biodiversidade e o clima, mas também afetaria diretamente a vida de toda a classe trabalhadora ao intensificar a degradação ambiental e social.
A retomada da tese do Marco Temporal por meio dessa PEC é mais um capítulo da ofensiva dos capitalistas do agronegócio para expropriar os territórios indígenas e expandir suas operações. Legalmente, a atuação dos setores da burguesia do agronegócio é proibida em terras demarcadas.
O direito à demarcação de terras indígenas, consagrado na Constituição de 1988, é fruto de décadas de resistência e luta dos povos indígenas contra a opressão colonial e capitalista. Embora a demarcação de terras não garanta por si só condições seguras de vida sem violência e exploração capitalista, é a única forma de assegurar o direito à terra em que vivem.
Esse projeto anti-indígena propõe alterar a Constituição e prever que o direito à terra será assegurado apenas se for comprovado que os indígenas ocupavam suas terras na data da promulgação da Constituição. Essa PEC é mais um ataque do governo Lula-Alckmin aos direitos dos povos indígenas, demonstrando seu alinhamento com os interesses dos ruralistas e grandes empresários, em detrimento dos direitos das comunidades tradicionais e da preservação ambiental.
O debate sobre a tese do Marco Temporal existe há mais de 10 anos e ganhou força recentemente. Até 2023, era discutida tanto no Supremo Tribunal Federal quanto no Congresso. Após anos de espera e intensas mobilizações dos movimentos indígenas, o STF finalmente rejeitou a tese do Marco Temporal em setembro de 2023, considerando-a inconstitucional. No entanto, a ameaça persiste com a tramitação da PEC 48/2023.
Paralelamente, a tese também tramitava no Congresso como Projeto de Lei 490, ganhando destaque durante o governo Bolsonaro em 2021, ano em que diversos ataques diretos a terras indígenas ocorreram. A lei continuou a ser movimentada nos anos seguintes e foi votada rapidamente em 2023 por uma manobra da burguesia latifundiária amparada pelo então presidente Lula.
Em setembro de 2023, antes da rejeição pelo STF, a tese do marco temporal foi aprovada pelo Senado como parte do PL 490 (ou PL 2903/2023) e encaminhada para sanção. Em outubro, o presidente Lula vetou parcialmente o PL 2903, contrariando a demanda do movimento indígena pelo veto completo. Em novembro, o governo federal aprovou a Lei 2903, que se transformou na Lei 14.701, como parte de um acordo com a bancada ruralista para obter apoio na aprovação da Reforma Tributária, utilizando a luta indígena como moeda de troca.
Desde então, o movimento indígena e seus aliados têm se mobilizado incessantemente para contestar a aplicação da lei e buscar sua declaração de inconstitucionalidade pelo STF, enfrentando a omissão e a conivência do Estado burguês. O marco temporal representa um ataque direto aos povos indígenas e a luta pela terra no Brasil. O Estado impõe um Marco Temporal ilusório datado de 1988 e controla as TIs com o intuito de entregá-las aos latifundiários, continuar a mineração, a venda de madeira com “selo verde”, a privatização de florestas e os acordos internacionais pela venda de carbono. Impede a demarcação de novos territórios e abre precedentes para reavaliar terras já homologadas, pois as TIs só podem ser demarcadas se houver como provar que estavam ocupadas na data anterior à promulgação da Constituição.
Segundo dados do Conselho Indigenista Missionário (Cimi), órgão ligado à Comissão Pastoral da Terra (CPT), há cerca de 1.296 terras indígenas no Brasil, das quais 530 não têm nenhuma ação do Estado brasileiro visando sua demarcação. Dessas, 401 estão completamente demarcadas, enquanto 306 têm o processo demarcatório iniciado, mas não finalizado. Além das terras não homologadas, há 65 terras indígenas que não se classificam como tradicionais devido à restrição imposta pela lei burguesa. A maioria das demarcações ocorreu na década de 1990. Durante os governos Lula e Dilma, apenas 79 e 21 TIs foram demarcadas, respectivamente, e nos governos Temer e Bolsonaro não houve nenhuma homologação.
A proposta de campanha do governo Lula-Alckmin era a demarcação imediata de 14 territórios indígenas nos primeiros 100 dias de governo. Isso não foi cumprido e até hoje o governo homologou apenas 10 terras indígenas. O Ministério dos Povos Indígenas indicou a necessidade de demarcar 25 terras indígenas nesse período, mas isso não foi acatado por Lula-Alckmin e seus projetos. Esse número ainda é insuficiente.
Com a aplicabilidade da Lei do Marco Temporal, algumas terras indígenas já demarcadas estão sendo revistas, como ocorreu recentemente com a terra Raposa Serra do Sol em Roraima. A não demarcação tem aumentado o nível de ataques diretos aos povos indígenas por madeireiros, mineradores, empreiteiras, especuladores imobiliários e grileiros, intensificando a contaminação das águas e a destruição do solo e das florestas.
As pessoas indígenas são as que mais sofrem com assassinatos por conflitos de terra no Brasil, representando cerca de 45,17% dos casos nos últimos dez anos, conforme dados da CPT. Em 2023, as principais vítimas do Estado burguês e dos setores privados foram indígenas, com 212 casos envolvendo disputas por água e terra, além de aproximadamente 116 invasões diretas em Terras Indígenas (TIs). Diante desses conflitos, o Estado esteve omisso e agiu de maneira conveniente.
A crise capitalista mundial, que se acentuou ainda mais a partir de 2008, causou no Brasil uma nova onda expropriatória. Aumentou-se a concentração fundiária, a expansão da monocultura, a prioridade à exportação de produtos primários, a superexploração do trabalho, a devastação ambiental e a violência no campo.
Historicamente, a política agrária no Brasil favorece o latifúndio, levando à concentração de terras e à expropriação de terras de camponeses, indígenas, quilombolas e comunidades tradicionais, além de contribuir para a degradação ambiental. O governo social-liberal continua a isentar o agronegócio de impostos e a destinar bilhões a ele. Recentemente, o povo Guarani Kaiowá bloqueou rodovias no Mato Grosso do Sul em protesto contra os planos do governo Lula de destinar 500 bilhões para o agronegócio através do Plano Safra, enquanto concede apenas "tostões" para a demarcação das Terras Indígenas e trava todas as homologações.