Senado aprova projeto de Novo Ensino Médio com mais retrocessos
O texto do Projeto de Lei 5230/2023 foi aprovado com a manutenção de termos como "notório saber" para docência, possibilidade de oferta de ensino à distância no Ensino Médio, a relação com o setor privado e a reversão da carga horária da Formação Geral Básica de 2400 para 2200 horas.
Por Redação
O Senado Federal votou nesta última quarta-feira (19) a aprovação do Novo Ensino Médio. Houve um retrocesso na carga horária da Formação Geral Básica (FGB) para a formação técnica profissional aprovada anteriormente pela Câmara dos Deputados, reduzindo-a de 2400 para 2200 horas nesta modalidade, pelo menos até 2029. Essa redução aumenta o número de horas que municípios e estados poderão terceirizar o serviço para o ensino privado. Essas 200 horas equivalem à carga horária anual da disciplina de Matemática ou Português em muitas redes públicas de ensino do país.
O texto também alterou a definição sobre o que faria parte dessa Formação Geral Básica. O texto a tornou dúbia, sendo composta não só pela Base Nacional Comum Curricular (BNCC), porque também prevê uma “parte diversificada”. Tal definição abre margem para inclusão de disciplinas fora das áreas do conhecimento convencionais de forma similar aos itinerários formativos. Além disso, o texto aprovado não cita nominalmente as disciplinas que farão parte de sua composição nem a carga horária mínima para cada uma, facilitando a exclusão de diferentes áreas do conhecimento que não são consideradas prioridade por parte dos governos burgueses
Portanto, essa alteração do Senado criou margem para transformar até mesmo a Formação Geral Básica (FGB) em disciplinas similares aos itinerários formativos. Com essa abertura, pouco importa se das 3 mil horas de formação obrigatória, a FGB terá 1800 ou 2400 horas, pois uma disciplina que faz parte dos itinerários pode entrar nessa carga horária.
Além dessas alterações, foram mantidos outros retrocessos que já haviam sido aprovados pela Câmara dos Deputados como a utilização do termo “notório saber” que permite que pessoas sem formação na área de educação possam atuar no ensino; a possibilidade de oferta ensino à distância (EAD) do ensino médio; e a oferta de disciplinas pelo setor privado no ensino público.
A redução da FGB na formação técnica profissional ocorreu devido à pressão do Sistema S de ensino. Esse Sistema é um conjunto de empresas privadas que, embora se apresentem como instituições educacionais e de treinamento, operam predominantemente para a reprodução da força de trabalho necessária ao funcionamento do sistema capitalista dependente de nosso país. As empresas que fazem parte dele são: Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (Senai); Serviço Social do Comércio (Sesc); Serviço Social da Indústria (Sesi); e Serviço Nacional de Aprendizagem do Comércio (Senac).
Com o aumento das horas em itinerários formativos, o Novo Ensino Médio permitirá que secretarias municipais e estaduais criem parcerias com instituições privadas para provimento desses conteúdos, aumentando a privatização do setor através do aumento dos recursos públicos que serão destinados a essas empresas. Hoje, diversas dessas companhias privadas de ensino já lucram com tais recursos vendendo apostilas e cursos de formação de professores para as secretarias de educação, além de angariar maior lucro através dos recursos públicos também seguem um modelo de ensino destinado à mera formação de força de trabalho, privando os estudantes de um ensino crítico e de qualidade.. Por isso, a proposta inicial para alteração da carga horária da FGB era de apenas 2100 horas nessa categoria de ensino.
Apesar de todos esses ataques à educação pública, a Senadora Teresa Leitão (PT - PE) afirmou que a aprovação do PL foi um avanço: “Estamos com o melhor projeto de lei possível. Os itinerários formativos de educação profissional são de verdade, baseados no catálogo de ocupações. Não serão invencionices como o [que ocorreu no] Estado de São Paulo que chegou a ter mais de 200 itinerários, [sendo] impossível acompanhar, impossível monitorar, impossível aprofundar qualquer conhecimento tecnológico ou profissional”.
Porém, pelo já exposto, a fala da Senadora contradiz o que foi aprovado no texto, o que é considerado como “o melhor projeto de lei possível” é um projeto ainda pior do que o aprovado anteriormente na Câmara dos Deputados. Ademais, esses itinerários criados no Estado de São Paulo e criticados por ela, podem ainda ser criados a partir no Novo Ensino Médio, sendo incluídos na “parte diversificada” que fará parte da Formação Básica Geral não só na formação profissional técnica mas também no regular.
Mesmo com o apoio da base do governo federal, tais retrocessos não passaram sem protestos. Logo na manhã desta quarta-feira o diretor do Diretório Central dos Estudantes (DCE) da Universidade de Brasília (UnB), Caio Sad, foi preso por participar de um protesto silencioso onde exibia cartazes contra o projeto do Novo Ensino Médio que seria votado ao lado de outros manifestantes. O estudante foi mantido preso até o fim da votação. Tal repressão visa impedir o debate público sobre o tema.
Para impedir os protestos da população a votação do projeto, que deveria ocorrer nesta quinta-feira (20), foi adiantada pela relatora, Dorinha Seabra (União Brasil - TO), buscando realizá-la sutilmente longe da mobilização dos estudantes e outros setores populares da classe trabalhadora brasileira.
Durante a votação houve consenso entre senadores que compõem a base do governo Lula e a oposição alinhada ao bolsonarismo que se colocaram a favor do adiantamento e elogiaram o novo relatório que, segundo eles, acolheu todas as questões, principalmente as do Sistema S de ensino. Isso demonstra grande apoio da burguesia pelo projeto, reiterado pela declaração do senador Marco Rogério (PL-PR) líder da oposição no senado:
“Essa é uma matéria que já veio da Câmara e está passando pelo Senado, dentro daquilo que a gente tem como ideal e o que é possível construir. (...) Não vejo o caminho da ampliação da carga horária como um caminho do aperfeiçoamento do ensino. Há um universo de matérias que nada acrescentam à formação do aluno. Mas o consenso do que veio da Câmara e o construído pela relatora é de aprovar essa matéria”.
O Projeto de Novo Ensino Médio é um substitutivo ao PL 13.415/2017 apresentado pelo, ex-Ministro da Educação, Mendonça Filho (União Brasil - PE) e faz parte do pacote de ataques à classe trabalhadora brasileira intensificado após o golpe de Michel Temer, em 2016.
Com a aprovação após a votação simbólica no Senado Federal, o texto volta para apreciação da Câmara dos Deputados com as novas alterações. O objetivo do Governo Federal é aprová-lo o mais rápido possível para que possa ser implementado já em 2025. Assim, caso seja aprovado, teremos uma maior precarização do ensino público além do avanço de sua privatização. Pela nova proposta, o ensino se voltará cada vez mais para a formação de força de trabalho capaz de atender às demandas do Capital em nosso país. Destruindo qualquer possibilidade de qualificação no ensino público e reservando o ensino crítico e científico apenas àqueles que puderem pagar.
Com a base do Governo Federal também apoiando tal projeto tornou-se inadiável a mobilização dos estudantes e da classe trabalhadora para barrar esse Novo Ensino Médio que deve ser enterrado junto com todas as outras contrarreformas realizadas nos últimos anos.