Rio de Janeiro: Militantes do núcleo UERJ aderem à Reconstrução Revolucionária

Anunciamos o rompimento de todos os presentes signatários com a Coordenação Regional da UJC-RJ e seus organismos, inclusive o núcleo UERJ, bem como a adesão à Reconstrução Revolucionária, em defesa do XVII Congresso Extraordinário.

Rio de Janeiro: Militantes do núcleo UERJ aderem à Reconstrução Revolucionária
Destinamos esta Carta a todos os camaradas da UJC do Rio de Janeiro, especialmente aos camaradas do núcleo UERJ e à CR UJC-RJ, mas também a todos os camaradas com quem compartilhamos as mesmas trincheiras nas mais diversas lutas no Rio de Janeiro e no restante do Brasil.
A democracia revolucionária exige que devemos combater o oportunismo, a tolerância diante dos erros, as desculpas sem fundamento, as amizades e a camaradagem com base em interesses contrários aos do Partido e do povo, a mania de que um ou outro responsável, é insubstituível no seu posto. Praticar e defender a verdade, sempre a verdade diante dos militantes, dos responsáveis, do povo, sejam quais forem as dificuldades que o conhecimento da verdade possa criar. A democracia revolucionária exige que o militante não tenha medo do responsável, que o responsável não tenha receio do militante nem medo das massas populares. Exige que o responsável viva no meio do povo, à frente do povo e atrás do povo, que trabalhe para o Partido ao serviço do povo.
Amílcar Cabral

Introdução

Todos nós que escrevemos esta Carta e, imaginamos nós, todos vocês que a leem nutrimos de alguns sentimentos em comum. Tristeza, decepção, angústia, desesperança, ódio e revolta traduzem um pouco do que nós podemos sentir nesse momento extremamente conturbado. Tristeza em ter tantas relações de camaradagem destruídas. Decepção em ver o oportunismo e o individualismo ascendendo em pessoas com quem dividimos inúmeras lutas. Angústia com a inexistência de uma resolução simples; em saber que, apesar de estarmos exaustos, estamos apenas no início de mais um capítulo em nossa história. Desesperança quando vemos tanto trabalho sendo posto de lado para dar espaço ao carreirismo e individualismo de alguns. Ódio e revolta contra todos os nossos algozes. Mas é justamente por sentirmos tudo isso, independente de qual lado estamos, que precisamos, mais do que nunca, colocar esses sentimentos em um segundo plano.

Assim, iniciamos a escrita desta Carta no dia 20 de agosto de 2023, mais precisamente, no exato momento em que nos é informado sobre a deliberação, em reunião do nosso núcleo da UJC (UERJ), da abertura de Processo Disciplinar contra alguns de nós por quebra do “centralismo democrático”. Contudo, não pretendemos, ao longo desta Carta, nos concentrar totalmente sobre a regularidade ou irregularidade meramente formal deste processo. Sua forma, nas atuais condições, pouco importa. Seu conteúdo e contexto político, sim. Destinamos, portanto, esta Carta a todos os camaradas da União da Juventude Comunista do Rio de Janeiro, especialmente aos camaradas do núcleo UERJ e à CR UJC-RJ, mas também a todos os camaradas com quem compartilhamos as mesmas trincheiras nas mais diversas lutas no Rio de Janeiro e no restante do Brasil.

Por fim, ao final desta Carta, diante de todo o exposto em seu texto, anunciamos o rompimento de todos os signatários com a Coordenação Regional da UJC-RJ e seus organismos, inclusive o núcleo UERJ, bem como a adesão à Reconstrução Revolucionária, em defesa do XVII Congresso Extraordinário.

Sobre a luta interna no Partido Comunista Brasileiro

Fundado na cidade de Niterói, em março de 1922, o Partido Comunista Brasileiro (PCB) trava há 101 anos a luta pelo socialismo no Brasil. Não é possível contar a história de nosso país no século XX sem citar o PCB e suas principais lideranças, como Luís Carlos Prestes, Carlos Marighella, Ana Montenegro, Thereza Santos, Minervino de Oliveira, Gregório Bezerra, Laudelina de Campos Melo, Jorge Amado, Claudino José da Silva, Zuleika Alambert, Clóvis Moura e mais tantos outros comunistas que deram suas vidas para a construção da ferramenta revolucionária da classe trabalhadora. O Partido Comunista Brasileiro é parte da história de nosso povo, de suas lutas e das suas conquistas sociais, tendo passado 56 dos seus 101 anos na clandestinidade por estar nas mais diversas linhas de frente da luta contra o capitalismo e todos os seus males estruturais e estruturantes que afetam o nosso povo.

Como descrito por Carlos Marighella, em 1966, na Tribuna de Debates do VI Congresso do PCB, em todos os partidos do proletariado “que foram adiante e obtiveram vitórias — inclusive chegando ao poder — passaram por um processo mais ou menos agudo da luta interna”. Isto aconteceu em países como China, Cuba e URSS. Em sentido semelhante, no Brasil, Marighella nos mostra que “todos os passos para a frente em questões de orientação ou de correção de erros, na vanguarda do proletariado, sempre foram acompanhados de intensa luta interna”. Foi assim em 1942-1945 (período do Estado Novo), em 1956-1958 (período da discussão do culto à personalidade) e no período após o golpe militar-fascista de 1964.

Em Carta à Comissão Executiva do Partido Comunista Brasileiro, Marighella denuncia, em 1966, os problemas presentes no núcleo dirigente do PCB. Muitos desses problemas destacados na década de 60 também se fariam presentes posteriormente na saída de Prestes em 1980, na crise liderada por Roberto Freire em 1992 e, agora, na crise de 2023.

“O centro de gravidade do trabalho executivo repousa em fazer reuniões, redigir notas políticas e elaborar informes. Não há assim ação planejada, a atividade não gira em torno da luta. Nos momentos excepcionais, o Partido inevitavelmente estará sem condutos para mover-se, não ouvirá a voz do comando. [...] Uma das questões em que a Executiva se mostra temerosa e conservadora é quanto ao aparecimento de livros e à circulação de ideias. Acerca de um ano e meio publiquei o livro Por que resisti à prisão. A experiência das lideranças passadas em matéria de lançamento de livros não é boa. As direções executivas dificultavam ou impediam tal coisa por meio de subterfúgios, retendo originais ou exercendo a censura prévia.”

Na década de 1980/90, novas questões surgem e a saída de Luís Carlos Prestes do PCB e, depois, a queda do muro de Berlim impactam diretamente a vida interna do Partido. Já em 1980, Prestes apontava os desvios de direita no Comitê Central do PCB que, posteriormente, viria a culminar no liquidacionismo liderado por Roberto Freire em 1992:

“Uma direção que não funciona como tal e não é capaz de exercer o papel para o qual foi eleita, um Comitê Central em que não é exercido o princípio da direção coletiva – caracterizado pela planificação e o controle das resoluções tomadas pela maioria —, no qual reina a indisciplina e a confusão, em que cada dirigente se julga no direito de fazer o que entende. [..] Na verdade, a justa preocupação da maioria dos comunistas com a unidade do PCB vem sendo utilizada pela atual direção como um biombo para tentar ocultar a falta de princípios reinante nessa direção, o apego aos cargos e postos, o oportunismo dos que mudam de posição política para atender a interesses pessoais, a tradicional conciliação em torno de formulações genéricas que nada definem e que visam apenas a manutenção do status quo, deixando, ao mesmo tempo, as mãos livres para que cada dirigente faça o que bem entenda. [...] O oportunismo, o carreirismo e compadrismo, a falta de uma justa política de quadros, a falta de princípios e a total ausência de democracia interna no funcionamento da direção, os métodos errados de condução da luta interna, que é transformada em encarniçada luta pessoal, em que as intrigas e calúnias passam a ser prática corrente da vida partidária adquiriram tais proporções, que me obrigam a denunciar tal situação a todos os comunistas.”

No momento em que Prestes rompe com o Partido e apela às bases, é aberto um espaço para que a ala eurocomunista (maioria) do Comitê Central se afirmasse como defensora da unidade do PCB e acusasse o ex-secretário geral de divisionista. Dessa forma, durante o período de afastamento de Prestes, as narrativas liquidacionistas e a capitulação política foram oportunisticamente apresentadas pelo já denunciado Comitê Central. Mas não somente isso, o seguidismo ao discurso de Mikhail Gorbatchov, liderança da URSS, levou a Direção do Partido Comunista Brasileiro a se articular para destruir o Partido, inclusive, dando voz e voto no Congresso do PCB às pessoas que não eram do Partido.

Ivan Pinheiro em sua Intervenção no Seminário Internacional promovido pelo Partido Comunista do México (PCM), em 23/11/19, explica como se deu esse processo:

“Em agosto de 1991, aproveitando-se do fim iminente da União Soviética e do PCUS, a Executiva Nacional do Partido resolve convocar, em caráter de urgência, uma sessão extraordinária do CC para 1º de setembro, com um único ponto na pauta: a convocação de um Congresso Extraordinário (para 24 e 25 de janeiro de 1992), para liquidar o PCB e decidir o nome e a direção do “novo partido de esquerda” que o substituiria, proposta aprovada, nesta sessão do CC, por cerca de dois terços dos presentes. Ao término da sessão, os membros do CC que votaram contra a proposta assumiram imediatamente a mesa dos trabalhos. Decididos a lutar pela manutenção do Partido, resolveram divulgar o manifesto “O PCB VIVE! VIVA O SOCIALISMO!”, criar o Movimento Nacional em Defesa do PCB e convocar o Encontro Nacional em Defesa do PCB, que se realizou com sucesso, no Rio de Janeiro, em 12 e 13 de outubro, com a presença entusiástica de centenas de militantes de 16 Estados brasileiros. Este Encontro aprovou uma Declaração Política, elegeu uma Coordenação Nacional do Movimento e decidiu como tarefa prioritária uma imediata campanha de agitação e contatos com a militância, considerando que era possível construir uma maioria para derrotar os liquidacionistas, já que nas bases partidárias a proposta de acabar com o PCB repercutia negativamente. No entanto, em meio aos debates para a eleição de delegados, a Executiva Nacional do CC instituiu o que chamou de “Fóruns Socialistas”, reuniões a que não tínhamos acesso, em que podiam ser eleitos delegados com direito de voto no Congresso Extraordinário não militantes do PCB que declarassem pretender filiar-se ao “novo partido” que nele seria criado, falsificando previamente o resultado, em aliança com setores identificados como a “esquerda do MDB.”

E aqui, um ponto fundamental de compreensão da crise de 1992: a ala liquidacionista venceu a disputa interna. Roberto Freire atingiu seu principal objetivo: expurgou os chamados “fracionistas” do Partido (que, na realidade, foram os que não se renderam frente ao liquidacionismo, antileninismo, revisionismo e direitismo do Comitê Central capitaneado por Freire e organizaram a “fração”, ou melhor, o Movimento Nacional em Defesa do PCB), tomou de assalto toda a estrutura partidária do PCB, seja política, organizativa ou patrimonial (a grande maioria do patrimônio ficou com o partido sucessor, PPS, como casas, lojas, bares, editoras, gráficas, etc), e desassociou essa estrutura partidária secular da tradição comunista revolucionária. Restou, portanto, aos expurgados apenas a continuação do legado histórico e político do PCB, através de um novo registro eleitoral, que objetivava a reconstrução do Partido.

Entre 1993 e 2005, os debates no interior do Comitê Central e nos Congressos foram marcados por grandes divergências no que tange  à natureza do partido, à política de alianças e ao caráter da revolução brasileira, levando sempre a uma frequente entrada e saída de militantes no PCB, como também aponta o ex-secretário geral Ivan Pinheiro em sua intervenção ao PCM. Em 2005, por sua vez, é iniciado verdadeiramente o processo de Reconstrução Revolucionária, através do XIII Congresso, compreendendo o PCB como um partido revolucionário. Esse processo, no entanto, não exclui totalmente as divergências inconciliáveis e uma ala antileninista e reformista continua a travar suas batalhas nas conferências e congressos seguintes, ainda dentro dos limites do centralismo democrático.

Como bem apontado recentemente por Caio Andrade, ex-membro do Comitê Central do PCB, em Questões fundamentais para o aprofundamento da reconstrução revolucionária, com a crise internacional do capital em 2008, as contradições da sociedade burguesa ampliaram “o espaço para as ideias marxistas e despertando o interesse de mais trabalhadores e jovens conscientes de importância de se organizar e lutar pelo socialismo”. Deste modo, com o avanço “nos debates sobre estratégia e tática da revolução socialista, o PCB voltou a atrair quadros interessados em contribuir na sua reconstrução revolucionária”. Em 2013, nas jornadas de junho, e no período de 2016-2017, na luta contra o golpe e o Governo Temer, uma nova geração de jovens militantes se somaram às fileiras da UJC, a juventude do PCB.

Com o crescimento quantitativo e qualitativo da UJC e o desenvolvimento dos coletivos anti-opressões do Partido, como o Coletivo Negro Minervino de Oliveira (CNMO), o Coletivo Feminista Classista Ana Montenegro (CFCAM) e o LGBT Comunista, o processo de proletarização do PCB se acentua e algumas contradições político-organizativas voltam a aparecer no interior da organização. Os coletivos anti-opressões começam, na prática, a servir como “caixinhas”, onde os militantes negros, LGBTs ou mulheres, recrutados ou vindos da UJC, eram direcionados. O Partido, por sua vez, acaba sendo composto em sua base justamente pelos militantes que não se encaixavam nesses coletivos, isto é, homens brancos cis hetéros. No entanto, os principais quadros da juventude e dos demais coletivos acessam, pouco a pouco, as fileiras do PCB e começam, em sua maioria, a confrontar essa estrutura organizativa e a criticar sua cultura e seus desvios pequeno-burgueses. É nesse momento que as contradições se tornam ainda mais evidentes.

Se a antiga geração se moldou na prática política de somente fazer o PCB continuar existindo, a nova geração não mais se contentava apenas com sua mera existência, mas exigia que o Partido se tornasse efetivamente um instrumento revolucionário da classe trabalhadora. Setores reformistas e declaradamente antimarxistas-leninistas voltam a se articular no interior do Comitê Central do Partido Comunista Brasileiro e a luta interna, influenciada também pela luta de classes, portanto, se intensifica e toma proporções mais agudas no período anterior e posterior ao XVI Congresso.

O Giro à Direita: Movimento Comunista Internacional, Eleições Burguesas e Governo Lula

Em resposta ao amadurecimento da Reconstrução Revolucionária, iniciada em 2005, uma ala antileninista tem articulado por dentro do Comitê Central um verdadeiro giro à direita, expresso nos mais diversos âmbitos da nossa política, seja interna (com desvios burocráticos, autoritários e persecutórios) ou externamente (nas eleições burguesas, na política nacional e internacional). Essa articulação em questão toma proporções ainda maiores nas inúmeras tentativas (muitas bem-sucedidas) em sabotar o XVI Congresso, congelando as nominatas de delegados, perseguindo administrativamente delegados mais críticos eleitos, impedindo a circulação das Tribunas de Debates para a militância do complexo partidário e tomando para si organismos de propaganda para difundir sua linha política antileninista e academicista. Todo esse embate, contudo, se torna de conhecimento geral quando o ex-secretário-geral Ivan Pinheiro faz uma denúncia pública sobre a participação do secretário-geral Edmilson Costa e do secretário de relações internacionais Eduardo Serra em encontros da Plataforma Mundial Anti-Imperialista (PMAI), à revelia das Resoluções do XVI Congresso e do próprio Comitê Central.

Muito tem sido colocado pela fração antileninista e pelos que se dizem “terceira via” que a polêmica ao entorno da Plataforma Mundial Anti-Imperialista, iniciada pelo ex-secretário-geral Ivan Pinheiro, se tratava apenas de uma “cortina de fumaça” e um “pretexto” para iniciar uma disputa no interior do Partido pelas vias externas. Isso é redondamente falso. Primeiro, tratar esse desvio direitista de um dos dirigentes do CC como algo “menor” é por si só uma compreensão antileninista do grau de relevância do internacionalismo proletário e do movimento comunista internacional. E segundo, compreender esse desvio como um mero “erro”, além de ser uma compreensão auto enganosa que ignora os fatos concretos desse desvio, rebaixa as nossas resoluções a estarem passíveis de interpretações enviesadas de dirigentes, como se o Comitê Central e seus membros estivessem em um patamar superior do Congresso e de suas resoluções.

Nesse sentido, é preciso enfatizar o que deveria ser óbvio para todo comunista: participar de uma plataforma política como a PMAI, à revelia da deliberação do pleno do CC, além de se configurar como uma quebra das resoluções congressuais, é também um forte desvio frente aos princípios do marxismo-leninismo. Um agravante a tudo isso é a forma com que Eduardo Serra, até aquele momento secretário de relações internacionais, e o Comitê Central tratou desses desvios. Serra não só agiu de má-fé descumprindo nossas resoluções congressuais, como ainda mentiu ao CC e aos militantes do PCB quando colocou como justificativa ter “passado mal” e acidentalmente ter participado do encontro da PMAI. Isso, é no mínimo ultrajante com todos nós, visto que o mesmo, como foi provado, preparou com antecedência discurso para a reunião e o realizou fazendo coro à linha política da plataforma.

Como anteriormente apontado no Manifesto em Defesa da Reconstrução Revolucionária do PCB, o primeiro sinal do giro à direita, no âmbito nacional, se deu a partir da política eleitoral, principalmente nas eleições de 2016 em diante.

“O PCB manteve, no período de 2008 a 2014, uma política eleitoral própria, expressão da independência política do proletariado, em oposição a um governo de conciliação de classes e recusando a subordinação política à pequena burguesia. Mas das eleições municipais de 2016 em diante, o PCB passou a coligar-se com o PSOL nas eleições nas principais capitais do país e depois em âmbito estadual e nacional, sem que houvesse qualquer balanço oficial do Partido sobre a correção da tática eleitoral anterior ou os fundamentos dessa mudança. Mesmo com o XV Congresso (2014) afirmando por diversas vezes a necessidade de uma postura eleitoral ligada estreitamente a nossos objetivos estratégicos [...]. Esse reboquismo produziu situações absurdas como, em 2016, o apoio do PCB a Edilson Silva, candidato do PSOL à prefeitura de Recife, cuja campanha adotava o mote “Recife, cidade empreendedora”; ou, ainda naquele ano, o apoio a Luciana Genro, que defendia em sua campanha abertamente as terceirizações no serviço público. E ainda hoje esse seguidismo se manifesta em nossas táticas, como no caso da adesão do PCB, em SP, à chapa reformista majoritária nas eleições sindicais da APEOESP em 2023.”

O giro à direita também se demonstrou durante todo o período da Campanha Nacional Fora Bolsonaro. Isso porque o CC do PCB escolheu adotar a campanha como o principal fórum de articulação e de luta contra o governo fascista, mesmo se tratando de uma clara frente ampla, que incluía partidos como o PSB, PDT, PV e outros partidos burgueses, e que tinha como principal tática o impeachment de Bolsonaro. Objetivamente, a Campanha Nacional esperava atingir a direita parlamentar e pressioná-la a aderir ao impeachment. Por óbvio, a tática se demonstrou falha e lotada de contradições. Erroneamente, apostaram na tática frente amplista, apelando ao Congresso e ao TSE pelo impeachment de Bolsonaro e a cassação da chapa de Bolsonaro e Mourão, em vez de se voltar à tática da Greve Geral que iria concretamente pressionar não só a classe política mas como também a burguesia. Há de se lembrar, inclusive, que vivíamos em uma pandemia, onde a Greve Geral era até mesmo uma necessidade sanitária dos trabalhadores!

Nas eleições de 2022, apesar da ala reformista e antileninista do Comitê Central ter sido derrotada em sua linha política, muitas dessas figuras em suas campanha eleitorais rebaixaram e recuaram a linha do partido (ex.: Sofia Manzano e Eduardo Serra), como bem explicitado no Manifesto em Defesa da Reconstrução Revolucionária.

“No curso do trabalho eleitoral, os desvios e perseguições prosseguiram. Durante a campanha, a candidata Sofia Manzano convence a maioria da CPN à assinatura pelo Partido da “Carta às Brasileiras e Brasileiros em defesa do Estado Democrático de Direito”, demonstrando nossa subordinação política, até mesmo eleitoral, ao democratismo da burguesia, justificando esse reboquismo num etapismo “tático” que vê a superação do fascismo como uma etapa anterior à ofensiva socialista. Outro exemplo flagrante de violação à nossa linha revolucionária durante a agitação eleitoral é o modo como o tema da segurança pública foi apresentado nas campanhas estaduais na Bahia e no Rio de Janeiro. Na Bahia, uma proposta reformista jamais debatida no Partido de cobrar dos soldados da PM o custo de cada bala que usassem, que pretendia ser a panaceia contra a violência policial, apenas expôs a militância partidária a uma onda de ameaças e intimidações de retaliação, sem de fato apresentar qualquer alternativa revolucionária para a classe trabalhadora. No Rio de Janeiro, além da demagogia no discurso do combate ao crime organizado, o candidato ao governo sequer levou em conta o programa aprovado no XVI Congresso do Partido e defendia abertamente uma concepção excêntrica acerca da reorganização do aparato policial.”

No Rio de Janeiro, na candidatura do Eduardo Serra ao Governo do Estado, fomos surpreendidos com uma linha política de campanha eleitoral completamente descolada da linha política real do PCB e seus coletivos. O candidato, em entrevista às grandes emissoras de televisão, como a Bandeirantes, rebaixou o discurso a uma perspectiva reformista e pequeno-burguesa da segurança pública e demonstrou completo desconhecimento sobre a pauta LGBTQIA+. A escolha de sua candidatura aparentava ser fruto muito mais de uma autoafirmação de uma ala da Direção do PCB RJ do que de fato ser uma representação de uma síntese dos acúmulos do complexo partidário sobre o nosso estado.

Quando o PCB anuncia suas candidaturas, onde dos 7 candidatos (3 deputados federais, 2 deputados estaduais, governador e senador) apenas um era negro, já ficou anunciado também para a sua militância o grau de afastamento da Direção do PCB com a realidade ao seu redor (talvez, o único estado que superou o Rio de Janeiro nesse quesito foi a Bahia, onde os negros são 80% da população do estado, mas ainda sim o candidato do PCB ao governo foi um homem branco), situação que prejudicou ainda mais os supracitados debates equivocados a respeito da segurança pública apresentados à população pelos candidatos do Partido nesses estados.

Não bastando as vacilações durante as eleições de 2022, iniciamos e seguimos o ano de 2023 com uma postura ainda mais vacilante frente ao Governo Lula. O Novo Teto de Gastos, o Marco Temporal, o processo de privatização dos presídios e as demais medidas do governo e de sua base tem se perpetuado sem nenhuma grande resistência ou enfrentamento de nossa parte. No mês em que o arcabouço fiscal de Haddad foi aprovado e o Marco Temporal tramitava no Congresso, a capa do Jornal O Poder Popular foi “Solidariedade à camarada Sofia Manzano”, numa clara tentativa de ressuscitar a sua imagem em cima de um falso fato político. Deste modo, o PCB adota, na prática, uma posição de “independência” ao governo federal, isto é, soltando notas políticas e posicionamentos críticos ao governo, mas sem buscar organizar efetivamente nenhuma trincheira de luta contra o governo.

O giro à direita, contudo, não se deu somente em nossa política nacional e internacional, mas também em nossa tradição política e organizativa. Historicamente, sempre existiu uma clara disputa interna acerca de qual tradição marxista nosso Partido deveria seguir. Isso não é de agora, é uma disputa secular presente no PCB, uma disputa que é travada em qualquer Partido Comunista - ou pelo menos em todos que não seguem os marcos do centralismo-teórico. Fazer a análise dessa atual crise sem se debruçar sobre essa disputa acerca da tradição marxista é fechar os olhos para o que está à nossa frente. Não é mera coincidência e nem detalhe que o comando da fração que tomou a direção do Comitê Central seja declaradamente antimarxista-leninista (Mauro Iasi, Sofia Manzano, Mazzeo, Heitor, Edmilson e outros) enquanto que o comando dos militantes que foram expurgados do Partido sejam radicalmente defensores da tradição marxista-leninista.

Mauro Iasi, em período pré-congressual com as Tribunas de Debates do XVI Congresso abertas, ainda que só para delegados, decide por publicar no Blog da Boitempo o texto “Dois métodos e uma decisão”, em uma clara movimentação de resposta a uma tribuna escrita por Gabriel Landi sobre o marxismo-leninismo. No texto, Iasi em consonância com José Paulo Netto, entende que o “marxismo-leninismo” se converte em “ideologia”, onde:

“O resultado desse processo [conversão do marxismo-leninismo em ideologia] conduz a um marxismo teoricamente tão estreito e vulnerável quanto o da Segunda Internacional, mas socialmente mais degradado: agora, ele é objeto de uma lógica de deformações que, facilitada pela via burocrático-administrativa, transita francamente para o arbítrio e a falsificação.” (José Paulo Netto, Capitalismo e reificação, 2015, p. 44).

Ainda no texto, é afirmado que “há um evidente parentesco entre as formas mais determinantes da sociedade tsarista e as formas políticas expressas no stalinismo”, stalinismo este que, segundo Iasi, está expresso na tradição marxista-leninista. Dessa forma, o marxismo-leninismo apresentaria “as deformações positivadas” que “já estavam presentes na Segunda Internacional (como o evolucionismo, o etapismo, o economicismo vulgar, etc.)”. Para Mauro Iasi,  todos “esses aspectos estavam presentes também em Lênin e nos demais bolcheviques”.

O que está em jogo é a tradição marxista-leninista de nosso Partido. A disputa acerca de nossa tradição marxista perpassa todas as frentes da atual crise. Esse antileninismo e a política tocada por esses dirigentes não são coisas apartadas entre si.

A juventude como agente de transformação

Há tempos vem sendo levantada a questão da necessidade de maior integração no Partido. No Ativo Sindical do Rio de Janeiro que ocorreu no dia 1º de julho, essa foi a palavra de ordem ao fim do dia enquanto síntese de tudo o que foi debatido naquele sábado: integração. Foi extensamente colocada em pauta a importância de os organismos do “complexo partidário” estarem em constante comunicação e interação, melhorando, assim, a dinâmica e efetividade das tarefas do Partido como um todo.

Nos debates dentro – e, dada a conjuntura, eventualmente, fora – das instâncias do Partido, pode-se perceber tal realidade comum entre os organismos do “complexo”: a ausência da integração intrapartidária. Essa notória lacuna imputa reflexos materiais na construção dos nossos trabalhos de base e na socialização e aplicação dos nossos acúmulos. Esse é um problema inerente a um modo organizativo que já estabelece a priori sua divisão em coletivos.

Somos comunistas, sabemos que poucas coisas são mais efetivas para construção coletiva que o “boca a boca”, a troca verbal e honesta de nossas impressões enquanto seres humanos e políticos. Instâncias partidárias são essenciais à organização e ao funcionamento de um partido marxista-leninista, mas, quando o caminho que esses conteúdos percorrem é atravessado por diversas condições – as quais, muitas delas, eventualmente a realidade nos mostra serem desnecessárias – a informação fica truncada. O engessamento de informações, experiências e debates tem um claro papel de, simplesmente, não permitir que esse fluxo ocorra, comprometendo, também, a dinâmica de atuação da nossa principal ferramenta de lutas.

Essa configuração organizativa do Partido possui um papel objetivo que reflete claras ideias do ponto de vista de uma maioria reacionária do Comitê Central: a divisão entre “nós” e “os outros”. “Nós” é composto por um grupo restrito que se contenta em operacionalizar arbitrariedades impunemente à mercê do que lhes parece fazer sentido. Esse sentido, divergindo-se da verdadeira práxis leninista, é encontrado em interesses e formulações teóricas que não têm diálogo com a prática e com o mundo real de luta de classes que os circundam.

“Os outros” parece justamente refletir essa realidade concreta. Em âmbito partidário, “os outros” dos quais os academicistas do Comitê Central buscam se diferenciar, são precisamente os jovens trabalhadores que permeiam as fileiras dos coletivos do PCB. Tanto buscam se diferenciar, que se apoiam exatamente nessa estrutura engessada de “complexo partidário”, dividida em diferentes coletivos. Questões do nosso tempo, como o surgimento de novas formas de tecnologia e comunicação, demandam renovação de debates, análises e ideias, como impera nossa prática de exercício da dialética, da crítica e da autocrítica. Aí reside o reacionarismo de nossa direção: resistir ao desenvolvimento histórico do proletariado!

Além disso, a conjuntura política na qual a classe trabalhadora está inserida, conta com elementos como pós-golpe de 2017, a destruição social planejada por um governo ultraliberal, acompanhado de uma pandemia e, no momento, uma gestão social-liberal que dança conforme a música tocada pela politicagem institucional e clama por aplausos quando não faz nem o mínimo. Neste ano, por exemplo, foi determinado um reajuste de apenas R$20,00 do mínimo salarial. A uberização e a pejotização do trabalho também são elementos contemporâneos que levam a juventude trabalhadora à máxima precarização.

Como sabemos, essa precarização da vida e opressão de classe incidem também em suas especificidades, em múltiplos âmbitos, levando em consideração diferenças de raça, identidade de gênero, sexualidade, e outras tantas formas de violência e marginalização social de grupos oprimidos. Incide o sistema capitalista no proletariado de forma predatória se adaptando de acordo com essas particularidades, como vemos na ação de mercantilização - e, consequentemente, esvaziamento - de debates políticos sérios, na forma do que é comumente chamado pelos setores direitistas de "pautas identitárias". Esse fenômeno conduz a práticas como, por exemplo, o chamado “pinkwashing”, ou como também a reivindicação de uma representatividade em abstrato, vazia, que se furta de conteúdo e função políticos.

O capitalismo vai se renovando e desenvolvendo suas tecnologias em função da incessante exploração da classe trabalhadora. As gerações dessa classe trabalhadora também vão se renovando, e renovam consigo seu ódio de classe. Um partido que se propõe comunista, marxista-leninista, não pode encarar grupos já marginalizados na sociedade como uma esfera à parte da construção coletiva.

A juventude do PCB, deu um largo salto quantitativo nos últimos anos, devido ao seu trabalho de base, à construção do movimento estudantil em âmbito nacional e à instrumentalização das ferramentas virtuais, alcunhas de nosso tempo, para alargar o alcance de ideias e informações. A pretensão do giro operário-popular nas fileiras do Partido permeava o trabalho de base da militância enquanto parte do projeto de sua reconstrução revolucionária. A proletarização em curso das fileiras partidárias se fez evidente, basicamente, com esse crescimento da juventude recrutada, ao passo que o partido em sua formalidade não absorveu, tampouco coletivizou, tal ampliação e renovação não apenas de jovens trabalhadores, mas de novas experiências, acúmulos e ideias.

Não há forma organizativa mais integradora que aquela com a ausência de divisões desnecessárias! A Reconstrução Revolucionária do Partido Comunista Brasileiro passa necessariamente por esse debate também!

A UJC-RJ frente ao processo disputa interna no PCB

A nota do CR da UJC-RJ, que optou por uma tentativa de terceira via, em diversos momentos pormenorizou situações e debates internos (ou a falta deles) que ajudaram a construir a crise política no Partido. Um dos exemplos que deixa clara a falta de elementos no debate foi a decisão de não listar as sucessivas ações antidemocráticas do Partido no processo de construção do XVI Congresso, os processos disciplinares anteriores à realização do Congresso e o acordo feito pelas duas defesas em disputa no Partido naquele momento. Discutamos, portanto, a pauta da democracia interna.

Não será a primeira vez que todos que verão esta Carta terão lido a questão da tribuna de debates, pauta aprovada em Congresso e não aplicada pelo Comitê Central, ou o congelamento das tribunas da UJC desde o começo da crise (esteja subentendida aqui a supressão da democracia interna), menos ainda a espécie de “cala a boca” que os membros dos coletivos partidários, ou "amigos da organização" como o CC gostaria de elencar, que alastrou a sensação de desconforto, revolta e causou a quebra de diversos militantes por todo o país. Contudo, os reflexos das ações antidemocráticas já eram possíveis de serem enxergadas no Rio de Janeiro, um ano antes da crise. Conforme evidenciada na carta de retorno às atividades do camarada Gustavo Pedro, o Partido optou por excluir do Ativo Eleitoral de 2022 as bases dos coletivos partidários, tornando-as alheias mesmas desta informação, mas convocando-as para incessantes panfletagens e pedindo doações financeiras para as campanhas. Tais atitudes demonstram a tendência mandonista que impera no PCB, mas o que poderia se esperar de um partido em que o Comitê Central mais delibera e debate linha do que as bases e um complexo partidário em que a grande maioria de seus membros se encontra afastada do debate interno por escolha do Partido?

O fato do veto aos coletivos partidários escancara mais um dos desvios do Partido no Rio de Janeiro, mas também no Brasil: o federalismo.

Rio de Janeiro e Pernambuco demonstraram diferenças crassas no período eleitoral de 2022 (enquanto o primeiro vetou a participação dos coletivos partidários na formulação da campanha, o segundo convocou todo os coletivos para construir conjuntamente), fato esse que só foi possível pela forma organizativa confusa que o PCB adotou, mas também pelas próprias resoluções congressuais que buscaram acordar, aglutinar ou deixar em aberto temas centrais da atuação política do Partido, criando lacunas para a utilização de todo o tipo de método possível. O espanto de alguns quanto à fragilidade e à legitimidade do Comitê Central frente a alguns estados que de maneira unitária aderiram à Reconstrução Revolucionária, ou ao menos as suas juventudes de forma quase unânime, podem ser explicados pelos pontos citados acima.

Foi possível ser enxergado no Rio de Janeiro, em especial na UJC, foi um fenômeno muito diferente dos diversos estados do Norte, Nordeste e Sul que majoritariamente aderiram à RR, mas que também recaiu no Federalismo. Utilizando-se da ideia de que “É preciso que o PCB exista para discordar dele”, o Rio de Janeiro tem adotado uma posição de ignorar as questões ocorridas nos outros estados de forma pública, sem ao menos tentar compreender os reais motivos para o desligamento de estados inteiros do PCB-formal. A perseguição de militantes no DF e em MG, a ativa tentativa de quebra de militantes na Bahia e diversos outros casos ocorridos nos últimos anos nem parecem ter ocorrido na mesma organização da UJC/PCB-RJ, fatos esses muito bem-postos no texto “O Sudeste e o Chauvinismo Brasileiro: Entraves para um partido nacional”, de Arthur Campos, em que é exposto o “monopolismo político do debate nacional entre uma suposta ala “paulista” e outra “fluminense”:

Enquanto camaradas na Bahia denunciavam abusos, perseguições, assédio moral e racismo em nossas fileiras, o que chocou os dirigentes da UJC-Rio de Janeiro e motivou seu pronunciamento público não foi a atitude de seus camaradas da CR e CC na Bahia, mas sim a existência de “grupos fraccionistas” nas redes sociais. Os “ratos” e “golpistas”, como se referiam os camaradas cariocas em suas redes, não eram os abusadores na Bahia ou seus pares fluminenses do Comitê Central, mas sim camaradas perseguidos e expulsos da organização. Afinal, a benevolência do Comitê Regional carioca permitiu “até mesmo” o debate interno! É quase como se perguntassem: como algo de outro recanto do Brasil haveria de ser mais importante do que a conjuntura de nosso estado?

Questionamos, portanto, quais foram os esforços dos camaradas do Sudeste em entender o Norte do país? Quais os esforços dos camaradas do Sudeste em apoiar materialmente o movimento comunista no Nordeste? Qual o ímpeto de reclamar para si um suposto “protagonismo” de liderança nacional quando essa liderança parece mais um reinado regional, de costas para o restante do Brasil. Quando uma direção política age tão isolada da realidade nacional, surge também um paralelismo e um fraccionismo, centrado justamente na ideia do excepcionalismo local.

Todos sabemos o quão doloroso tem sido viver essa situação, ver trabalho sendo quebrado, amizades desfeitas, o Partido literalmente terminando de apodrecer na nossa frente, mas assumirmos uma postura defensiva não nos fará sair dessa situação, ao menos não de uma forma digna de um partido comunista. Não é possível ignorar a realidade alheias às nossas, ainda mais se estamos tentando construir um partido a nível nacional, nem muito menos aceitar que por não sermos nós sofrendo tais perseguições pessoais, sufocamento das CRs com núcleos inteiros ou invisibilidade dentro do Partido, que levemos somente as contradições do Rio como foco do debate dentro do PCB-formal.

A nota política do CR se debruça em sua finalização na mudança do perfil social dos militantes da UJC no Rio de Janeiro e no processo do giro operário-popular em andamento no estado – utilizemos então dessa temática para compreender a atuação do partido no estado.

Os dados elencados demonstram um claro avanço nas práticas do complexo partidário e da juventude em adentrar em diferentes segmentos da sociedade, construindo luta em diversas frentes e aprendendo a somar em questões que os comunistas tanto perduraram a apoiar, mas é justamente por esses motivos que é necessário um aprofundamento da atuação revolucionária em território fluminense. É muito comum ouvir de amigos, familiares e conhecidos do estado o descontentamento com o processo de desindustrialização, expresso para a maioria da população no desemprego contínuo (o Rio se encontrava no primeiro semestre desse ano como o terceiro estado com maiores taxas de desemprego, sendo de longe a maior da região sudeste) e a uberização como já citados anteriormente.

Porém, se é tão visível o espaço para a radicalização do discurso político no estado e as contradições da luta de classes se mostram de maneira tão aparentes aqui, o que tem feito o PCB-formal para compreender as dinâmicas e os segmentos que devem ser o foco da atuação comunista? Milhares de jovens trabalhadores trabalham nos pequenos e médios comércios, supermercados ou em diversas regiões como o sul fluminense e a região metropolitana passam a compor o quadro da força de trabalho nas fábricas, mas o PCB-formal não faz diferenciação dentro do proletariado como um todo, como já exposto por direções do Partido no Rio de Janeiro. A não distinção de foco na atuação do Partido já se mostrou como um erro, mas uma das expressões de tal política na juventude é a força que colocamos em eleições do movimento estudantil, quando giramos todos os que tiverem disponibilidade para auxiliar os militantes do núcleo atuante, este fato não significaria algo problemático por conta própria, mas quando colocamos o mesmo peso em outros tipos de tarefas?

Não acreditamos que esse seja um problema exclusivo da UJC-RJ, ou que não seja um reflexo do PCB-formal e da sua cultura política no estado, haja vista o abandono dos “comitês do poder popular”, uma grande oportunidade de enraizamento dos trabalhos políticos do Partido no período eleitoral, não utilizando da eleição somente com o viés eleitoreiro, mas como uma forma de se inserir nas regiões de atuação. A maneira com que o PCB-formal do Rio de Janeiro trata as eleições hoje é com os votos como a finalidade, rebaixando e apagando parte de sua linha para disputar, mas também ignorando que a eleição deveria se tornar somente um dos meios de expandir a sua inserção, afinal, somos reformistas ou revolucionários para seguir atuando dessa maneira? Em qual momento entrou o tão citado “poder popular” nesse meio? De fato, caminhamos rumo ao socialismo? Lamentamos que nesse texto não possamos trazer tantas respostas, mas garantimos que a melhor forma de chegarmos nelas é com o debate franco e a livre circulação de ideias.

A militância do PCB-formal não deve se restringir à concepção de que os trabalhos que temos em desenvolvimento no Partido configuram-se estritamente como objeto da estrutura formal partidária. Os trabalhos que temos enquanto PCB são da própria militância que os toca, afinal, o Partido somos nós. Posicionar-se no sentido de  não reconhecer o atual CC, os expurgos e a prática política que vem sendo tocada no interior da organização não significa, jamais, relegar nossos trabalhos e a história do Partido Comunista Brasileiro, mas, justamente, reivindicá-los enquanto ferramentas da classe a quem os servem: a classe trabalhadora.

Pela Reconstrução Revolucionária do PCB e em Defesa do XVII Congresso

Nessa Carta fica evidente o nosso descontentamento e críticas em relação às ações tomadas pelo Comitê Central e suas práticas anti-leninistas. Diante dessa conjuntura de cerceamento do debate e expurgos ao nível nacional, não vemos outra alternativa a não ser a chamada do XVII Congresso Extraordinário com a ampla participação de seus coletivos partidários. Diferente dos argumentos de “terceira via” utilizados pela Coordenação Regional (CR) da União da Juventude Comunista (UJC) do Rio de Janeiro, isto é, de instrumentalização da Conferência Política Nacional para resolver a crise partidária, sabemos que ela é ilusória. Dessa forma, o único espaço que possui todas as competências para as reformulações necessárias acerca de como nosso Partido vem sendo operado é através do XVII Congresso, nossa instância máxima de deliberação. Diante desse chamado, observamos a postura do Comitê Central em não aceitar as demandas de seus militantes, muito pelo contrário, vem sendo operadas expulsões, dissoluções de células, processos disciplinares que não seguem o nosso Estatuto e, no caso da UJC, a criação de uma Coordenação Nacional paralela que não foi eleita por nossas bases.

Nossa defesa vai em direção ao aprofundamento da Reconstrução Revolucionária do PCB e do marxismo-leninismo. Nós reivindicamos um Congresso com ampla possibilidade de debate, tribunas abertas, pois essa é a única forma de superação dessa crise. Nós comunistas não devemos temer críticas e polêmicas, mas sim enfrentá-las através do debate. A fração academicista que tomou conta das direções do PCB optou por expurgar os militantes que estavam na ala esquerda de nossa organização, fazendo uma política justa de defesa do seu caráter revolucionário, que está sufocada. Assim, agravando-se uma crise que já vinha sendo gestada por disputas sobre a linha política do Partido.

Os que são chamados de fracionistas pelo Comitê Central são aqueles que apontam a importância da reconstrução revolucionária, algo que está em nossas resoluções congressuais. São aqueles que mostram a necessidade da profissionalização, que buscam pelo fim das práticas políticas artesanais, que percebem a necessidade de proletarização das nossas fileiras, que defendem o fim do federalismo e, por último, que lutam para pôr em prática as Resoluções Congressuais do último Congresso, que vêm sendo violadas. Camaradas, é urgente que tenhamos em mente que apenas um Congresso Extraordinário irá garantir um espaço adequado de disputa, debate e unidade partidária.

Portanto, diante de todo o exposto, anunciamos o rompimento de todos os presentes signatários com a Coordenação Regional da UJC-RJ e seus organismos, inclusive o núcleo UERJ, bem como a adesão à Reconstrução Revolucionária, em defesa do XVII Congresso Extraordinário.

Assinam esta Carta:

João Marcelo Lisboa - Estudante de Direito, Militante da UJC UERJ e ex-secretário de finanças do núcleo UERJ

Lara Pedret - Bacharel em Direito, ex-diretora do CALC e Militante da UJC UERJ

Matheus Mantuani - Estudante de Direito, ex-diretor do CALC e Militante da UJC UERJ

Gabriela Krug - Estudante de Ciências Sociais, membra do CACIS e Militante da UJC UERJ

Bruna Alves- Estudante de Ciências Sociais, membra do CACIS e Militante da UJC UERJ

Fernanda Marchezin - Estudante de Ciências Sociais, ex-membra do CACIS e Militante da UJC UERJ

Daniel Goulart - Estudante de Jornalismo e Militante da UJC UERJ

Davi Tavares - Estudante de História e Militante da UJC UERJ

Ana Lúcia - Estudante de Ciências Sociais, membra do CACIS e Militante da UJC UERJ

Leonardo Garcia - Estudante de Direito, integrante do “Samba Arrasta Povo” e Militante da UJC UERJ

Caio Tito - Bacharel em Direito e Militante da UJC UERJ

Maria Luporini - Estudante de Letras e Militante da UJC UERJ

Victor Vicente - Estudante de Ciências Sociais e Militante da UJC UERJ

Gabriel Barboza - Estudante de Relações Internacionais e Militante da UJC UERJ

Yan De Sá - Estudante de História e ex-Militante da UJC UERJ

Ivo Mineiro - Estudante de Direito e Militante da UJC UERJ

Lucas Reis - Estudante de Filosofia e Militante da UJC UERJ