Retirada de Imposto sobre Grandes Fortunas prenuncia regressividade da reforma tributária
O resultado final desse processo de reforma da tributação será uma base tributária de enfática tributação sobre o consumo, na qual seu aspecto essencialmente regressivo recairá, sobretudo, nos trabalhadores.
Por Redação
Concluída a votação do Projeto de Lei Complementar (PLP) 108/24 na quarta-feira (30) pelo plenário da Câmara dos Deputados, ficam estabelecidas as diretrizes para a gestão e a cobrança do Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), como importante parte administrativa da reforma tributária em curso. A proposta seguirá para análise e deliberação no Senado Federal.
Destaca-se entre as propostas rejeitadas pela Câmara dos Deputados, por 262 votos a 136, a emenda do parlamentar Ivan Valente (PSOL), que visava à criação do Imposto sobre Grandes Fortunas (IGF), a ser aplicado sobre patrimônios cujo valor ultrapasse R$ 10 milhões. A medida tinha como objetivo estabelecer tributação adicional sobre a renda de indivíduos com grandes concentrações de riqueza, prevista desde a promulgação da Constituição Federal de 1988 na base tributária brasileira, mas jamais implementada nos mais de 35 anos da Carta Magna, em razão da ausência de regulamentação de sua regra-matriz de incidência.
A proposta do deputado do PSOL previa que, nos cinco anos após a instituição do IGF, as alíquotas iniciais do imposto — fixadas em 0,5%, 1% e 1,5% — seriam gradualmente aumentadas para 1%, 2% e 3%, respectivamente. Esses percentuais incidiriam sobre três faixas de patrimônio: acima de R$ 10 milhões até R$ 40 milhões; acima de R$ 40 milhões até R$ 80 milhões; e acima de R$ 80 milhões.
Apesar do “equilíbrio das contas públicas” e o alcance da meta fiscal ser fundamento de primeira ordem das políticas econômica e fiscal de austeridade do Ministério da Fazenda, o executivo federal nada fez para influenciar na aprovação de proposta que poderia arrecadar R$ 40 bilhões adicionais ao orçamento da União.
Buscando blindar-se das divisões internas da chamada “Frente Ampla” da base governista, o executivo federal sequer se manifestou sobre o resultado da votação. Isso demonstra que, apesar das inúmeras declarações em fóruns internacionais, seja na ONU, seja nos Brics, de que o Governo Lula-Alckmin teria um compromisso com a tributação dos “super-ricos”, essa retórica não é acompanhada de medidas efetivas para incorporar essa preocupação a uma reforma tributária que, até o momento, ainda é acentuadamente regressiva.
Apesar de rejeitada a proposta de regulamentação do IGF, ainda há a possibilidade de instituir uma tributação enfaticamente progressiva sobre a renda de milionários e bilionários a partir da reforma do Imposto sobre a Renda, entretanto, diante das decisões políticas tomadas pelo atual governo, dificilmente se verá qualquer proposta nesse sentido ter apoio considerável do executivo federal.
A cada passo que dá a Reforma Tributária, evidencia-se que a dita estratégia do Ministro da Fazenda, Fernando Haddad, de aprovar em um primeiro momento a reforma da tributação sobre o consumo, para posteriormente reformar a tributação sobre a renda, não passa de entrega da tributação brasileira aos interesses da burguesia.
Nesses moldes, o que surgirá ao final desse processo será uma reforma de enfática tributação sobre o consumo, na qual seu aspecto essencialmente regressivo será preponderante sobre quaisquer “avanços” que poderão ser aprovados na colcha de retalhos que será a reforma da tributação sobre a renda – se houver.