Quem venceu as eleições de 2024?
Crescimento avassalador da extrema-direita e enfraquecimento da esquerda nas eleições municipais é resultado direto da falta de alternativas reais para a classe trabalhadora e da derrota da frente ampla.
Por Redação
As eleições municipais de 2024 trouxeram à tona um cenário político alarmante para o Brasil, com o crescimento avassalador da extrema-direita e o enfraquecimento da esquerda, resultado direto da falta de alternativas reais para a classe trabalhadora. O fortalecimento de partidos como o PL e o Republicanos evidencia que, diante do vazio deixado pela esquerda conciliadora do PT e seu projeto social-liberal, o campo da direita encontra espaço para avançar com uma agenda reacionária. O crescimento expressivo dessas legendas é apenas um reflexo da ausência de uma proposta transformadora à altura das demandas populares.
O PL, partido de Jair Bolsonaro, conquistou 47,9% mais prefeituras em comparação com as eleições anteriores, enquanto o Republicanos mais do que dobrou o número de prefeitos, saltando de 212 para 430, um aumento de 102,8%. O desempenho no número de vereadores foi ainda mais impressionante, com o Republicanos aumentando sua presença em 80,2%, adicionando 2.067 cadeiras às câmaras municipais. Esses números não deixam dúvidas: a extrema-direita ideológica não só manteve como expandiu sua influência, ocupando o vácuo político deixado pela esquerda.
Vereadores eleitos em 2024 como Moana Valadares (PL) de Aracaju (SE), que defende a retórica “deus, pátria e família” associada ao bolsonarismo, promove uma agenda contrária aos direitos da comunidade LGBTQI+. Lúcio Flávio (PL), também de Aracaju, apoia o combate ao uso de banheiros por crianças de gêneros diferentes nas escolas, uma falsa polêmica usada para espalhar desinformação. Lucas Pavanato (PL) em São Paulo (SP), o mais votado do município, amplia o discurso de ódio contra pessoas trans, ridicularizando suas identidades.
Enquanto isso, partidos da direita pragmática, o chamado “centrão”, como o PSD, MDB e União Brasil, continuam dominando o cenário local, com o PSD superando o MDB em número de prefeituras, alcançando mais de 800 municípios. Mas a aparente neutralidade desses partidos esconde uma realidade incômoda: muitos de seus candidatos seguem uma pauta conservadora, defendendo políticas de direita, mesmo quando são apresentados pela mídia tradicional como “moderados”. Essa narrativa ajuda a mascarar a consolidação de um bloco político conservador e neoliberal, em detrimento de uma “esquerda” que se perde em conciliações vazias. O próprio presidente do PSD, Gilberto Kassab, é linha de frente na defesa do teto de gastos que sufoca os investimentos públicos em áreas essenciais.
Por outro lado, o desempenho da dita “esquerda” foi, no mínimo, desastroso. Embora o PT e o PSB tenham registrado algum crescimento em número de votos para vereador (31,8% e 37,1%, respectivamente), partidos como PDT, PV e PCdoB perderam terreno. O saldo final foi a perda de 558 cadeiras de vereadores pelo campo dito progressista, demonstrando a incapacidade da esquerda de reconquistar seu eleitorado. Essa dificuldade é resultado de uma estratégia que prioriza a disputa institucional, nos marcos da democracia burguesa e do capitalismo, e é incapaz de apresentar uma alternativa à degradação da qualidade de vida da classe trabalhadora. Em nome da governabilidade, mantém medidas de austeridade e antipopulares, ao mesmo tempo que cavam suas próprias covas e facilitam o trabalho da direita, que se aproveita da falta de um projeto alternativo que mobilize verdadeiramente as bases populares. UP, PSTU, PCB e PCO não chegaram a 100.000 votos.
A grande mídia, por sua vez, tem desempenhado um papel crucial na normalização desse avanço conservador. Jornais como O Globo e canais como a GloboNews têm insistido em minimizar o crescimento do campo fascistoide da extrema-direita, ao mesmo tempo em que apresentam a direita pragmática como uma força de moderação. Ao associar partidos como o PSD e União Brasil a uma suposta "moderação", a mídia contribui para a legitimação de políticas reacionárias que, na prática, empurram o país cada vez mais para a direita. Esse "centrão" é uma farsa criada por políticos e analistas para fabricar uma falsa neutralidade, sem conteúdo real, fingindo compromisso com a democracia e boa gestão. O crescimento de 236,2% do PL em prefeituras e de 92% em cadeiras de vereadores em relação a 2020 não pode ser simplesmente ignorado ou subestimado.
O uso dos recursos públicos foi um fator determinante para esse cenário. Partidos como o PL, PSD e Republicanos se beneficiaram amplamente do fundo eleitoral e das chamadas "emendas-pix", o que lhes permitiu organizar campanhas robustas e captar eleitores em várias regiões do país. Em 2024, cerca de R$5 bilhões foram distribuídos pelo fundo eleitoral, com PL e PT recebendo juntos quase 30% desse montante. Os prefeitos eleitos nas capitais brasileiras no primeiro turno de 2024 receberam R$78 milhões em recursos dos partidos políticos, com quase 100% desse montante vindo dos fundos eleitoral e partidário. Entre os maiores beneficiados estão Eduardo Paes (PSD), no Rio de Janeiro, com R$21,3 milhões, e Bruno Reis (União Brasil), em Salvador, com R$20,1 milhões, demonstrando a alta concentração de recursos em candidatos das grandes capitais. Em média, os partidos gastaram R$7,09 milhões por prefeitura conquistada nas capitais, mas os valores variam significativamente de acordo com o porte da cidade.
As emendas parlamentares, especialmente as "emendas-pix", que permitem transferências diretas de recursos aos municípios, também foram decisivas: em cidades fortemente beneficiadas por essas transferências, a taxa de reeleição de prefeitos chegou a impressionantes 89,3%. Sob a liderança do presidente da Câmara, Arthur Lira, essas emendas permitiram que parlamentares enviassem recursos diretamente para suas bases e fortaleceu os partidos do da direita pragmática, o “Centrão”. Essas emendas permitiram que prefeitos lançassem obras e projetos até a véspera das eleições, garantindo visibilidade e a reeleição. O uso dessas emendas consolida o domínio de Lira e seus aliados da direita.
No entanto, a chamada “esquerda”, e particularmente o PT, tem insistido em uma tática equivocada de conciliação com a centro-direita e o centro, buscando alianças que, na prática, diluem qualquer projeto de transformação real. Essa conciliação com a burguesia e seus representantes apenas reproduzem o programa burguês e confunde a classe trabalhadora que não reconhece nessa “esquerda” um setor aliado. A aposta em uma "frente ampla" para isolar a extrema-direita tem se mostrado insuficiente e incapaz de alterar o equilíbrio de forças. Ao evitar o confronto direto com as pautas conservadoras e ao aprofundar o movimento de abandonar a construção de uma alternativa política que fale diretamente às necessidades da classe trabalhadora, a esquerda corre o risco de cada vez mais se tornar coadjuvante em um cenário dominado pela direita.
O fracasso dessa estratégia é evidente: enquanto o PT tenta negociar espaços com o centro e a centro-direita, a extrema-direita se organiza, se fortalece e ocupa os espaços de poder, sustentada por um projeto de ultraconservadorismo e neoliberalismo radical. Se a esquerda não reavaliar suas táticas e se reconectar com as lutas populares, o cenário de 2024 será apenas um prenúncio de um retrocesso ainda maior nas próximas eleições de 2026. Deputados, senadores e governadores bolsonaristas da extrema direita e da direita têm atuado de maneira incisiva nas campanhas municipais. Isso faz parte de uma estratégia para ganhar projeção e apoio político nas diferentes regiões. Esses políticos têm participado ativamente das campanhas, com vistas à disputa ao executivo e legislativo em 2026. Os aliados bolsonaristas estão unificados em torno de um objetivo: garantir que as prefeituras conquistadas em 2024 se tornem trampolins políticos para a disputa majoritária de 2026.
O Partido Comunista Brasileiro Revolucionário (PCBR) enfrentou as eleições de 2024 com uma tática clara, alinhada à sua linha marxista-leninista, de utilizar o processo eleitoral como um momento para a agitação nacional de seu programa. A Plataforma Municipal do partido focou em demandas concretas, como a redução da jornada de trabalho, a reestatização de serviços essenciais e a defesa intransigente dos direitos sociais, sempre com o objetivo de fortalecer a luta proletária e expor os limites do sistema político burguês. Embora não tenha lançado candidaturas próprias, o PCBR adotou uma postura de apoio crítico a candidatos que se comprometeram com sua plataforma, sempre analisando o cenário local para garantir que suas alianças respeitassem a independência ideológica e a coerência programática do partido.
A tática do PCBR nas eleições de 2024, ao evitar tanto o abstencionismo quanto a capitulação às alianças com partidos burgueses, refletiu a resolução de seu Congresso de manter uma linha revolucionária no campo eleitoral. O partido conseguiu ampliar sua visibilidade, mobilizar setores da classe trabalhadora e fortalecer suas bases, apesar das dificuldades impostas pela ausência de uma legenda eleitoral própria.
A tarefa que se impõe agora é clara: a construção de uma alternativa política com independência de classe, que rompa com o pragmatismo eleitoral e as concessões à direita, e que seja capaz de mobilizar a classe trabalhadora em torno de suas demandas reais, fazendo avançar a estratégia da revolução proletária. Sem isso, o Brasil continuará sua marcha para a direita, com a extrema-direita e a direita pragmática, o chamado “centrão”, consolidando seu domínio sobre o cenário político, enquanto essa “esquerda” se dissolve em suas próprias contradições e reboquismo.