Queda nas sindicalizações evidencia desafios para a esquerda

Os sindicatos e atuação política nestes instrumentos de luta são pontos em constante destaque na tradição revolucionária. O desafio está colocado e cabe a nós comunistas a tarefa de compreender a conjuntura em que estamos e desenvolver as melhores táticas para nossa atuação.

Queda nas sindicalizações evidencia desafios para a esquerda
"Os dados apresentados pelo IBGE trazem à tona questionamentos fundamentais para a esquerda, que é obrigada a reavaliar um espaço em que teve forte atuação por muitos anos."

Uma pesquisa feita pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) apontou que a taxa de sindicalização registrou o menor nível em dez anos, evidenciando os efeitos da reforma trabalhista efetuada durante o mandato de Temer e da precarização das relações de trabalho. De acordo com o levantamento, das 99,6 milhões de pessoas ocupadas, apenas 9,2% eram sindicalizadas em 2022, uma redução de 1,8% em comparação ao ano de 2019, último ano onde os dados foram coletados. Os dados são da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) contínua, que iniciou o levantamento destas informações em 2012, quando a taxa de sindicalização era de 16,1% dos trabalhadores ocupados. Em retrospectiva, os números apontam que a redução já era notada ano após ano, com uma média de queda de aproximadamente 0,2% ao ano até 2015. A partir de então a queda passa a ser de quase 1% ao ano.

Para o militante do PCB-RR e Diretor do Sind-REDE/BH Diego Miranda, para se compreender a redução do número de sindicalizados é necessária uma compreensão mais ampla das relações trabalhistas no Brasil. "Temos que observar qual era a veiculação dos sindicatos junto ao estado e como isso afeta a relação com os trabalhadores. Até recentemente, era comum que o primeiro contato de um trabalhador com a existência do sindicato era a cobrança que vinha na folha de pagamento. Então o trabalhador se via em uma relação onde ele não tinha vínculo sequer com sua consciência política, era algo que era dado pela sua relação institucional. Então parte destas sinalizações eram compulsórias, não expressavam uma real relação com suas representações.", explica. Para ele, as transformações nas relações trabalhistas também geram forte impacto na redução do número de trabalhadores sindicalizados, principalmente por conta das terceirizações e dos vínculos precarizados por meio de aplicativos  e plataformas.

A presidenta do Sindicato dos Metroviários de São Paulo e integrante da Resistência, uma das correntes do PSOL, Camila Lisboa, destaca que a reforma trabalhista tirou poder e capacidade organizativa dos sindicatos, até mesmo nas negociações salariais, atacando a relação dos trabalhadores com seus representantes e na criação de contratos com muita flexibilização de direitos. "Existe também uma campanha ideológica contra a coletividade, vivemos sob a égide do neoliberalismo, que é um sistema que se orienta pelo máximo do individualismo, não só do ponto de vista da sua organização econômica, mas também na ideia de que o indivíduo é o centro do mundo e de que sozinho se pode conquistar seus objetivos. Tudo isso contribui com um pensamento que conspira contra a coletividade e a organização sindical tem a ver, essencialmente, com coletividades", afirma.

Camila defende que a resposta a ser dada para reverter esse quadro passa por um trabalho de reforçar o sentido de solidariedade entre os trabalhadores e também de resgatar o histórico de conquistas da classe. "Embora estejamos vivendo em um período em que é difícil ver as conquistas, elas estão relacionadas à uma luta coletiva. No nosso sindicato fazemos essa propaganda de forma permanente, de que não existe luta individual", pontua.

Diego destaca que a atuação dos comunistas nas entidades representativas se dá de forma articulada com a luta política. "Para nós o trabalho nos sindicatos é um trabalho onde devemos atuar para desenvolver uma consciência de classe. Vemos que para isso é necessário retomar bandeiras importantes para o proletariado e que foram deixadas de lado nos últimos anos, como por exemplo a redução da jornada de trabalho. Também temos que evidenciar questões importantes para o mundo do trabalho, mas que são renegados ou deixados de lado, como a previdência ou mesmo a questão dos adoecimentos, que é uma realidade hoje para boa parte dos trabalhadores. Então temos que ter bandeiras que se universalizam e organizar nossas reivindicações em uma perspectiva revolucionária. É preciso aproveitar quando as pautas econômicas se evidenciam para dar um encaminhamento político para elas, sempre no sentido de fortalecer a luta e ampliar nossa influência no movimento sindical".

Os dados apresentados pelo IBGE trazem à tona questionamentos fundamentais para a esquerda, que é obrigada a reavaliar um espaço em que teve forte atuação por muitos anos. Os sindicatos e atuação política nestes instrumentos de luta são pontos em constante destaque na tradição revolucionária. O desafio está colocado e cabe a nós comunistas a tarefa de compreender a conjuntura em que estamos e desenvolver as melhores táticas para nossa atuação.