'Que comunista tem medo de tribuna?' (izacloss)

A crítica e autocrítica via tribunas pode ser parte importante do nosso motor no sentido de evidenciar o movimento das contradições no corpo do discurso — que se forma ideologicamente em nossos pensamentos e atitudes — e continuar avançar sobre as contradições.

'Que comunista tem medo de tribuna?' (izacloss)
"Assim, se queremos avançar ideologicamente, devemos criar um espaço para que as ideias e conflitos circulem livremente e reitero como a escrita por seu aspecto temporal pode dar estes meios na conjuntura em que vivemos."

Por izacloss para a Tribuna de Debates Preparatória do XVII Congresso Extraordinário.

Camaradas, vou fazer uma breve digressão de como conheci a importância das tribunas no caminho da minha militância, farei tal digressão porque pessoalmente preciso fazê-la e porque me ajuda a demonstrar minha linha de pensamento. Então peço que me acompanhem. Entrei no CFCAM Curitiba em meio a sua criação, pois tinha procurado o PCB e o espaço do CFCAM foi onde poderia iniciar meu processo militante com o partido. Durante a construção do núcleo tivemos muitas dificuldades sobre o reconhecimento de sua criação, e eu sem formação sobre o que era a organização comunista — no sentido de entender seus pilares de estudo, propaganda, agitação e organização da classe trabalhadora — me coloquei desajeitada para a tarefa. Veio a pandemia e nosso núcleo passou por muitas dificuldades, mas nos mantivemos e só mais recentemente comecei a me debruçar sobre os dramas do que é uma organização comunista, pensando nas questões relacionadas ao centralismo democrático e a necessidade de um manejo correto das lutas de linhas.

Em abril deste ano fizemos uma formação sobre centralismo democrático aberta ao complexo partidário. Eu e uma outra camarada escolhemos dois textos para serem discutidos na formação, dividimos os participantes em grupos de 4-5 pessoas para lermos os textos conjuntamente, debatermos entre grupos para depois debatermos em grupo geral. Esta proposta pedagógica de divisão de grupos mais dinâmica veio de uma camarada que compunha a instância nacional e se desligou antes do racha Hoje, no meu entendimento, um dos motivos dela ter se desligado tem a ver com como a crise já vinha se instalando no partido pois tínhamos bastante dificuldade em entender o que acontecia nacionalmente. Digo isto para possibilitar um parênteses que julgo necessário: nestas linhas quero deixar meu carinho à todes que estiveram conosco, se desligaram e passaram por dificuldades diante das problemáticas da militância. Meu imenso respeito pelo caminho que abrimos juntes! O CFCAM Curitiba cresceu apesar do próprio partido, cresceu pelo esforço de camaradas valoroses demais e chegou a ter mais de 30 pessoas se aproximando do coletivo.

Mas, retornando…durante a leitura e a preparação da formação, conheci o que seriam as tribunas propostas para a organização comunista. Fiquei totalmente impactada positivamente com a ideia de termos tribunas de circulação de ideias e formulações. Porém isso não existia e essa lacuna foi me incomodando (comentamos na formação como o site do LavraPalavra acabava cumprindo algo desta função). Em maio também tivemos um ativo político em que foi tocado mais seriamente na questão das disputas de linhas — e desvios — e comecei a me dar conta de que algumas divergências já vinham ocorrendo a nível nacional e que estávamos sempre mais ou menos no escuro sobre os ocorridos. Após o ativo, como havíamos feito alguns textos-formulações sobre as questões relativas ao partido (neste ativo fiz uma fala sobre adoecimento psíquico e outra sobre camaradagem) propus que se iniciasse uma tribuna já com estes textos que fizemos. Eu sabia que as falas que fizemos no dia no mínimo deveriam ter impactado, incomodado e provocado nosses camaradas sobre diversas coisas e nada mais interessante do que continuar o debate por outras vias, forçando o que inclusive disse no ativo:

“É dever de todo comunista manifestar suas dúvidas e opiniões tendo em mente que no processo dialético nossos entendimentos e pensamentos são feitos para ir contra a outros apresentados e que estão em constante movimento no debate vivo. Em contrapartida também é dever de todo comunista criar espaço para que as dúvidas e opiniões sejam ouvidas, um ambiente confortável para se estar ao lado mas também poder ir contra”. E completei com um trecho da Frente Popular pela Libertação da Palestina (1969) de que “devemos nos libertar de todos os costumes e tradições herdados da sociedade de classes na qual fomos educados e estabelecer relações de respeito mútuo, apreciação objetiva das qualificações ao invés de cortesias formais, adulação e servidão. Deve haver abertura de ideias entre os dirigentes responsáveis para que, em vez de serem impacientes com a crítica, eles a incentivem e se esforcem para aumentar a coragem moral dos membros e desenvolver sua virtude e atitude revolucionária.”

Camaradas, eu tenho pouco acúmulo sobre as teorizações marxistas-leninistas, conflitos e lutas ideológicas em relação ao comunismo em qualquer nível que seja, nacional e internacional, tenho sede de querer saber mas sei dos meus limites temporais e, assim, tenho a delimitação sobre o que consigo tocar mais profundamente e sei que em alguns assuntos só toco por conta do que me chega de quem estuda e das formações e formulações que vamos construindo coletivamente no nosso espaço de militância. Ademais, a formação comunista é uma formação permanente que se desenrola no tempo com novas formulações que vão sendo construídas no seio do debate internacional e nacional.

Quando eu coloquei pós ativo político sobre a proposta de fazermos a abertura de tribunas, é óbvio que eu considerei que isso não seria aceito de cara, afinal eu não era da célula e teria que talvez ser feito por lá, ter sido debatido, ou coisa do gênero. Mas coloco pra vocês o como pra mim — depois de ter estudado e debatido na formação sobre centralismo democrático —, isso não fazia sentido diante do avanço de consciência sobre a organização comunista que comecei a construir. Posso estar viajando (e se eu tiver mesmo, espero que vocês possam tecer uma crítica) mas não faz sentido não termos uma tribuna ativa de debates. Acho que é por isso que a formação me tocou tanto: a possibilidade do debate de ideias é o que produzirá novos problemas, rumo a formulações novas e melhores, com mais possibilidade de camaradas se colocando no debate e não apenas aqueles que já vivem de formular. Para tanto, precisaremos lidar com o que for subindo à superfície, e sabe, camaradas, teremos que superar muitos entendimentos para construir um mundo novo. Assim, de novo da Frente Popular pela Libertação da Palestina (1969):

“É dever dos dirigentes ouvir os combatentes e membros, pensar bem no que eles dizem, reconhecer a validade de qualquer crítica cientificamente bem fundamentada sobre o trabalho, beneficiar-se humildemente de toda opinião bem fundamentada e esforçar-se para corrigir qualquer opinião equivocada entre os membros através do diálogo, da discussão e da persuasão.”

Tudo o que está saindo nas tribunas hoje são questões que os militantes já tinham pra si e que hoje estão sendo publicizadas. E por mais que às vezes possam vir a serem controversas, é importante que elas estejam sendo publicizadas para que sejam debatidas para nosso avanço ideológico. Todas as tribunas que estão saindo hoje são de camaradas que compunham as mesmas fileiras que nós a nível nacional e pouco tínhamos notícias de suas formulações. Ademais, se tecemos críticas, também estas críticas são do campo comunista brasileiro e do que precisamos avançar nacionalmente rumo a revolução brasileira, visto que as tribunas também podem ser respondidas por pessoas de fora da organização.

Neste sentido, quando as tribunas começaram de forma pública, eu não vou negar, eu fiquei maravilhada. Contudo, eu entendo que o grande número de tribunas e debates pode provocar certa angústia e na minha cabeça pensante (pensando sempre nela, na revolução), comecei a imaginar as dificuldades e em como as tribunas poderiam ser organizadas; em blocos, em temas; algumas dialogando mais com algumas e outras com outras, e por aí vai. Pensei o quanto a possibilidade de acompanhar debates entre tribunas de temas que não tenho tempo hábil de me aprofundar pode ter um valor fundamental para minha práxis comunista, deste modo a teoria afetando e sendo afetada pela prática e vice-versa. E chamando no Jorge Ben, camaradas, não existe outro modo de dançar, a não ser dançando. E caso encontremos problemas com a forma como as tribunas estão sendo publicizadas, que possamos avançar num modo mais adequado de debates via tribunas, melhorando a ferramenta das tribunas dentro da organização comunista.

Em um dado momento também foi percebido que camaradas começaram a se angustiar com os temas, com receio de que estaríamos falando mal do partido, de sua imagem, sua história. E aí eu fiquei pensando nesse medo e não consigo imaginar forma mais honesta do que lidar com essas confusões do que com o próprio caráter que a tribuna tem. Houve incômodo, faça a digestão, leia o texto de novo, reflita, troque uma ideia com algume camarada e forneça uma crítica. Não é esse o nosso motor comunista? A crítica e a autocrítica?

Deste modo, a crítica e autocrítica via tribunas pode ser parte importante do nosso motor no sentido de evidenciar o movimento das contradições no corpo do discurso — que se forma ideologicamente em nossos pensamentos e atitudes — e continuar avançar sobre as contradições. No caso da escrita, eu acredito no potencial que a mesma tem porque traz uma marcação bem diferente por sua relação com o tempo de digestão das palavras e de construção de respostas para além da fala imediata. Assim, se queremos avançar ideologicamente, devemos criar um espaço para que as ideias e conflitos circulem livremente e reitero como a escrita por seu aspecto temporal pode dar estes meios na conjuntura em que vivemos.

Para finalizar, gostaria de colocar o quanto considero o processo de escrita um processo subjetivamente difícil e me custa muito estar escrevendo esta tribuna, assim como me custou escrever uma carta com outres camaradas no momento do racha. A gente escreve, e as palavras reverberam. E para quem escreve sempre reverbera em maior ou menor grau no sentido de tentar entender como nossas palavras foram recebidas. De todo modo, só queria deixar isso explícito no meu texto, sobre como é difícil escrever ou se colocar: todo o aparato ideológico que vivemos nos condiciona em se isolar com receio de crítica. Assim sendo, meu intuito com esta tribuna é que ao expor estas dificuldades, possamos superá-las de modo que mais e mais camaradas consigam se colocar sem medo de um modo conhecido sobre críticas — como aqueles da ideologia burguesa (com críticas corrosivas e deboches) — para um novo entendimento sobre crítica, onde o reconhecimento do nosso escrito seja levado em consideração e que cresça a vontade de debates dignos da revolução brasileira..


Referência:

https://traduagindo.com/2022/12/06/o-centralismo-democratico-e-um-principio-basico/