'Preparar a contraofensiva: Teses para a profissionalização da agitação e propaganda' (Bruno Alves)

Nossa agitação e propaganda não devem girar em torno da autoconstrução, da autoproclamação e da arrogância academicista. Longe disso, deve ser uma agitprop profundamente vinculada ao trabalho real de nossa militância, em sua luta diária para construir o Poder Popular.

'Preparar a contraofensiva: Teses para a profissionalização da agitação e propaganda' (Bruno Alves)
Ao contrário do que dizem os conservadores e fascistas, nós não começamos a guerra cultural. Mas daremos um desfecho para ela!

Por Bruno Alves para a Tribuna de Debates Preparatória do XVII Congresso Extraordinário.

Há algum tempo (pelo menos 100 anos) os reacionários de todas as espécies nos acusam de travar uma “Guerra Cultural”. Eles dizem, desde muito, que estamos minando silenciosamente as bases do Ocidente, a partir do que chamam “politicamente correto” e “multiculturalismo”. Para além das raízes racistas e antissemitas dessa declaração, sobre as quais valeria um estudo extenso e próprio, precisamos observar que, com isso, conservadores e fascistas se lançaram nas trincheiras culturais. Nós, por outro lado, nem ao menos conseguimos entrar nessa guerra.

É fato que a direita possui abundantes recursos financeiros, talvez infindáveis, para tirar seus planos de hegemonia do papel. Mas enquanto nos conformarmos em depositar sempre o motivo de nossas derrotas na superioridade da força do inimigo, nunca mais veremos algo como uma Sierra Maestra ou a Queda de Saigon. Se eles têm a mina de ouro, nós temos a disposição, “que vale mais”. Porém, pontuo que a disposição sem um planejamento coletivo se torna iniciativa individual, sujeita a todos os tipos de desvios individualistas e mesquinhos, sem capacidade real de transformar a sociedade. Precisamos superar o discurso derrotista disfarçado de “leitura material" e, com ele, os métodos artesanais que se tornaram o modus operandi da nossa organização. Esse amadorismo se reflete negativamente também na nossa agitprop.

A agitação e a propaganda sem trabalho prático real perde sua razão de ser. Tudo isso precisa estar em consonância. Sem essa coesão, corremos o risco de rebaixar a agitprop de nosso partido em gritos autoproclamatórios e sectários, transformando-a, no máximo, em marketing político. Não podemos cair na mesma armadilha que a social-democracia e socialistas pequeno-burgueses que, de 4 em 4 anos, correm para os pontos de ônibus e estações de metrô para vender bolo seco e café mal passado para, quem sabe, “virar os votos” dos trabalhadores. Esses setores se tornam realmente politicamente ativos apenas em períodos eleitorais na esperança de ganhar, em votações cada vez mais apertadas, do candidato de direita.

É preciso estar no dia a dia da classe trabalhadora. Devemos aproveitar esse pequeno lapso histórico de legalidade do partido para fomentar uma agitprop capaz de dialogar com as amplas massas de trabalhadores para os quais o Estado só aparece em forma de repressão militarizada.

Sobre o que já existe

Por vezes nos mantemos em uma posição cômoda de “criar novos espaços”, em que estejamos, naturalmente, à frente desses. Isso é um entrave para a nossa agitprop. O vanguardismo (não confundir com vanguarda), o anseio por dirigir a qualquer custo os espaços, faz com que uma parcela da classe trabalhadora ainda nos olhe com desconfiança. Precisamos ter em mente que uma entidade de base fortalecida é um partido revolucionário fortalecido. Ainda nos furtamos a participar e incentivar esses espaços por medo de sermos dissolvidos. Esse receio não poderia ser mais falso. Se estivermos organizados e demarcando pacientemente nossa posição, não há o que temer.

É preciso fazer um balanço autocrítico sério: ainda temos dificuldade em nos inserirmos nas lutas dos bairros. Temos, por exemplo, núcleos e células genéricas, com camaradas que moram na mesma zona, mas cuja distância real é um empecilho para a ação política qualificada. Esporadicamente nos pegamos chegando como alienígenas para panfletar em um bairro ou outro. É certo que dessa ação podemos colher alguns frutos e fazer com que nossa agitação chegue um pouco mais longe. No entanto, essa é uma tarefa dispendiosa e pouco frutífera. É preciso que estejamos inseridos de fato na vida social desses bairros para conquistar a confiança dos que moram ali. As pessoas precisam saber nosso nome, nossa cara. Precisam saber que não estamos ali apenas para entregar um panfleto e ir embora em seguida. Essa é a forma de fazer política dos partidos da ordem, não a nossa forma.

Onde existem iniciativas culturais já bem estabelecidas, não há a necessidade de “inventarmos a roda”. Podemos prestar auxílio para essas iniciativas, sejam batalhas de rima, rodas de capoeira, rodas de samba, casas de cultura, academias vermelhas, etc. Tomemos a atitude de ajudar na manutenção desses espaços, contribuindo financeiramente e juridicamente, e/ou colocando nossas habilidades à serviço do crescimento dessas iniciativas. Tudo isso será muito menos dispendioso, e muito mais efetivo do que estar “à frente” delas. Uma das tarefas mais importantes da vanguarda é saber quando deve ser retaguarda. A ânsia pela autoconstrução é um desvio de direita da função do partido revolucionário, e deve ser combatido como tal.

Já existem algumas experiências próprias a nível local, mais ou menos avançadas, mas ainda são desconhecidas de toda a militância. Se fará necessário, para um próximo período, que realizemos um balanço dessas experiências, além de mapeá-las. Precisamos avaliar onde erramos, onde acertamos e o que podemos melhorar. Com esse balanço será possível superar os localismos e nacionalizar essas experiências, corrigindo erros cometidos anteriormente. Não podemos começar do zero a cada nova empreitada.

Em locais onde essas iniciativas não existem, podemos estudar a possibilidade de criá-las. Tomemos, camaradas, os Panteras Negras como exemplo: eles passavam muito mais tempo servindo ao povo com seus programas comunitários de todos os tipos do que em protestos. Precisamos de espaços de sociabilidades distintos daqueles que a burguesia nos fornece. É nessa espécie de Estado Paralelo onde reside o embrião do Poder Popular; nas casas de cultura, nas academias vermelhas, nas bibliotecas comunitárias, etc.

Sobre nossa política editorial

Mesmo depois de 30 anos desde o início da reconstrução, ainda engatinhamos em nossa política editorial. Isso se deve, em grande medida, pela falta de recursos financeiros, fruto do amadorismo do nosso partido nesse quesito. Outro fator que também contribuiu foi a nebulosidade que se criou ao redor da presidência e da direção de aparelhos como o Instituto Caio Prado Júnior e a Fundação Dinarco Reis. Com a pouca ou nenhuma transparência (e a consequente ausência de renovação) esses aparelhos se tornaram inertes, fazendo alguns poucos lançamentos pontuais.

Não é de se espantar que nos últimos anos tenham surgido iniciativas editoriais indiretamente ligadas ao partido. É certo que, pelo esforço pessoal de alguns militantes, temos avançado no sentido da propaganda qualificada. O trabalho de divulgação e aprofundamento do marxismo dessas editoras oxigenou a literatura revolucionária no Brasil. Porém, é preciso dizer, que elas ainda atuam de forma descentralizada. Por serem iniciativas próprias, não há uma decisão coletiva do partido, ou daqueles responsabilizados por ele, sobre a linha editorial a ser desenvolvida.

De certa forma essas iniciativas são “espontâneas”. Explico: dependemos que um ou outro camarada decida que esta ou aquela obra tem relevância e deve vir à luz do dia. Depois, dependemos que algum camarada consiga traduzir o texto se ele estiver em outra língua. Com isso, a boca do funil fica ainda mais estreita e o trabalho editorial geral acaba prejudicado. Não há aqui um juízo de valor sobre as obras publicadas por essas editoras. Mas essas iniciativas - funcionando como oásis -  não são suficientes para desenvolvermos um trabalho nacional capaz de (des)desertificar a nossa propaganda. Devemos aproveitar que a literatura marxista-leninista não está proibida (como já esteve e pode voltar a ser), para fazer florescer a revolução brasileira.

Podemos nos utilizar da experiência e da cadeia de produção dessas editoras ligadas indiretamente ao partido para melhor elaborar uma editora partidária forte e atuante. De igual maneira, poderemos centralizá-las a partir do trabalho coletivo para criar um ecossistema de agitação e propaganda que, mesmo diferentes, trabalhem em uníssono para levar adiante a linha do partido.

A parte de finanças do XVI Congresso versa sobre “desenvolver um planejamento para aquisição de meios de produção gráficos (impressoras, serigrafias, etc.)”(pg.9) . Isso é de extrema importância, potencialmente barateando os custos de nossa produção e podendo gerar mais receita para as finanças partidárias. Na verdade essa necessidade foi colocada na ordem do dia desde que “perdemos” muitas das nossas gráficas em 1992. É de se lamentar que poucos avanços tenham sido feitos desde então. Se não temos nossos próprios meios de imprimir panfletos, jornais, revistas e outros materiais de agitprop, ficamos dependentes de terceiros. Não preciso dizer que, em qualquer situação, de legalidade ou não, isso atrasa e dificulta a difusão das nossas ideias. Construir um parque gráfico extenso e espalhado por todo o país é a garantia de que, mesmo forçados à clandestinidade pela repressão, nossa agitação e propaganda não serão extintas.

O ponto 87, no que diz respeito à nossa política editorial, é o que julgo mais equivocado. Ele diz que:

“O PCB deve envidar esforços para recriar uma editora própria, com gestão designada pelo CC, não nitidamente vinculada ao Partido, contando com a contribuição de dirigentes e militantes do Partido sem pagamento de royalties ou qualquer forma de retorno financeiro. (...)” (p. 14) (grifos meus)

Começo dizendo que não vejo motivos para a gestão ser escolhida a dedo pelo Comitê Central. Não sendo um tema de urgência no que diz respeito à segurança, não existe ônus em elegermos essa gestão em nossa instância máxima, o Congresso. Com o debate aberto e franco sobre cada indicação podemos evitar que chegue à gestão indicações por proximidade ou coleguismo. Outro ponto positivo dessas indicações surgirem das nossas fileiras é a diversidade entre camaradas que cumprirão essa tarefa, garantindo que nossa política editorial não caia no recorrente erro de achar que “Lima é o Peru”.

Segundo ponto: gostaria, sinceramente, de saber que debate foi feito para chegarmos na síntese de “não nitidamente vinculada ao partido”. Se o debate for “por segurança”, para despistar em caso de reação, considero inócuo. Sabemos que, historicamente, qualquer imprensa não hegemônica, em tempos de repressão, cai como um baralho de cartas. Até mesmo a imprensa liberal, se não pisar nos ovos certos, vira alvo dos aparelhos de repressão do Estado. Não vejo qualquer motivo para dissimulação, como disse Marx. Evitemos a postura de algumas organizações, em que “O rei está nu”. O rei, no fundo, sabe que está nu. Já o público tem certeza, mas todo mundo finge que não.

Por fim, considero que o caráter “voluntário” que se atribuiu à contribuição de militantes e dirigentes pode ser uma resposta à curtíssimo prazo diante da falta de recurso financeiro. Se esse prazo for muito estendido dará à editora um caráter amador. Pior! Refletirá a divisão elitista entre trabalho intelectual e trabalho manual. Aqueles camaradas que têm outras formas de sustento escreverão e trabalharão em prol da nossa editora. Pelas próprias condições materiais, aqueles que recebem pouco, ou que estão desempregados, acabarão por priorizar outras atividades que tragam algum retorno financeiro. Assim, a literatura marxista fica, uma vez mais, nas mãos da pequena burguesia e dos intelectuais. Nada mais justo que camaradas recebam algum tipo de retorno com suas contribuições.

Sobre uma falsa dicotomia

Pelo menos desde o nosso XV Congresso temos o acúmulo coletivo de que os meios físicos e digitais se complementam. Se lutamos para que as gerações mais novas de comunistas entendessem a importância do jornal (com relativo sucesso), falhamos em instruir as gerações mais antigas sobre nossa agitação na internet. Ainda restam em nossas fileiras preconceitos injustificados com as mídias digitais. Para alguns camaradas, essas servem apenas para divulgar um evento ou alguma ação pontual. Essa concepção é errática. Dificilmente temos espaço na televisão, rádio ou qualquer outro veículo de massa. Se há alguns anos isso era possível, com a reforma eleitoral de 2017 a burguesia limitou drasticamente nossos canais. Nos restou, enquanto veículo de massa, a atuação nas redes.

Não se trata aqui de reafirmar ilusões liberais sobre uma suposta imparcialidade na internet. Todos nós sabemos que as redes sociais são produtos das Big Tech. Não somos inocentes a ponto de acreditar que há imparcialidade no Youtube, Twitter, Facebook, etc. Além do mais, as redes ainda trazem um novo impasse à militância; elas possuem uma espécie de “economia política” que incentiva os provocadores, o espontaneísmo dos nossos militantes e os bate-bocas infindáveis e infrutíferos. Tudo isso não será resolvido com um único golpe de machadinha, é fato. Para seguirmos adiante, precisamos avançar em nossas formulações sobre a disciplina partidária nas redes e fazer um balanço das nossas experiências de agitprop com esses canais.

O que muitos camaradas não entenderam é que o advento da internet criou uma nova categoria de trabalho (portanto, uma nova categoria em nossa classe), os produtores de conteúdo digital. Youtubers, Streamers, “Blogueiras". Essas categorias não estão suspensas no ar. Todas elas são parte da nossa classe, ainda que se tenha uma distorção na consciência de muitos deles, que os fazem acreditar serem donos dos meios de produção. Talvez pela ausência de um chefe que lhes chamem atenção, aos gritos, para que produzam conteúdo. Para essas categorias, a pessoa do gestor é uma fantasmagoria que chamamos algoritmo.

Ainda existem aqueles camaradas que buscam diminuir a agitprop na internet, tratando-a como “apenas entretenimento”. Parece que alguns camaradas ainda subestimam o entretenimento como canal com potencialidade de despertar as consciências. Ainda carregados de preconceitos reacionários, consideram o entretenimento algo menor, supérfluo. Isso é, de certa forma, irônico, considerando que o nosso partido já teve uma célula, por exemplo, na rede globo. Me salta aos olhos que o Partido de Vianinha tenha se esquecido do sucesso de A grande família. Isso indica que os academicistas (mesmo os de esquerda) ainda buscam estabelecer uma divisão artificial entre “alta cultura” e “a cultura das massas”. Devo alertar que apenas inverter os pólos negativo-positivo não torna a tese mais verdadeira.

Gostemos ou não, a internet hoje é parte do cotidiano da classe trabalhadora, em maior ou menor grau. Diante da crise que se instaurou, vemos tentativas de desqualificar o trabalho de camaradas como Jones Manoel e Gustavo Gaiofato na internet. Podemos argumentar que o prestígio de uma ou outra figura pública pode levar à distorção da linha do Partido. Isso é válido. Devemos ainda questionar sobre a possibilidade de desvios personalistas, mesmo sem que haja a intenção por parte desses camaradas. Isso também é válido. Mas a solução para essas contradições vem sendo nivelada por baixo nas nossas fileiras. Diante do aumento do prestígio desses camaradas, temos medo de que essas figuras se tornem maiores que o próprio partido. É um absurdo que, diante desse temor, nossa solução seja buscar diminuir o prestígio desses camaradas ao invés de aumentar o prestígio do Partido entre as massas pelo exemplo e pelo trabalho coletivo. Isso tudo é se render à pequena política, à política dos mexericos. A fofoca, a mentira, as conversas de corredor. Essas coisas que  "servem como uma luva” nos círculos acadêmicos e no mundo corporativo devem ser extirpadas do Partido Comunista. Nossas críticas devem ter espaço para serem francas, duras, mas fraternais. Sem isso, viramos um balde de caranguejos.

Considero que temos ainda muito a avançar no debate sobre a internet enquanto veículo de massas da nossa agitprop. Sendo certo que estamos reféns de "atravessadores digitais"¹, que são as Big Techs, precisamos encontrar os meios para "burlar" seus algoritmos. Isso envolve um trabalho sério de pesquisa. Precisamos entender que cada rede tem seu formato. Podemos dizer que é possível fazer agitação no TikTok ou no Twitter, mas a propaganda acaba por ficar defasada nessas plataformas. Hoje o Instagram prioriza a entrega de vídeos à imagens estáticas, mas permanecemos postando imagens com textos enormes. Esses são apenas alguns aspectos que considero relevantes, ainda existem muitos mais.

Não priorizar este ou aquele método em detrimento de outro implica em conhecê-los em toda a sua extensão, sabendo qual seu alcance e seus limites. Para estar à altura da nossa tarefa histórica enquanto agitadoras e propagandistas, precisamos que todas as bases estejam em igual ponto de partida. Sugiro que organizemos seminários de agitação, propaganda e formação que versem sobre as redes sociais, boas práticas em comunicação e em design. Aliado a isso, precisamos de uma plataforma para que esse seminário não se perca a enxurrada de informação da internet e que tenhamos sempre à disposição e de fácil acesso para toda a militância.

Sobre acessibilidade

Como se não bastasse o cerco midiático da burguesia, contamos ainda com a auto sabotagem. Grande parte da esquerda negligencia um aspecto importante da agitação e propaganda: a acessibilidade. Este, camaradas, também é nosso calcanhar de aquiles. Posso citar, por exemplo, a falta de um intérprete de libras em nossos canais como O Poder Popular.

Hoje nossa agitprop não chega em pessoas com deficiência (PCDs). Isso é inaceitável. Nosso site, por exemplo, carece de revisões seríssimas sobre o assunto. Não basta que esperemos que essas pessoas "se virem" para acessar nossos canais de comunicação. Precisamos rever essa política lamentável. Implementar descrições de textos e imagens, bem como formar mais camaradas na língua de sinais, são tarefas urgentes de nossa agitprop. Devemos, também, nos acostumar a fazer transcrição de texto para áudio para notas políticas, matérias e textos.

A falta de acessibilidade em nossos canais se retroalimenta negativamente na falta de acúmulo de nosso partido sobre acessibilidade no geral. Não temos, hoje, uma política bem estabelecida com reivindicações importantes desse setor da classe trabalhadora. Aliás, devo dizer que não temos política alguma. Resta o que alguns poucos camaradas tentam fazer por conta própria, sem que haja uma linha política sistematizada.

Nossos canais de comunicação que já existem precisam passar por uma revisão completa em termos de acessibilidade. E os que pretendemos criar a partir daqui precisam ter isso como pedra angular de sua construção. Não basta que esperemos essas pessoas achem artifícios para acessar nossos canais, precisamos buscar ativamente garantir a acessibilidade em todos os meios de nossa agitprop.


Sobre o que deve existir

Muitos camaradas durante essa crise alertaram para a necessidade de completarmos um giro operário-popular em nosso Partido. Para isso precisamos nos inserir em setores estratégicos da classe trabalhadora. Isso já se tornou um mantra há muito tempo, porém continuamos esperando que alguém desses setores nos procure espontaneamente. Essa inércia não é uma atitude leninista frente ao problema.

Correndo o risco de chover no molhado, devo lembrar que um dos pilares da agitprop leninista é reconhecer o público de sua intervenção. É praticamente impossível que nossa agitação atinja, por exemplo, os caminhoneiros, com chamadas genéricas e abstratas, distantes de seu dia a dia. Precisamos estar atentos às demandas imediatas desses setores e estar decidida e continuamente defendendo a justeza de suas reivindicações com o restante da classe. É a nossa agitação que sistematiza essas demandas, dando a elas um conteúdo político geral para além da reivindicação econômica imediata.

Até hoje nos limitamos a entrar em ação apenas quando há mobilizações espontâneas desses setores. Ainda que possamos ter algum resultado com isso, é insuficiente para nos inserirmos eficientemente na categoria. Se queremos realmente atingir esses setores estratégicos precisamos desenvolver um trabalho constante de agitação e propaganda centradas entre eles. Mesmo em tempos de “relativa paz” na categoria, o descontentamento e a revolta estão presentes. Devemos empenhar todos os nossos esforços em um trabalho de agitprop nacionalizado, com mídias diversas (folhetos, postagens, matérias, cartazes, podcasts, vídeos) que digam respeito às demandas e às condições de vida e trabalho dessas categorias. Todos os nossos canais devem estar agitando as mesmas palavras de ordem simultaneamente.

Nomeio como um exemplo do que digo, o Saúde Camarada, que considero uma das mais importantes nesse sentido. Com o devido suporte poderia ser uma ponte entre o Partido e as categorias de profissionais na área da saúde. Desempenhar esse trabalho “nichado”, digamos assim, não substitui um trabalho mais amplo (como o jornal). Ao contrário, é o tipo de agitprop que potencializa a capilarização do nosso jornal na categoria. Mas para isso é necessário uma centralização eficiente das instâncias responsáveis por desenvolver esse tipo de trabalho sistematicamente.

Sobre o audiovisual

O projeto de profissionalizar nossa agitação e propaganda perpassa, necessariamente, em reconhecer que negligenciamos o impacto do audiovisual no mundo moderno. Grande parte do nosso imaginário, da nossa cultura e da nossa sociabilidade são perpassados por áudios, vídeos, imagens e etc. Considero esse um dos maiores entraves à nossa profissionalização. Enquanto dispensarmos investir esforços nesse ramo estaremos sempre atrás nessa batalha.

Posso citar aqui como o Brasil Paralelo conquistou o que nem Narloch sonhava. Dando vazão a todo o tipo de revisionismo histórico, eles obtiveram êxito em levar adiante sua agenda política conservadora e fascistóide. Poderia aqui passar horas fazendo ressalvas sobre financiamento duvidoso e investimentos obscuros. Tudo isso não muda o fato de que o jogo começou e nem ao menos saímos no vestiário. Por enquanto, eles têm o campo todo para eles.

Precisamos fazer um planejamento sério sobre como constituir uma produtora audiovisual do partido. Até quando esperaremos que os "astros se alinhem” para que contemos a história de nosso povo? Devemos ser capazes, camaradas, de “fazer nós por nossas mãos”. Não podemos deixar que as classes dominantes contem nossa história em nosso lugar. Precisamos ser capazes de produzir profissionalmente documentários, curtas, filmes e outras peças de audiovisual para entrar nessa disputa qualificadamente. Ainda acrescento que a produtora pode servir também para captar recursos para o Partido.

Essa produtora pode seguir os mesmos moldes da editora, sendo sua direção e presidência eleitas coletivamente no Congresso, tendo em vista o próximo período. Da mesma forma, deve apresentar um planejamento bem elaborado, colhendo sugestões e mapeando camaradas na base que tenham experiência em roteirização, captação, edição de vídeo entre outras habilidades úteis no ramo audiovisual.

Conclusão

Eu sei, camaradas, são muitos pontos a serem pensados e corrigidos. Tudo isso demanda um investimento que hoje parece impossível. Mas seremos julgados historicamente pela nossa capacidade de romper o cerco midiático que se estabeleceu contra nossa comunicação. Mas para constituir um ecossistema eficiente de agitação e propaganda, respostas individuais não serão suficientes. Devo dizer o óbvio: não pensar em um problema não faz com que ele deixe de existir.

Todos os aparelhos de agitação e propaganda, direta ou indiretamente ligados ao partido, devem responder a um órgão central capaz de coordenar nossos esforços comunicativos. Esse órgão não deve ditar o planejamento de todos os aparelhos, mas construir a coesão entre eles a partir de um planejamento próprio, centralizado, tendo em vista nossa tática para o próximo período e a estratégia socialista. Diante disso, os aparelhos devem estudar como podem aplicar esse planejamento em seu próprio, sem descaracterizá-los.

Devemos ser capazes de pautar os veículos de comunicação burgueses. Tomemos como exemplo nossa campanha sobre a redução da jornada de trabalho para 30 horas semanais sem redução salarial durante as eleições. Ao bombardeá-los por todos os lados com essa proposta, ficou impossível ignorá-la. Sem entrar no mérito sobre o conteúdo dessa campanha, a ausência de campanhas nacionais para além das eleições é sintoma da crise do nosso Partido. Uso aqui a analogia de uma “guerra popular prolongada” contra o monopólio da imprensa no Brasil. Devemos ser capazes de cercá-los e ditar o ritmo do confronto.

Nossa agitação e propaganda não devem girar em torno da autoconstrução, da autoproclamação e da arrogância academicista. Longe disso, deve ser uma agitprop profundamente vinculada ao trabalho real de nossa militância, em sua luta diária para construir o Poder Popular. Não basta que digamos que somos marxistas-leninistas, precisamos sê-lo de fato.

E, ao contrário do que dizem os conservadores e fascistas, nós não começamos a guerra cultural. Mas daremos um desfecho para ela!

Rumo ao XVII Congresso pela unidade dos comunistas no Brasil!


¹ Desafios da comunicação revolucionária: a agitação e a propaganda na era da internet. Disponível em: https://lavrapalavra.com/2021/02/17/desafios-da-comunicacao-revolucionaria-a-agitacao-e-a-propaganda-na-era-da-internet/ acesso em: 26/08/23