Porto Alegre (RS): Voto nulo ou em Rosário, o central é reorganizar a força independente dos trabalhadores

Diante de toda essa prévia exposição, é bom constatar o óbvio: não sairá nenhum voto em Melo do PCBR. Acreditamos que este liberal reacionário, principal rearticulador da direita em Porto Alegre, deve ser derrotado - o que só acontecerá com um movimento de massas forte. 

Porto Alegre (RS): Voto nulo ou em Rosário, o central é reorganizar a força independente dos trabalhadores

Nota política do PCBR em Porto Alegre (RS)

A chapa PT/PSOL/PCdoB já perdeu o pleito do executivo municipal em Porto Alegre. Só formalmente que a eleição continua, devido aos inexpressivos 0,30%, que impediram a vitória de Melo no primeiro turno. A disputa que segue no mês de outubro será nada mais que uma tentativa romântica, vã e inútil de eleger uma chapa sem apelo popular, sem capacidade de oferecer uma alternativa real à ofensiva burguesa operacionalizada por Sebastião Melo na capital gaúcha. Melo representa um programa puro sangue da burguesia local. Seu programa político é escrito nos gabinetes da Melnik, da Gerdau, do Zaffari, da RBS e de tantos outros que compõem o grupo multimilionário de grandes empresas privadas que mandam na cidade e em suas instituições.

A "frente ampla" petista, que até não foi tão ampla assim comparada com outras cidades gaúchas, por sua vez, insiste na falida tentativa de conciliação: não enfrenta os monopólios econômicos (os "donos da cidade"), tenta dialogar com eles e lhes convencer de fazer concessões mínimas aos interesses populares. A resposta desta burguesia não pode ser outra: "Por que faríamos isso, se temos o Melo? Por que ceder se podemos ter tudo?". Não há qualquer discurso que convença esta burguesia de apoiar a alternativa petista, pois não há qualquer ameaça ao poder desta elite local que lhe obrigue a recuar, que lhe obrigue a ceder.

Rosário até apelou para a memória dos "anos de ouro" das prefeituras de Olívio Dutra, Tarso Genro e Raul Pont, mas esqueceu que o fator decisivo para viabilizar aquelas gestões foram a organização e mobilização populares - estas que foram desmontadas posteriormente com ajuda do próprio PT. Rosário, no auge do seu oportunismo e alinhado ao governo federal, fala em "esperança", em "tornar Porto Alegre uma referência democrática", mas acredita que pode - de forma quase onipotente - refazer isso tudo na base da canetada. É como quem diz: "depende da minha eleição a Porto Alegre democrática, não do povo trabalhador organizado. Se eu não me eleger, não haverá democracia". Que a candidata em si não tem qualquer vínculo com as lutas populares, que não apostou sequer um centavo nas lutas independentes da classe trabalhadora como motor das transformações, disso já sabíamos. Mas invocar seu currículo institucional e se vender como a esperança deste povo chega a ser desrespeitoso - não atoa é a candidata mais rejeitada, inclusive pela sua própria base.

Porém, na entrevista coletiva após a apuração, Rosário, o PT e o PSOL se superaram. Primeiro, não reconheceram sua óbvia derrota. Segundo, destacaram o grande número de abstenções, votos brancos e nulos. Os eleitores de Porto Alegre foram os que mais se abstiveram dentre as capitais brasileiras. Este é o público no qual a direção da campanha apostou suas fichas. A tática é: "Vamos conquistar os desiludidos! Vamos mostrar a eles que somos a esperança na política!". Se é cinismo ou inocência, nunca saberemos, apesar de ser difícil acreditar em inocência em disputa eleitoral. Fato é que não conseguirão extrair nada deste público. O slogan da campanha de Rosário diz: "Somos a mudança segura!". Ao mesmo tempo, é o governo federal - o lastro político em que Rosário se ancora - que vem patrocinando o agronegócio, instituindo o novo Teto de Gastos, privatizando presídios, cortando verbas da educação e da saúde, retalhando a greve dos servidores federais, dando continuidade à política econômica responsável pela alta inflação dos alimentos, os baixos salários e os empregos precários. Fora a parcela de responsabilidade do Governo Federal na Grande Enchente de Maio, ignorada por petistas, mas muito bem recordada por ampla parcela da população, inclusive pelas regiões mais afetadas. Que segurança terá nesta mudança qualquer trabalhador minimamente consciente?

O presidente Lula prometeu em campanha que revogaria o Teto de Gastos e a Reforma Trabalhista, mas o que fez foi o contrário. Hoje, defende o Arcabouço Fiscal e comemora os índices enganosos de diminuição da taxa de desemprego, que mascaram a precariedade generalizada nos postos de trabalho. É verdade que o PT foi e é muito demonizado e atacado pela direita, mas o principal responsável pelas sucessivas derrotas do PT é ele mesmo: hoje, é um partido da ordem, não da mudança. Não há "segurança", nem "esperança" possíveis. A massa de trabalhadores que optaram pelo voto nulo ou sequer vão votar, tem a absoluta legitimidade de fazê-lo, pois não legitimam as instituições, não acreditam nesta democracia, não confiam no Estado Burguês. Sabem que de lá não virá nada que lhes mude a vida efetivamente, porque este Estado pertence aos ricos e aos políticos que lhes servem. Por isso, não cabe a qualquer força política de esquerda consequente, especialmente às comunistas, tentar convencer que devem dar mais uma chance às instituições, de que devem ter esperança nas eleições e, particularmente, que devem ter "esperança de mudança" em uma chapa que está pronta para renunciar aos interesses populares na primeira mesa de negociação com a burguesia local.

Antes de prosseguir, é preciso fazer uma pontuação fundamental: Rosário e Melo não são idênticos. Não se trata de fazer uma análise grosseira e teoricamente pobre, igualando um ao outro. Apesar de terem em comum o objetivo de serem bons gestores da crise capitalista, isto é, de serem ambos defensores do capitalismo, oferecem ao público programas com algumas diferenças não desprezíveis. A principal delas é a privatização do Departamento Municipal de Água e Esgoto (DMAE), que está no topo da lista de prioridades da burguesia. Melo, já diz nos bastidores que pautará a privatização do DMAE imediatamente após o fim das eleições, aproveitando que possui uma ampla bancada governista capaz de votar pela sua privatização e se valer de uma onda de legitimidade caso confirme sua vitória em 27 de outubro. Pelo apoio que tem, tanto de partidos mais à esquerda do PT, como de sindicalistas e funcionários do serviço público, Rosário reafirma categoricamente sua defesa do DMAE público. Outros pontos importantes que constam no programa oficial(!) de Rosário é a revisão (atenção: não é a revogação!) da privatização da Carris, a instituição do Passe Livre estudantil e a abertura de concursos públicos. No entanto, antes de se apegar ao que está dito no papel, é preciso relembrar algumas medidas práticas de Rosário e do PT:

1) Há menos de 6 meses atrás, durante as enchentes, Rosário e toda bancada do PT, sob orientação de Haddad e Lula, votaram contra a proposta de perdão da dívida pública do Rio Grande do Sul com a União. Isso significa que Rosário votou contra o fim de uma das maiores amarras do orçamento público gaúcho. Esta dívida fraudulenta consome cerca de 45% de nosso orçamento há décadas e já foi paga mais de uma vez, mas continuamos em débito por causa de um sistema de juros impagável. Ela e a bancada gaúcha do PT no congresso votaram contra uma bandeira histórica do próprio petismo gaúcho diante de sua pior tragédia climática, quando, por décadas, o PT reafirmava que essa dívida estava paga!
Sob justificativa de renegociar esta dívida, o governo Leite, no primeiro mandato, aprovou o Regime de Recuperação Fiscal (RRF), fruto de uma negociação com o governo federal (à época, presidido por Bolsonaro), cujos termos eram os seguintes: em troca da suspensão (!) do pagamento da dívida por 4 anos (durante os quais, os juros continuam rolando), o governo gaúcho deveria promover a privatização da CEEE, da CORSAN, da SULGÁS e da CRM, bem como suspender aumento de salário de servidores públicos, não fazer novas contratações e não aumentar o investimento público nas áreas como saúde, educação, assistência social, etc. O governo Sartori tentou emplacar este projeto, mas a aguerrida mobilização dos trabalhadores das estatais atrasou seus planos. Porém, poucos anos depois, Leite consegue a aprovação. Este Regime de Recuperação Fiscal está vigente até hoje, sustentado em cima desta dívida que custa muito ao povo gaúcho, e que Rosário e o PT se articularam junto ao centrão para barrar o perdão, no meio de uma catástrofe terrível. A deputada defende este seu voto até hoje. Se Rosário apoia as medidas de austeridade do governo federal, de onde o povo portoalegrense deve tirar a "segurança" de que no município será diferente?

2) Como já dito, existe um abismo entre o que está posto no programa eleitoral do PT e sua prática política. No programa, a fim de conquistar o eleitorado mais progressista, faz acenos à esquerda. Quando Lula prometeu que revogaria a Reforma Trabalhista, tinha em sua cola todo o movimento sindical, especialmente a CUT, que colocava isso como uma necessidade urgente. Na posse do governo, apesar dos elogios desmedidos à Lula, os sindicalistas da CUT e CTB reafirmaram a necessidade desta revogação. Hoje, passados 2 anos de governo, não há qualquer menção ao tema, nem qualquer gesto em direção a esta revogação – mas o contrário. O que há, na verdade, é o de sempre: o governo diz que não tem correlação de forças para passar esta medida na Câmara, enquanto o movimento sindical sob hegemonia petista não se mobiliza para "não desestabilizar o governo e garantir a governabilidade". Uma vez de posse da máquina pública, trair os trabalhadores (com a cumplicidade dos burocratas sindicais) é o que o PT melhor fez nos últimos anos - não por outro motivo este partido continua sendo uma das alternativas para os capitalistas que mandam no Estado brasileiro.

3) Além disso, outra coisa inevitável é a tendência de já renunciar a diversos pontos programáticos "de esquerda" durante o segundo turno. Na busca de apoio de diferentes partidos da burguesia, como o PDT de Juliana Brizola (que estava coligado com o PSDB, União Brasil, etc.), o PT tende a entrar em negociações nas quais o que está em jogo são as poucas migalhas prometidas aos trabalhadores. A tendência é um abrandamento do discurso, para que seja mais tragável e mais convincente para os setores da classe média que rejeitam Rosário. Noutras palavras, isso significa um programa e um discurso ainda mais centrista (isto é, pendendo à direita). Veja que nem esse discurso está sendo capaz de absorver automaticamente, o eleitorado que votou em Juliana Brizola no segundo turno, conforme as pesquisas de intenção de voto vem constatando.

Seguindo esta cartilha carcomida pelas traças, no dia 27 de outubro, o PT tende a consolidar uma derrota acachapante e desmoralizante em Porto Alegre. Não reconhecerão que esta derrota eleitoral é responsabilidade dos erros da própria “esquerda”, o que estava definido desde antes do início da campanha. Daí, veremos sua base triste, incrédula, inconsolável, momento em que se manifestará com vigor todos os preconceitos despolitizados da classe média. Vão atribuir a derrota à "ignorância do povo", à “Síndrome de Estocolmo”, dirão que "não sabem votar", que "são masoquistas" e mais uma série de adjetivos moralizantes, que não explicam uma vírgula da situação política abismal em que nos encontramos. Sequer se perguntam: se os governos petistas de 1989 a 2005 foram tão bons, por que a direita domina desde então? O que aconteceu para perder toda a base de apoio que fora tão forte anteriormente? Em que medida os governos do PT contribuíram para organizar a classe trabalhadora enquanto força independente para enfrentar a direita e a extrema-direita? O que possibilitou chegarmos em um nível tão grande de desorganização da classe trabalhadora? Hoje, a direita não pede mais licença às lideranças populares de várias vilas e bairros periféricos para propagar suas posições, difundir ideologia liberal e mesmo reacionária, que atenta contra a dignidade e mesmo a existência da grande maioria dos moradores dessas vilas, comunidades e bairros periféricos.

Para fazer justiça, nem tudo é responsabilidade do PT. Há de reconhecer que há uma grande parcela de competência em nossos inimigos de difundir suas posições, conquistar a opinião pública e organizar para defender seus interesses, e a mera crítica negativa ao petismo, sem apresentar uma alternativa consequente e séria de superação dessa atual fase da esquerda cai sobre a dita esquerda revolucionária.

Frente à ofensiva burguesa no Brasil, nenhuma outra força política de esquerda foi capaz de oferecer uma resposta contundente. Em Porto Alegre, não é diferente. Seja a UP, o PSTU, o “PCB” ou mesmo nós do PCBR, nenhum desses partidos conseguiu conquistar relevância  suficiente na luta de classes para se impor como uma alternativa, nenhum conseguiu superar a influência do petismo nas massas e seu protagonismo no movimento organizado dos trabalhadores brasileiros em décadas. Pelo contrário, suas limitações acabam sendo exploradas pelo petismo para se reafirmar como única alternativa de esquerda consequente. Nenhum partido radical conseguiu oferecer, até agora, uma resposta convincente - teórica e praticamente - à necessária reorganização da classe trabalhadora. Estamos perdendo a luta de classes. A burguesia impõe todas suas medidas sem encontrar resistência que dure mais que um vídeo nas redes sociais, mais que uma manifestação na Esquina Democrática, mais que ações performáticas que servem mais para satisfazer o ego militante e encontrar validação entre seus pares da esquerda “revolucionária”

A quantidade de votos nulos, brancos e abstenções é um bom sinal, não mau. Claro, isso quando se pretende fazer uma mudança estrutural no sistema em que vivemos, uma mudança radical (na raiz), que não se contente em "diminuir as desigualdades", mas erradicá-las: uma mudança revolucionária. Cabe às organizações revolucionárias, então, politizar essa descrença na democracia e no Estado para um sentido de auto-organização e luta. Não subestimar o nível de consciência dos trabalhadores e dos setores oprimidos, nem se colocar num pedestal moral de superioridade, mas construir, em diálogo direto, a partir das demandas imediatas e históricas, a necessária alternativa revolucionária para nossa cidade.

Enquanto não superarmos a falta de alternativa radical, não existirá voto útil que faça qualquer diferença. Entre votar nulo ou votar criticamente na Rosário, aqueles que querem mudanças estruturais neste sistema que ameaça a humanidade de extinção devem se preocupar mais com encontrar a solução para este problema: como criar uma força proletária organizada capaz de enfrentar a classe dominante em nossa cidade?

Diante de toda essa prévia exposição, é bom constatar o óbvio: não sairá nenhum voto em Melo do PCBR. Acreditamos que este liberal reacionário, principal rearticulador da direita em Porto Alegre, deve ser derrotado - o que só acontecerá com um movimento de massas forte. 

Por isso, o PCBR, em Porto Alegre, tem como palavra de ordem: Voto nulo ou em Rosário, o central é reorganizar a força independente dos trabalhadores. Não condenamos aqueles trabalhadores que optam pelo voto nulo, bem como respeitamos quem aposta suas fichas na tentativa de eleição do “mal menor”. Acreditamos que ambas as posições estão assentadas na desilusão e falta de confiança nas alternativas políticas postas. Um sentimento completamente legítimo e necessário, pois é o ponto de partida para construção de uma alternativa radical.

Por fim, independente do resultado das urnas neste próximo domingo, todas pessoas lutadoras sociais, revolucionárias, combativas, não podem se deixar abalar pela provável derrota. A classe trabalhadora porto-alegrense, no dia seguinte, levantará cedo para trabalhar e continuará sendo humilhada em seus postos de trabalho diante de regimes e condições de trabalho degradantes, salários incompatíveis com sua existência digna, senão, com sua própria subsistência. A violência destinada ao nosso povo, aos setores oprimidos vai persistir. A reconstrução de suas vidas, de suas residências e de seus bairros depois das enchentes vai prosseguir e os ataques da burguesia contra todos os já precários serviços públicos continuarão sendo levados a cabo. Não devemos abandonar as trincheiras de luta neste momento. As mudanças estruturais nunca dependeram exclusivamente das eleições. A luta para criar as condições de nossa vitória total é a tarefa imediata e mais importante.

Comitê Local do Partido Comunista Brasileiro Revolucionário (PCBR)
Porto Alegre - 23 de Outubro de 2024.