'Pela visibilidade e acolhimento das mães revolucionárias' (Rafaela Sarmento)

Sabendo que um partido comunista defende, entre outras pautas, o combate a qualquer tipo de opressão contra as mulheres, é importante se perguntar: o que está sendo feito para a manutenção das mães na luta revolucionária?

'Pela visibilidade e acolhimento das mães revolucionárias' (Rafaela Sarmento)
Mãe e filha da Plaza de Mayo, 1982. Foto: Adriana Lestido

Por Rafaela Sarmento para a Tribuna de Debates Preparatória do XVII Congresso Extraordinário.

Sabendo que um partido comunista defende, entre outras pautas, o combate a qualquer tipo de opressão contra as mulheres, é importante se perguntar: o que está sendo feito para a manutenção das mães na luta revolucionária?

A maternidade representa uma batalha incessante por respeito e dignidade para as mulheres e seus filhos, vivemos em um contexto político que mantém e perpetua os privilégios masculinos, o que dificulta a nossa inserção em qualquer espaço que desejamos ocupar.

O sistema capitalista subjuga mães, causando dificuldades em todos os aspectos de nossas vidas. Somos preteridas e ocupamos funções precarizadas ou consideradas invisíveis, como a de culinária e do cuidado. Até mesmo no espaço de militância política revolucionária, percebo que a estrutura se mantém. As funções mais valorizadas no complexo partidário demandam tempo disponível para realizar tarefas rapidamente, boa oratória, leitura e escrita constantes - atividades que muitas mães não podem desenvolver sem uma boa rede de apoio.

Ao ler a tribuna 'Suicídio, Vida Interna e Partido Comunista' de Aya Setembru K.[1], percebi que não temos protocolos para apoiar camaradas em situações de risco de saúde mental. Devido à grande sobrecarga, mães têm maior probabilidade de enfrentar problemas psicológicos decorrentes do alto estresse, ansiedade, isolamento social, abandono, exaustão, falta de tempo para o autocuidado, dentre outros fatores. Tudo Isso corrobora com dados da Organização Mundial de Saúde (OMS), destacando que a saúde mental das mulheres é afetada não apenas por fatores biológicos, mas principalmente por questões socioculturais[2].

Lembrando que durante sua militância política, Lênin se opôs aos que cultuavam a espontaneidade da luta operária, ou seja, aos que desconsideravam a heterogeneidade da classe trabalhadora, todas as clivagens feitas pela exploração e que rechaçavam a teoria socialista. Assim, aconselho os camaradas a não ignorarem a invisibilidade da luta específica das mães, da mesma forma que acontece com as lutas antimanicomial, ambiental, racial, de gênero e de identidade não são negadas. Refiro-me precisamente à posição ocupada por mim e por diversas mães (organizadas ou não), cuja dignidade e existência são negadas. Negar nossa luta e não nos acolher significa negar um aspecto da luta de classes!

Camaradas, não é fácil se declarar, muito menos se manter uma mãe comunista organizada, nossas demandas são relativizadas e deixadas para depois. Por vezes, deixei de participar e de levar minha filha para atividades no complexo partidário devido à falta de estrutura nos locais de atuação. Embora o problema da falta de estrutura seja conhecida, há uma relativização e ausência de empenho em etapas de planejamento de atividades para superá-lo. Além disso, estamos sujeitas a perder nossa rede de apoio enquanto estamos na luta revolucionária.

Como a sociedade nos exclui, sustento que o ambiente de luta deva nos incluir, seja com a profissionalização das mães militantes, seja com a criação de espaços seguros para nossos filhos, oferecendo atividades infantis esportivas ou pedagógicas nos complexos partidários e até mesmo repensando o cadastro de militância de forma que mapeie nossa existência (considerando as demandas e as habilidades das mães). Juntos, podemos tornar o ambiente político verdadeiramente inclusivo.

Sabendo de tantas dificuldades que as mães enfrentam na formação econômico-social brasileira, com seu capitalismo dependente, é crucial que a militância em um partido comunista seja um espaço acolhedor, não reproduzindo valores que nos excluam dos debates políticos e valorizando nossa presença e a de nossos filhos nesses espaços. Embora sejamos minoria, nós, mães comunistas, não somos seres passivos ou invisíveis. Queremos e devemos ocupar espaços de maneira igualitária com os demais camaradas. Lanço esta provocação na expectativa de que tomemos os cuidados necessários para não reproduzir comportamentos que combatemos tanto. Que nossas lutas e demandas sejam ouvidas!

Saudações comunistas!


REFERÊNCIAS

[1] SETEMBRO K, A. Suicídio, Vida Interna e o Partido Comunista. Em Defesa Do Comunismos, 2023. Disponível em: https://emdefesadocomunismo.com.br/suicidio-vida-interna-e-o-partido-comunista/

[2] TINÉ, L. Saúde da mulher é mais do que cuidados ginecológicos. Agência Saúde, Gov.br, 2020. Disponível em: https://www.gov.br/saude/pt-br/assuntos/noticias/2020/marco/saude-da-mulher-e-mais-do-que-cuidados-ginecologicos