'Pela nacionalização do sistema ferroviário brasileiro!' (João Lucas Leite)
O povo sofre diretamente as consequências do monopólio rodoviário nos transportes, o povo é quem mais se beneficiaria com a volta da Estrada de Ferro. Uma campanha pela criação de uma empresa pública que tenha como compromisso reabilitar essa Estrada de Ferro seria extremamente aceita pela classe.
Por João Lucas Leite para a Tribuna de Debates Preparatória do XVII Congresso Extraordinário.
Começou a circular recentemente entre os veículos progressistas a notícia de que “Lula quer inaugurar a era dos trens no Brasil”. Bom, um pouco sensacionalista pois que ocorreu foi que o governo pôs em consulta pública a Política do Transporte Ferroviário de Passageiros pelo Ministério dos Transportes, o objetivo no geral é facilitar os investimentos privados no transporte ferroviário. Pretendo aqui debater quais perspectivas acredito que nós devemos ter sobre o transporte ferroviário no Brasil.
A história do sistema ferroviário no Brasil, como sabemos, não é muito amistosa. Apesar de muito mais eficientes no transporte de cargas e de passageiros, as ferrovias foram solapadas pelos monopólios rodoviários, que se instalaram no Brasil na década de 50 com muito apoio do Estado brasileiro. Mesmo assim, em 1957 foi criada a Rede Ferroviária Federal (RFFSA), empresa estatal de transporte ferroviário. O sistema ferroviário brasileiro teve seu desmonte consolidado no governo de Fernando Henrique Cardoso com a privatização da RFFSA em 1998, como esperado, a empresa deixou de existir em 2007.
Se formos debater desenvolvimento econômico e industrial, sabemos que o transporte ferroviário é muito mais eficiente. Tanto para o transporte de cargas quanto de passageiros a longas distâncias. O sistema rodoviário se tornou predominante no Brasil não por ser mais eficiente ou ser mais vantajoso para o desenvolvimento econômico do país, mas sim por lobby e contratos com empresas automobilísticas do exterior. Para todos que já estão inseridos no debate sobre transporte, sabemos que o forte investimento nas ferrovias é necessário para o desenvolvimento industrial brasileiro, entretanto, também é sabido que isso não ocorrerá por boa vontade da burguesia nacional brasileira por conta de vivermos em um país de capitalismo dependente esse não é o interesse, tanto da burguesia nacional brasileira quanto da burguesia internacional que lucra com a indústria de produção e venda de automóveis, o mercado do asfalto (que também recentemente se tornou monopólio estrangeiro fruto das privatizações das refinarias da Petrobrás).
Entretanto, o transporte ferroviário muito interessa ao povo, é uma pauta extremamente popular. Especificamente em meu estado, o Ceará, o povo que viveu a época da Estrada de Ferro onde se podia viajar de trem da cidade de Fortaleza até o extremo sul do Ceará, Juazeiro do Norte, tem muitas memórias boas.
A Estrada de Ferro está na memória popular, para além disso, representa o interesse popular de se ter um transporte público de qualidade, pois atualmente a única forma de se viajar longas distâncias é de ônibus ou avião, opções muito caras ao povo.
Apesar das iniciativas do governo, o interesse não é tornar o transporte ferroviário em algo público e de acesso a todo o povo e sim um mercado privado, que provavelmente será muito caro e restrito a poucas regiões pois não há interesse do mercado privado em investir no transporte ferroviário pois isso significaria ter que enfrentar o monopólio rodoviário.
O transporte ferroviário é uma pauta extremamente popular entre a classe trabalhadora, tanto por memórias afetivas da época onde existia a Estrada de Ferro, quanto pela facilidade de locomoção entre cidades do interior, capitais de diferentes estados, sendo uma pauta mais popular ainda entre os trabalhadores dos interiores que gastam muito para poderem vir as capitais conseguirem acesso a diversos serviços pois esse transporte está monopolizado pelas rodovias.
Visto a extrema popularidade que o transporte ferroviário viria a ter se fosse reabilitado no Brasil, principalmente entre a população interiorana, uma campanha em defesa da reativação do transporte ferroviário de passageiros no Brasil teria extrema adesão de diversos setores das massas trabalhadoras. Portanto, defendo que o partido deveria iniciar uma campanha nacional pela criação de uma companhia ferroviária estatal.
Vejam, camaradas, essa é uma pauta unificadora e popular entre a classe trabalhadora. O povo sofre diretamente as consequências do monopólio rodoviário nos transportes, o povo é quem mais se beneficiaria com a volta da Estrada de Ferro. Uma campanha pela criação de uma empresa pública que tenha como compromisso reabilitar essa Estrada de Ferro seria extremamente aceita pela classe. Com nosso partido tomando a frente para consolidar essa campanha, conseguimos nos inserir nas massas e mostrar que é o Partido Comunista que está liderando a campanha pelo transporte ferroviário, conseguiríamos ter um contato direto com as massas e pautar o debate público brasileiro. Representaria, mesmo que a campanha não fosse bem sucedida, um enorme ganho político para o partido com as massas, pois durante a campanha conseguiriamos atingir camadas da classe trabalhadora, principalmente do interior, que nunca conseguimos atingir, seria um enorme passo no processo de interiorização do partido.
Se começássemos um plebiscito popular, por exemplo, conseguiríamos diversos adeptos em vários interiores do Brasil, esses adeptos que iriam buscar assinaturas para nossa campanha poderiam posteriormente, com um trabalho político do partido com essas pessoas, se transformar em núcleos do partido em diversos interiores. Essa é uma pauta popular, milhares de pessoas são simpatizantes dela, essas pessoas reconhecendo no partido a vanguarda dessa campanha ganharão afinidade com o partido e poderão demonstrar interesse em integrar o partido e continuar seu trabalho político.
Devemos enxergar essa tarefa como um salto rumo a construção da revolução brasileira, pois nosso objetivo não é apenas nacionalizar setores da economia como o transporte ferroviário, e sim construir o Poder Popular, a revolução proletária e o socialismo. Entretanto, a luta pelo socialismo necessariamente passa por uma luta por reformas. É dever dos comunistas lutar pelas reformas no sistema burguês, mas sem nunca perder a estratégia comunista de emancipação do proletariado, tendo sempre em mente que a luta por reformas tem um papel político: o de organizar e elevar a consciência das massas da luta de classes. Nossa luta pela nacionalização do sistema ferroviário brasileiro não deve ser somente uma luta por uma pauta, e sim uma luta que tem como objetivo crescer o trabalho de nosso partido com a classe, organizar a classe e elevar sua consciência. Como já dizia um advogado russo (calvo, não podemos esquecer…) “Os marxistas, diferentemente dos anarquistas, reconhecem a luta por reformas, isto é, por melhorias na situação dos trabalhadores que deixam como antes o poder nas mãos da classe dominante. Mas, ao mesmo tempo, os marxistas travam a luta mais enérgica contra os reformistas, que directa ou indirectamente limitam as aspirações e a actividade da classe operária às reformas. O reformismo é um logro burguês dos operários, que permanecerão sempre escravos assalariados, apesar de determinadas melhorias, enquanto existir a dominação do capital.” (Vladimir Lênin, “Marxismo e Reformismo”, 1913)
Claro, precisaremos de muita disposição e trabalho duro de nossa militância para seguir com essa campanha, mas sabemos muito bem o quanto nossa militância é aguerrida e tem disposição de tocar a luta política. Temos diversos militantes que fazem com firmeza e disciplina o trabalho de massas no movimento estudantil e tem extrema capacidade para poder tocar uma tarefa como essa; temos diversos quadros que já são do partido que são operários de ramos da indústria que tem muita simpatia com o transporte ferroviário, como a metalurgia, o petróleo ou a mineração, por exemplo. O sucesso de uma campanha como essas, camaradas, representaria uma volta do PCB ao cenário político nacional como uma força política real, capaz de movimentar grandes setores da classe, representaria um crescimento do nosso trabalho político e influência com as massas, representaria um grande salto rumo à construção de uma força política capaz de construir a revolução brasileira. Uma campanha pela nacionalização do sistema ferroviário brasileiro, a criação de uma companhia estatal ferroviária, é uma pauta unificadora e com muita adesão popular, é uma campanha que se levada a frente por nossa militância tem muita chances de ter sucesso e irá elevar em mil por cento a consciência de luta das massas.
Este é um tema que acredito que deva ser debatido no XVII Congresso, está é uma pauta popular e unificadora que pode nos fazer crescer nossa influência com as massas, um acirramento da luta de classes no Brasil e uma guinada à esquerda das pautas da classe trabalhadora no Brasil. Claro, é uma tarefa muito difícil, estaremos comprando briga com os monopólios rodoviários, e é uma briga na qual levaremos muitas pancadas, entretanto, se tivermos o apoio da classe, devemos estar dispostos a levar essas porradas, devemos ser ousados, devemos dar a cara a tapa, devemos lutar pela nacionalização do sistema ferroviário brasileiro!