Pela construção das lutas classistas no estado do Rio de Janeiro e pela revolução socialista!

Que possamos aprender com a história de resistência da classe trabalhadora que no estado do Rio de Janeiro construiu nos sindicatos, nos quilombos, nas favelas, entre outros diferentes espaços forjados nas lutas populares!

Pela construção das lutas classistas no estado do Rio de Janeiro e pela revolução socialista!
Greve dos Garis no Rio de Janeiro durante as Jornadas de 2013-2014 (Reprodução/Redes sociais)

Por Mariana Nogueira e Stella Aragão

Conjuntura atual do estado do Rio de Janeiro

Camaradas, este texto é fruto do acúmulo de militantes comunistas e extraído da capacidade de produzir análises conjunturais que ao mesmo tempo estejam embasadas na realidade das lutas da classe trabalhadora e se empenhem em aprofundar as táticas para o enraizamento da militância nessas lutas. É um esforço primeiro que tenta, em linhas breves, colocar no papel aquilo que nos movimenta enquanto militantes comunistas. Nesse sentido, é importante frisar que nosso objetivo, aqui, não é de esgotar todas as perspectivas das lutas e trabalhos passados e futuros, mas tão somente inspirar e engajar nossa militância a realizar análises de conjuntura precisas nos mais diversos campos necessários para as lutas no nosso estado, iniciando um debate necessário que inclua dados, estatísticas, determinações sociais e projeções.

As diferentes regiões do Rio de Janeiro possuem especificidades. Produzir qualquer esforço da luta da classe trabalhadora que foque apenas nas atribuições das instituições burguesas para o estado não é a solução. A socialização das experiências reais das lutas é crucial e a divisão revolucionária das tarefas também deve levar em consideração as diversas formas políticas que atravessam a organização das trabalhadoras e trabalhadores a nível estadual (Gustavo Pedro, 2023).

Nossa intenção é fazer uma explanação que consiga estabelecer ligações com as necessidades da nossa classe em suas mais diversas características e recortes. É importante ressaltar que este esforço não tem intenção de detalhar a situação real do estado do Rio de Janeiro, mas tão somente iniciar um debate que consiga ir além do superficial e compreender algumas das causas que, enfim, nos direcionam para as lutas.

No estado do Rio de Janeiro, no que se refere à política institucional/eleitoral, quase todos os ex-governadores foram presos – Moreira Franco, Garotinho, Rosinha, Sérgio Cabral e Pezão –, um foi cassado – Witzel – e, atualmente, o governo Cláudio Castro (PL) reeleito em 1º turno com 4.930.288 de votos, 58,67%, larga distância em relação aos votos do 2º candidato colocado (27,8%), Marcelo Freixo (PSB), é acusado de diversos crimes. Cláudio Castro deu continuidade ao uso da máquina pública para interesses próprios e burgueses, apesar da denúncia, divulgada na grande mídia, de um dos seus grandes esquemas de corrupção (Ceperj teve mais de 20 mil cargos que recebiam em uma folha de pagamento secreta) e um processo em andamento, de autoria do Ministério Público Federal, em que se solicita cassação da chapa por abuso de poder econômico e político. No entanto, não há indícios de que exista uma correlação de forças favorável à cassação da chapa, o governo fascista segue sucateando serviços públicos a partir do subfinanciamento dos mesmos, avança com as privatizações no estado; apoia-se no argumento jurídico burguês e neoliberal de redução dos gastos públicos devido ao Regime de Recuperação Fiscal e da lógica de ajuste fiscal permanente; não atua contra as precárias condições de vida da classe trabalhadora que reside no estado e, ainda, intensifica a utilização do aparato militar para aprofundamento da política de segurança pública racista, elitista e genocida nas favelas e periferias. As forças políticas identificadas como esquerda, mais próximas ao campo classista como UP, PCB e PSTU, somadas, conseguiram menos de 1% dos votos válidos.

A difícil articulação e unidade de ação entre as forças de esquerda também se apresenta no cotidiano das lutas da classe trabalhadora fluminense. Foram poucas as iniciativas recentes que articularam esse campo e que resultaram em mobilização popular ou apoio orgânico de diferentes setores da classe trabalhadora. Nesse sentido, é importante destacar as lutas dos estudantes contra a reforma do ensino médio, que marcaram o mês de março. A última mobilização que aglutinou estas diferentes forças, e contou com algum apoio popular, foi a greve dos profissionais da educação da rede estadual (que amargam péssimas condições de trabalho e recebem um salário menor do que o piso salarial nacional instituído) entre os dias 17 de maio a 29 de junho do presente ano.

Além destas mobilizações, o que prevalece são poucas iniciativas dispersas de indignação e revolta por parte dos trabalhadores, trabalhadoras e juventude que reside em territórios invadidos com frequência pelo aparato militar (principalmente, pela PM), contrárias e em protesto aos assassinatos cotidianos de pretos, jovens e pobres cometidos em nome da falaciosa guerra às drogas. Na verdade, as incursões militares nos territórios periféricos e favelas, locais de moradia e trabalho da classe trabalhadora são produto da luta de classes em um país marcado pelo colonialismo, por mais de 3 séculos de escravidão e por uma burguesia autocrática e racista que não somente se utiliza de diversas formas de violência contra a nossa classe, assim como lucra com o terrorismo e guerra que instituem. Assim, alimentam a indústria de armamentos, que sabidamente possui forte lobby no congresso nacional e participa como financiadora de campanha dos partidos conservadores, liberais e dos assumidamente fascistas.

Somente no estado do Rio de Janeiro, nos últimos 7 anos, operações policiais foram o principal motivo para vitimar crianças e adolescentes. Pelo menos 286 foram atingidas nestas circunstâncias — resultando na morte de 112 e deixando outras 174 feridas (Instituto Fogo Cruzado, 2023). Nós, comunistas, não aceitamos que esta realidade de desespero, sofrimento, dor e luto seja imposta à nossa classe. É necessário que realizemos ações que denunciem este quadro como uma ofensiva de classe, desnaturalizando que esta situação ocorre por um suposto “despreparo policial”. É central que afirmemos que a polícia militar é um aparato do estado burguês e serve às classes dominantes. Também é necessário construir trabalhos enraizados nos territórios periféricos e favelados com vistas à disputa da consciência de classe, fortalecimento de laços de solidariedade e participação nas iniciativas que envolvam auto-organização popular e enfrentamento a esta realidade.

É importante ressaltar que em relação às violências cometidas contra a classe trabalhadora, o estado do Rio de Janeiro está entre os três onde se concentra o maior número de assassinatos de transsexuais e travestis, sendo a maior parte destes crimes cometidos contra pessoas pretas e pardas (ANTRA, 2022). É necessário que se reconheça, se denuncie, e enquanto comunistas, possamos construir lutas para combater, também, o alto índice de violências contra mulheres. Estima-se que 1 mulher seja vítima de violência a cada 4 horas no estado do Rio de Janeiro. O crime mais cometido é a tentativa de feminicídio/agressão física. O número de estupros/violência sexual quase dobrou no estado entre os anos de 2021 e 2022 (REDE DE OBSERVATÓRIOS DE SEGURANÇA).  Esta realidade é produto de um processo histórico de misoginia, transfobia e homofobia, escancarados e defendidos pelos fascistas, mas que não se restringe a eles. As violências contra a nossa classe são sustentáculos do capitalismo, o patriarcado, a mercantilização da vida e objetificação dos nossos corpos. Constituem, portanto, a luta de classes.

Segundo o último censo, o Rio de Janeiro possui 16.054.524 pessoas. No penúltimo censo, o percentual de pessoas que viviam em favelas era de 22%. Segundo os dados do IBGE, o Rio de Janeiro é, no país, o estado com maior percentual de pessoas desempregadas por até dois anos ou mais. O Rio de Janeiro tem mais de 1 milhão de pessoas buscando trabalho (IBGE, 2023). A taxa medida é ainda maior para as mulheres. A informalidade também cresce no estado, configurando-se, assim, falta de acesso a direitos trabalhistas, maior precariedade das condições de vida e queda de renda para a maior parte dos trabalhadores. A informalidade e o desemprego são condições que os comunistas precisam combater com prioridade.

A destruição de postos de trabalho formal e a elevação das taxas de desemprego são ainda mais sentidas pela juventude. A organização de ações coletivas que visem a solidariedade de classe, mas também as lutas por melhores condições de trabalho, de renda, de moradia, de serviços públicos de qualidade e contra as privatizações, assim como o fortalecimento da luta sindical urgem como prioridades táticas, além da defesa da vida, contra a violência policial direcionada ao povo trabalhador e a juventude preta, pobre, que reside em favelas.

A economia do estado do RJ inclui o setor extrativista mineral – petróleo e gás, principalmente – e de serviços, com destaque para os serviços financeiros e comércio (formal e informal). No setor industrial, tem destaque a cadeia produtiva de petróleo e gás e a grande siderurgia (CSN e CSA). Realizar um mapeamento do setor industrial no estado para elencar áreas prioritárias de atuação dos comunistas e atuar na organização sindical dos trabalhadores deste setor, segue sendo um importante eixo de luta dos comunistas. Apesar da queda nas taxas de sindicalização nos últimos anos, em nível nacional, a partir de uma forte ofensiva burguesa contra a organização sindical classista, perseguição de lideranças sindicais a partir de multas e outros aparatos utilizados pela justiça burguesa, e também pela adesão por parte das grandes centrais a uma linha econômico-corporativa reduzida às lutas defensivas e jurídicas, os sindicatos permanecem sendo instrumentos centrais para a organização e luta dos trabalhadores.

No estado do Rio de Janeiro, a classe trabalhadora também lida com elevação do custo de vida, alta especulação imobiliária, aprofundamento da mercantilização e da apropriação privada, para poucos, de questões que deveriam ser de acesso universal a todo povo trabalhador como moradia e transporte. Os prejuízos da privatização dos serviços públicos se traduzem em péssimas condições de transporte público com altos preços dos mesmos, insuficiência e continuidade da lógica de mercadoria imposta pelos governos liberais que se apresenta como um ataque cotidiano ao povo trabalhador. Controlado por grupos privados, o sistema de transportes não somente custa caro para o povo trabalhador, como também é ineficiente. Lutar pela reestatização dos transportes é enfrentar os interesses burgueses, é defender os interesses dos trabalhadores e das trabalhadoras.

Há no estado falta de planejamento urbano, insuficiência e deterioração das escolas públicas e o subfinanciamento do SUS e da assistência social no estado são resultantes das políticas liberais implantadas pelos últimos governos e das contrarreformas que avançam em prejuízos para a nossa classe. Na saúde pública, nenhum governo estadual cumpriu com o piso constitucional. O financiamento está ainda mais ameaçado com a proposta do governo do PT de extinção destes mínimos constitucionais, ameaçando a manutenção de serviços essenciais ao povo trabalhador. Ampliam-se as terceirizações, as parcerias público-privadas, o sucateamento das Unidades de saúde para favorecimento do setor privado, a retirada de direitos dos trabalhadores da saúde avança e há piora no atendimento no setor. É central para a manutenção da saúde dos trabalhadores e trabalhadoras que o SUS organize-se de fato para atender as necessidades da nossa classe, e não a partir dos interesses da indústria médico-farmacêutica e dos grandes grupos privados dos planos de saúde e redes hospitalares. As lutas dos comunistas devem exigir a universalidade do acesso a serviços de qualidade, um sistema 100% público e com participação popular na sua elaboração, avaliação e gestão.

A luta pela educação pública, gratuita, universal e de qualidade é necessária para a juventude trabalhadora e deve ser prioritária para os comunistas. A precarização do ensino e a disputa ideológica burguesa pela formação, seja pela via do Novo Ensino Médio, seja através do avanço das lógicas cívico-militares e do sucateamento das Universidades estaduais, precisam ser combatidos! A militância comunista deve seguir atuando para a defesa do fim do vestibular e contra táticas burguesas que mercantilizam ainda mais a educação, como a criação de vouchers ou cobrança de mensalidades em instituições públicas de ensino.

O estado do Rio de Janeiro, apesar de ter o 2º maior PIB do país, tem um déficit habitacional de pelo menos 476 mil casas – 331 mil na Região Metropolitana. Pessoas sem casa ou que sobrevivem em condições extremamente precárias (sem banheiro, sem acesso a gás/ sem fogão; “paredes” feitas de lona etc.). O estado do Rio tem 1,2 milhões de pessoas sem acesso a água e 8 milhões sem saneamento básico (IBGE, 2023). Ademais, os episódios de inundação e enchentes que produziram desmoronamentos e mortes, resultaram em centenas de trabalhadores desabrigados na região serrana nos últimos anos. Estes processos são produtos do descaso dos governos privatistas burgueses e liberais com a vida do povo, do aprofundamento da especulação imobiliária e da falta de planejamento urbano. As lutas por moradia digna, por terra, e o acesso a saneamento básico são prioritárias para os comunistas!

Outro grave problema é a insegurança alimentar. Estima-se que quase 3 milhões de pessoas passam fome no estado ou não fazem refeições no número de vezes e com a qualidade de alimentos necessários e adequados. Lutar contra a fome e pela soberania alimentar também deve ser um eixo de luta dos comunistas no estado do Rio de Janeiro e isso se traduz de diversas formas, como por exemplo, na defesa da reforma agrária, pela implantação de restaurantes populares e de medidas urgentes do governo para financiar alimentação a partir de um incentivo estatal a agricultura familiar e sua distribuição. A soberania alimentar é central para a vida do povo trabalhador.

Nossos esforços políticos e organizativos devem incluir: I) a elevação da consciência de classe; II) análises sobre o nível de organização atual da juventude e da classe trabalhadora em nossos locais de atuação; III) fomentar um avanço na organização independente do proletariado; IV) construir, nas disputas pelo avanço da organização dos trabalhadores e da juventude, uma hegemonia proletária (Gustavo Pedro, 2023).

A classe trabalhadora que vive e trabalha no estado do Rio de Janeiro se forja em uma realidade constituída por graves desigualdades econômicas, sociais, de gênero, raça e classe. As diversas formas de violência impostas pela burguesia ao proletariado são somadas, ainda, a existência de representantes institucionais e existência de grupos paramilitares da extrema direita organizada e suas múltiplas formas de capilarização em diversas regiões do estado. Considerar estes elementos e a história de lutas da classe trabalhadora nas diferentes regiões do Rio de Janeiro é central, e isto precisa ser feito a partir da inserção, vivência, militância orgânica dos comunistas nos locais onde vive, trabalha, estuda, luta a nossa classe. Que possamos aprender com a história de resistência da classe trabalhadora que no estado do Rio de Janeiro construiu nos sindicatos, nos quilombos, nas favelas, entre outros diferentes espaços forjados nas lutas populares! Elencar os eixos políticos, apontar lutas prioritárias, organizar a atuação comunista de forma orgânica, e contínua, com vistas ao enraizamento e a sustentação da luta classista e revolucionária, é a nossa tarefa! Sem conciliação com as classes dominantes ou ilusão com a democracia burguesa! Façamos do estado do Rio de Janeiro um caldeirão de indignação e lutas proletárias pelo poder popular e pela revolução socialista! (h)À luta, camaradas!


Texto elaborado em 07/09/2023 com o objetivo de fomentar o debate sobre análise de conjuntura e lutas prioritárias no estado do RJ que ocorreu na plenária organizada pelo movimento em defesa da Reconstrução Revolucionária do PCB, realizada na região em 09/09/2023. O mesmo texto foi base para a explanação de uma das autoras na mesa de abertura do evento.