'Paz entre nós, guerra aos senhores. Sobre as críticas ao PCR' (Silas Adriano)

A liberdade de crítica é o que diferencia burocrata de um militante. Um burocrata não tem o comprometimento de formar, criar ou pensar sua realidade ou outras, ele apenas reproduz de cima para baixo e cobra para que outros façam o mesmo.

'Paz entre nós, guerra aos senhores. Sobre as críticas ao PCR' (Silas Adriano)
Vladimir Lenin no funeral de Yakov Sverdlov, autoria desconhecida.

Por Silas Adriano para a Tribuna de Debates Preparatória do XVII Congresso Extraordinário.

O movimento comunista nos últimos anos vem crescendo a passos curtos, porém qualitativos. Nunca nesse século (até então) o socialismo era referido aos marxista-leninistas, em diversos momentos o socialismo era uma palavra de ordem distorcida usada pelos reacionários e pelos reformistas. O socialismo do século XXI era o movimento reformista latino americano que se tornou a maior frente anti-imperialista, o socialismo estava na sua forma mais retrocedida mesmo em seus avanços econômicos. Contudo, a partir do avanço da crise do capitalismo veio o anseio de radicalidade da classe trabalhadora. Esse anseio foi capturado pelo fascismo bolsonarista, mas também contribuiu para radicalização de muitos (a maioria da juventude). Apensar do avanço o movimento comunista apresenta suas próprias contradições. O ponto mais gritante veio ser o rompimento do PCB entre academicistas e marxista-leninistas. O academicismo marxista (que nada mais é do que revisionismo) possui as mesmas peculiaridades do elitismo universitário. O desprezo a crítica tem sido a pedra angular do velho PCB. O partido de paredes de mármore é a base organizativa que vem desmontando militantes com passar do tempo. Não se pode criticar o partido publicamente, mas é permitido criticar outros partidos de outros campos publicamente. Quando se pede uma forma mais livre de crítica vários questionamentos vêm aos montes. A crítica publica degenera o partido ou democratiza? Devemos criticar outros partidos do nosso campo? Isso é autofagia?

Esse texto provavelmente vai ser o mais prevê que já escrevi em tempos, mas senti a necessidade de escreve-lo pelo rebaixamento que debate teve na bolha comunista. A pouco tempo um camarada lançou um texto debatendo a situação do PCR no Pará e isso vem repercutindo de forma esquentada, contudo o fato dessa critica ter estourado no Twitter fez com que ela tivesse uma dinâmica típica das redes, ou seja, muita baixaria, muito ataque e sem um debate real sobre o que foi abordado.

A dois pontos centrais a ser debatido.

1 Devemos criticar outras organizações do nosso campo?

A resposta curta é: sim, devemos e temos o dever de fazê-lo com mais rigidez. Temos que compreender o lugar na cronologia histórica que nos encontramos. Não estamos nos estágios finais da revolução ou introduzindo a teoria marxista-leninista na sociedade brasileira. Estamos na era reconstrução revolucionaria, não só o partido em si, mas em recolocarmos no debate nacional a revolução. O socialismo cresce, mas cresce na perspectiva de colocar o socialismo como uma alternativa ao povo brasileiro. O nosso objetivo histórico é pavimentar o caminho. Com isso em mente fica claro que a crítica é essencial para abandonarmos o revisionismo que infectou os nossos partidos no passado, mas também popularizar o marxismo-leninismo. Um ponto que deve ser entendido é que o marxismo brasileiro foi gestado majoritariamente nas universidades, com isso ele ainda carrega elitismo, academicismo, oportunismo, eurocentrismo e outros aspectos bastantes comum nas universidades brasileiras. Criticar significa se livrar dos erros do passado e educar os que estão em sua volta.

A liberdade de crítica é o que diferencia burocrata de um militante. Um burocrata não tem o comprometimento de formar, criar ou pensar sua realidade ou outras, ele apenas reproduz de cima para baixo e cobra para que outros façam o mesmo. Um militante tem compromisso com sua classe e por isso constroem um partido que possa organizar sua classe, por conta disso deve-se pensar seu país, suas condições, erros e acertos de forma aberta, pois a classe trabalhadora não é uma massa que precisa ser guiada pelo partido, mas organizada. A diferença entre guiada e organizada diferencia um militante de um burocrata. Criticar um camarada de outro partido ou do mesmo aos olhos dos poucos atentos pode parecer um tiro no pé, mas se engana quem pensa assim. Criticar camaradas alimenta a construção do pensamento organizativo de forma didática, exemplar e pedagógica. Quem teme a crítica teme estar errado, quem teme estar errado é porque nunca se comprometeu a estar certo.

Já se tornou clichê criticar o PT e outros partidos social-liberal, fazemos isso publicamente com orgulho. O nosso campo também precisa ser criticado ou somos muito sensíveis para isso? Será mesmo que nosso movimento é tão delicado que críticas públicas debatendo a questão organizativa é tão prejudicial assim? Se resposta for sim e então o que será de nós quando formos uma ameaça real ao capital? É bom lembrar que nos EUA quando panteras negras se tornaram uma ameaça real ao capitalismo estadunidense, o governo dos EUA estimulou o conflito entre organizações afro-americanas buscando fragilizar a unidade. Se somos tão frágeis criticando uns aos outros o que será de nós no futuro?

Alguns podem argumentar que críticas públicas tiram o prestigio do partido e faz parecer que somos desorganizados. Camaradas, o partido deve ser o que ele é por dentro e por fora. O PcdoB se apresenta como democrata, constitucional e conciliador para o povo que o observa por fora, PcdoB é quase uma ONG de foice e martelo. Ao mesmo tempo que dentro do partido se debate sobre Stalin, luta armada camponesa, projeto de revolução brasileira e outros assuntos (claro de forma revisionista e questionável). O mesmo partido se apresenta de formas diferentes. Para povo e para seus internos o partido é diferente, a pergunta é: queremos isso? Obvio que não. O partido deve ser aberto na sua política de emancipação da classe, claro que se pode ocultar assuntos que ferem a segurança dos militantes, mas quando se trata de debater questão organizacional ou elevação da teoria ela deve ser pública.

Devemos criticar outras organizações? Sim. A crítica não se teme, ela se responde ou se absorve, nas duas o resultado é melhor do que ignorância.

A militância deve ter liberdade de debate público na imprensa partidária para ter a verdadeira unidade. No antigo PCB usava-se o método que a crítica deve ser feita em seus devidos lugares, a crítica deve ser interna diziam eles. Quem hoje constroem o PCB-RR sabe o que isso significava na pratica. Posso dar um relato próprio quando militava na UJC Joinville: fazia a crítica na instancia correta, a crítica não era debatida e na ata da reunião pouco era descrito qual tinha sido a crítica e o que foi criticado. No final o argumento “a crítica deve ser feita internamente” era só uma desculpa para sufocar o debate que não era produtivo para lideranças do partido. Obviamente não faço uma defesa em organizamos em frações como Trotskistas. Temos que ter liberdade de crítica, mas unidade na ação.

Lenin era defensor da liberdade de crítica. Ele mesmo escreveu sobre falsa contradição logica entre unidade de ação e critica pública.

“Aqueles que elaboraram a resolução têm uma concepção totalmente errada da relação entre a liberdade de criticar dentro do Partido e a unidade de ação do Partido. A crítica dentro dos limites dos princípios do Programa do Partido deve ser bastante livre (lembramos ao leitor aquilo que Plekhanov disse sobre esse assunto no Segundo Congresso do POSDR), não apenas nas reuniões do Partido, mas também nas reuniões públicas. Tal crítica, ou tal “agitação” (porque a crítica é inseparável da agitação) não pode ser proibida. A ação política do partido deve ser unida. Nenhuma “convocação” que viole a unidade de ações definidas pode ser tolerada tanto em reuniões públicas, como em reuniões do Partido ou na imprensa do Partido.”

Se não a debate honesto entre os militantes a unidade será artificial e frágil. É direito do militante expressar sua visão para que erros posam ser corregidos que novas visões de mundo possam ser compreendidas pelo partido. Isso se torna indispensável quando lembramos que o velho PCB tinha uma politica que beirava racismo, a misoginia e a LGBTfobia que eram debatidas pela base, mas não chegava ao topo.

A relação entre partidos deve ser debatida publicamente. Os militantes devem expressar suas relações com determinados partidos para sanar tenções e desvios. Fazer a critica ao PCR (ela sendo coerente ou não) não deve ser a problemática, o conteúdo pode ser problematizado, mas o “fazer a crítica” deve ser livre. Discordar é diferente de não quererem que falem.

Os partidos podem compartilhar o mesmo espaço de luta e debaterem suas discordâncias abertamente dentro de seus critérios.

2 A Falsa polemica entre PCR e PCB-RR

Queridos camaradas, esse trecho escrevo só para vocês. Quando o texto de um camarada criticando o PCR do Pará foi lançado, muitos criticaram o PCB-RR por ter permitido tal texto ser circulado. Ouve críticas ao texto em si, o que é valido, mas a maior parte da militância da UP/PCR criticou o PCB-RR de ter publicado o texto. Ou seja, criticaram terem feito a crítica e questionaram a necessidade dos militantes do PCB-RR de debater o PCR. Os militantes do PCR têm todo direito dar sua resposta ou de não dar resposta nenhuma, mas o que foi defendido foi que PCB-RR não deveria fazer o debate aberto sobre a relação e estrutura de outros partidos do mesmo campo por não ser qualitativo.

A frase popularizada por João Carvalho “Paz entre nós, guerra aos senhores” é dita a exaustão, mas se ignora o que seria essa “Paz entre nós”. Queremos paz a crítica e artificial? Queremos apertar nossas mãos em atos e depois jogar pedras uns nos outros em reuniões privadas do partido? Ou queremos uma paz genuína? Queremos construir pontes firmes e honestas debatendo nossas diferenças para elevar a consciência de nossos militantes. Eu posso dar a minha palavra que muitos aprenderam sobre a questão organizativa do PCR a partir do debate que foi feito. Muitos formaram suas opiniões a partir do debate público, vamos ignorar isso?

Paz honesta entre nós, e unidade a guerra aos senhores. Os militantes do PCB-RR têm liberdade de debater publicamente, a qualidade desse debate pode ser formulada e criticada com tempo, mas a liberdade de crítica deve existir. É uma falsa polemica de existe uma rixa entre PCB-RR e PCR. O próprio Ivan Pinheiro elogiou o PCR pela entrevista feita pelos mesmos e exigiu que velho PCB fizesse uma matéria sobre PCR.

Camaradas do PCR/UP, devemos ser abertos em nossas críticas e unidos na nossa ação.