'Organização interna do partido e o fim da UJC: A busca por uma mediação' (Mateus Filgueira)

Com esse caráter mais prático, mas [...] sem perder o caráter político e não cair num vício de trabalhos meramente operativos, as demandas serão suavizadas na UJC, permitindo que, a partir dessa nova estrutura e dinâmica, camaradas da juventude consigam também se desenvolver nas direções do Partido.

'Organização interna do partido e o fim da UJC: A busca por uma mediação' (Mateus Filgueira)
"Por fim, vale pontuar que não é a intenção que a UJC seja transformada em “mão-de-obra do Partido” e as comissões de juventude virem grupos de trabalho, porque ouso dizer que essa configuração é a que ta posta HOJE herdada pela cultura política do Comitê Central. A proposta é dinamizar as demandas da UJC e integrá-la ao Partido."

Por Mateus Filgueira para a Tribuna de Debates Preparatória do XVII Congresso Extraordinário.

Atualmente por muitos é feito a leitura de que se não unificar as direções, o Partido vai padecer uma vez que nossos quadros mais experientes estão na UJC ao passo de que se unificar as direções, a UJC vai padecer porque as demandas do Partido são maiores e necessitam de mais atenção (sobretudo neste novo ciclo de fundação/disputa de sigla e legenda).

Particularmente, compartilho dessa leitura – basta percebemos cada vez mais sobrecarga e quebra dos nossos quadros das direções (seja regional, seja nacional). O que não consigo aceitar é essa dicotomia posta como solução: “acaba UJC” (atuação exclusiva via Partido) versus “mantém UJC” (na estrutura que estamos). 

Tal dicotomia surge porque nos últimos anos, a UJC, apesar de submetida política e ideologicamente ao PCB, atuava quase que uma força “à parte” e independente (única atuação do Partido na juventude era para pedir dinheiro, mandar ou proibir algo, nunca direcionar, dirigir e atuar com unidade) e isso só se tornou um “problema” para o CC quando quadros avançados formados pela UJC começaram a disputar suas linhas no Partido.

Enfim, o ponto do debate aqui é tentar pensar numa forma organizativa que não percamos nosso partido nem a UJC. Tentei me basear no que conheço da juventude do KKE (KNE) e da juventude do TKP (TKG) [sobre o TKP menos por causa da barreira linguística, o KKE posta textos em inglês e alguns até em espanhol, o TKP só posta em turco].

A alínea “b” do artigo 6º do capítulo 2 “Membros do Partido: Obrigações e direitos” do Estatuto do KKE (de 2013)[1] coloca que os membros do KNE migrarão para o partido depois de completado a idade mínima, depois de ter militado ao menos 1 ano no KNE e com a recomendação de ao menos dois membros titulares do Partido. Reconhecidos como a juventude revolucionária do KKE, o artigo 41 do referido estatuto é claro ao colocar que o KNE está AO LADO do partido, mas com uma estrutura orgânica diferente; ao mesmo tempo, garante aos membros do KNE direito a voz (mas não a voto) nos congressos e conferências do KKE.

Já o TKG tem uma aproximação mais orgânica com o TKP, fazendo parte de sua estrutura e quase nenhuma distinção do que é juventude e o que é partido, inclusive, com quadros da juventude compondo o CC. A juventude sequer tem um site próprio (o que dificultou entender como funciona sua organização interna) e no site do TKP não encontrei resoluções de congressos da juventude. Nas redes sociais da juventude (instagram e twitter), a parte de “recrutamento”/”organize-se conosco” leva direto à página do próprio partido. Até onde eu sei [e aqui sem nenhuma pesquisa com documentos apenas por conversa com outros camaradas], o foco da juventude se dá no movimento estudantil (mas não apenas). Tudo isso me faz crer que não possuem resoluções e programas apartados dos do Partido. 

Friso que me inclino ao alinhamento posto pelo TKP/TKG, e nossas pré-teses parecem estar mais próximas dessa estrutura. Minha ideia de mediação vem para tentar conciliar os dois posicionamentos postos (acabar ou unificar a UJC) tendo como referência o KNE e TKG, unindo os dois até que possamos (quem sabe num próximo congresso) unificar de fato os trabalhos (usando os acúmulos que adquirimos nesse período nessa nova estrutura).

Na minha proposta, a UJC se dá como uma frente de juventude do nosso partido. Isso quer dizer que ela não é uma organização “à parte” subordinada ao partido... isso quer dizer que ela é PARTE do partido, está dentro dele.

Respeitando critérios como a idade (14? aos 30) e área de atuação (com a UJC voltada principalmente – mas não somente – ao movimento estudantil?), todo militante da UJC é, antes de tudo, militante do Partido. Tendo direitos e deveres como todo e qualquer outro militante do Partido, podendo compor suas direções de CL ao CC e com direito a voz e voto em congressos, conferências e ativos.

Para trabalhar suas especificidades, a direção da UJC atuará através de uma Comissão Nacional de Juventude (CNJ). Essa CNJ será composta por todos os militantes de base da UJC que estão no CC (membros-natos) e pelos militantes da UJC eleitos em sua respectiva etapa Nacional de Conferência. 

Neste momento, a CNJ será composta pelos membros da CN eleitos no IX ConUJC.

A Secretaria de Juventude do CC prestará assistência a essa comissão que terá autonomia relativa com suas linhas gerais (aprovadas em conferência) referendadas pelo Comitê Central. Os membros da juventude que fazem parte do CC podem, caso queiram, não compor a CNJ, sobretudo para evitar acúmulos de tarefas (como ser membro de mais de uma comissão, não correr o risco de atrapalhar a assistência de um estado e etc).

O trabalho político das comissões de juventude (seja nacional, seja local) será de colocar em prática suas resoluções e as do partido. Por atuar mais conjuntamente ao Partido, a CNJ não precisará de pastas como Secretaria de Relações Internacionais, nem Secretaria de Formação, nem Secretaria de Finanças, mas é essencial que tenha Sec. Política, Sec. de Organização, Sec. Agit. e Prop e secretaria de pastas de sua “jurisdição (como Sec de Mov. Est., Sec de Jovens Trabalhadores e etc...) [destaco que, mesmo sem uma secretaria de formação, os secretários de pastas especificas poderão (e devem!) sugerir formações e textos para serem elencados às suas jurisdições e indicados à formação política direcionada pelo Partido].

A atuação intermediária se dará nas Uniões de Comitês Locais (UCL). Nesse intermédio haverá a Comissão de Juventude (CJ), que será assistida tanto pela Secretaria de Juventude da UCL, quanto pela CNJ.

A Comissão de Juventude será composta por todos os militantes de base da UJC que estão na UCL (membros-natos) e pelos militantes da UJC eleitos em sua respectiva etapa Regional/Local de Conferência. Os membros da juventude que fazem parte do UCL podem, caso queiram, não compor a CJ, sobretudo para evitar acúmulos de tarefas (como ser membro de mais de uma comissão, não correr o risco de atrapalhar a assistência de um CL e etc).

Seu trabalho político será de intermediar as demandas postas pelo Partido e pela CNJ junto as bases. A recomendação é de terem as secretarias política, de organização, de agit e prop e, caso precise, de alguma específica para cada área de atuação existente em sua “jurisdição” como Sec de Mov. Est., Sec de Jovens Trabalhadores e etc...

As CJs prestarão assistência direta ao Comitê Local (junto à assistência da UCL) ou, caso haja necessidade, fundarão uma Comissão Local de Juventude (CLJ); nesse caso, prestará assistência ao CLJ junto com a Secretaria de Juventude da CL. 

Como instância “sub-intermediária”, e ainda mais prática, a CLJ não precisará de nenhuma outra secretaria a não ser secretaria de organização e política (e se precisar, alguma específica para cada área de atuação existente em sua “jurisdição” como Sec de Mov. Est., Sec de Jovens Trabalhadores).

A Comissão Local de Juventude (CLJ) só ocorrerá quando houver muitas células de juventude (células da UJC) e surja a demanda de um acompanhamento mais específico e próximo por parte da direção superior. Não havendo CLJ, o CL assiste a célula de juventude. Havendo CLJ, a própria CLJ assiste suas células de juventude.

A Comissão Local de Juventude será composta por todos os militantes de base da UJC que estão no CL (membros-natos) e pelos militantes da UJC eleitos em sua respectiva etapa Local de Conferência. Os membros da juventude que fazem parte do CL podem, caso queiram, não compor a CLJ, sobretudo para evitar acúmulos de tarefas (como ser membro de mais de uma comissão, não correr o risco de atrapalhar a assistência de uma célula e etc).

As células de juventude cotizarão para seu respectivo CL, uma vez que as comissões de juventude não terão vida financeira própria (quaisquer dinheiros ganhos por elas devem ser passados integralmente ao seu comitê superior). Ao mesmo tempo, os comitês (de local ao central) deverão prestar, além da assistência política, também a assistência financeira às comissões de juventude e/ou as células de juventude, bem como acompanhar e dirigir os trabalhos das demais secretarias que não tenha nas comissões de juventude (como direcionar formações, ajudar nas agitações e propagandas das páginas de juventude se houver, ajudar nas finanças e etc... – enfim, fazer o trabalho com as células da UJC o que faria com as células que não são da juventude).

MAS O QUE MUDOU?

Em primeiro lugar, o próprio fato dos membros da UJC serem considerados membros do Partido, podendo ter direito a voz e voto nos congressos, conferencias e ativos e podendo ser votados para CLs, UCLs e CC.

Ademais, nessa proposta, a ideia das comissões de juventude é serem as mais práticas possíveis, atuando para fazerem as intermediações necessárias (estratégia) para serem colocadas em prática nosso programa dentro da juventude. As tarefas/demandas para base de juventude serão DIRIGIDAS [e não mandadas] pelo Partido e pelas comissões de juventude (que por sua vez atuará a partir de suas resoluções aprovadas em conferência e demais orientações vindas do partido). 

Com esse caráter mais prático, mas obviamente sem perder o caráter político e não cair num vício de trabalhos meramente operativos, as demandas serão suavizadas na UJC – seja pela diminuição de áreas de atuação, seja pelo número menor de secretarias, seja pela redução de demandas (como por exemplo Processos Disciplinares serem tocados pelos CL/UCL/CC e não pelas comissões de juventude e o direcionamento de aproximações decididos também pelos comitês) – permitindo que, a partir dessa nova estrutura e dinâmica, camaradas da juventude consigam também se desenvolver nas direções do Partido.

Bom frisar novamente que em caso de quadros de juventude essenciais ao Partido, principalmente naquelas tarefas exclusivas ao Partido que não tem na juventude (como relações internacionais e finanças, por exemplo) ou algum camarada mais experiente e por isso destacado para acompanhar algum estado específico, podem se dedicar exclusivamente à direção do Partido, mesmo sendo membro-nato.

Por fim, vale pontuar que não é a intenção que a UJC seja transformada em “mão-de-obra do Partido” e as comissões de juventude virem grupos de trabalho, porque ouso dizer que essa configuração é a que ta posta HOJE herdada pela cultura política do Comitê Central. A proposta é dinamizar as demandas da UJC e integrá-la ao Partido.

Por isso, sugere-se de proposta para “Resoluções de Organização” dentro do tópico “Sobre o Partido e seus organismos”: 

O parágrafo 21 é a porta de abertura para nossa nova estrutura enquanto juventude: 

“As células ligadas a trabalhos estritamente juvenis >(particularmente o movimento estudantil)< serão células da União da Juventude Comunista, integradas organicamente como células partidárias para todos os efeitos. Os Comitês organizarão Comissões de Juventude, compostas por militantes eleitos pelas células da UJC por meio de Conferências periódicas” [texto original]

O que está destacado é um ponto polêmico que não tenho opinião fechada, mas que deve ser discutido também nesse tema porque coloca em voga o “papel da juventude”. Sobre isso, aponto que a UJC dando foco no mov estudantil terá ainda menos tarefas, permitindo que menos camaradas precisem compor suas comissões e podendo auxiliar mais no Partido, sobretudo porque algumas pastas são comuns ao partido (como Movimentos de Bairro e Cultura).

Depois deste ponto adicionar os seguintes:

__) A União da Juventude Comunista se integrará ao Partido em forma de uma frente de juventude, se organizando em células de juventude. Nos moldes do parágrafo anterior, a UJC superará a ideia de uma “organização à parte com autonomia relativa” e será verdadeiramente parte do Partido tendo direito a voz e voto em suas conferências, ativos e congressos e podendo ser votados em todas as suas instâncias de direção.

__) A Coordenação Nacional da UJC será integrada à Comissão Nacional de Juventude. Sendo assistida pela Secretaria Nacional de Juventude do Comitê Central. Além de organizar e dirigir as tarefas e demandas da juventude, a CNJ (Comissão Nacional de Juventude) também trabalhará na construção de conferências de juventude periódicas (com espaçamento máximo de 4 anos entre si) para novas diretrizes/resoluções e eleição de uma nova Comissão Nacional de Juventude.

__) Todos os membros da juventude que compõe o Comitê Local, União de Comitê Local e Comitê Central serão membros-natos na Comissão Local de Juventude, Comissão de Juventude e Comissão Nacional de Juventude, respectivamente. Podendo abrir mão de compor tais comissões visando especializar seu trabalho junto ao Partido.

Espero que esse texto possa ser, ao menos o início de um debate que vejo ainda tímido nas tribunas, mas que será polêmico no XVII ConExPCB.

Saudações comunistas.


[1] https://inter.kke.gr/es/articles/ESTATUTOS-DEL-PARTIDO-COMUNISTA-DE-GRECIA/