Ocupação da Fazenda Aquidoana em Parauapebas
Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) mobiliza mais de 5 mil famílias em defesa da alimentação e da reforma agrária no Brasil e ocupa fazenda durante o "Abril Vermelho".
Na manhã desta segunda-feira, 15 de abril de 2024, a fazenda Aquidoana, localizada no município de Parauapebas, foi palco de uma ocupação liderada pelo Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST). Mais de 5 mil famílias se uniram em uma ação que faz parte da Jornada Nacional de Lutas em Defesa da Reforma Agrária, iniciada no mesmo dia 15 e que tem data até o dia 19 de abril, trazendo à tona a urgência e a importância da luta por moradia digna e do combate à fome no país. A iniciativa busca inverter a lógica do uso da terra para bens primários voltados à exportação e da especulação agrária sobre as terras improdutivas, que dá poder ao agronegócio sobre os preços gerais dos alimentos. Sob o lema "Ocupar para o Brasil Alimentar", o MST se posiciona em favor da garantia de acesso à terra para quem nela trabalha.
A Jornada teve início no dia 15 de abril, mês do intitulado Abril Vermelho, em que se somam às ocupações de terras atividades de formação a fim de engajar à luta em defesa dos trabalhadores do campo. A Jornada reivindica a memória dos 21 trabalhadores rurais no massacre de Eldorado do Carajás de abril de 1996 por policiais militares no sul do Pará. O Abril Vermelho conta com marchas, ocupações, atividades de solidariedade e enfrentamento à concentração de terras no país, além de denúncias às práticas criminosas do agronegócio por todo país e em especial na Amazônia.
"A jornada nacional de abril deste ano traz como lema 'ocupar para o Brasil alimentar', entendendo que só a reforma agrária é capaz de acabar com a fome no nosso país e apontar a urgência e a necessidade de o Estado brasileiro realizar a reforma agrária", explicitou Margarida Silva, a Magal, dirigente nacional do MST.
O Programa Federal “Terra da Gente”
A fazenda Aquidoana é o local reivindicado pelo Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra para estabelecimento de um acampamento. Para além do Pará, a Jornada Nacional de Lutas em Defesa da Reforma Agrária já realizou 30 ocupações de terra, sendo 24 dirigidas pelo MST em 11 estados. No mesmo dia 15, concomitante à ocupação em Parauapebas, o presidente Lula participava de um evento no Palácio do Planalto para divulgação do programa “Terra da Gente” que, pretende beneficiar 295 mil famílias agricultoras até o fim de 2026.
A capacidade real, entretanto, de alocar recursos para a Reforma Agrária em um governo de conciliação sob a égide do Novo Teto de Gastos é cada vez menor, ainda que pleiteada em cerimônias em Brasília. O orçamento para desapropriação de terras improdutivas e direitos básicos no campo, tais como infraestrutura, crédito para produção, moradia e saneamento básico é, pelo segundo ano consecutivo, o menor dos últimos 20 anos.
Para além da necessidade da desconcentração fundiária no vasto território brasileiro, com a distribuição e regularização das terras, as ocupações buscam pressionar pela garantia de direitos aos trabalhadores rurais por condições para o desenvolvimento da sua produção e de suas famílias no campo. Demandas essas que, se ainda não foram sanadas sequer nas regiões urbanas do litoral brasileiro, ainda estão muito aquém no Brasil agroexportador. Disto, é necessária a reivindicação de políticas concomitantes para oferecimento de água, luz, estradas, postos de saúde com efetivo de medicina e enfermagem, escolaridade plena e assistência social.
“Essas demandas são direitos básicos que toca ao Estado resolver. É imprescindível também que a Companhia Nacional de Abastecimento, a Conab, seja fortalecida e protagonista da retomada de políticas de abastecimento, formação de estoques e regulação de preços e que tenha seu orçamento recomposto para que todo o povo brasileiro tenha acesso ao alimento, com preço justo e de qualidade”, como destaca Ceres Hadich, da Coordenação Nacional do MST.
Esse contexto nacional reforça a necessidade da luta em unidade dos trabalhadores rurais e urbanos de todo país por melhores condições de vida e políticas gerais de geração de emprego e renda pois, se no campo a concentração fundiária é uma temática sem perspectiva de mudança, as medidas urbanas para dirimir o déficit habitacional são programas como o “Minha Casa, Minha Vida”, que projeta a conciliação entre financeirização e especulação imobiliária, sendo a lucratividade um marco para direcionar a atuação do programa.
Os Conflitos Frente à Jornada e um Horizonte Socialista
Desde o início de abril, o (MST) ocupou 24 áreas, incluindo propriedades utilizadas para pesquisa pela Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) e pela Comissão Executiva do Plano da Lavoura Cacaueira (Ceplac), ambas vinculadas ao Ministério da Agricultura e, consequentemente, ao governo federal.. E ainda que o governo federal apresente o programa de reformas com suposta disposição às pautas do movimento, diversas das iniciativas do MST sofrem repressão constante por parte do aparelho estatal.
No município de Agudos, em São Paulo, um helicóptero da Polícia Militar sobrevoou o acampamento recém-criado, causando terror e intimidando as famílias Sem Terra presentes no local. Já em Campos dos Goytacazes, no Rio de Janeiro, na manhã desta segunda-feira (15), mais de dez viaturas do 8º Batalhão da Polícia Militar cercaram o assentamento Josué de Castro. Os policiais utilizaram drones e bloqueadores de sinal para intimidar as famílias assentadas. Vale ressaltar que o assentamento foi criado pelo Incra em 2007 e já está totalmente regularizado, reforçando que as tentativas de intimidação à luta organizada não se restringiram aos meios legais. Houve ainda conflitos em Goiás, com ação truculenta da Polícia Militar, além do Distrito Federal e Entorno.
Após a ocupação na fazenda Mariana, no município de Campinas, em São Paulo, as famílias foram reprimidas pela força policial, que despejou a ocupação usando força repressora de forma indiscriminada. Em seguida, as famílias dirigiram-se à sede do poder municipal em busca de negociações sobre a situação dos acampamentos. No entanto, neste momento, a Guarda Municipal bloqueou a entrada do Paço Municipal, impedindo tanto a entrada quanto a saída das pessoas.
Nos últimos anos, o MST tem se destacado por suas ocupações e mobilizações em diferentes regiões do país. Entre as ações mais importantes, destacam-se a Ocupação da Fazenda Annoni, ocupada desde abril de 2021 e que reivindica a destinação das terras para a reforma agrária e denunciando a concentração fundiária na região; o Acampamento Marielle Franco, construído em homenagem à vereadora do Rio de Janeiro assassinada em 2018, que teve como objetivo fortalecer a luta por terra e justiça social; a Ocupação da Fazenda São Pedro, no Paraná, em julho de 2023, demandando a desapropriação da área para a criação de assentamentos e o acesso à terra para famílias sem-terra.
Essas ações são exemplos de uma tática em defesa da reforma agrária e da distribuição de terras no Brasil, e que cuja intimidação e repressão devem ser denunciadas de maneira vigilante. É importante, porém, salientar como o projeto de Reforma Agrária que se restringe a cobrar a burguesia o cumprimento da função social da terra e que se contente, nos marcos do direito burguês vigente, aos latifúndios improdutivos não pode ser o horizonte da luta da classe trabalhadora brasileira, que deve almejar um programa desgarrado dos parâmetros da propriedade privadas dos meios de produção.
Os constantes desafios que o MST tem enfrentado como a violência no campo, a falta de políticas públicas efetivas e a pressão de interesses contrários à reforma agrária mesmo dentro de uma tática que não projeta, como horizonte estratégico, a superação do latifúndio, do agronegócio e da monocultura como formas de propriedade e relações sociais de produção agroalimentares apontam cada vez mais para a radicalização política na questão agrária brasileira para além do modo de produção capitalista.