'O tempo urge: um balanço do XVI Congresso do PCB' (Thandryus Augusto)

O CC construiu a narrativa de que um grupo derrotado no XVI estaria querendo passar por cima das resoluções tiradas dali ao chamar um novo Congresso. Oras, espero ter ajudado a demonstrar que quem não está seguindo as atuais resoluções é justamente o atual CC

'O tempo urge: um balanço do XVI Congresso do PCB' (Thandryus Augusto)
"Dito isto, gostaria de passar para o grosso deste texto, algo que posso resumir em uma pequena frase: o Comitê Central não cumpriu nenhuma das tarefas que cabiam diretamente a ele pelas Resoluções do XVI Congresso, e muitos de seus dirigentes agiram de fato contra elas. Tal descaso não pode decorrer de erros pontuais ou acidentais, e nem pode ser resolvida com mera autocrítica do tipo “errei, não farei mais” (que infelizmente parecem estar se tornando cada vez mais comuns…)."

Por Thandryus Augusto para Tribuna de Debates Preparatória do XVII Congresso Extraordinário.

Diante das polêmicas que estão ocorrendo no interior do PCB nos últimos dias, eu gostaria de contribuir com algumas reflexões que vim fazendo. Sou militante do LGBT Comunista, onde componho o secretariado, e estou no processo de recrutamento para o chamado partido em si há mais de 4 anos. As demais contribuições que já foram publicadas, como a carta transformada em diário de Ana Paula, o texto da Lorena, Ivie e Ruggeron, e o desabafo de Juliana Guerra, já expõem muitos dos problemas em um nível muito maior do que sou capaz. Gostaria de focar em alguns outros pontos tanto no tocante ao discurso quanto no tocante às resoluções congressuais que estão sendo tanto abordadas ultimamente.

Primeiramente, é necessário dizer que o coletivo no qual atuo, a princípio, rejeitou a tese de que existe um grupo fracionista e liquidacionista. O que podemos observar é a disputa, em linhas gerais, de duas correntes, o que é absolutamente normal dentro do centralismo democrático. Nas palavras do hoje secretário geral Edmilson Costa:

Também achamos fundamental para a oxigenação partidária e para a nossa democracia interna a existência de tendências dentro do PCB. […] Entendemos que com a discussão organizada das ideias será muito mais fácil o exercício do centralismo democrático do que continuar no velho e viciado sistema que existe atualmente.

Dentro desta perspectiva de disputa, não faz sentido a caracterização de uma das correntes como fracionista ou liquidacionista. Isto já parte de uma certa desonestidade intelectual, ainda mais quando uma circular ao meio-dia informa que será aberta investigação sobre um grupo fracionista atuando dentro do partido e menos de 6 horas depois já é feita uma nota nacional afirmando que existe tal fração. Qualquer militante, por menos tempo que tenha dentro do complexo partidário, sabe que tamanha eficiência simplesmente não é factível.

Também acho profundamente antiético os ataques personalistas feitos contra Ivan Pinheiro e Jones Manoel. Primeiramente, porque isto é simplesmente “bancar o avestruz” e achar que a disputa gira apenas em torno dessas duas figuras; em segundo lugar, porque é faltar com a história do Partido e com o reconhecimento para dois camaradas muito valiosos. Veja, eu posso discordar por exemplo das posições colocadas por Geraldinho, figura histórica de Volta Redonda, mas jamais vou atacar a sua figura, ou querer pintá-lo como narcisista, egóico, bêbado, hipócrita, ou o que quer que seja. Vale lembrar que não devemos fazer crítica à moda cristã, cobrando a perfeição moral de nossos camaradas, mas sim a coerência e consistência na luta pela Revolução Brasileira, uma vez que antes de tudo devemos ser leais à classe trabalhadora. É possível, sim, errar, e nós não devemos abandonar camaradas que tenham errado, desde que façam a autocrítica do modo marxista-leninista, isto é, que apontem maneiras de superar os erros; o problema é quando o erro se torna prática comum.

Outro ponto importante nessa discussão é a camaradagem, conceito fundamental para qualquer comunista. Sem camaradagem não existe centralismo democrático. Sem confiança não existe centralismo democrático. O centralismo democrático morre no momento em que se instaura um clima de medo e caça às bruxas, em que qualquer opinião pode resultar no seu afastamento ou desligamento do complexo, quando você não pode nem mais trocar ideias com outras pessoas por medo de ser dedurado.

E todas as circulares e notas políticas do Comitê Central e da Comissão Política Nacional instauraram justamente esse clima. Somam-se a isto as dezenas de relatos de perseguições políticas por parte do CC que têm vindo à tona.

Dito isto, gostaria de passar para o grosso deste texto, algo que posso resumir em uma pequena frase: o Comitê Central não cumpriu nenhuma das tarefas que cabiam diretamente a ele pelas Resoluções do XVI Congresso, e muitos de seus dirigentes agiram de fato contra elas. Tal descaso não pode decorrer de erros pontuais ou acidentais, e nem pode ser resolvida com mera autocrítica do tipo “errei, não farei mais” (que infelizmente parecem estar se tornando cada vez mais comuns…).

Vamos começar pelas resoluções organizativas. Segundo o documento, presente no site do Partido, vemos que as Resoluções 20, 48, 50, 57, 58, 64, 80 e 87 não foram cumpridas. Vamos esmiuçá-las:

  • a Resolução 20 diz claramente que, a fim de fazer o centralismo democrático funcionar, o CC deve organizar e regulamentar uma tribuna/boletim interno de debates, algo que não foi feito;
  • a Resolução 48 diz que o Comitê Central deve estabelecer a cotização progressiva. Também não foi feito;
  • a Resolução 50 trata de diversas fontes de finanças que deveriam ser organizadas pelo Comitê Central: (a) fortalecer o “circulismo nacional”, uma rede de amigas(os) e simpatizantes que contribuiriam mensalmente para um fundo de finanças; (b) a realização, através das mídias digitais, de uma campanha financeira; (c) resgatar o Mês Nacional das Finanças; (d) uma política de formação e finanças ligada ao Instituto Oswaldo Pacheco; (e) criação de campanha financeira online e recorrente; (f) planejar a aquisição de meios de produção gráficos. Alguma destas ações foi realizada com êxito?
  • as Resoluções 57 e 58 tratam da criação de uma Escola de Formação Política pelo Comitê Central. Tais escolas não foram criadas (ao menos, nada que se pareça com o que está nas resoluções partidárias) e nem temos ideia se serão criadas;
  • a Resolução 64 diz que é de competência exclusiva do CC um Programa Nacional de Formação de Quadros, programa este que também seria um “curso de formação técnica pedagógica para aqueles/as que forem ministrar as aulas”. Foi feito?
  • a Resolução 80 trata como competência do CC a profissionalização da impressão do Poder Popular;
  • por fim, a Resolução 87 diz que o PCB deve realizar esforço para ter uma editora própria e que o Instituto Caio Prado Jr., Fundação Dinarco Reis e Jornal Poder Popular devem estar submetidos ao Comitê Central. Aqui temos dois problemas: primeiro, porque sabemos que a existência da Lavra Palavra é um dos problemas da atual crise, por razões internas que não cabem expor em público; em segundo lugar, porque o Instituto Caio Prado Jr. não está submetido ao CC uma vez que escolhe sua diretoria de forma independente. Aliás, cabe a pergunta: por que o diretor é o mesmo desde 2006, mesmo que desde 2018 o Instituto está com o CNPJ em situação inapta por omissão de declarações? Claramente a diretoria não é escolhida pela boa gestão ou eficiência…

Como podemos observar, nenhuma das tarefas foi tocada na questão organizativa. Outro exemplo dessa ineficácia é facilmente observado nos recrutamentos (Resoluções 65 a 73). Eles simplesmente não funcionam, e meu caso é emblemático. 4 anos de espera é compatível com “crescer com qualidade e recrutar com ousadia” (Resolução 72)? Podemos dizer que “o objetivo de ampliar o número de recrutados/as” está “presente em todas as ações partidárias” (Resolução 68); e nisso, como fica a Circular de São Paulo que oficializou o congelamento dos recrutamentos? Temos já organizado um guia que permita um recrutamento padronizado e profissionalizado (Resolução 66)? Ao que tudo indica, no entanto, os recrutamentos não funcionam por questão de projeto, e não de forma acidental, uma vez que a entrada pelos Coletivos é vista como um fim em si mesmo, contrariando inclusive as resoluções partidárias.

Por fim, até o presente momento não tivemos a Conferência política, que deveria ter sido organizada no início de 2023 também de acordo com a já citada Resolução 20. O atraso não foi justificado, e quando questionei a secretária R. R. do CC diretamente sobre tal demora injustificada ela apenas versou que não estava atrasado, e perguntou de onde eu havia tirado tal calendário. Oras, está em nossas Resoluções, e é inconcebível que uma dirigente não soubesse disso.

Dentro da crise, muito tem se falado também do trabalho em redes sociais, estranhamente em tom de reprovação. Contudo, isso demonstra mais uma vez a incapacidade de dar fim ao que foi proposto e aprovado no XVI Congresso. Se a comunicação digital não é trabalho militante, então por que “devemos trabalhar para a organização de uma rede de comunicadores populares” (Resolução 81)? E se vemos com desdém o trabalho em ambientes virtuais,como podemos colocar em prática a Resolução 86 que coloca que “a propaganda e agitação em meios virtuais também precisa passar por um processo de profissionalização e centralização por parte do Partido e seus coletivos”? A relação da direção com a internet merece um texto à parte, uma vez que é altamente problemática, mas posso adiantar que tende ao obreirismo, algo que deve ser combatido segundo a Resolução 56.

Na questão política, não fica muito melhor. Acessando nosso Programa de Lutas, vemos facilmente que o Comitê Central deveria estimular “formação cultural” (Resoluções 63 e 64) e organizar espaços de debates, acúmulo e intervenção política nos esportes (Resolução 65). Sobre este ponto, foi o LGBT Comunista que organizou este ano uma formação pública sobre cultura contra-hegemônica com militantes de outras células; partiu de nós a preocupação de integrar melhor os acúmulos justamente porque não existe nada sistematizado.

Também não temos nenhuma diretriz política e plano de atuação junto aos povos indígenas (Resolução 79), inserção esta que o LGBT Comunista do Rio recorrentemente discute (e sei que também o Minervino), mas que não conseguimos realizar em parte por falta de trabalho positivo de nossa parte mas também por falta de orientações por parte da direção; para quem mora na capital carioca, veja se alguma vez o PCB esteve junto à Aldeia Maracanã ou traçou qualquer atividade junto a ela, ou mesmo partiu em sua defesa nos ataques sofridos por membros da extrema-direita e do PCO ano passado?

E não estou dizendo que todas as resoluções já deveriam estar feitas. Sei que não houve tempo hábil para isso. Mas nenhuma é inaceitável, ainda mais quando não há nenhum planejamento ou algo que leve a crer que serão cumpridas. Veja, a tribuna de debates já devia estar funcionando ano passado, e não é necessário amplo estudo logístico para que se faça a cotização progressiva, ou ao menos se repasse um informe para as bases dizendo que os núcleos e células devem implementá-la.

Quanto mais vemos, no entanto, mais vemos atitudes em desagravo à nossa linha política. Para explicitar isso, opto por retornar ao PMAI. Vou abrir aqui um breve parêntesis, uma vez que este fato é ilustrativo da atual crise.

A participação na Plataforma Mundial Anti-imperialista fere nossas resoluções?

Muito já se foi falado acerca da participação de Edmilson Costa e Eduardo Serra na PMAI, onde ambos fizeram discurso. Segundo circulares, tal participação não fere as nossas resoluções, estando em consonância com elas por não sermos isolacionistas e admitirmos a possibilidade de atuar em conjunto com forças além do campo revolucionário no campo internacional (mas então cabe a pergunta: por que então o CC não aprovou a participação?). De fato, a circular está em total acordo com o que podemos ler na Resolução 130 do nosso Programa de lutas:

130) O PCB respeita a diversidade de opiniões existente no atual Movimento Comunista Internacional e busca estabelecer um diálogo com todos os partidos comunistas do mundo, para trocar avaliações acerca dos processos políticos em curso e coordenar ações comuns contra a ofensiva burguesa. No entanto, o PCB deve privilegiar aproximações e ações políticas com os partidos do bloco revolucionário, que se articulam em espaços como a Iniciativa Comunista Europeia e a Revista Comunista Internacional, preservada a nossa autonomia política.

No entanto, o artigo 130 vem logo depois do artigo 129:

129) É preciso fortalecer o bloco revolucionário em articulação no interior do movimento comunista internacional, que se reúne anualmente no Encontro Internacional dos Partidos Comunistas e Operários, assim como contribuir para a construção do polo revolucionário dos Partidos Comunistas da América Latina, com inserção suficiente no movimento operário-popular para barrar a ofensiva imperialista-capitalista no nosso continente e tirar a direção da classe das mãos da socialdemocracia. Isso não obstante, é fundamental avançar no sentido de buscarmos construir um espaço permanente de articulação entre os PCs da América Latina, com o objetivo principal de coordenar lutas comuns.

Ou seja, o diálogo descrito na resolução 130 só pode de fato existir se não for contra o estabelecido na resolução 129, que o supercede, e que diz claramente que é preciso fortalecer o bloco revolucionário representado no EIPCO. E está aí o cerne da questão, uma vez que o PMAI é (possivelmente) uma plataforma que visa o enfraquecimento desse bloco, discussão que é admitida na Circular 22/2023, uma vez que é dito que “os debates sobre a Plataforma Mundial Anti-imperialista serão feitos no próximo pleno do CC. A CPN faz questão de afirmar que o PCB não participa nem apoia nenhuma articulação que tenha como objetivo promover a divisão no interior do EIPCO”. No mínimo, aqui temos explícita a relação problemática da PMAI com o EIPCO.

Mas se isso não bastasse, a Circular 22 traz que Edmilson participou do encontro de Caracas apenas como observador. Me causa profundo espanto que um observador possa discursar, visto que é possível encontrar seu discurso no site do PMAI. Em tal fala, que vale a pena notar que em momento algum defende o Partido Comunista Venezuelano, podemos ver alguns pontos sobre a política interna do Brasil que devem causar profundo estranhamento a qualquer militante do complexo partidário, uma vez que coloca linhas políticas que nunca foram postas para a base. A saber:

  • Em qual discussão o PCB fechou a interpretação de que o fascismo foi derrotado com a vitória eleitoral de Lula? (“Lula’s electoral victory was of great importance not only because he defeated the extreme right and fascism”)
  • o PCB defende agora as chamadas “liberdades democráticas”? Se somos um partido revolucionário, não somos necessariamente a favor da derrubada do chamado “estado democrático de direito”? Aliás, o que o camarada quis dizer com “forças democráticas”? (“On the other, the democratic and leftist forces that seek to recover the initiative, remove the fascists from the state apparatus, denounce the atrocities of the Bolsonaro government and consolidate democratic freedoms”)
  • Lula não cumprir as promessas de campanha tem a ver com o fato do governo atual ser representante da burguesia ou por conta da Frente Ampla, como colocado no PMAI? De onde surgiu tal análise que culpa a Frente Ampla pelo estelionato eleitoral? (“As Lula’s government is the result of a broad front, which brought together parties of the left, center and right wings, as well as sectors of the bourgeoisie, this alliance makes it difficult for the government to fulfill its promises made during the electoral period”)
  • Conforme fica claro nas Resoluções 122 e 131 do Programa de Lutas, nós não somos “independentes”, somos oposição ao governo Lula. (“As a revolutionary party, we will maintain our political and organic independence in any situation in the Brazilian context”)

Como fica a relação com os coletivos?

Outro ponto central na atual disputa é o papel dos coletivos, que já foram até comparados ao PMDB por um dos atuais dirigentes do Comitê Central, em post apagado do Twitter. Muito se diz que os Coletivos não são parte do Partido em conta de que supostamente teriam pessoas que poderiam querer entrar nos Coletivos sem de fato querer compor o Partido, e isto portanto seria motivo suficiente para não participarem dos Congressos. Tal argumentação possui dois erros fundamentais, em que explicitarei nos próximos pontos.

Primeiramente, a já citada Resolução 72 diz que a inserção preferencial de novas pessoas para o Partido deve se dar nos Coletivos. Isso já explicita a relação intrínseca entre a entrada nos Coletivos e a entrada no Partido, embora esta última esteja, na prática, fechada. Aqui, no entanto, cabem outras questões acerca de como se dá a relação Coletivo-Partido, que está descrita principalmente na Resolução 92:

92. Os coletivos partidários precisam estar inseridos na vida do Partido. O objetivo principal dos mesmos é nossa inserção nos setores e movimentos de luta da classe. […] Por conseguinte, nossos coletivos não são somente espaços de estudo sobre as condições das mulheres, da população negra e LBGT, são mecanismos que devem gerar leituras e aproximações para o Partido sobre a realidade dentro desse campo, que precisam ser apropriadas por toda organização e estar concretamente inseridas na nossa estratégia e tática. Outrossim, não é obrigação apenas dos coletivos produzirem conhecimento nesse campo, é de toda a organização.

Temos aqui dois pontos importantes. Primeiramente, que os Coletivos devem estar inseridos na vida do Partido, e em seguida temos como se dá tal inserção: através da apropriação dos acúmulos dos Coletivos pelo Partido. Infelizmente, este acúmulo não ocorre, inclusive pela ausência de uma tribuna interna de debates e de trocas. Isto é admitido, por exemplo, na Circular da Comissão Nacional do LGBT Comunista, em que é admitida “a dificuldade em ter a nossa produção teórica incorporada pelo Partido”.

Outro exemplo importante é que, embora as Resoluções do Programa de Lutas incorporem os acúmulos dos coletivos, estes acúmulos de fato não parecem ser incorporados por membros do CC em suas campanhas políticos. Inclusive, vale aqui lembrar que a Resolução 111 estabelece que nenhuma campanha deve renunciar ao Programa de Lutas em busca de votos, e a Resolução 114 deixa claro que todas as aparições e falas públicas devem ser centralizadas pelo Programa de Lutas. Diante disso, como fica a defesa na política de “nenhuma concessão ao crime organizado de qualquer tipo” (em outras palavras, discurso típico da política de “guerra às drogas”) preconizada por Eduardo Serra em sua campanha no Rio de Janeiro, indo contra inclusive as resoluções que versam sobre o tema e tiradas em Congresso (Resoluções 43 e 75)? É mais um caso de descentralização em que não foi feita nenhuma autocrítica? (E digo mais um caso porque a “autocrítica” feita pelo mesmo militante na questão da sua atuação no PMAI não foi uma autocrítica e sim uma ofensa à inteligência da base). Perguntem a camaradas de outros estados candidaturas lançadas pelo Partido em 2022 refletiram os acúmulos, presentes no nosso Programa de Lutas, do Ana Montenegro, LGBT Comunista, Minervino, UJC e Unidade Classista?

Outro problema que vemos é o seguinte: como os Coletivos podem se inserir na vida do Partido se, de fato, não existe comunicação? O sistema de assistências é problemático e merece outro texto profundo, mas sabemos que nada sobe às CRs, que as assistências não participam das reuniões (ferindo a Resolução 44), e no núcleo no qual atuo tivemos até assistente passando por cima da decisão do secretariado (isto é, contrariando a Resolução 43), o que de fato levou ao auto-desligamento de um secretário de sua posição. Não conseguimos subir documentos, críticas, sugestões, e muito menos nossos acúmulos. Vemos que, de fato, o que temos na realidade é que os Coletivos agem não em uma autonomia relativa (conceito nunca definido nas resoluções, por sinal), mas em uma autonomia quase total em todas as tarefas que toca, embora sejam proibidos de debater problemas internos; na prática, os Coletivos são uma miríade de pequenos PCBs que não possuem qualquer comunicação entre si. Digo autonomia quase total porque sabemos que os Coletivos muitas vezes não podem depender do Partido para realizar qualquer atividade, embora carreguem consigo o nome do PCB. A relação das direções com o trabalho de militância dos Coletivos é quase uma relação alienante.

Aliás, vale notar que, dentro dessa crise, tivemos pela primeira vez uma pessoa do Comitê Central entrando na reunião de secretariado mesmo quando dissemos que não precisava porque tínhamos autonomia relativa. Entendemos que isso se deu pelo nosso núcleo criticar abertamente as circulares e a nota vergonhosa da CPN sobre o assunto, e a presença da Renata Regina aumentou a sensação de um clima inquisitorial, uma vez que se tratou de um fato inédito. Agora, se é tão fácil assim que o CC se comunique diretamente com os Coletivos, por que isto não acontece sempre? Será que só poderemos entrar em contato com a nossa direção para poder dialogar, criticar e fazer propostas em momentos de crise? Um adendo: em nossa reunião (extra)ordinária, solicitamos ao Comitê Regional não uma reunião de esclarecimentos, mas uma reunião de diálogo, sem ameaças de processos disciplinares, e com debate em igualdade de condições (conforme consta na Resolução 27, não respeitada já que apenas dirigentes podem fazer circular suas notas). Até este momento, não obtivemos qualquer resposta, embora nos tenha sido garantido que ela virá com a reunião do CR do dia 12/08. Para não dizer que não obtivemos respostas, obtivemos três ao longo dos dias 13 e 14: não houve resposta, que não foi possível discutir no pleno mesmo que a discussão tenha sido cobrada, e que foi discutido mas não houve consenso. Em qual acreditar? Por que tantas respostas contraditórias?

E o Congresso?

Por fim, diante do mar de desinformações que vimos nos últimos dias por meio de circulares e notas, vale a pena discutir um último ponto: a participação dos Coletivos no Congresso. Para quem é novo no complexo, o argumento de que militantes dos Coletivos não deveriam participar por não serem parte do Partido em si pode até fazer algum sentido, ainda mais quando é lembrado que o XVI funcionou dessa maneira.

Esse argumento, no entanto, é uma completa farsa.

Veja, os Congressos do Partido sempre funcionaram com a participação de pessoas que não eram nem ligadas ao Complexo Partidário. Conheço casos de pessoas convidadas para o XV Congresso cuja primeira aproximação com o PCB se deu ali naquele momento, e o seu encantamento com o Partido se deu justamente por ver a democracia comunista de perto. As tribunas do XIV Congresso estão até hoje abertas no site do Partido.

De fato, o que esta argumentação acerca da participação dos Coletivos em Congressos quer fazer é sutilmente transformar a situação excepcional (o XVI Congresso ocorrido no meio da pandemia) em situação normal. A não ser que militantes de Coletivos valham menos que observadores de fora do complexo partidário que sejam convidados por membros do CC, tal argumentação não tem o menor sentido.

A partipação não deve estar atrelada ao voto. É possível debater, sim, se militantes de Coletivos podem ou não votar, embora particularmente eu concorde que o XVI Congresso estabeleça que isso não seja possível. Agora, deve ser consenso que esses militantes tenham direito de participar do XVII Congresso, podendo ouvir discussões, debater e até mesmo ter falas. Esse nem deveria ser um ponto de disputa para qualquer pessoa que conheça um pouco da história do partido e de como sua democracia interna foi e é construída. Então, ao que parece, tal tentativa de transformar a exceção em regra parte unica e exclusivamente do medo de ter as bases participando ativamente nos debates e na nossa democracia, e aí devemos nos perguntar: por que desse medo? Será que este medo também explica a falta da tribuna de debates? A resposta, ao que parece, ecoa Lenin:

[…] vocês precisam fazer isso para esconder o fato incontestável de que é de fato um espírito de burocracia, um espírito de disputa por cargos, que obceca aqueles que não conseguiram por si próprios contribuir ao trabalho no Partido exceto como membros de suas instituições centrais. Sim, seu comportamento de fato mostrou claramente para nós que nosso Partido sofre de um espírito de burocracia que coloca o cargo acima do trabalho e não evita nem boicote nem rompimento no esforço de conseguir esse cargo.

Por fim, deixo uma última reflexão para quem está lendo. O CC construiu a narrativa de que um grupo derrotado no XVI estaria querendo passar por cima das resoluções tiradas dali ao chamar um novo Congresso. Oras, espero ter ajudado a demonstrar que quem não está seguindo as atuais resoluções é justamente o atual CC, e aí diante disso devemos nos perguntar: quem de fato saiu derrotado no último Congresso e em conseguinte está desrespeitando suas decisões democráticas?

Adendo: Todo militante deve defender irrestritamente a reconstrução revolucionária do Partidão!

Escrevi este texto no final de julho, antes das expulsões se consolidarem. Ele era inicialmente intitulado “Que se cumpram as resoluções do XVI Congresso!”. O que me levou a escrevê-lo foi o estudo sistemático das resoluções do XVI Congresso por uma demanda do meu coletivo de fazer uma formação acerca delas no mês de agosto. Oras, para a minha surpresa, as resoluções não estavam sendo cumpridas! Publicizei o texto, internamente, no dia 31 de julho, após a “Circular a toda a militância do PCB e dos coletivos”.

Antes de continuar, quero fazer uma errata da última frase escrita anteriormente. Eu não acredito que nenhum grupo tenha saído derrotado ou vitorioso. O Congresso é o maior espaço de síntese que uma organização marxista-leninista tem ao seu dispor, e sínteses não comportam derrotas e vitórias. Existe um problema quando pensamos dessa forma e fazemos apontamentos neste sentido, até porque criamos a priori uma ideia de “nós e eles”, criamos mentalmente uma fração ou tendência já no período congressual. Ainda assim, as Resoluções do XVI Congresso estão sistematicamente não sendo cumpridas.

Esta circular foi extremamente problemática. Primeiramente, mostrou claramente que existia um vício no julgamento das pessoas consideradas fracionistas, vício este que pode ser observado de diversas maneiras:

  • um documento sem assinatura, que Jones Manoel havia se colocado contra, e que havia até suspeitas de que foi escrito como “bait” por pessoas do CC foi usado como evidência contra… Jones;
  • Lazzari foi expulso por ser “defensor da linha política defendida pelos fracionistas em todos os espaços da organização de que tem participado, a exemplo da defesa de um partido que exponha publicamente suas divergências internas [...]. Atua como operador interno do grupo fracionista”. Ou seja, Lazzari foi expulso por concordar com uma linha política… internamente.
  • outra evidência para a expulsão de Lazzari foi ele ter organizado um livro com textos de Lenin anteriores à Revolução, inclusive com um posfácio de cunho próprio que foi utilizado em formação do LGBT Comunista por apresentar problemas de maneira muito clara.

Os eventos posteriores, como a criação do PCB-RR, não permitem supor que portanto o processo tenha sido justo: isto seria uma confirmação a posteriori, uma análise anacrônica.

De lá para cá, tivemos muitas outras circulares “marxistas e leninistas” altamente problemáticas. A começar pela Circular 003/2024, que afirma que Eduardo Serra realizou uma “autocrítica interna, encaminhada para toda a militância partidária”, o que é mentira, como comprovado pelo documento escrito pelo LGBT Comunista RJ e subido para o CR via assistência.

Outros pontos problemáticos foram os “Esclarecimentos acerca das críticas públicas” que circulou no dia 06 de agosto, que dá voltas sem responder, no entanto, uma questão central: que o Partido decidiu priorizar um twitaço eleitoral do que formular uma resposta partidária sobre a chacina no Complexo do Alemão. Inclusive, sobre este último ponto, existe uma confusão gravíssima para qualquer organização comunista ao confundir “nota política” com “nota de campanha”. Explico: enquanto a primeira é uma resposta direta a um evento dada pelo Partido, e portanto faz parte de sua própria história, algo que pode ser consultado no futuro, uma análise que pode servir para análises posteriores; uma nota de campanha é uma nota com um tempo de vida muito menor, e é realizada por um(a) candidato(a). Uma nota partidária é perene, uma nota de campanha é efêmera. A suposição de que uma nota de campanha equivale a uma nota do Partido é digna de partidos que confundem a sua vida política com a sua vida eleitoral.

A circular 004/2023, do dia 07 de agosto, subiu o tom, inclusive com a assistência falando que “a divulgação de seus materiais [do PCB-RR] [...] darão lugar às sanções previstas em nosso estatuto”. Temos medo e receio de leitura, agora? Será que como marxistas-leninistas também não podemos ler autores liberais, pós-estruturalistas, ou corremos o risco de deixarmos de ser marxistas-leninistas? Essa proibição beira ao ridículo.

Escrevo agora este adendo, bem como a mudança de título, por conta da Circular interna do dia 10 de agosto. Nesta circular é informado que 23 militantes foram expulsos do partido por “assumirem publicamente que estão aderindo ao movimento fracionista PCB-RR”. Vale notar que as expulsões se deram de maneira ilegal, sem abertura de PDs e sem o direito de defesa. E qual foi a evidência utilizada para rasgar nosso estatuto? Tais militantes assinaram um documento com o seguinte parágrafo:

Portanto, mesmo diante de uma crise tão grave, a movimentação das células e coletivos pode contribuir para formular e construir saídas que não apenas preservem os avanços conquistados até aqui, como também apontem para a superação dos limites escancarados nas últimas semanas. Entendendo que a democracia interna, a garantia das instâncias de direção coletiva, a unidade de ação, a prioridade do trabalho de base e das lutas concretas não podem mais ser deixadas de lado, nos somamos à defesa da RECONSTRUÇÃO REVOLUCIONÁRIA DO PARTIDO COMUNISTA BRASILEIRO. (grifo meus)

Este parágrafo claramente denota que é necessário fazer a reconstrução revolucionária do PCB através da movimentação das células e coletivos, ou seja, internamente (visto que o PCB-RR não é nem célula, nem coletivo, ou agora é?). Mas apenas por falar de Reconstrução Revolucionária, 23 camaradas foram vistos como fracionistas.

Deixo claro aqui: É DEVER DE TODO MILITANTE DO PCB DEFENDER A RECONSTRUÇÃO REVOLUCIONÁRIA.

Isto não é o PCB-RR que diz, é literalmente a Resolução 1 das Resoluções de Organização:

1. O atual momento do PCB caracteriza-se pelo aprofundamento da etapa de reconstrução revolucionária, depois de termos superado o momento inicial de defesa da manutenção de nossa organização e de reinserçãodo Partido no cenário político e social brasileiro (1992-2005).

É extremamente problemático quando a primeira frase de nossas resoluções é vista como prova de fracionismo, ou quando camaradas que repetem a resolução são acusadas e acusados de pertencerem a outras organizações. Quer dizer que, para efetivar nossas resoluções, não devemos mais estar organizados nas fileiras do PCB? Isto não faz o menor sentido, mas é sintomático dentro de uma série de resoluções não cumpridas que, mais cedo ou mais tarde, a nossa PRIMEIRA resolução também teria sua hora de ser desrespeitada.

Mais um adendo: O governo Lula e a formação de tendências.

Este texto cresce cada vez mais, infelizmente. No dia 14/08 o Comitê Regional do Rio de Janeiro lançou uma nota intitulada “O combate ao fracionismo é necessário para seguirmos fortalecendo o PCB”. A nota, em conteúdo ou explicações, é vazia. Ali não se encontra nenhum dado, nenhuma informação nova, é apenas a profissão de fé de uma narrativa. Isso pode ser visto inclusive pela conclusão, onde é dito que “aqui no Rio de Janeiro seguiremos lutando contra a política de segurança pública que mata jovens, negros e moradores das periferias, favelas e bairros populares; pelo fim da política de guerra as drogas; pela desmilitarização da segurança pública e pelo fim da PM”; oras, como é possível ter confiança nisso diante da campanha de Eduardo Serra em 2022 no tangente à segurança pública? Até o momento não foi feita qualquer tipo de balanço, autocrítica, ou dada explicação sobre este fato, inclusive.

Mas mesmo sendo uma nota tão fraca, um ponto em particular me chamou especial atenção:

- Acusam-nos de recusarmos compor uma oposição ao governo PT. Nós do PCB mantemos a mesma posição de independência que nos norteou desde o segundo turno, quando nos somamos unilateralmente na campanha pela derrota de Bolsonaro mas sem exigir nada em troca por conhecermos os limites do governo Petista. Nesse sentindo [sic] mantemos nossa posição de independência em relação ao governo e mobilizando e organizando a classe para enfrentar tanto ameaças da extrema direita fascista como a agenda liberal do governo.

Primeiramente, cabe dizer que este parágrafo não possui qualquer sentido lógico mesmo. Ele pode ser quebrado na seguinte estrutura: “Nos acusam de não ser A. No entanto, somos B”. Em nenhum momento é rebatido a acusação de não ser oposição. Ser independente NÃO equivale a ser oposição. Exemplo: tecnicamente, éramos independentes também do governo Bolsonaro, mas além disso também éramos oposição. O PCB (espero) será independente de todo governo da democracia burguesa. Independência é uma condição necessária para ser oposição, mas não suficiente; ser oposição implica em ser independente (não existe possibilidade de ser oposição sem ser independente, o PSOL que o diga), mas ser independente não implica necessariamente em ser oposição, é apenas um primeiro passo.

Mas é importante notar que em várias notas da direção essa posição de independência é reiterada. Fiz este questionamento na célula. Infelizmente, vou expor algumas mensagens internas do meu núcleo por elas apontarem bem a problemática.

Assistência: Não é uma mera questão de palavras, independência ou oposição, e a interpretação que o PCB-RR dá para essa questão é esquerdista e isolacionista, camaradas. A nota explícita muito bem essa divergência.

Eu: então nossas resoluçoes sao esquerdistas e isolacionistas camarada.

Eu: mas se sao erradas devem ser mudadas em conferencia ou congresso

Assistência: Justamente. E a nossa Conferência, que estava sendo programada pelo CC, foi atropelada pela polêmica suscitada pela divulgação pública de questões internas ao Partido.

Eu: se é uma questao então que tem qus ser debatida dm conferencia pq ela esta “errada” nas resoluçoes, nao cabe qualquer CR ou CC atropelar a conferência e falar de independência e nao de oposiçao antes da resoluçao ser mudada tambem uai

Eu: isso é quase o mesmo que lançar publicamente a polêmica independencia vs oposiçao que é tema de nossa proxima conferencia

e lançar esses termos publicamente inclusive fortalece a formação de uma tendencia.

ate a conferencia temos que falar de oposiçao e quem acha isso esquerdista ou isolacionista deve debater internamente ali. nao?

Como enviei no grupo, colo aqui as Resoluções 122 e 131:

122) Para nos opormos de modo consequente à ofensiva burguesa, nossas alianças eleitorais devem ter como base o acordo estratégico em torno da revolução socialista, recusando alianças com candidaturas de conciliação de classes. Nos casos de eleições onde o segundo turno apresente a polarização entre candidaturas reacionárias e reformistas, caberá a avaliação em cada caso concreto da possibilidade de apoio crítico, que ressalte desde logo o fato de que estaremos na oposição ao futuro governo de conciliação de classes. Sabemos perfeitamente a diferença entre governos reacionários da extrema direita e da direita e governos de conciliação de classe. Nossa firme decisão sempre será nos colocar junto com a classe trabalhadora, organizando-a na defesa de seus interesses e direitos, seja no terreno das liberdades formais ou num contexto reacionário.


131) O PCB considera que é negativo para a classe trabalhadora que os Partidos Comunistas abram mão de defender o programa revolucionário proletário para abraçar programas reformistas pequeno-burgueses, seja em nome da “unidade contra o neoliberalismo”, seja pela “unidade antifascista”. A experiência recente do nosso país e toda a história do movimento comunista internacional demonstram nitidamente que, ao invés de gerar um acúmulo de forças, o que isso gera na prática é o desarmamento político, ideológico e real da classe trabalhadora. A desilusão gerada pelo não cumprimento das promessas da socialdemocracia é um dos fatores que contribui para a chegada do fascismo ao poder e a sua aceitação por parte das massas populares, como já nos apontava a Internacional Comunista antes do estabelecimento da linha das Frentes Populares, de colaboração com a socialdemocracia.

Apesar do dirigente C. B. N. do CR do Rio de Janeiro dizer publicamente no Twitter que desconhece resoluções que versem sobre o tema até porque seria impossível a militância ter discutido, em 2021, uma possível vitória de Lula em 2022, a Resolução 122 coloca, sem chance para entender de forma equivocada, que somos oposição ao atual governo petista. Membros e membras do CR possuem todo direito de compreenderem essa oposição é vista como “esquerdista” e devem levar este debate para a próxima Conferência ou Congresso, mas não possuem o direito de publicarem sua compreensão nas redes do Partido desrespeitando nossas Resoluções. Isso tem nome: quebra de centralismo democrático e formação de tendência.

Se agem dessa foma, agem inclusive de maneira conscientemente negativa contra a classe trabalhadora de acordo com as próprias resoluções congressuais. Por que a insistência em falar de independência e não de oposição?

Vale aqui inclusive fazer um balanço de qual é o papel do Comitê Central de acordo com as Resoluções do XVI Congresso, uma vez que poderiam falar que falar de “independência” e não de oposição é um “ajuste” que o Comitê Central tem o direito de realizar. Mais que isso, também é dito pela direção que a posição do Partido em respeito a algum tema é a “posição que a maioria do CC definir”. No entanto, isto não tem respaldo. Aqui, cabe trazer uma série de resoluções que versam sobre o tema:

  • a Resolução 16 diz que a militância deve sim “ter a liberdade de iniciativa relativa para a atuação cotidiana”, mas que isso é um “trabalho delimitado pelas resoluções [em primeiro lugar], estatuto [em segundo lugar] e diretrizes partidárias dos organismos superiores [em terceiro lugar]”. A ordem em que os termos aparecem é fundamental;
  • a Resolução 21, amplamente desrespeitada nas últimas semanas, diz que 21 “procuramos fazer com que nosso Partido seja uma organização leninista sem personalismos nem mandonismo, onde a militância participe efetivamente da construção coletiva da linha política e das ações (...)”. Esta Resolução é clara: a linha política não parte do CC e é obedecida pela militância, e sim construída de forma conjunta e sem mandonismo. É necessário reparar que em nenhum momento desta resolução é dito que estaconstrução coletiva é restrita apenas às etapas congressuais, de forma que é possível concluir, portanto, que é algo que se deve dar a todo momento;
  • a Resolução 23 deixa claro que o "CC tem plena autoridade para dirigir o Partido subordinado à sua instância máxima, que é o congresso, e para execução das tarefas congressuais" (como vimos, nenhuma das tarefas foi executada até agora);
  • a Resolução 27 é interessante, porque diz que “os cargos de maior responsabilidade, como os de secretários/as do Comitê Central, de comitês intermediários, células e frações, não dão privilégio estatutário ou simbólico aos seus ocupantes no debate do coletivo, que é o verdadeiro dirigente. Os cargos de direção exigem mais responsabilidade e compromisso com as tarefas a se cumprir, não são posições privilegiadas.”. Esta mesma resolução, além de falar que quem ocupa o Comitê Central está subordinado ao coletivo (e não vice-versa) também versa sobre a necessidade de toda a militância estar em condição de igualdade para fazer debates e propostas, de forma que a interpretação do Comitê Central não é a única e pode ser questionada a qualquer momento. Inclusive, a operacionalização de uma tribuna de debates é imprescindível para operacionalizar justamente esta resolução que garante nosso centralismo democrático;
  • a Resolução 37 reforça que “as principais instâncias deliberativas do PCB são o Congresso do Partido [em primeiro lugar] e o Comitê Central [em segundo lugar], respectivamente”. Novamente, é o CC que está subordinado às Resoluções e não vice-versa.

Com isto quero deixar claro que não cabe o argumento de que o Comitê Central pode, à sua revelia, mudar a nossa política de oposição em relação ao governo Lula, ainda mais sem consultar as bases. Falar em independência só poderia ocorrer de três maneiras: 1. ou com uma Conferência política; 2. ou com um Congresso; 3. ou com ampla consulta às bases. Como nenhum dos três casos está posto, concluo que esta tomada de posição prematura é portanto uma formação de tendência, e que sua colocação em notas públicas visa efetivar este giro em nossa próxima Conferência.

Eu recebi a incumbência de minhas camaradas e meus camaradas do LGBT Comunista estudar nossas resoluções congressuais. Espero que com esse escrito tenha me mostrado à altura da confiança depositada em mim, e que posso dar essa tarefa sobre a qual me debrucei nas últimas semanas finalmente como acabada.

Concluo (espero).

¹ Era quando escrevi este texto. Fui expulso no dia 18/08.

² Uma nota posterior ratificaria que, na verdade, eles foram “auto-expulsos”. A narrativa sem sentido da auto-expulsão é só um jogo retórico para querer assumir a presunção de culpa e não a presunção de inocência. Vejam bem: a circular diz, sem provas, que esses e essas militantes entraram em outra organização (mesmo que negassem), e portanto não devia ser aberto um processo disciplinar já que não estariam mais nas fileiras partidárias. Ou seja, se parte da culpa para negar o processo e o próprio direito de defesa. Houve uma interpretação (errada) sobre um texto, e com base nela houve outra interpretação (errada) sobre o estatuto; quando questionada, a assistência se limitou a dizer que “o Partido interpreta”. A auto-expulsão entra no mesmo léxico do desrecrutamento e do afastamento preventivo?