'O liberalismo pequeno-burguês e a organização da polêmica pública' (Victória Pinheiro - Pernambuco)
É impossível criar uma imprensa livre do domínio burguês se elegemos as suas redes sociais como plataforma prioritária para veiculação de nossas ideias.
Por Victória Pinheiro para a Tribuna de Debates Preparatória do XVII Congresso Extraordinário.
(Explico que assino com meu estado de origem entre parênteses a fim de evitar confusões sobre a autoria do texto, existe mais de uma pessoa com o mesmo nome e sobrenome em nossa organização no estado de São Paulo, base que me encontro vinculada nesse momento.)
Camaradas, refleti muito sobre qual deveria ser a primeira tribuna que enviaria como contribuição ao nosso debate congressual. Depois de me defrontar com isso por muito tempo e compartilhar também muitas das minhas divergências com a minha célula, optei por enviar aqui a crítica (adaptada e acrescida de novas informações/reflexões) que encaminhei na célula com evidente solicitação de que fosse enviada ao CR de São Paulo e ao Comitê Nacional Provisório no dia 19 de dezembro. Até hoje (24/01), dia que envio essa tribuna para publicação, não recebi nenhum tipo de retorno dos organismos citados.
O twitter deveria ser nossa plataforma prioritária?
Todos os dias ao acessar as redes sociais, sobretudo o twitter, observamos que a polêmica em nossa organização é pautada diretamente pelas discussões e debates travados nos perfis pessoais dos nossos militantes ou de figuras da bolha de esquerda nessa mesma rede social.
Muitos podem dizer que faz parte da publicização de nossas ideias, mas mentem para o conjunto da militância e, em alguns casos, para si. Vamos olhar para essa rede com cuidado:
O twitter é uma rede social extremamente nichada, o conteúdo a que você tem acesso é profundamente filtrado para circular numa bolha específica de pessoas com gostos/interações comuns. Quem diz isso não sou eu, mas o time de engenharia do twitter e o algoritmo da aba "for you" que no ano passado veio a público. Simplificando, o algoritmo processa uma base diária de milhões de tuítes para construir a página "For You". Esse processo envolve três etapas principais:
- Escolha dos tuítes mais relevantes através da técnica "candidate sourcing";
- Classificação de cada tuíte;
- Implementação de filtros para segurança, contas bloqueadas e postagens já visualizadas.
O método de "candidate sourcing" identifica os 1.500 tuítes mais relevantes, levando em consideração tanto as contas que você segue quanto aquelas que não segue. Para indicar conteúdo dentro da rede do usuário, o modelo opera com base em três fatores: se um usuário segue o outro; se um usuário tem o outro em sua lista de contatos do telefone; se já houve interação prévia entre os usuários.
Já para identificar sugestões de tweets e perfis que um usuário ainda não segue, são empregados dois filtros: quais tuítes uma pessoa que você segue interagiu? Quais usuários gostam de tuítes parecidos e quais, nessa categoria, receberam curtidas recentemente?
Além disso, são organizados conjuntos de usuários influentes, sendo que um usuário pode fazer parte de vários desses conjuntos, cujos tweets são igualmente apresentados no seu feed. Quanto mais interação e engajamento os usuários de um conjunto têm com um tuíte em específico, mas esse tuíte será associado a esse agrupamento.
Ou seja, todas essas informações reforçam a ideia de que o agrupamento de pessoas que acessam o que estamos disseminando nessa rede, sobretudo pessoas com poucos seguidores (caso da maioria dos militantes envolvidos nesse grupo de debates nas redes), é muito pequeno para se falar em qualquer valor coletivo para além de se criar uma casta dentro do próprio partido que foge da regulamentação coletiva do debate e da exposição de ideias e apela para o direito individual à expressão.
O modelo de conteúdo também deve ser questionado, com 280 caracteres disponíveis por tuíte é extremamente difícil trabalhar temas com algum nível de profundidade ou até mesmo qualidade, podemos dizer. O modelo de fios, apesar de parecer uma alternativa a restrição de texto, é limitado e são poucos conteúdos desse tipo que conseguem a visibilidade necessária para comunicar fora da bolha.
Além disso, trata-se de uma rede que sequer é utilizada pela maior parte da classe trabalhadora, na verdade é efetivamente uma rede popular entre jovens de classe média quando comparada com outras redes sociais em funcionamento no Brasil. Portanto, já se pode questionar o método de debate e disputa a partir daí: sob nenhuma situação (de conteúdo organizado ou pessoal) trata-se de uma rede prioritária.
Que tipo de polêmica estamos construindo? Será que realmente rompemos com o cerceamento de debate do velho PCB ou apenas entregamos uma roupagem mais democrática para o mesmo comportamento?
Não tem sido incomum que o esforço de um militante em sistematizar suas ideias e torná-la pública através de uma tribuna seja reduzido a alguns tuítes e comentários em redes sociais. Dado que uma parte dos integrantes do CNP e de diversos CRs, camaradas experimentados, seguem alimentando essa lógica, acho importante trazer alguns questionamentos diretos para serem levados ao CR e ao Comitê Nacional.
Efetivamente elegemos as redes sociais como fórum de debate da nossa organização? O CNP não tem nenhum tipo de preocupação ou discussão interna sobre como organizar o debate para o nosso congresso e de forma permanente em nossa organização? Para debater as tribunas teremos todos que criar um Twitter, seguir a bolha comunista e começar retuitar, distribuir likes e comentar posts? Como serão sistematizadas as polêmicas? Vão abrir tuíte por tuíte, ver engajamento em cada post, número de likes e comentários negativos para dizer se uma posição tem relevância, tem encontrado base na organização ou é rejeitada?
Camaradas, a polêmica pública tem por objetivo, num partido comunista, dar vazão às diversas posições, enriquecer o debate, permitir que sínteses sejam formuladas, identificar as divergências no seio da nossa organização, educar as massas e o próprio movimento comunista. Para isso, o primeiro passo é assegurar que todos tenham direito a expor a sua opinião do mesmo modo, tendo seu direito de formular/criticar/divergir respeitado, mas também seu direito a uma resposta também organizada pelo mesmo regimento — ou quem escreve realmente tem a tarefa de vasculhar perfis para saber o que estão respondendo sobre algo que ele submeteu ao coletivo do partido de forma sistematizada e organizada? A devida organização dos veículos de debate permite aos organismos de direção e ao órgão ideológico a correta análise sobre as ideias que circulam no partido para orientar seus planejamentos, intervenções e o próprio debate.
No velho PCB criticamos incessantemente que não possuíamos direito a divergência assegurado, ao livre debate de ideias, mas que uns poucos podiam explorar suas plataformas pessoais para expor suas posições, no entanto seguimos aqui reforçando a mesma prática liberal e individualista quando permitimos que sejam as redes sociais pessoais de militantes a plataforma de debate sobre as posições que circulam em nossa organização. No fim, o que prevalece é o algoritmo, o número de seguidores, os likes e a autopromoção.
Esse desvio, pequeno-burguês, vale destacar, não exprime mais que a necessidade de alguns em impor suas posições, utilizando de meios não regulamentados por nós e apelando para a lógica do engajamento para forjar uma maioria. Forjar porque sequer a maior parte da nossa militância está nesse espaço — basta observar como os nomes que protagonizam os debates virtuais são os mesmos, mas não tem sido incomum a utilização das discussões de rede para direcionar os debates internos, a tomada de decisão dos organismos de direção e até mesmo definir o que é uma polêmica ou não no partido.
A concentração nas redes impulsiona a violação de direitos militantes e o fortalecimento das opressões no seio do partido.
Com o comportamento já descrito, começam também nas redes, naturalmente, os debates e questionamentos acerca do respeito aos camaradas e suas opiniões. Camaradas, o desrespeito começa quando um militante faz o esforço para sistematizar suas posições, produz uma tese, defende em tribuna e os demais vão para uma rede social aleatória comentar. Sendo franca, esse comportamento nada mais é que a eleição, por uma minoria que se impõe como hegemônica, de qual militante merece uma resposta adequada (no formato tribuna) e qual merece o rebaixamento nas redes, um tuíte de deboche ou até mesmo um mero fio – curioso que alguém consiga escrever um fio, mas não colocar em um documento e enviar para a tribuna de debates.
Me assusta ainda mais que quem hoje incentiva isso, antes, no velho PCB, criticava tão intensamente a mesma prática liberal e sobretudo como as direções utilizavam dessa para se esquivar do dever de escrever para a tribuna. Não sentiram a ausência dos membros do CNP ou do CR nas tribunas, ainda que sempre tenham opiniões para dar em seus perfis na internet? É inadmissível que nossa direção política e ideológica seja agente que alimenta essa lógica que só expõe pessoas, causa vexame e desestimula ir a público, sobretudo, quem sofre com o cerceamento constante da segurança para formular e escrever como mulheres, lgbts, negros/as.
Pessoas que sofrem com opressão de raça, classe, gênero, são constantemente submetidas na militância a espaços que podam nossa vontade de falar, que calam nossa voz e quando ousamos dizer algo, sofremos com o contingente de homens cis, brancos e de classe média ignorando o que falamos, se apropriando do que produzimos e recebendo crédito no nosso lugar (já que ninguém nos ouve), ou com a constante insegurança de que todos eles tem condições de se formar e nós temos trabalho, estudo, casa, as vezes filhos e idosos pra dar conta.
Para mim, a gota d'água foi quando recentemente uma militante se desligou com a publicação de uma carta que expõe diversos episódios de violência de gênero sofridos em nossa organização e o nosso secretário nacional de organização se pôs individualmente numa cruzada virtual de comentar a carta no seu perfil, responder todos os comentários sobre e utilizando em suas respostas de profundo desrespeito. Tal atitude além de abrir espaço para diversas consequências políticas (e a depender inclusive legais/jurídicas) que terão que ser arcadas não por esse militante, mas coletivamente, também ensina aos nossos camaradas que, ao receber uma denúncia ou ser acusado, podemos agir de forma espontaneísta, descentralizada e sobretudo individualista.
Vejam, camaradas, essa ex-militante pode ter mentido até sobre o seu nome e absolutamente nada que ela disse ser verdade, no entanto, situações como essa, de exposição de uma série de denúncias de violência, não podem ser respondidas dessa forma. Esse é o exemplo de um tópico que exige resposta organizada, emitida não por um indivíduo, mas pelo organismo responsável pela apuração, endereçada a base da organização (e se necessário publicado), com a exposição de material robusto sobre a apuração do ocorrido. Não ocorreu em nenhum momento ao camarada que sua necessidade de se impor sobre aquela mulher, ainda que ela esteja profundamente errada, deseduca a militância? abre precedente para que, ao ser acusado de violencia, outros homens cis e brancos também cheguem a público dizendo "falar, até papagaio fala"?
Não à toa os debates em nossa tribuna, em sua maioria, não têm pautado o que é central para um congresso que vai estruturar um novo partido. Contam-se nos dedos as tribunas que debatem organização, agitação e propaganda, finanças, estatuto, vida interna, programa, estratégia e tática. Ao passo que por todo país se implementam medidas novas, que constituem um novo modelo político-organizativo para nosso partido sem se debater de forma qualificada.
Precisamos de um retorno do Comitê Nacional sobre como se pretende sistematizar a discussão das tribunas. Chega a beirar o ridículo que um militante comunista se veja obrigado a depender de rede social para acompanhar os debates da sua organização, para ser ouvido, mesmo com uma tribuna disponível. Trata-se de um vício medonho que, ao invés de transmitir uma imagem de um partido democrático, no máximo expressa um partido elitizado, baseado no amiguismo e na vontade de pequenos círculos, onde existem temas e pessoas que merecem a resposta/divergência organizada e temas e pessoas que não.
Se antes, no velho PCB, o debate não fluía nos espaços e fóruns fechados/internos, deixando o protagonismo para rádio corredor e excluindo militantes dos debates e da tomada de decisões, agora vejo a exclusão ocorrer nas redes contra quem se esforça para escrever e contribuir para nosso congresso e contra aqueles que dependem dos mecanismos partidários de debate e circulação de informação, o que conta, tal qual no velho PCB, com a ajuda dos dirigentes e até de quem nem constrói a organização.
A organização da polêmica: não é possível reivindicar Lenin aos pedaços.
Outro debate, que inclusive os leninistas mais fervorosos de nossa organização têm omitido ou ignorado, é que a polêmica leninista é organizada! Nesse tópico, peço perdão pelo prolongamento em citações, no entanto é necessário ler o que o próprio Lenin pontuou como desvio dentro da tão polêmica liberdade individual de produção intelectual.
A literatura deve tornar-se partidária. Em oposição aos costumes burgueses, em oposição a imprensa empresarial e mercantil burguesa, em oposição ao carreirismo e ao individualismo literários burgueses, ao "anarquismo aristocrático" e à corrida pelo lucro, o proletariado socialista deve erguer o principio da literatura partidária, desenvolver este princípio e aplicá-lo da forma mais completa e integral possível.
Em que consiste este princípio da literatura partidária? Não é só no fato de, para o proletariado socialista, a atividade literária não poder ser um instrumento de lucro de pessoas ou grupos; ela não pode ser de modo nenhum uma atividade individual, independente da causa proletária geral. Abaixo os literatos apartidários! Abaixo os literatos super-homens! A atividade literária deve tornar-se parte da causa proletária geral, a "roda e a engrenagem" de um só grande mecanismo social democrata posto em movimento por toda a vanguarda consciente de toda a classe operária. A literatura deve tornar-se parte integrante do trabalho organizado, planejado e unido do Partido Social-Democrata (LÊNIN, 1905).
Nesse escrito, "organização partidária e literatura partidária", Lenin debate a necessária reorganização do trabalho ideológico do partido diante das novas condições de luta, em que o trabalho ideológico partidário não necessita mais estar 100% na ilegalidade, pelo contrário, é hora de tornar a imprensa partidária em imprensa "legal". Para tal, Lenin caracteriza precisamente a incompatibilidade de classe entre os veículos legais e ilegais na Rússia feudal e defende que tal incompatibilidade seja superada por meio da reorganização do aparelho de imprensa do partido e sua profunda vinculação aos organismos partidários, assim como dos próprios escritores.
Lenin é objetivo ao taxar que o princípio da literatura partidária consiste em não encarar o trabalho intelectual militante como individual, pessoal e apartado do partido e de seus objetivos políticos-ideológicos, precisando, sim, ser regulamentado, organizado e estruturado a partir do partido.
[...] Talvez se encontrem mesmo intelectuais histéricos que ergam brados a propósito desta comparação [trecho anterior que diz: a atividade literária deve tornar-se parte da causa proletária geral, a "roda e a engrenagem"], que rebaixa, paralisa, "burocratiza" a livre luta ideológica, a liberdade de crítica, a liberdade da criação literária etc., etc. No fundo, semelhantes brados seriam apenas uma expressão de individualismo intelectual burguês. Não se discute que a atividade literária é a que menos se submete à igualização e nivelamento mecânicos, à dominação da maioria sobre a minoria. Não se discute que nesta atividade é absolutamente necessário assegurar maior amplitude à iniciativa pessoal, às inclinações individuais, permitir amplitude ao pensamento e à fantasia, à forma e ao conteúdo. Tudo isto de modo nenhum refuta a tese, alheia e estranha para a burguesia e para a democracia burguesa, de que a atividade literária deve necessária e obrigatoriamente tornar-se uma parte, indissoluvelmente ligada às outras partes, do trabalho partidário social-democrata (LÊNIN, 1905).
Sempre que apontamos o quão danosa é a prática de impor suas opiniões e formulações de modo desorganizado — e em nossa realidade, por meios estranhos ao partido, controlados por algoritmos e pela financeirização das redes burguesas — é comum que os mesmos questionamentos acima sejam feitos por quem tanto quer proteger não sua liberdade intelectual e de crítica, mas seu individualismo pequeno-burguês. Como apontou Lenin, não é sobre negar que o trabalho e a produção ideológica no seio do partido gozem de liberdade, mas que a liberdade dentro de um partido proletário não ocorre nos termos burgueses, em que a individualidade se sobrepõe ao coletivo. O seu "direito" de utilizar quase que exclusivamente suas redes pessoais para debater o partido, a luta proletária e tudo aquilo que é pertinente ao coletivo, nada mais é que tirar o direito do conjunto do partido, dos seus camaradas, de participar desse debate, de divergir, de convergir e inclusive de disciplinar suas posições quando necessário.
[...] Estamos longe de pensar em defender qualquer sistema uniforme ou a resolução da tarefa com alguns decretos. Não, neste domínio é menos possível do que em qualquer outro falar de esquematismo. [...] Queremos criar e criaremos uma imprensa livre não apenas no sentido policial, mas também no sentido da liberdade em relação ao capital, da liberdade em relação ao carreirismo; mais ainda: também no sentido da liberdade em relação ao individualismo burguês-anarquista (LÊNIN, 1905).
Esse tópico em específico é caro a nós partidários da Reconstrução Revolucionária do Partido Comunista. Primeiro, é preciso pontuar a impossibilidade de criar uma imprensa livre do domínio burguês se elegemos as suas redes sociais como plataforma prioritária para veiculação de nossas ideias. Aqui, cabe pontuar, não se trata de uma defesa de que devemos abandonar as redes, mas de que por ser território regulamentado integralmente pelo inimigo torna-se necessário um planejamento ainda mais estruturado para que o partido atinja os objetivos devidos a esse espaço. Quanto mais difusa, autonomista e individualizada for nossa utilização desse espaço para promover e realizar o trabalho e a disputa ideológicos do partido, menos chegaremos aos que nos interessam e mais nos perdemos entre os códigos, valores e princípios da burguesia, sendo dirigidos por interesses estranhos aos da classe. Segundo, por muito tempo vivemos sob as castas ideológicas do velho partido, o aparelho ideológico do PCB era propriedade de alguns que faziam deste seu espaço pessoal de autopromoção, apartado da classe, em que se fortalecia a ideia do carreirismo intelectual tão valorizado naquelas fileiras. A contradição entre quem é feito para escrever e quem é feito apenas para ler era gritante em nosso meio, de tal forma que era mais fácil um estranho ao partido publicar em sua imprensa que um militante orgânico. Acredito que não seja de nosso interesse seguir reforçando essa dicotomia elitista, mas forjar um organismo ideológico em que todos estão aptos a escrever e ler, opinar, criticar e ser criticado, sob a organização e regulamentação não de terceiros ou de uns poucos dirigentes, mas do coletivo partidário.
[...] Como! gritará talvez um intelectual, ardente partidário da liberdade. Como! Você quer subordinar à coletividade uma coisa tão sutil e individual como a criação literária! Você quer que os operários resolvam por maioria de votos as questões da ciência, da filosofia, da estética! Você nega a liberdade absoluta da criação ideológica individual! Calma, senhores! Em primeiro lugar trata-se da literatura partidária e da sua subordinação ao controle partidário. [...] Em segundo lugar, senhores individualistas burgueses, devemos dizer que os seus discursos sobre a liberdade absoluta não passam de hipocrisia. Numa sociedade baseada no poder do dinheiro, numa sociedade em que as massas dos operários vivem na miséria e em que um punhado de ricos vive como parasitas não pode haver "liberdade" real e efetiva. [...] Esta liberdade absoluta é uma frase burguesa ou anarquista (porque, como concepção de mundo, o anarquismo é burguesismo virado do avesso). [...] E nós, socialistas, desmascaramos esta hipocrisia, derrubamos as falsas indicações, não para obter uma literatura e uma arte não-classista (isto só será possível na sociedade socialista sem classes), mas para contrapor a uma literatura hipocritamente livre, mas de fato ligada à burguesia, uma literatura realmente livre, abertamente ligada ao proletariado. [...] Será uma literatura livre porque não será o interesse pessoal e uma carreira, mas a ideia do socialismo e a simpatia pelos operários que recrutaram novas e novas forças para as suas fileiras (LÊNIN, 1905).
Por fim, a questão da liberdade intelectual em nosso partido só será resolvida na medida em que nossos esforços não se concentrem em mitigar repercussões ou engajar nas redes sociais e demais plataformas individuais, onde prevalece não a autonomia, mas o autonomismo. Pelo contrário, a liberdade teórica, formulativa e de crítica ainda prevê subordinação ao partido e a coletividade proletária, pois também a liberdade de associação partidária deve ser completa, como disse Lenin. Somente assim poderemos construir uma imprensa partidária forte, independente e profundamente vinculada com nossos objetivos táticos e estratégicos e, no limite, profundamente vinculada ao proletariado.
Por fim, convido todos à reflexão e ao debate acerca dos métodos que estamos construindo para a disputa ideológica em nossa organização. É imperativo que no pouco tempo que antecede nossas etapas regionais e a etapa nacional do nosso congresso, possamos realizar o necessário giro do debate para organização, o pilar que estrutura todo o partido comunista.
Saudações!
Referência: Lênin, Vladímir Ilitch. Organização partidária e literatura partidária. In: Landi, Gabriel; Lazzari, Gabriel (org). O centralismo democrático de Lênin. São Paulo: LavraPalavra, 2021. p. 211-216.