Nota Política: O primeiro turno das eleições de 2024, a derrota da frente ampla e os rumos das lutas da classe trabalhadora

Nessa campanha e nas próximas lutas que enfrentará a classe trabalhadora, nossa postura seguirá apontando para nossos objetivos estratégicos: o desenvolvimento de uma Frente Anticapitalista e Anti-Imperialista que possa desenvolver um forte movimento no seio da classe trabalhadora.

Nota Política: O primeiro turno das eleições de 2024, a derrota da frente ampla e os rumos das lutas da classe trabalhadora

9 de outubro de 2024

O primeiro turno das eleições municipais de 2024 demonstrou a falência da tática majoritária da “esquerda” brasileira, a tática da Frente Ampla, e o sucesso da tática burguesa de enfrentamento e apresentação de sua alternativa “de força”, a extrema-direita. Em todo o Brasil, pudemos ver o abandono de pautas históricas da classe trabalhadora em partidos considerados de esquerda, como PT, PCdoB e PSOL, e o avanço da agenda da burguesia. Em nome do enfrentamento abstrato ao bolsonarismo e à extrema-direita,  as políticas de austeridade fiscal, de militarização da máquina pública municipal, de privatização dos serviços públicos e a precarização do trabalho foram normalizadas.

Aquilo a que chamamos da tática da Frente Ampla tem dois momentos distintos: foi usada pelo PT como forma de buscar aglutinar setores da burguesia para um projeto chamado “Democrático-Popular”, ainda no primeiro governo Lula, como forma de conciliar os interesses de trabalhadores e patrões para uma gestão “humanizada” do capitalismo brasileiro. A falência absoluta dessa tática veio com o golpe de 2016, em que os setores da burguesia que se colocavam nessa Frente se utilizaram do apoio popular arregimentado para tomar as rédeas do governo com Michel Temer e apresentar os novos ditames de aprofundamento das medidas neoliberais. Essa mesma visão foi “repaginada” como uma Frente entre burgueses e trabalhadores contra o avanço da extrema-direita a partir de 2018 – uma nova máscara para o mesmo projeto, que buscava defender a “democracia” (burguesa) do “autoritarismo” representado pelos setores fascistas. Essas várias formas de apresentação escondem do olhar menos atento o seu cerne de classe: toda forma de atuação da esquerda que tenha como objetivo a gestão do capitalismo brasileiro – e não a sua superação com uma revolução socialista – levam ao enfraquecimento da classe trabalhadora e a mais ilusões em um mítico “setor democrático da burguesia”, que teria algum interesse nacional em comum com os trabalhadores.

Já com quase dois anos do governo burguês de Lula e Alckmin, fica cada vez mais difícil aos olhos da população trabalhadora ver uma diferença entre as gestões “de esquerda” e “de direita”. O governo “progressista” de Lula deu continuidade à Ponte para o Futuro de Michel Temer, com a manutenção das privatizações das gestões anteriores, o aprofundamento do Programa de Parcerias e Investimentos, que facilita a privatização de serviços públicos, e a implementação de um Novo Teto de Gastos que visa retirar os investimentos mínimos em Saúde e Educação.A tática da Frente Ampla atua justamente para diluir essa diferenciação e é defendida pelos setores que hoje compõem o governo federal. Para os defensores de tal tática, a derrota do bolsonarismo, como expressão da extrema-direita em nosso país, será feita a partir do deslocamento de setores da burguesia nacional para uma aliança “democrática” com a classe trabalhadora. Todo apoio que possa haver entre trabalhadores e patrões é o mesmo apoio que a corda dá ao pescoço do enforcado, uma enganação em todos os termos do acordo.

Isso, longe de ser uma bravata, é verificável pelas últimas grandes mobilizações de setores da classe trabalhadora que se chocaram contra os interesses do governo: técnicos e docentes de universidades federais, apoiados pelos estudantes, foram tratados com desdém e ignorados em sua greve nacional; os funcionários do INSS estão agora sob ameaça de corte de ponto justamente por sua combatividade e irredutibilidade no movimento grevista de mais de dois meses; a campanha nacional dos bancários amargou uma derrota com reajustes de menos de 1% de ganho real sob pressão inclusive dos bancos públicos; a greve dos servidores ambientais do Ibama e ICMBio teve mais de seis meses de paralisação da categoria, em um cenário de ampla necessidade de apoio à proteção ambiental. O que conecta todos esses resultados é a completa intransigência do governo federal em negociar condições de trabalho dignas para essas categorias e a ação das forças aliadas ao governo, como a CUT e a CTB, para desmontar os movimentos o quanto antes, servindo como verdadeiro freio das lutas dos trabalhadores em prol das alianças com a burguesia.

O resultado desse “banho de água fria” na classe trabalhadora é a perda de seus vínculos ideológicos e eleitorais com a própria esquerda. Depois de quase dois anos de governo, os setores mais atrasados dos trabalhadores, não enxergando qualquer mudança positiva e já começando a sentir o peso das mudanças negativas (como o Novo Teto de Gastos do ministro Fernando Haddad), depositam suas confianças nos velhos gestores da ordem e nos aventureiros da extrema-direita, ambos atores destacados da oposição pela direita ao atual governo. Em números, o crescimento de votos mais expressivo dessas eleições foi exatamente do Partido Liberal (PL) de Bolsonaro, saltando de 4,7 milhões de votos para prefeito em 2020 para assombrosos 15,7 milhões, lhes fazendo aumentar para 512 prefeituras. Dentre os partidos da base governista, o PT ficou com apenas o 7º lugar em prefeituras (com seu 2º pior desempenho nos últimos 20 anos), sendo os demais, em ordem decrescente, PSD, MDB, PP, União Brasil, Republicanos e PSB. O PSOL perdeu as cinco prefeituras que conquistou nas últimas eleições e a tendência é que não ganhe mais nenhuma.

O crescimento dos partidos do chamado “centrão”, como PSD, MDB, PP e União Brasil, demonstram como a política de gestão do capitalismo orquestrada pela Frente Ampla também fortalece as máquinas eleitorais dos partidos fisiológicos e da direita. O rebaixamento cada vez mais acentuado dos interesses populares frente a uma análise estática da correlação de forças desfavorável no Congresso Nacional, fortalece figuras como Arthur Lira, Gilberto Kassab e Valdemar da Costa Neto. Sem o debate público da grande política, sem a organização e mobilização da classe trabalhadora, a pequena política de bastidores ganha espaço e é fortalecida pelo aumento escandaloso das emendas parlamentares. Como resultado, as eleições de 2024 apresentaram a maior taxa de recondução da história, com 81,4% dos prefeitos reeleitos ou seus indicados, muito acima dos 63,7% de 2008, segunda mais alta.

A lição a ser aprendida é óbvia: qualquer amoldamento ao programa burguês enfraqueceu ou manteve estagnados os setores que pretendem representar a classe trabalhadora e fortaleceu a burguesia.

É preciso esclarecer a fraqueza da esquerda revolucionária também nesse cenário eleitoral. O PCBR apoiou candidatos à prefeitura vinculados à “ala esquerda” do PSOL, ao PSTU, à UP e ao PCB. Esse apoio, programaticamente direcionado por nossa Plataforma Municipal, buscou com que as bases da esquerda revolucionária não se deixassem levar pelo canto da sereia do voto útil no primeiro turno, o que seria um reforço à lógica de abandonar completamente as bandeiras proletárias nos períodos eleitorais, lógica com a qual não compactuamos e que, em nossa análise, vai exatamente no sentido da Frente Ampla.

Em um cenário aterrador como esse, a única esperança é conseguirmos fazer da força dos trabalhadores um contrapeso à tendência geral observada nessas eleições. Também esse fato pode ser demonstrado por alguns dos movimentos já mencionados: a greve do Ibama conquistou mais de 20% de reajuste por conseguir emparedar o governo, e a última proposta para a greve dos servidores do INSS (Instituto Nacional do Seguro Social) foi de 18%, muito acima da média nacional. Enquanto esse movimento fica praticamente restrito às esferas do funcionalismo, no setor privado a situação é completamente diferente, como comprova a média nacional de 1,55% acima do INPC (Índice Nacional de Preços ao Consumidor). A fraqueza dos trabalhadores na luta econômica também se apresenta na sua fraqueza nas lutas políticas.

No segundo turno, que ocorrerá no dia 27 de outubro, as tendências se mantêm: na sua imensa maioria, teremos embates entre candidatos totalmente comprometidos com a agenda burguesa e com os ataques à classe trabalhadora, variando apenas em qual grupo empresarial se apossará mais do fundo público e com qual velocidade serão os ataques aos trabalhadores. Por isso, na imensa maioria do país, o PCBR defenderá e fará campanhas para o voto nulo nessas eleições: é a nossa contribuição, através do contato com a classe trabalhadora, para aumentar a desconfiança da classe trabalhadora no jogo eleitoral burguês e nos representantes da classe dominante. Em algumas poucas localidades, mesmo considerando a postura de oposição a qualquer que seja o candidato vencedor, defenderemos junto à classe trabalhadora que há diferenças importantes o suficiente entre os candidatos para considerarmos que um dos candidatos fará ataques mais fortes, mais rápidos e mais coesos à classe trabalhadora e impedirá com mais violência e mais repressão às tentativas de organização independente dos trabalhadores. Não temos, contudo, qualquer ilusão no programa representado por essas candidaturas – programas que se comprometem com a manutenção da privatização da saúde e da educação via OSs (Organizações Sociais) e com as medidas de austeridade fiscal que estrangulam o orçamento público voltado para os trabalhadores, por exemplo – e com seu apoio ao atual governo federal.

Nessa campanha, que vai até o segundo turno, e nas próximas lutas que enfrentará a classe trabalhadora em seu combate histórico, nossa postura seguirá apontando para nossos objetivos estratégicos: o desenvolvimento de uma Frente Anticapitalista e Anti-Imperialista que possa desenvolver um forte movimento no seio da classe trabalhadora. Não são as eleições burguesas o palco mais favorável para a exposição das posições proletárias e buscamos ocupá-las no sentido da agitação de nosso Programa, tendo a certeza de que apenas os ascensos da classe trabalhadora consciente, poderão nos fazer superar esse momento de derrotas e partir para uma contraofensiva. Esse é o caminho que, em uma crise dos poderes da democracia burguesa, poderá se constituir o Poder Popular e romper com o Estado burguês em uma Revolução Socialista. É para isso que nós trabalhamos e convidamos todos os trabalhadores com consciência de classe a se somarem nessa luta conosco!

Conselho Editorial do Órgão Central
Comitê Central do PCBR