Mortes por intervenção policial são 2ª maior causa de mortes violentas de crianças e adolescentes no Brasil
Segundo estudo da UNICEF com o Fórum Brasileiro de Segurança Pública, das 15.101 vítimas durante o período analisado, 90% são meninos e 82,9% são negros, e a maioria das crianças e adolescentes de 10 a 19 anos.
Por Redação
Segundo relatório recente, produzido pelo UNICEF em parceria com o Fórum Brasileiro de Segurança Pública, entre 2021 e 2023, as mortes em decorrência de intervenção policial (MDIP) foram a segunda maior causa de mortes violentas intencionais (MVI) entre crianças e adolescentes, de 10 a 19 anos, no país. O relatório também aponta raça e gênero como principais marcadores sociais para a violência. Do total de vítimas dessas MVI, 16% foram assassinadas em decorrência de ação das forças policiais do Estado burguês, e das 15.101 vítimas de MVI durante o período analisado, 90% são meninos e 82,9% são negros.
A faixa etária mais afetada por essas MVI se concentra entre os anos finais da adolescência, considerada entre 15 e 19 anos, com 13.829 vítimas, ou seja, 91,6% do total de casos registrados. Em comparação, a taxa de letalidade provocada pelas polícias contra maiores de 19 anos é apontada como de 2,8 mortes por 100 mil, enquanto entre a faixa etária de 15 a 19 anos o mesmo índice cresce 113,9%, apresentando uma taxa de 6,0 mortes provocadas pelas forças policiais por 100 mil habitantes.
Os índices de letalidade e violência racista por policiais são desproporcionais contra adolescentes negros do sexo masculino em relação às demais parcelas da população. Em números relativos, risco de um adolescente negro, do sexo masculino, de até 19 anos, ser assassinado é 4,4 vezes superior que um adolescente branco da mesma idade, e 21 vezes superior ao risco de uma adolescente branca. Esses dados se somam ao crescimento de 188,9% no número de mortes por intervenção policial na última década, com 83% das vítimas sendo pessoas negras.
A divulgação desses dados explicita um cenário contínuo de repressão e violência policial por todo o país, e este foi o principal tópico debatido durante a Marcha das Periferias – evento realizado anualmente no mês do novembro negro –, onde o tema foi “Periferia Livre: Políticas Para a Vida e Não Para a Morte”. A população brasileira se mobilizou em diversas localidades para denunciar e protestar contra as práticas criminosas cometidas por agentes policiais, além de reivindicar uma segurança pública popular.
Também vem sendo noticiados nas últimas semanas, diversos casos de violência policial flagrados por câmeras, e parcela da esquerda e direita liberal descreve esses casos como “exageros” e “exceções” impulsionados pela linha política de governadores de extrema-direita, a exemplo da atuação da polícia paulista, coordenada por Tarcisio de Freitas. No entanto, o uso abusivo da força promovido por policiais não é um problema recente, e estes crimes expressam a violência como um instrumento de repressão burguesa, sendo uma tática de dominação sobre um grupo bem específico da população trabalhadora no país.
Apesar da politização reacionária das forças policiais contribuir para parte desse aumento, não é o suficiente para comprovar o porquê da violência policial ser um ato constante na história brasileira, e não apenas um fenômeno recente ou isolado a poucas gestões estaduais reacionárias. Além disso, o argumento de que este problema vem do despreparo dos agentes policiais seria desconsiderar o nítido padrão de tratamento quando envolve pessoas pretas e periféricas, que difere completamente do tratamento direcionado à pessoas brancas, em todas as regiões do país.
Essa questão é originada desde a falta de políticas nacionais verdadeiramente pensadas para a segurança das amplas massas trabalhadoras, até uma herança cultural escravocrata de dominação e manutenção da ordem burguesa. A simples implementação de câmeras nos uniformes ou a própria profusão de registros em vídeo de abusos por policiais não resolverão este problema, ainda que ajudem a mitigar ou, ao menos, trazer visibilidade para a violência policial.
As tentativas de explicação propagadas pelo progressismo liberal são superficiais e fogem do debate sobre o enfrentamento aos mecanismos de repressão da classe trabalhadora pelo Estado burguês, e por isso, acabam por banalizar as raízes do problema. Soluções reformistas não serão suficientes para enfrentar um problema que é antigo e constante na nossa sociedade, e a violência policial só será combatida efetivamente através de mudanças estruturais, portanto, é fundamental a luta pela desmilitarização e desfinanciamento das polícias, além do enfrentamento à políticas de encarceramento e criminalização que contribuem para a marginalização de jovens negros periféricos e colocam em risco milhares de vidas inocentes.