Governo emite decreto sobre regulamentação do uso da força policial no Brasil

O conjunto de medidas editadas pelo Governo Federal nos temas da segurança pública busca dar um verniz de “racionalidade técnica” à mesma lógica racista de encarceramento e assassinato da juventude negra que sempre imperou no Brasil.

Governo emite decreto sobre regulamentação do uso da força policial no Brasil
Reprodução/Foto: Tânia Rêgo/Agência Brasil - Rio de Janeiro (RJ), 17/08/2023 - O movimento de familiares de vítimas de violência policial do Rio faz ato em frente ao Palácio Guanabara

Por Redação

Em meio à repercussão de diversos casos de violência policial nos últimos meses, o Governo Lula-Alckmin editou, através do Ministério da Justiça e Segurança Pública, o Decreto nº 12.341, de 22 de dezembro de 2024, que estabelece diretrizes para disciplinar o uso de instrumentos de menor potencial ofensivo pelos agentes de segurança pública. O objetivo é regulamentar a aplicação da Lei nº 13.060/2014, aprovada há dez anos, que estabeleceu princípios para o uso da força repressiva pelos agentes, tais como legalidade, necessidade, razoabilidade e proporcionalidade.

O decreto acrescenta aos princípios a precaução, responsabilização e não discriminação, estabelecendo que “a força deve ser empregada com bom senso, prudência e equilíbrio”, apenas nos casos em que recursos de menor intensidade não forem suficientes para atingir os objetivos legais. Ainda, reforça a ilegalidade do uso de armas de fogo contra pessoas desarmadas e veículos em fuga, criando um Comitê de Monitoramento, adicionando a necessidade de planejamento e de fomento de pesquisas sobre avaliação de impacto das ações, e condicionando repasses de verbas aos Estados à adequação ao disposto no decreto e na Lei de 2014.

Conforme a Portaria Interministerial nº 4.226/2010, as armas e equipamentos de menor potencial ofensivo são aquelas “projetadas e/ou empregadas, especificamente, com a finalidade de conter, debilitar ou incapacitar temporariamente pessoas, preservando vidas e minimizando danos à sua integridade”. Embora balas de borracha, sprays de pimenta, bombas de efeito moral, armas de eletrochoque e de concussão sejam largamente utilizadas pelas polícias, as diretrizes de uso “proporcional e progressivo da força” não impediram um aumento dramático da violência policial nos últimos dez anos, direcionada predominantemente a homens e meninos negros.

Pelo contrário, o deslocamento do eixo do debate para o reforço da lógica da “guerra às drogas”, somado a medidas recentes de flexibilização da política de desarmamento – que contribui para a manutenção da ampla circulação de armas de fogo entre a extrema-direita, as milícias e organizações do tráfico de drogas –, caminha para aumentar a ostensividade do policiamento nas periferias, assim como as mortes de policiais e por policiais. O conjunto de medidas editadas pelo Governo Federal nos temas da segurança pública busca dar um verniz de “racionalidade técnica” à mesma lógica racista de encarceramento e assassinato da juventude negra que sempre imperou no Brasil. Isto é, não oferece mecanismos concretos de transformação do projeto burguês de segurança pública vigente, limitando os avanços nesse sentido à edição de normas legislativas, regras e diretrizes técnicas, como no caso da ADPF das Favelas, que são sucessivamente transgredidas.

A “modernização das práticas de segurança pública” não passa de populismo penal, tendo pouco efeito prático na preservação da vida e na redução da criminalidade e da violência. A produção de chacinas enquanto método de controle social dos trabalhadores mais pobres nas favelas e periferias é mecanismo essencial para a garantia de altas taxas de lucratividade da burguesia, especialmente às custas da exploração da mesma camada que é alvo da letalidade policial.

Por essa razão, combater o projeto racista da burguesia só será possível através da luta de massas da classe trabalhadora pautando enfrentamento aos mecanismos de repressão do Estado. Passa, ao contrário do caminho social-liberal trilhado pelo Governo Lula-Alckmin, por amplificar lutas pelo fim das polícias militares e pelo desfinanciamento das polícias no geral, com o fim da lógica de “guerra às drogas”, mas também pautando o enfrentamento ao poder político e econômico que fortalece políticas de encarceramento, de criminalização da pobreza e de violência racista nas favelas e periferias.