Governador se compromete a revogar a Lei 10.820/2024, mas resiste em exonerar Rossieli

Após 24 dias de ocupação na SEDUC - PA, lideranças comemoram avanço: governo promete revogar a Lei 10.820 e restaurar direitos, mas a saída de Rossieli da secretaria de Educação segue como demanda central.

Governador se compromete a revogar a Lei 10.820/2024, mas resiste em exonerar Rossieli
Foto/reprodução: Instagram @escolaborari

Por Redação

O compromisso firmado nesta quarta-feira (05) prevê que o Poder Executivo encaminhe à Assembleia Legislativa do Pará (ALEPA) um novo projeto de lei para revogar a Lei 10.820/2024 e restaurar os direitos anteriormente suprimidos.  Essa minuta foi elaborada pela Secretaria de Planejamento e Administração do Estado (SEPLAD) e foi assinada pelas lideranças presentes na ocupação da SEDUC e Greve da educação. Estima-se que projeto na ALEPA deverá ser votado em até dez dias.

O acordo estabelece que os manifestantes desocupem o prédio da SEDUC e enviem representantes para um Grupo de Trabalho (GT) responsável por elaborar um novo estatuto para a educação indígena. No entanto, as lideranças indígenas afirmam que não deixarão a sede da SEDUC até que a revogação da Lei 10.820/2024 seja publicada no Diário Oficial. Além disso, mantêm a exigência pela saída do secretário de Educação, Rossieli Soares.

O Termo de Compromisso foi elaborado na manhã desta quarta-feira (05) por uma comissão composta por cinco indígenas, um quilombola, a vice-governadora e secretária de Planejamento e Gestão (SEPLAD), Hana Ghassan Tuma, o presidente da Assembleia Legislativa do Pará (ALEPA), Chicão (MDB), cinco parlamentares e seis representantes do Sintepp (Sindicato das Trabalhadoras e dos Trabalhadores em Educação Pública do Pará). Isso reflete também uma certa concessão de pautas para entrar em acordo com a postura errada do governo: de ser irredutível com a exoneração de Rossieli.

Até terça-feira (04), Helder Barbalho (MDB) adotava uma postura inflexível diante dos protestos, chegando a disseminar notícias falsas sobre as manifestações, incluindo acusações de "vandalismo" contra os indígenas. No entanto, uma decisão judicial garantiu o direito à manifestação pacífica e criticou a tentativa de criminalização dos povos originários.

A mobilização agora se volta para a ALEPA, que terá a responsabilidade de criar uma nova legislação que atenda às demandas por uma educação escolar indígena específica e garanta os direitos dos trabalhadores da educação. A luta dos povos indígenas do Pará segue com apoio e vigilância, enquanto aguardam os próximos passos do governo.

É fundamental continuar exigindo a exoneração de Rossieli Soares, um representante dos grandes interesses dos 'tubarões da educação', que lucram ao transformar o ensino presencial em EAD. Sua trajetória é marcada por uma série de desmontes na educação pública, sempre priorizando o interesse privado em detrimento do público.

Indígenas, quilombolas e professores ocupam a Secretaria de Educação do Pará (SEDUC-PA) desde 14 de janeiro, em protesto contra a Lei 10.820/2024 que substituia o ensino presencial pelo remoto, medida vista como um retrocesso aos direitos dos povos tradicionais. A greve dos docentes, iniciada em 23 de janeiro, ampliou a pressão sobre o governo estadual. E desde o início uma das prioridades do movimento era a exoneração do secretário de Educação, Rossieli Soares. 

A Lei nº 10.820/2024 que tinha sido sancionada pelo governador Helder Barbalho, extingui o Sistema Modular de Ensino (SOME) e o Sistema Modular de Ensino Indígena (SOMEI). Sistemas essenciais para garantir educação presencial de qualidade em todas as comunidades do campo, das águas e das florestas.

Por que Rossieli Soares é considerado uma ameaça à educação pública?

Rossieli Soares foi nomeado secretário de Educação do Estado de São Paulo em 2019, durante o governo de João Doria, e saiu em 2021. Antes de assumir essa Secretaria, já tinha sido secretário da Educação no estado do Amazonas entre 2012 a 2016, também foi Ministro da educação  por um breve período em 2018, durante o governo de Michel Temer.

Sua gestão no Amazonas foi duramente criticada por não resolver problemas de infraestrutura em escolas de comunidades rurais e indígenas, com falta de transporte escolar e condições adequadas de ensino. Também não atendeu as demandas dos professores. O Sinteam (Sindicato dos Trabalhadores em Educação do Amazonas), denunciou salários baixos e más condições de trabalho, especialmente nas áreas rurais.

Vale lembrar que a educação rural no Amazonas é tecnológica desde 2007 com a criação do Centro de Mídias de Educação do Amazonas (CEMEAM) que utilizava tecnologia de satélite para transmitir aulas ao vivo para escolas em áreas remotas. Professores em estúdios em Manaus ministravam as aulas, que eram assistidas por alunos em salas de aula equipadas com antenas parabólicas e televisores. Esse modelo de ensino não leva em conta as particularidades dos alunos e suas vivências nas comunidades, ignorando o período cíclico, as etapas de trabalho na agricultura, a coleta de alimentos, a cultura local e, no caso dos povos indígenas, a língua materna de cada etnia. Em vez de adaptar-se à realidade do campo, impõe-se uma educação totalmente urbana, sem a presença de professores em sala de aula.

Rossieli, foi responsável por aprofundar esse modelo de ensino, criou o Sistema PADEAM (Programa de Apoio ao Desenvolvimento Educacional do Amazonas) que pretendia modernizar a educação por meio das tecnologias digitais. Mas a realidade foi uma educação com a falta de infraestrutura adequada e grande dificuldade em garantir a manutenção dos equipamentos distribuídos. A educação do Amazonas para o Ensino Médio e EJA segue esse modelo até os dias atuais.

O modelo de educação que vem sendo aplicado no Amazonas há anos serve como referência para o que se pretende implantar no Pará. E Rossieli Soares, com sua trajetória, é um especialista em promover esse tipo de precarização.

No contexto de sua gestão como secretário de Educação em São Paulo, em 2020, foi responsável por retirar de circulação um livro didático que abordava temas considerados "sensíveis" pelo agronegócio, como o uso de agrotóxicos e os impactos ambientais da produção rural. Rossieli alegou que o material continha "erros conceituais" e "preconceitos". Essa medida contraria aspectos científicos sobre o tema e ainda mostra como Rossieli foi capaz de censurar livros didáticos apara atender o Lobby do agronegócio.

Essa ação esteve alinhada aos interesses do agronegócio, que tem pressionado por mudanças nos materiais didáticos para evitar críticas ao setor.

Rossieli foi acusado em 2019 pelo Ministério Público Federal (MPF) de usar R$ 12,7 milhões em recursos do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica (FUNDEB) injustamente. O caso envolveu a contratação direta, sem licitação, de Associações de Pais, Mestres e Comunitários (APMCs) para prestar serviços de transporte escolar em sete municípios do Amazonas entre 2013 e 2015. Porém, essas APMCs não tinham finalidade a prestação de serviços de transporte escolar.

Também durante sua gestão como ministro foi responsável por acabar com o programa de Bolsa Permanência de Indígenas e Quilombolas na Universidade pública.

Também foi um dos principais articuladores da implementação do Novo Ensino Médio, tanto em São Paulo quanto em nível nacional. Medidas que precarizaram a vida do trabalhador da educação e o ensino.

O secretário representa uma ameaça aos professores, a educação e as comunidades tradicionais, atendendo sempre interesses externos e favorecendo a burguesia e seus cúmplices. Uma investigação conduzida pelo jornalista Adriano Wilkson revelou possíveis irregularidades em contratos firmados pela Secretaria de Educação do Pará para o Centro de Mídia da Educação Paraense (CEMEP), estúdio em Belém responsável por transmitir aulas para escolas do interior do estado. Os valores pagos pelo governo para alugar equipamentos, como fones de ouvido e microfones, estão significativamente acima dos preços de mercado.

Wilkson também identificou contratos milionários, incluindo um com a Starlink, empresa de satélites do bilionário Elon Musk, para expandir o acesso à internet em áreas isoladas e viabilizar o ensino à distância. No entanto, os valores envolvidos geraram questionamentos sobre a transparência e a necessidade de gastos tão elevados.

O governo teria alugado 39 fones de ouvido por R$166 mil. Enquanto um fone de alta qualidade custaria, no máximo, R$2 mil. A SEDUC pagou R$4,2 mil pelo aluguel de cada unidade. Esses gastos excessivos explicam desvio de recursos públicos e as verdadeiras intenções do projeto de Educação à distância.

Enquanto a educação é sucateada, grupos ou indivíduos ligados ao agronegócio, empresas de tecnologias e a burguesia do Ensino à Distância estão se beneficiando financeiramente disso.

A exoneração de Rossieli Soares é uma medida fundamental para garantir uma educação de qualidade no Pará. Além disso, é crucial que ele seja responsabilizado por todos os crimes cometidos, tanto no estado quanto em suas gestões anteriores. A impunidade de Rossieli não pode ser tolerada, pois representa um risco para a justiça e para o futuro da educação pública.