Gabriel Galípolo na presidência do Banco Central: rentismo segue no comando

Trocou-se o presidente do Banco Central, mas a política segue a mesma. Nos último ano, os detentores de títulos da dívida pública tiveram um lucro de quase 1 trilhão de reais. A única diferença é que como o presidente do BC foi indicado por Lula, a simulação de luta dos dois anos vai desaparecer.

Gabriel Galípolo na presidência do Banco Central: rentismo segue no comando
Gabriel Galípolo, Presidente do Banco Central. Reprodução/Foto: Arthur Menescal/Bloomberg.

Por Redação

Gabriel Galípolo assumiu a presidência do Banco Central neste 2025. O presidente da República e a militância governista passaram dois anos com um discurso despolitizado que resumia todos os problemas na gestão do Banco Central ao fato do antigo presidente, Roberto Campos Neto, ser um bolsonarista. A ideia básica era: Campos Neto mantinha a taxa básica de juros (Selic) sempre alta porque, como bolsonarista, quer sabotar o Governo Lula-Alckmin e reduzir o nível de crescimento econômico e geração de emprego no país.

É importante lembrar um fato básico: desde o Plano Real, o Brasil tem consistentemente as maiores taxas de juros do mundo. Numa diversidade de presidentes da república, composições no Congresso Nacional e presidentes do Banco Central, é uma constante uma taxa de juros alta, remunerando os rentistas na casa dos milhões e bilhões. Isso por si só coloca em dúvida a consistência da retórica de resumir todos os problemas do Banco Central ao antigo presidente bolsonarista. Esse elemento até poderia ser usado, mas como um instrumento de agitação e parte de um debate mais amplo, sólido e consistente sobre a financeirização, rentismo e controle do capital sobre o Banco Central (BC).

Além deste elemento, vale lembrar que Gabriel Galípolo era diretor do Banco Central antes de se tornar presidente da instituição. Nas reuniões do Comitê de Política Monetária (Copom) cada diretor tem um voto, ou seja: para as decisões votam todos os diretores do BC e o presidente da instituição. Quando o bolsonarista Campos Neto era presidente, como votou Gabriel Galípolo? Atuou para baixar a taxa de juros? Era um contraponto ao presidente bolsonarista do BC? Não. O portal Poder360 elaborou um gráfico revelador com as votações de Galípolo e Campos Neto nas reuniões do Copom, vejamos:

Reprodução: Poder 360. Fonte: Banco Central.

Como o gráfico demonstra, nunca aconteceu qualquer divergência significativa entre Campos Neto e Galípolo. Enquanto o indicado por Bolsonaro era o presidente do BC, o discurso governista era dizer que o indicado de Lula deveria manter um perfil discreto e não buscar o confronto, para quando assumir a presidência, mudar os rumos da política monetária e do Banco Central. Se todos os problemas do mundo fossem por causa do presidente do BC bolsonarista, assim que assumisse o petista teríamos um céu de brigadeiro.

Pois bem, Gabriel Galípolo assumiu a presidência do BC. Na primeira reunião do Copom no novo cargo ele anunciou um aumento de 1% na taxa de juros e deixou encaminhado um novo aumento para reunião de março do Copom. Ou seja: a taxa Selic hoje está em 13,25% e em março vai para mais de 14%. Frente a essa decisão do Copom, com presidência e maioria dos diretores indicados por Lula, qual foi a nova mentira criada? A ideia de que Campos Neto montou uma armadilha para Galípolo, deixando indicado na ata do Copom de dezembro, mais dois aumentos da taxa de juros – um em janeiro e outro em março.

Agora o discurso oficial é que não é possível dar “cavalo de pau” na economia brasileira e que a baixa da taxa de juros é algo que virá com o tempo. É muito fácil desmontar essa mentira. Em dezembro, na última reunião do Copom com Campos Neto como presidente do BC, Galípolo outra vez votou junto com o bolsonarista. A conclusão é óbvia: se foi uma “armadilha” deixada, o indicado de Lula é um dos autores de tal armadilha.

Em segundo lugar, é falso resumir as opções de Galípolo a aumentar 1% a taxa de juros ou já em janeiro começar a redução da taxa Selic. O presidente do BC e os diretores indicados pelo Governo Petista poderiam ter mantido a taxa de juros, subido menos que 1% ou até, na ata do Copom, indicar uma nova leitura da realidade econômica do país, começando a desconstruir os mitos neoliberais que justificam uma irreal meta de inflação de 3% e a maior taxa de juros real do mundo.

O BC presidido por Galípolo não só aumentou a taxa de juros em 1% e indicou um novo aumento para março, como na ata da reunião, o discurso ideológico dos tempos de Campos Neto é o mesmo: é preciso aumentar a taxa de juros porque o mercado – como o mercado de trabalho – está aquecido demais e a única forma de controlar inflação é com política monetária, isto é, aumentando a taxa de juros.

Em suma, trocou-se o presidente do Banco Central, mas a política segue a mesma. Nos últimos 12 meses, os detentores de títulos da dívida pública tiveram um lucro de quase 1 trilhão de reais. A única diferença é que agora, como o presidente do BC foi indicado por Lula, a simulação de luta dos dois anos vai desaparecer. Ninguém verá mais Lula, Gleisi Hoffmann e a bancada do PT – e partidos satélites, como a majoritária do PSOL, dirigida por Guilherme Boulos e Erika Hilton – falando que o presidente do BC é um sabotador do país e funcionário do capital financeiro por manter a maior taxa de juros do mundo.