'Entre formalismos e juridiquês: o futuro da nossa organização. Tarefas da base e das direções nacionais' (Mateus Filgueira)

O intuito desta tribuna é trazer aos camaradas alguns pontos para além das disputas “””só políticas””” [propositalmente com muitas aspas], porque o futuro da nossa organização está também sujeito ao ordenamento jurídico.

'Entre formalismos e juridiquês: o futuro da nossa organização. Tarefas da base e das direções nacionais' (Mateus Filgueira)
"Nomes como “Revolucionário” “revolução” e variáveis podem ser entendidos como um atentado ao “estado democrático de direito” visto que uma revolução ameaça sim esse espantalho criado pela democracia burguesa chamado “estado democrático de direito”/”regime democrático”."

Por Mateus Filgueira para a Tribuna de Debates Preparatória do XVII Congresso Extraordinário.

Só vai haver uma judicialização do nosso racha se no XVII Congresso Extraordinário do PCB deliberarmos por disputar, junto ao Tribunal Superior Eleitoral, o nome, sigla, símbolo e legenda do PCB, mas é certo que o Comitê Central do PCB já optou pela judicialização da disputa da União da Juventude Comunista muito antes mesmo da Coordenação Nacional eleita no IX CONUJC ter soltado a nota de adesão ao Movimento de Reconstrução Revolucionária do PCB.

O intuito desta tribuna é trazer aos camaradas alguns pontos para além das disputas “””só políticas””” [propositalmente com muitas aspas], isso porque o futuro da nossa organização está sujeita sim ao nosso ordenamento jurídico, caso contrário, seríamos uma organização clandestina.

Nesta tribuna, por óbvio, vou trazer uma percepção formalista e uma preocupação jurídica sobre o tema (como o próprio nome da tribuna sugere), mas de forma alguma pretendo incentivar que abramos mão da nossa convicção política por um simples ajuste ao formalismo e à justiça burguesa, a ideia é fazer com que os camaradas possam interseccionar o formalismo com a disputa política.

Sei que nossos planos e anseios para esse novo ciclo de lutas do PCB e da UJC são grandes, mas tenho medo de estarmos nos perdemos na nossa utopia e esquecendo de preparar a possibilidade concreta para que ela aconteça.

I - SOBRE A UNIÃO DA JUVENTUDE COMUNISTA

A retirada do domínio do site da UJC (ujc.org.br) - que culminou num novo site para nós: ujcbrasil.com -, os ataques às redes da nossa organização (seja juventude, seja partido), mas principalmente o registro de marca da UJC junto ao Instituto Nacional de Propriedade Industrial antes da adesão da UJC ao PCB-RR [a reunião da CN para isso se deu dia 12 de agosto, o pedido de registro se deu 18 de julho] demonstram que o Comitê Central está buscando uma legitimidade, na justiça… o que, sinceramente, era de se esperar, porque nenhum “dos dois lados” aparenta abrir mão do nome, sigla, história (e cadeiras na UNE) que pertencem a UJC - tanto que o próprio CC fundou a UJC(doB) no final do ano de 2023 e a reivindica como a “verdadeira UJC”, sem um congresso de fundação e atropelando o próprio referendo que deram à atual CN no final do IX CONUJC perante as bases.

Isso posto, temos uma questão candente: vamos fundar uma nova juventude ou vamos disputar a UJC? Se a escolha for a primeira, é mais fácil. Abriremos mãos dos quase um século de história, lutas e glórias, abriremos mão ou brigaremos na UNE pelas cadeiras [o que até acho que deva dar pra chegar num consenso com o CC e com a UJS/majoritária sobre a divisão delas] e seguiremos completamente desvinculados do que outrora já fomos. Se escolhermos a segunda opção [espero e acredito que é o que se caminha o XVIIConExPCB], precisamos também trabalhar os aspectos de possibilidade jurídica da nossa disputa. Se não, camaradas, todo nosso esforço e luta será em vão já que a última coisa que a justiça burguesa vai se debruçar é na legitimidade política dos comunistas. Sinto em dizer que vai ganhar o nome da UJC (e até do Partido, caso seja isso que optemos) aqueles com maior arcabouço probatório para conquistar a legitimidade jurídica desse racha.

O CC já está se movimentando e criando seu arcabouço probatório… estamos nós? 

I.II - A UJC É NOSSA?

O estatuto da UJC é bem claro em dizer que a União da Juventude Comunista é a juventude do Partido Comunista Brasileiro e com autonomia relativa a ele, ou seja, não somos uma organização autônoma, somos uma organização subordinada a outra. Portanto, camaradas, uma vez que o PCB-CC optou por não reconhecer essa UJC, ela não é nossa.

“Ah, mas fomos expulsos sem Processo Disciplinar”, “Ah, mas temos um Estatuto e Pleno da CN aprovado em Congresso”... Bom, meu PD que culminou na minha expulsão por “ser de outra organização”, levou exatos 30 minutos para inventarem uma denúncia, montar comissão, montar documento e deliberar pela expulsão a tempo do golpe da Sec Juv do CC na reunião da CN; então ter um documento arranjando algum motivo - qualquer que seja - para expulsar cada um de nós, não será problema. Quanto ao Estatuto, é justamente ele que nos coloca subordinado ao CC.

E é justamente pelo Estatuto que nos rege que o PCB tem autonomia e legitimidade para fazer um CNPJ para UJC e registrar a marca, por exemplo. 

I.III - O QUE FAZER?

Finalizado o XVII Congresso Extraordinário do PCB deverá ser feito o X Congresso da UJC para que possamos adequar nosso estatuto ao que foi aprovado no XVIIConExPCB. Isso porque no estatuto teremos que modificar ou não: (1) nossa subordinação ao PCB, (2) se seremos a juventude do PCB ou de um novo Partido, (3) se seremos uma organização de juventude ou frente de juventude ou frente de massa do Partido, (4) se teremos diferentes instâncias para juventude ou Partido e etc.

Pode parecer trabalhoso e até custoso, camaradas [e é!], mas num sentido mais técnico da coisa, nos moldes do Código Civil, se nós aceitamos estar subordinados ao PCB (lê-se CC), então ele está sim acima de nós e nossas ações precisam sim ser referendadas por eles (principalmente aderir a um movimento que, à revelia da direção, está puxando um congresso). Não sou eu quem estou falando, é o Estatuto que nos rege.

II - SOBRE O PARTIDO

A partir daqui irei destrinchar a Lei dos Partidos Políticos (Lei nº 9.096/1995) e destacar alguns pontos que vejo como polêmico para nos atentarmos partindo do princípio que seremos um novo Partido. Caso seja aprovado para disputarmos nome, símbolo, sigla e legenda do PCB, sinceramente, não faço ideia de por onde começar (mas com certeza, precisaremos estar de acordo com essa lei para que possamos abrir o processo de disputa). 

Lembrando que o direito é subjetivo e volátil, logo, qualquer um de nós pode ter entendimento diferente, e até mesmo o juiz do TSE, por isso, esse debate por mais que seja formal/jurídico, é sobretudo POLÍTICO, mas tentarei partir de uma ótica para nos proteger de eventuais perseguições políticas e jurídicas. 

Algumas das pontuações que colocarei aqui, por questões políticas internas da nossa organização, só surgem e são debatidas se demandar das bases (como por exemplo: detalhar ou não como funciona um PD), mas MESMO QUE A BASE NÃO MODIFIQUE NOSSO ESTATUTO/PROGRAMA, é uma exigência do TSE e precisaremos SIM debater. Em alguns pontos, a CNP deverá incluir na versão final do debate para a etapa nacional FORÇANDO o debate (caso não tenha surgido espontaneamente pelas bases) para que cumpramos os requisitos postos pelo TSE da maneira mais democrática possível, que será nosso Congresso. Enfim, sigamos:

Art. 1º O partido político, pessoa jurídica de direito privado, destina-se a assegurar, no interesse do regime democrático, a autenticidade do sistema representativo e a defender os direitos fundamentais definidos na Constituição Federal.

Art. 2º É livre a criação, fusão, incorporação e extinção de partidos políticos cujos programas respeitem a soberania nacional, o regime democrático, o pluripartidarismo e os direitos fundamentais da pessoa humana.

Art. 6º É vedado ao partido político ministrar instrução militar ou paramilitar, utilizar-se de organização da mesma natureza e adotar uniforme para seus membros.

Destaquei esses pontos a começar pelo nome que iremos escolher. Nomes como “Revolucionário” “revolução” e variáveis podem ser entendidos como um atentado ao “estado democrático de direito” visto que uma revolução ameaça sim esse espantalho criado pela democracia burguesa chamado “estado democrático de direito”/”regime democrático”.

Outro ponto a ser destacado é que temos que ter um programa específico para ser registrado no TSE, obviamente, um programa que, sem rebaixar nossa linha política, não tenha coisas como “disputar militares para revolução”, “fim do Senado Federal” e etc… E sim, camaradas, um PL colocar isso num programa deles pode até ser aceito, mas a métrica com um partido comunista é diferente.

Art. 7º O partido político, após adquirir personalidade jurídica na forma da lei civil, registra seu estatuto no Tribunal Superior Eleitoral.
§ 1o  Só é admitido o registro do estatuto de partido político que tenha caráter nacional, considerando-se como tal aquele que comprove, no período de dois anos, o apoiamento de eleitores não filiados a partido político, correspondente a, pelo menos, 0,5% (cinco décimos por cento) dos votos dados na última eleição geral para a Câmara dos Deputados, não computados os votos em branco e os nulos, distribuídos por um terço, ou mais, dos Estados, com um mínimo de 0,1% (um décimo por cento) do eleitorado que haja votado em cada um deles.

Teremos que pensar num plano de logística e, principalmente finanças, para que consigamos cumprir essa exigência meramente burocrática dentro do prazo previsto. Serão dois anos insanos para nossa organização. Há outras regras no decorrer da lei, que serão igualmente difíceis, mas elas partem deste primeiro princípio aí, não vou me debruçar mais sobre isso, destaque só com caráter de alerta.

§ 3º Somente o registro do estatuto do partido no Tribunal Superior Eleitoral assegura a exclusividade da sua denominação, sigla e símbolos, vedada a utilização, por outros partidos, de variações que venham a induzir a erro ou confusão.

Outra atenção ao nome, para que não tenhamos que enfrentar problemas com o PCB e até o PCBdoB (quanto ao símbolo da foice martelo, não há problema porque não é um símbolo exclusivo de um partido)

Art. 8º  O requerimento do registro de partido político, dirigido ao cartório competente do Registro Civil das Pessoas Jurídicas do local de sua sede, deve ser subscrito pelos seus fundadores, em número nunca inferior a 101 (cento e um), com domicílio eleitoral em, no mínimo, 1/3 (um terço) dos Estados, e será acompanhado de:
I - cópia autêntica da ata da reunião de fundação do partido;
II - exemplares do Diário Oficial que publicou, no seu inteiro teor, o programa e o estatuto;
III - relação de todos os fundadores com o nome completo, naturalidade, número do título eleitoral com a Zona, Seção, Município e Estado, profissão e endereço da residência.
§ 1º  O requerimento indicará o nome e a função dos dirigentes provisórios e o endereço da sede do partido no território nacional.  

Destaquei esse ponto para que pensemos em (I) atentarmos em fazer ata do congresso (precisa ser congresso todo ou apenas essa polêmica em específico? algo a se procurar com um advogado especialista em questões eleitorais); (II) quem serão os fundadores da nossa organização (os membros eleitos pro CC? todos os delegados do congresso? camaradas históricos das nossas fileiras?)?; e (III) isso irá expor nossos militantes a um nível absurdo (haja visto os dados que pedem), logo, camaradas que pretendem carreira diplomática, juiz e etc não podem se comprometer com esses registros (haverá dirigentes clandestinos do CC não registrados no TSE? qualquer questão que ocorra dentro do CC estes militantes não poderão recorrer à Justiça já que para todos os fins não estarão registrados junto ao TSE)

§ 1º. O Partido comunica à Justiça Eleitoral a constituição de seus órgãos de direção e os nomes dos respectivos integrantes, bem como as alterações que forem promovidas, para anotação:
I - no Tribunal Superior Eleitoral, dos integrantes dos órgãos de âmbito nacional
II - nos Tribunais Regionais Eleitorais, dos integrantes dos órgãos de âmbito estadual, municipal ou zonal.

Atenção na eleição do CC para casos de quadros clandestinos e/ou camaradas que almejam cargos como diplomacia ou juízes e etc ou demais cargos públicos que impedem vinculação partidária (o que falei no ponto anterior).

Art. 11. O partido com registro no Tribunal Superior Eleitoral pode credenciar, respectivamente:
I - delegados perante o Juiz Eleitoral;
II - delegados perante o Tribunal Regional Eleitoral;
III - delegados perante o Tribunal Superior Eleitoral.
Parágrafo único. Os delegados credenciados pelo órgão de direção nacional representam o partido perante quaisquer Tribunais ou Juízes Eleitorais; os credenciados pelos órgãos estaduais, somente perante o Tribunal Regional Eleitoral e os Juízes Eleitorais do respectivo Estado, do Distrito Federal ou Território Federal; e os credenciados pelo órgão municipal, perante o Juiz Eleitoral da respectiva jurisdição.

Iremos credenciar? Qual será a composição? Competirá ao CC escolher? Será com pessoas da base? Será uma eventual equipe jurídica do Partido?

Art. 12. O partido político funciona, nas Casas Legislativas, por intermédio de uma bancada, que deve constituir suas lideranças de acordo com o estatuto do partido, as disposições regimentais das respectivas Casas e as normas desta Lei.

Assim como julgo importante termos um programa específico ao TSE, também devemos ter no estatuto questões mais específicas do âmbito eleitoral, como no caso de elegermos vereadores, prefeitos, deputados, senadores, governadores e etc…

Art. 15. O Estatuto do partido deve conter, entre outras, normas sobre:
I - nome, denominação abreviada e o estabelecimento da sede no território nacional;

Até 2019 todos os partidos políticos legalizados deveriam ter sede na capital federal, mas a Reforma Eleitoral de Bolsonaro modificou essa exigência, de qualquer forma, a sede deverá constar no estatuto, e não há este debate até o momento.

II - filiação e desligamento de seus membros;
III - direitos e deveres dos filiados;

É preciso colocar no Estatuto nosso parâmetro de filiação… até o momento não há nada disso.

IV - modo como se organiza e administra, com a definição de sua estrutura geral e identificação, composição e competências dos órgãos partidários nos níveis municipal, estadual e nacional, duração dos mandatos e processo de eleição dos seus membros;
V - fidelidade e disciplina partidárias, processo para apuração das infrações e aplicação das penalidades, assegurado amplo direito de defesa;

Precisaremos detalhar como funcionará nossos Processos Disciplinares [atualmente, foi resumido em apenas duas linhas].

VI - condições e forma de escolha de seus candidatos a cargos e funções eletivas;

Não há debate sobre isso, devemos colocar no Estatuto.

VII - finanças e contabilidade, estabelecendo, inclusive, normas que os habilitem a apurar as quantias que os seus candidatos possam despender com a própria eleição, que fixem os limites das contribuições dos filiados e definam as diversas fontes de receita do partido, além daquelas previstas nesta Lei;

Isso foi colocado nas Resoluções de Organização, deve ser aprofundado e colocado no Estatuto.

VIII - critérios de distribuição dos recursos do Fundo Partidário entre os órgãos de nível municipal, estadual e nacional que compõem o partido;
IX - procedimento de reforma do programa e do estatuto.
X - prevenção, repressão e combate à violência política contra a mulher.

Não há debate sobre isso, devemos colocar no Estatuto.

Art. 23. A responsabilidade por violação dos deveres partidários deve ser apurada e punida pelo competente órgão, na conformidade do que disponha o estatuto de cada partido.
§ 1º Filiado algum pode sofrer medida disciplinar ou punição por conduta que não esteja tipificada no estatuto do partido político.

Não apenas lavrar um PD, deveremos tipificar todas as condutas inaceitáveis; não há debate sobre isso, devemos colocar no Estatuto

Art. 31. É vedado ao partido receber, direta ou indiretamente, sob qualquer forma ou pretexto, contribuição ou auxílio pecuniário ou estimável em dinheiro, inclusive através de publicidade de qualquer espécie, procedente de:
I - entidade ou governo estrangeiros;

Separei este artigo mais como uma provocação ao CC que não prestou conta do financiamento para viagem à Coreia do Sul. Foi tirado do bolso do próprio companheiro? Foi o Partido que pagou? Foi algum outro partido que pagou (porque se foi, cabe uma denúncia por recebimento indireto de auxílio por entidade estrangeira)?

As demais disposições da lei versam sobre o recebimento de dinheiro, propaganda eleitoral e etc.; nada de imediato para que nos preocupamos até o XVII Congresso Extraordinário.

Finalizo esta tribuna incitando aos camaradas que prestem atenção nesses tópicos e pensem em como abordar isso em suas respectivas etapas de congresso, devido ao tempo e a própria falta de experiência não consigo pensar em todos eles para propor nesta tribuna.

No mais, não havendo demanda das bases para abordar esses temas, reafirmo o pedido o feito nos primeiros parágrafos: a CNP deverá incluir na versão final do debate para a etapa nacional FORÇANDO os debates (que não surgiram espontaneamente pelas bases) para que cumpramos os requisitos postos pelo TSE da maneira mais democrática possível, que será nosso Congresso.

Saudações comunistas.