Eleições em Niterói (RJ): extrema direita ganha espaço, PSOL rebaixa o programa e encolhe na Câmara
As eleições municipais burguesas em Niterói/RJ foram marcadas pela despolitização, avanço da extrema direita e encolhimento das forças políticas de esquerda.
Nota política do PCBR em Niterói (RJ)
Para as eleições municipais de 2024, o PCBR elaborou uma plataforma com 14 temas centrais que seriam norteadores da nossa postura durante o momento eleitoral. Dentre elas, destacamos a redução da jornada de trabalho do serviço público municipal para 30h, com proibição de realização de licitação com empresas que pratiquem a escala 6x1, o fim das OSs na saúde e na educação, a reestatização dos sistemas de água, esgoto e energia elétrica, a criação ou reforço de estruturas de saúde que possibilitem a prática do aborto legal com segurança, respeito e sigilo, entre outros.
Entendemos que a campanha deveria ser pautada por esses assuntos a fim de produzir avanço político sobre temas centrais para a vida da classe trabalhadora. No entanto, o que se viu foi uma campanha programaticamente muito rebaixada, sem discussão consequente e politizadora sobre a especulação imobiliária, a Enel ou ao trânsito caótico da cidade e o modelo rodoviário, motivo pelo qual não apoiamos ou chamamos voto para nenhuma candidatura, tanto no primeiro quanto no segundo turno.
De um lado, ocupando a prefeitura desde 2013, o grupo político de Rodrigo Neves (ex PT, hoje PDT), prefeito entre 2012 e 2016, e agora novamente prefeito eleito de Niterói, jogou com o peso da máquina. Desde 2013, a prefeitura vem sendo liderada por Axel Grael (ex PV, hoje PDT), sucessor de Neves. Utilizando-se de recursos acumulados com o tempo, como uma máquina pública com milhares de cargos comissionados a seu serviço como cabos eleitorais, apoio das empreiteiras (para quem a prefeitura recentemente liberou novas áreas de preservação para a especulação imobiliária) e diversos veículos de imprensa locais lhe concedendo notícias favoráveis diariamente, Neves veio tentando liquidar a fatura no primeiro turno.
Pela extrema-direita, a campanha do fascista Carlos Jordy, deputado federal pelo PL e ex -líder do governo Bolsonaro na Câmara dos Deputados, adotou uma tática de se apresentar como gestor humanizado, pacífico, com fala mansa e promessa de uma gestão “técnica”. Abordou temas como pontos de descanso para motoboys e acessibilidade para PCDs, com a leitura política de que uma campanha histriônica aos moldes bolsonaristas não lhe renderia bons frutos, e assim chegou ao segundo turno. O espetáculo bolsonarista foi protagonizado por figuras que concorriam ao legislativo, com acanhadas participações de Jordy em alguns vídeos com esse perfil.
Pelo outro flanco, tivemos a campanha de Talíria Petrone, deputada federal pelo PSOL. A campanha foi marcada pelo giro à direita que vem sendo feito pela ala majoritária do PSOL: semiótica verde e amarela nos materiais, um tom festivo no qual a candidata se colocava como “presidenta do país Niteroi” e a tentativa insistente de dividir o campo lulista com Neves foram as marcas da campanha. Fazendo repetidas menções ao presidente Lula para se colar na sua imagem, utilizando um tom descontraído, festivo e criticando Rodrigo Neves por ter trocado o PT pelo PDT durante o golpe de 2016, afirmando que apenas ela seria a candidata “leal” ao PT e ao lulismo, Talíria Petrone não animou e ficou apenas em terceiro lugar. Com isso, foi retirada do PSOL a posição de referência da oposição na cidade e, assim como na capital, o partido sofreu um encolhimento: na Câmara Municipal de Niterói, o partido perdeu uma cadeira e agora terá a presença apenas de Benny Briolly e Tulio.
Foi ensurdecedor o silêncio das campanhas sobre os desastres ambientais que vêm acometendo a cidade, como as chuvas de outubro de 2023 a março de 2024, que geraram inúmeros alagamentos sucessivamente, com ventos que causaram quedas de dezenas de árvores, destruição da infraestrutura urbana e, como consequência, apagão total em diversas regiões da cidade, que passaram até uma semana sem fornecimento de energia elétrica. Nem mesmo as ações diretas de moradores, queimando pneus nas estradas para chamar atenção e protestar contra a falta de energia elétrica, foram suficientes para que a campanha de Talíria Petrone encampasse o “Fora Enel” e se utilizasse da péssima reputação da empresa a nível nacional para pautar a reversão das privatizações e um modelo de gestão popular da energia elétrica, em pleno contexto de emergência climática.
No que diz respeito aos transportes, a campanha de Talíria raramente mencionava a proposta de tarifa zero, de forma superficial, sem mesmo pontuar explicitamente qual modelo de tarifa zero estava sendo proposto: o modelo liberal, que se limita a repassar os valores das passagens para as empresas privadas, ou a tarifa zero popular, construída com base em uma empresa pública com mecanismos de controle direto pela população.
Temas de repercussão nacional que afetam a realidade de Niterói também não foram mencionados no debate eleitoral, como o Novo Teto de Gastos e a liberação para privatizações na saúde e educação. Embora candidaturas do PSOL vinculadas à educação mencionassem o déficit de 3 mil crianças nas creches, nada foi dito sobre como o Novo Teto de Gastos (Arcabouço Fiscal) ataca diretamente os pisos constitucionais da saúde e da educação. Também não se viu menção à liberação geral do governo Lula-Alckmin para Parcerias Público-Privadas (PPPs) em escolas, UBSs, praças, áreas de conservação, presídios etc., ferindo de morte categorias como saúde e educação, base do próprio PSOL, além do prejuízo de se instituir de uma vez por todas a lógica da privatização e da mercadologização da saúde e da educação. As campanhas fortes pelo fim das OSs, vistas nas décadas de 2000 e 2010, não são mais ecoadas pelas figuras centrais do PSOL.
Ainda vale mencionar que a candidatura do PSTU, com Danielle Bornia na cabeça de chapa, foi de baixa intensidade e relevância, com tom autoproclamatório e abstrato em nome do socialismo e contra a burguesia, de forma pouco vinculada aos problemas cotidianos da cidade e com um nível de amadorismo que já se verificava na baixa qualidade dos próprios materiais desenvolvidos pela campanha. Embora tenha sido a única campanha comprometida com pautas da classe trabalhadora, infelizmente não agitou, não empolgou e novamente não conseguiu sair da irrelevância.
Para o segundo turno, tivemos uma disputa entre Rodrigo Neves, figura de centro com relevante carisma na cidade, que carrega consigo o legado das últimas 4 gestões e todo o peso da máquina, contra o fascista Carlos Jordy, do partido de Bolsonaro, que, embora tenha perdido por 57% a 42%, obteve mais de 116 mil votos. Embora tenhamos nos livrado por ora do desastre de um fascista na prefeitura da cidade, sabemos que a gestão do PDT em Niterói está comprometida com o grande lobby das construtoras para cima de áreas de preservação ambiental, das empresas de ônibus e da leniência com o péssimo serviço prestado pela Enel.
Para a classe trabalhadora de Niterói, a eleição de 2024 não trouxe nenhum saldo político positivo. Já para o fascismo, seu saldo foi a conquista de espaço enquanto oposição, com mais de 116 mil votos, contra um governo de centro já consolidado há muitos anos, num cenário em que o PSOL gira à direita e encolhe. Frente a esse contexto, convidamos as forças socialistas e antiimperialistas, que compartilhem de uma postura combativa pela esquerda, à construção de um projeto conjunto de poder popular para o município, com o qual seremos oposição a este e a qualquer outro governo burguês.