'Desalienar o trabalho militante, organizar o proletariado estudantil! Pela hegemonia proletária no ME universitário!' (Marte)

Essa tribuna traz reflexões e formulações sobre o movimento estudantil universitário, à luz de nossos objetivos estratégicos enquanto um partido que luta pela revolução socialista no Brasil e pela revolução proletária em todo o mundo.

'Desalienar o trabalho militante, organizar o proletariado estudantil! Pela hegemonia proletária no ME universitário!' (Marte)

Por Marte para a Tribuna de Debates Preparatória do XVII Congresso Extraordinário.

Saudações, camaradas. 

Essa tribuna traz reflexões e formulações sobre o movimento estudantil universitário, à luz de nossos objetivos estratégicos enquanto um partido que luta pela revolução socialista no Brasil e pela revolução proletária em todo o mundo. Essa é a questão central de minhas reflexões. No momento em que nos encontramos se faz urgente repensar nossa atuação no ME universitário para reorientarmo-nos no caminho da tomada do poder pelo proletariado, o caminho da construção da hegemonia proletária, rumo à revolução política e social no Brasil e no mundo. Por isso, afirmo desde já que a nossa atuação nas universidades (pré e pós racha) não segue esse caminho, salvo raras e honrosas exceções.

Causas e consequências do trabalho alienado no ME universitário

Antes mesmo da pandemia de COVID-19, quando o ME se encontrava bastante agitado por conta da situação política que vinha se gestando desde 2013, se encaminhando para o golpe de 2016 e a eleição de Bolsonaro em 2018, já era nítido que os comunistas tinham dificuldade de se diferenciar das outras forças políticas atuantes nas universidades. Não vou me debruçar aqui sobre as diversas tentativas de diferenciação que foram tentadas nesse período (visual/imagética, programática, discursiva, comportamental…). O que importa é que fracassamos, pois mesmo quando não fracassamos completamente, os ganhos eram muito pequenos e sempre seguidos de grandes perdas. Nas palavras do companheiro Ora Thiago, comunicador no YouTube, “vitórias simbólicas, derrotas concretas”. A UJC comete até hoje o erro de participar acriticamente de diversos processos eleitorais de entidades estudantis, recrutar de forma dissociada de nossos objetivos políticos e construir um movimento estudantil fechado em si, isolado do resto da sociedade. Não é só a UJC que faz isso, essas são práticas generalizadas no ME, não só universitário, e o problema é justamente esse. 

Atualmente, nosso trabalho nas universidades é extremamente alienado, no sentido de que não se sabe os porquês das coisas. Por que disputamos tal CA, por que recrutamos em tal curso, por que não fazemos isso ou aquilo…não sabemos. Eram poucos os organismos de base do ME universitário em que as coisas eram tratadas nesses termos até a cisão do PCB, entre julho e agosto do ano passado. De lá para cá, acredito que isso possa ter melhorado um pouco, considerando que muitos dos dirigentes que reproduziam essa militância alienada e alienante ficaram no PCB, mas o problema segue conosco, não somos um partido surgido do nada e isso significa concretamente que os problemas do PCB podem ser todos vistos nas fileiras do RR ainda hoje. É nossa tarefa transformar essa realidade. Até muito pouco tempo atrás, a lógica imperante na nossa atuação era jogar o grande jogo do ME universitário, disputar as entidades de base e os DCEs para conquistar mais e mais delegados para o CONUNE (Congresso da UNE), ganhando, assim, mais e mais cadeiras na Direção Executiva da UNE. Seria lindo se fosse assim! Sabemos que, no fim das contas, o que ocorre é que nos aliávamos com forças como Correnteza e correntes do PSOL, servindo de mão de obra gratuita para eles e ficando com menos cadeiras e delegados que eles, pois tanto o Correnteza quanto o PSOL são numericamente maiores que a UJC, em grande parte por conta de seus métodos de aproximação e recrutamento.

Falando em recrutamento, eis outra tarefa em que seguimos a moda do ME. O mais comum em nossas fileiras é recrutarmos amigos, parentes, pessoas com quem temos laços e afinidades pessoais, mas que não necessariamente são de interesse estratégico para o partido. Já vêm de anos nossas formulações sobre setores estratégicos do proletariado - mesmo com todos os erros - e por algum motivo a UJC fracassa em direcionar seus esforços de recrutamento para estudantes e trabalhadores desses setores. Com certeza é muito mais fácil recrutar onde já temos militantes ou recrutar pessoas que já conhecemos para além da militância, mas quando recusamos o desafio de nos inserir onde não estamos, está aí a nossa grande derrota, pois o maior desafio dos comunistas atualmente é justamente se re-inserir no seio do proletariado, de onde estamos muito distantes. 

Essa reprodução acrítica do recrutamento por afinidades pessoais e por comodidade de não ter que planejar a inserção em novos cursos, novos campi, etc, leva à reprodução acrítica de outra prática: a construção de um ME em-si-mesmado. Geralmente, nossa inserção se dá primeiro em cursos de história, letras, geografia, ciências sociais, filosofia, humanidades em geral. Nesses cursos, encontramos grandes debates sobre a sociedade, a história, etc, mas não se fala da realidade concreta da classe hoje, pelo menos não de forma propositiva. Não se toca em questões que são centrais para a tomada e a manutenção do poder político pelo proletariado, como a questão energética, gestão de recursos naturais, questões objetivas na luta pela manutenção da soberania popular, entre outros temas que não cabem nesta tribuna. Se queremos nos inserir na universidade para questionar as fundações dela, precisamos estar em cursos que consigam dialogar com a classe para fora da universidade, cujos estudantes estejam preocupades com questões do dia-a-dia da classe, e não somente com discussões sobre a ontonegatividade do capital, as dinâmicas de micropoder no antropoceno e a revolução molecular. É claro que o combate à ciência burguesa passa pelo enfrentamento a todo tipo de produção alienada e alienante de ciência e isso envolve as ciências humanas, mas geralmente o que se vê na realidade é que não importa quantas discussões acadêmicas alguém pode ter sobre o capital na universidade, a materialidade da experiência vivida sob o capitalismo muitas vezes equivale a centenas e centenas de páginas de teoria marxista, pois vejam só, é daí que a teoria marxista vem e é para aí que ela volta: a prática!

Não podemos seguir construindo um ME universitário apartado do resto da realidade da classe e ao mesmo tempo nos perguntarmos por que o povo não se importa tanto assim com o sucateamento das universidades públicas no Brasil. Há um apelo genérico pela defesa da educação, algo muitas vezes romântico e idealista, mas esse apelo subjetivo por si só não é suficiente para que o povo se mobilize para a luta em defesa da educação superior pública, gratuita e universal em nosso país. Se as pessoas não vêem como a universidade (não) faz parte de suas vidas, não “entendem” a importância do ME universitário na vida política do Brasil, elas não vão se mobilizar, e é aí que vem o nosso trabalho. Temos que mostrar para nossa classe como a universidade é um instrumento extremamente poderoso na transformação da realidade e como esse instrumento vem sendo ostracizado e, quando utilizado para algo, é para mudar nossas vidas para pior. Mas para isso, temos que saber para que serve a disputa de uma entidade de base o geral do movimento estudantil, temos que saber quem queremos recrutar e por que, temos que saber como conectar as pautas da universidade com as pautas da maioria da classe, que não frequenta a universidade mas é afetada direta ou indiretamente por coisas que acontecem dentro dela.

Até agora, da reprodução acrítica da política senso comum do ME em nossas fileiras, só colhemos sobrecarga, disputismo vazio, recrutamentos que não duram ou que dão muito trabalho para se efetivarem enquantos militantes de fato e, como consequência disso tudo, muito trabalho sem qualquer sentido político concreto, trabalho alienado que nos aliena da realidade material do proletariado estudantil e do proletariado em geral e não nos dá nem algumas cadeiras xexelentas da executiva da UNE em troca. Não preciso citar aqui exemplos dessa alienação, basta abrirmos o falecido twitter e rolar a página por alguns minutos que lá estão os exemplos. 

Medidas para a edificação de um Movimento Estudantil Universitário proletário e combativo

Camaradas, listo a seguir o que acredito serem as diretrizes para uma verdadeira transformação do trabalho dos comunistas no ME universitário, que se seguidas podem mudar o Movimento Estudantil como um todo, pois as penso no sentido da construção da hegemonia proletária nas universidades, diferenciando-nos das organizações da pequena-burguesia e da burguesia, visando a disputa de poder com as administrações das universidades, com o objetivo de exigirmos a estatização de todas as universidades privadas e o controle popular de todas as universidades públicas, a partir de conselhos universitários com representação paritária dos três setores da comunidade universitária e mecanismos de pressão sobre as administrações das universidades.  Atualmente no Brasil contamos nos dedos quais universidades são bem administradas e não têm debilidades em estrutura, orçamento, corpo docente e de funcionários em geral. Tanto o Estado como as empresas privadas vêm se mostrando verdadeiras destruidoras das universidades, isso é parte do projeto das classes dominantes do Brasil e do mundo para a classe trabalhadora de nosso país, é parte da realidade dos trabalhadores no capitalismo dependente. 

Se não podemos confiar as universidades à iniciativa privada, muito menos ao Estado burguês, que é justamente quem sucateia as universidades públicas, ao mesmo tempo que enche os bolsos dos grandes conglomerados de educação privada. O projeto burguês para o Brasil é a política de terra arrasada, de regressão para as condições de existência dos trabalhadores aos tempos anteriores ao varguismo e às lutas do movimento operário no Brasil. A realidade das classes trabalhadoras brasileiras até hoje é majoritariamente a escravidão (oficialmente de 1530 à 1888. Façam a conta “2024 -1888” para ver a quanto tempo a força de trabalho é “livre” no Brasil), e é para ela que a burguesia nos encaminha novamente, de modernização conservadora em modernização conservadora. Um elemento central na luta de classes no Brasil é o combate a esse projeto de reconstituição de um cenário de trabalho escravo institucionalizado e generalizado em nosso país. A disputa das consciências sobre o papel do desenvolvimento científico e tecnológico, o direito à educação e a garantia das condições materiais para o exercício desse direito (permanência estudantil) desempenha um papel fundamental nesse combate.

 É nesse sentido que elenco as seguintes diretrizes para a construção de um Movimento Estudantil universitário proletário, comunista e revolucionário:

  1. Reorientar o ME à luz de nossos objetivos estratégicos
  • Disputar a consciência das comunidades universitárias sobre o projeto burguês de universidade, educação e ciência
  • Lutar pela permanência do proletariado nas universidades por todos os meios necessários
  1. Demarcar as diferenças entre a política proletária e a políticas de todas as outras classes
  • Postura de combate e constrangimento dos docentes vacilantes e reacionários
  • Combate às organizações do campo democrático-popular
  • Pressão sobre os partidos pequeno-burgueses ditos radicais/oposição de esquerda da UNE
  1. Organizar a juventude proletária nas universidades
  • Inserção nas universidades privadas de massa
  • Trabalho com coletivos de bolsistas, residentes das moradias estudantis, estudantes com filhes e estagiáries 
  1. Construir poder material nos espaços do ME
  • Treinamento de defesa pessoal e artes marciais para mulheres, LGBTs e pessoas racializadas
  • Organização de “grupos de combate às opressões” (com um dept. jurídico incluso)
  • Buscar fazer o trabalho que as administrações das universidades falham ou se recusam a realizar

Reforço que essas são apenas diretrizes, a linha central para guiar nossas ações. Cada ponto listado tem dentro de si uma infinidade de desenvolvimentos possíveis, um sem número de táticas que devem ser pensadas e aplicadas de acordo com a realidade de cada local específico. Espero que após o encerramento de nosso congresso, possamos organizar uma conferência nacional da juventude, não só para pensar o ME universitário, mas principalmente para formularmos como instrumentalizá-lo à serviço da juventude trabalhadora e do proletariado como um todo. Acho bom pontuar que não vejo o ME universitário como espaço prioritário para a UJC, entendo que temos muito mais a ganhar desenvolvendo nosso trabalho com a juventude trabalhadora que se encontra fora das universidades (que é a grande maioria da juventude). No entanto, isso não significa que devemos abandonar as escolas e universidades e, sendo assim, temos que ter uma atuação consequente nesses espaços, para não perder mais tempo do que já perdemos nos últimos anos. 

Venceremos!