Correios em luta: Greve Nacional contra o desmonte da Estatal

Os Correios têm sido alvo de diversas tentativas de privatização, refletindo o constante embate entre os interesses do capital privado e a defesa de um serviço público essencial para o povo brasileiro.

Correios em luta: Greve Nacional contra o desmonte da Estatal
Reprodução/Fonte: Sintectrj

Por Redação

Os trabalhadores dos Correios deflagram greve nacional por tempo indeterminado iniciada no dia 7 de agosto. Essa decisão foi fruto de um longo processo de negociação frustrado, onde após 14 rodadas de reuniões com a direção da estatal, não houve avanços significativos que atendessem às demandas urgentes da categoria. Em carta aberta à população, os trabalhadores deixam claro que a paralisação é uma resposta necessária diante da intransigência da empresa e do governo federal, que se recusaram a discutir 35 cláusulas essenciais para a manutenção de condições dignas de trabalho.

Entre as principais reivindicações da categoria está a luta por um reajuste salarial imediato que contemple as necessidades reais dos trabalhadores. A proposta apresentada pela empresa de um pequeno reajuste apenas em 2025 ignora a data-base de 1º de agosto de 2024, instrumento legal de reposição salarial previsto na Constituição Federal que visa evitar a defasagem salarial do trabalhador. A categoria também denuncia a situação precária do plano de saúde dos Correios, que hoje se tornou inacessível para mais de 20 mil trabalhadores devido aos altos custos de mensalidades e coparticipações: "Solicitamos a redução desses custos para manter este benefício vital", afirmam os trabalhadores em sua carta aberta.

A greve também levanta a bandeira da realização de novos concursos públicos, uma demanda crucial para reverter o sucateamento deliberado da empresa. Desde 2011, não houve novas contratações significativas, resultando em uma drástica redução do efetivo de 127 mil para os atuais 78 mil trabalhadores. Este déficit impacta diretamente a qualidade dos serviços prestados à população, sobrecarregando os trabalhadores restantes e tornando inviável a manutenção do nível de trabalho estratégico e logístico de sua responsabilidade.

As tentativas de privatização da Estatal

Os Correios têm sido alvo de diversas tentativas de privatização, refletindo o constante embate entre os interesses do capital privado e a defesa de um serviço público essencial para o povo brasileiro. Desde o governo de Fernando Henrique Cardoso, nos anos 1990, as discussões sobre a privatização da empresa começaram a ganhar força, impulsionadas por uma política neoliberal que buscava desmantelar o patrimônio público em prol de interesses financeiros. A resistência dos trabalhadores, organizados em sindicatos combativos, foi fundamental para barrar essas investidas, mantendo a estatal sob controle público, mesmo diante de pressões intensas.

O governo de Michel Temer, que assumiu após o golpe jurídico-parlamentar de 2016, intensificou as tentativas de privatização, promovendo o sucateamento dos Correios como estratégia para justificar a venda da empresa. A redução de investimentos, a precarização das condições de trabalho e a terceirização foram apenas algumas das medidas adotadas para enfraquecer a estatal, alimentando um discurso de ineficiência e inviabilidade econômica. O governo Temer, entretanto, em seu relatório intitulado “Transição de Governo 2018-2019”, não recomenda a privatização dos Correios para o próximo governo, em razão das múltiplas tarefas cumpridas pela empresa e a dificuldade de fornecer uma estrutura logística para atender os rincões mais longínquos do território nacional por parte da iniciativa privada. O cenário de precarização, porém, ainda foi agravado durante o governo de Jair Bolsonaro, que colocou a privatização dos Correios como uma de suas prioridades e entregou o projeto de privatização da estatal ao então presidente da Câmara Arthur Lira, ainda em 2021.

A resistência dos trabalhadores dos Correios, no entanto, não cessou. Mobilizações e discussões sobre possíveis greves se tornaram frequentes, especialmente em momentos críticos, como em novembro de 2023, quando houve acordo sobre reajuste e novos concursos. Hoje, trabalhadores de diversos estados paralisaram suas atividades em resposta à tentativa de imposição de um reajuste zero pelo governo Lula-Alckmin, que perpetua a precarização e demonstra que os ataques aos serviços públicos, iniciada por governos anteriores, permanecem em curso.

O desmonte do plano de saúde da categoria

Nos últimos anos, os trabalhadores dos Correios têm enfrentado um verdadeiro ataque aos seus direitos em relação ao seu plano de saúde. O que antes era um benefício sólido e acessível, foi corroído por um processo de privatização que visa transformar o Correios Saúde em um convênio privado. Desde 2014, quando a gestão do plano foi terceirizada para a Postal Saúde, os custos dispararam e a qualidade dos serviços despencou. Clínicas e hospitais estão se descredenciando devido à falta de pagamentos, como é o caso do Mater Dei, maior hospital de Belo Horizonte, que deixou de trabalhar com o Postal Saúde, retornando somente após pressão da categoria por melhoria dos serviços do seu plano.

Esse desmonte não é apenas uma questão de gestão ineficiente; é parte de uma estratégia maior para fragilizar a empresa e pavimentar o caminho para a privatização, removendo as seguranças adquiridas pelo funcionalismo público e os direitos pelos quais lutaram a categoria de funcionários dos Correios. Com o discurso de gastos “insustentáveis”, a mudança para o modelo de “coparticipação” resultou em gastos inflacionados em até quatro vezes mais por parte da gestão privatizada. Impor mensalidades aos trabalhadores em um contexto de piora drástica dos serviços é uma clara afronta a um direito conquistado.

A importância logístico-estratégica para o Brasil

Os Correios, com mais de 350 anos de existência, desempenham um papel fundamental na integração do território brasileiro, conectando todas as regiões do país e crescendo em relevância no cenário nacional após a pandemia da Covid-19. Em um cenário onde o comércio eletrônico se tornou vital para a população, os Correios foram responsáveis pela entrega de mais de dois terços das mercadorias. Sua atuação abrange ainda a execução de políticas públicas essenciais, como a distribuição de vacinas e materiais de saúde para postos do SUS, entrega de livros didáticos e provas do ENEM em todo o território nacional, e até mesmo o transporte de urnas eletrônicas para as eleições. Essas funções só são possíveis graças à capilaridade única dos Correios, presentes nos 5.570 municípios brasileiros, algo que empresas privadas dificilmente conseguiriam replicar, já que a lógica do capital imposto ao setor privado não prevê os melhores serviços de transporte e logística para toda a população, mas somente a garantia dos lucros.

Além disso, os Correios operam sem utilizar recursos de impostos, financiando suas operações inteiramente com seus próprios lucros. Essa autossuficiência financeira demonstra que a empresa é não apenas viável, mas essencial para o funcionamento do país, especialmente em tempos de crise. Mesmo assim, a proposta de privatização ressurge periodicamente, muitas vezes desconsiderando as complexas consequências para a soberania nacional e a integração territorial. A experiência de países como Argentina e Portugal, onde a privatização dos serviços postais resultou em restrições de atendimento e desassistência nas regiões menos lucrativas, serve como um alerta para o Brasil. A entrega de um serviço tão estratégico para empresas privadas, especialmente estrangeiras, não apenas comprometeria a universalidade do serviço, mas também colocaria em risco a segurança dos dados dos cidadãos brasileiros.

A ampliação da luta

Neste contexto, é urgente que a luta dos trabalhadores dos Correios seja ampliada para todo o Brasil. A resistência não pode se limitar a um único setor ou categoria, mas deve ser incorporada por todos aqueles que defendem os serviços públicos, a dignidade no trabalho e os direitos sociais, sobretudo neste momento de ascensão de medidas de arrocho salarial e corte de investimentos públicos guiadas pelo Novo Teto de Gastos do Governo Lula-Alckmin. Como bem expressa a carta aberta dos trabalhadores: "Nossa luta é por condições de trabalho dignas, reajuste salarial e benefícios justos, além de um plano de saúde acessível." A mobilização não é apenas pelos trabalhadores dos Correios, mas por toda a classe trabalhadora brasileira, que enfrenta o mesmo desmonte e a precarização promovidos por uma agenda neoliberal que prioriza o lucro em detrimento de condições dignas de vida, trabalho e lazer.