'Cautela, camaradas! Outras tantas palavras sobre a formação' (Contribuição anônima)

Nas formações temos a oportunidade de conhecer nossos camaradas, de ver quais são as divergências teóricas em nossas fileiras de maneira exposta e suscitar debates que poderão nos levar além em nossas concepções políticas básicas.

'Cautela, camaradas!  Outras tantas palavras sobre a formação' (Contribuição anônima)
"O Centralismo Democrático, por exemplo, é um termo diariamente utilizado por todos nós tanto interno quanto externamente, mas apenas em seu brocardo "discussão interna, unidade externa". É produtivo continuarmos assim?"

Contribuição anônima para a Tribuna de Debates Preparatória do XVII Congresso Extraordinário.

Convencimento, camaradas. Essa é a base de nossa organização. Sem esse instrumento, estamos fadados a repetir os mesmos vícios personalistas que tantas vezes foram motivo de derrota em nossas fileiras. Se estamos dispostos a construir uma nova lógica organizativa, se acreditamos que é possível a melhora de nossa vida interna, precisamos, primeiramente, garantir que obtenhamos resultados pelo convencimento.

Começo a tribuna com uma crítica: ora, se é bem verdade que as tribunas preparatórias têm a função garantir o livre e público debate entre todos aqueles dispostos a somar em nossas fileiras, como pode ocorrer que camaradas se recusem a utilizar desta plataforma? Para ser mais específico: como pode um camarada achar razoável não criticar, mas caçoar de um texto em um espaço inadequado como é o do Twitter? Esse instrumento que temos em nossas mãos deve ser utilizado para que consigamos afiar nossas argumentações, para que seja aguçada e certeira nossa posição sobre os temas debatidos. Se começarmos a ridicularizar textos feitos de boa vontade por outros camaradas ao invés de os rebater teoricamente (formalmente) com tribunas de oposição, o que nos resta senão uma guerra digital de clãs? A linguagem vexatória utilizada nas redes sociais deve ser inadmissível se assumirmos que temos, sim, o compromisso de ser vanguarda na emancipação de nossa classe contra a exploração. Caso contrário, então não nos diferenciamos em nada de grupos de extrema-direita que se utilizam do ambiente virtual para criar edições e memes com o simples intuito de deboche aos opositores.

Inicia-se o texto desse modo pois sinto que é um exemplo paradigmático sobre como temos, cada vez mais, nos debruçado sobre um discurso que é, em essência, uma fábula: pregamos o convencimento, mas o que temos feito para, de fato, convencer?

Percebam que não exploro aqui um argumento de ilegitimidade ao novo movimento que se inicia, mas tão apenas evidencio que temos falhado como um todo em algo basilar para nosso sucesso. É fundamental desde já eliminarmos tendências de grupismo em nossas novas fileiras. Ora, é evidente que não digo nada novo para aqueles que estejam analisando criticamente nosso cenário atual. Nosso diferencial deve ser, nesse próximo período, dar ênfase em algo há muito deixado de lado ou colocado em papel de secundariedade: a formação política.

Camaradas, com formação não digo de nosso modelo datado de educação bancária onde um camarada concentra o conteúdo apresentado e se coloca como "especialista provisório" no assunto, apresentando um PowerPoint ou, então, lendo um texto que só ele imprimiu. Formações não são meras aulas. Se nos debruçamos em um modelo já ultrapassado de desenvolvimento político subjetivo, estamos fadados a repetir o que há tanto tempo já temos: formações verticais, pautadas por um monopólio de conhecimento concentrado em alguns quadros e, para os outros, uma posição simplista de "concordantes" ou de críticos pontuais.

Não nego o papel que as apresentações têm em nosso aprendizado, como no caso de uma eventual formação de apresentação e contextualização sobre a República Democrática Alemã, tão porém enfatizo que precisamos extrapolar essa barreira. Nas formações temos a oportunidade de conhecer nossos camaradas, de ver quais são as divergências teóricas em nossas fileiras de maneira exposta e suscitar debates que poderão nos levar além em nossas concepções políticas básicas. O Centralismo Democrático, por exemplo, é um termo diariamente utilizado por todos nós tanto interno quanto externamente, mas apenas em seu brocardo "discussão interna, unidade externa". É produtivo continuarmos assim?

A formação política deve ser utilizada como ferramenta para a fortificação do "subjetivo militante" entre os membros de nossas fileiras. Explico: com "subjetivo militante", me refiro à capacidade de análise e, fundamentalmente, de discernimento sobre como e, principalmente, da possibilidade de atuação. É do conceito básico de convicção política obtido não pela emoção, pelos amores, mas pelo convencimento. É de fortalecimento de um projeto que transcende o "eu", mas que em nada se assemelha a uma seita.

Sobre o convencimento, vale trazer um axioma da educação que é o de que "é ensinando que se aprende". Notem que isso não significa ensinar o que não se sabe, mas justamente de que o movimento de apresentação de um tema que julga-se conhecido por aquele que o apresenta é o momento em que a socialização serve como motor para aparar (lapidar) o pensamento. É evidente que surgirão dúvidas nunca nem pensadas sobre o tema, afinal, temos vivências muito diferentes.

Como podemos observar na "Teoria da Argumentação" de Robert Alexy, "os fatos são a sustentação de um argumento". É da teoria que um juiz não pode, simultaneamente, julgar uma decisão e a considerar injusta, visto que foram utilizados fatos lógicos em cadeia para chegar até a decisão. É uma teoria funcional para o processo jurídico, mas que pode ser exportada no que diz respeito ao nosso método argumentativo. Precisamos estar munidos das armas da teoria, senão de que modo poderemos defender nossos ideais?

Pode ser interpretado esse texto como uma crítica à base, erroneamente afirmando que "a base não estuda", mas é justamente o oposto. É uma crítica às dirigências. Ao adotarmos um ritmo produtivista, com relação semelhante a uma empresa, alimentando poucos espaços de crítica e de reflexão às tarefas tocadas, criamos uma massa amorfa não de cabeças pensantes, mas de camaradas que "botam fé". Estamos fadados a repetir as formações espontâneas de quadros, dando espaço de florescimento a uma parcela muito pequena e seleta da nossa militância: aquela com acesso à crítica.

Precisamos pensar meios alternativos de formação que garantam a participação do pleno, seja em seminários de apresentação, um sarau literário, com a produção de um material coletivo feito após a formação dada, etc. É um movimento de estimular o estudo e garantir que tenhamos quadros preparados para os inevitáveis e muito evidentes problemas que enfrentamos.