'Causa animal: Uma nova pauta para um novo partido' (Contribuição anônima)

A exploração animal é parte intrínseca do nosso sistema de produção. Utilizamos animais para tudo: alimentação, vestimenta, testes farmacêuticos, entretenimento (como rodeios, pesca esportiva, vaquejadas, zoológicos, etc), comércio de filhotes de raças, dentre inúmeras outras coisas.

'Causa animal: Uma nova pauta para um novo partido' (Contribuição anônima)
"Embora o foco aqui seja a luta por uma alimentação sem exploração animal e humana, e nosso papel em reproduzir culturalmente esse objetivo para uma futura revolução, pautas como vacinação e hospitais veterinários gratuitos para animais, touradas, adoção de animais em situação de vulnerabilidade, castração para evitar a superpopulação de cães em gatos nas ruas, dentre outras, raramente são discutidas por bocas marxistas."

Contribuição anônima para a Tribuna de Debates Preparatória do XVII Congresso Extraordinário.

Essa reflexão vem da onda de reivindicações acerca da adesão do partido, e da esquerda marxista como um todo, à pauta animal, levantada por alguns camaradas em suas tribunas.

É seguro dizer que de todas as pautas que tratam da defesa de determinados grupos oprimidos dentro e por conta do sistema capitalista, a pauta animal é uma das mais recentes. Esse ao meu ver, é um dos principais fatores que fazem a causa ser tão pouco debatida dentro de qualquer espaço, marxista ou não. E claro, a exploração animal é parte intrínseca do nosso sistema de produção. Utilizamos animais para tudo: alimentação, vestimenta, testes farmacêuticos, entretenimento (como rodeios, pesca esportiva, vaquejadas, zoológicos, etc), comércio de filhotes de raças, dentre inúmeras outras coisas. Logo, é de se esperar que isso reflita em nossa cultura e em como pensamos o lugar destes seres no mundo que vivemos.

Tendo dito isso, imagino que nosso papel enquanto comunistas seja justamente questionar a superestrutura que advém do sistema capitalista. E até ir além ao meu ver, tendo em vista que o patriarcado por exemplo, antecede o capitalismo, apesar de ser parte intrínseca dele também.

Assim como outros camaradas apontaram, sobretudo a companheira Maria Fernanda Moneda em seu texto ''Se a cooptação liberal das lutas anti-opressão não nos afasta delas, por que nos afasta do veganismo?'', é de se espantar, lendo alguns comentários das respectivas publicações, colocações que só posso classificar como reacionárias, vinda do nosso próprio campo. Acusações da pauta ser liberal, pequeno-burguesa, branca, moralista cristã, dentre outros adjetivos, mostram ao meu ver uma desonestidade intelectual tremenda no pior dos casos, ou um conhecimento raso sobre o que estes termos significam. Chamar de liberal tudo aquilo que você não gosta equivale ao bolsonarista que diz que tudo é comunismo para as pautas que lhe incomodam.

Apesar de uma maioria ter aplaudido e aceitado a pauta animal/vegana dentro dos comentários, numa minoria, majoritariamente masculina, parece ter acendido um reacionarismo disfarçado de preocupação social. Dentre estes por exemplo, houve um comentário sobre como a esquerda as vezes perde tempo com pautas frívolas. Ao citar exemplos destas pautas frívolas, cita o veganismo e pronomes neutros. Ao meu ver, não é coincidência que os mesmos indivíduos que se opõem a causa animal, são aqueles que colocam uma das discussões da comunidade LGBTQAI+ como irrelevantes.

No manifesto do PCB-RR, muito se falou sobre (e com toda a razão) as empinadas à direita que o PCB teve em certos momentos, dentre outras questões. Penso que se o objetivo deste novo partido é uma melhora em relação a sua encarnação anterior, que é totalmente incoerente desmerecer uma luta tão recente e que em tudo tem a ver com nossa causa, como fizeram (e ainda fazem em alguns casos) os movimentos feministas do passado, ao não considerarem as mulheres negras e trans em seus meios, ou como outras pautas relacionadas à identidade foram só recentemente bem vindas às nossas trincheiras. Se queremos um partido novo, devemos nos livrar de velhos conceitos banhados em patriarcado e conservadorismo, mesmo quando estes vem disfarçados ou erroneamente defendidos como sendo em nome do povo.

Lembremos que não acreditamos em espaços vazios. Se a esquerda não ocupar o espaço de discussão sobre libertação e exploração animal, a direita certamente irá. E já tem feito isso, na verdade. Embora o foco aqui seja a luta por uma alimentação sem exploração animal e humana, e nosso papel em reproduzir culturalmente esse objetivo para uma futura revolução, pautas como vacinação e hospitais veterinários gratuitos para animais, touradas, adoção de animais em situação de vulnerabilidade, castração para evitar a superpopulação de cães em gatos nas ruas, dentre outras, raramente são discutidas por bocas marxistas. Protetores e resgatadores de animais, sejam eles apenas de ''pets'' ou não, donos de ONG's que manejam santuários ou abrigos temporários, são trabalhadores EXTREMAMENTE precarizados, vivendo em grande parte de doações espontâneas individuais. São em sua grande parte mulheres, e totalmente esquecidas pelo Estado - e por nós, a esquerda radical.

Como bem lembra uma contribuição anonima desta tribuna sobre o assunto:

''Falemos por exemplo do Veganismo Popular. Enquanto defendido por Ecossocialistas e grupos Anarquistas, que já superaram a crítica de que o veganismo seria elitista, tal tema nem é cogitado pelos leninistas.

No que toca ao debate sobre soberania alimentar e relações de produção que diminuam a exploração animal e humana, é comum que nosso campo fale de um trabalhador idealizado que não teria condições de entender o  veganismo, mas não consideram os trabalhadores de frigoríficos que estão entre os mais precarizados, desenvolvendo doenças físicas e mentais.  Como mencionar o debate da crueldade animal e preservação da Natureza se isso é considerado anti-marxista? Camaradas, as lutas pelos animais não humanos, pela Natureza, e pela classe trabalhadora estão interligadas. As falhas em ver isso são justamente por estarmos atrasados na Ecologia Marxista.''

Por isso, não só proponho a criação de um coletivo antiespecista, semelhante aos coletivos dedicados à questões LGBTQI+, feministas, raciais, etc, dentro do partido, como convido à todos os outros comunistas veganos ou ainda não veganos, mas simpatizantes da causa, a se manifestarem da forma que puderem, ou através destas tribunas, e continuarem na construção de um partido cada vez mais preocupado e coerente com todos os seres explorados pelo sistema que vivemos. Por uma conduta e práxis comunista!

Finalizo com uma passagem da autora Maila Costa em seu texto ''O Marxismo e a Questão Animal:

''Se os animais, por não serem humanos, não fazem parte da nossa classe, também não fazem parte da classe dominante, e possuem muito mais em comum conosco do que com eles, seja em relação à exploração, à  privação de liberdade ou à comoditização. A moral comunista, como desenvolvimento da moral proletária vislumbrada por Engels, só poderá  ser construída com base na rejeição a todas as formas de opressão, portanto, consideradas as relações de produção presentes, devemos rejeitar a exploração animal, incorporando a luta por sua libertação à luta por emancipação humana, uma vez que não há justificativa, que não no moralismo burguês, para a aplicação industrial do sofrimento.''